Quem tem medo do MAPPOINT 2000?

Setores censitários de São Francisco agrupados por renda per capita, gerados pelo MapPoint
(Fonte: Microsoft Corp.)

Provavelmente é a novidade mais esperada do mercado de geotecnologias desde há muito tempo. Com lançamento no próximo 10 de junho, o novo produto da Microsoft (MapPoint 2000) representa a entrada de Bill Gates no mundo do GIS. As dimensões psicológica e mercadológica deste anúncio já foram discutidas anteriormente (GIS é como um grão: tem que morrer para germinar, InfoGeo nº 4), mas em se tratando da Microsoft o assunto desperta tantas emoções que acreditamos ser útil fazer uma análise detalhada do produto e tentar especular sobre seu impacto.

Em que consiste o MapPoint2000? Um software orientado para aplicações comerciais das geotecnologias, especialmente mapeamento de mercados, localização de endereços, e planejamento de rotas (capacidades de business geographics). Permite visualizar pontos, linhas e polígonos, criar mapas temáticos e importar dados tabulares do Excel, Access e arquivos de texto (para maiores detalhes, veja-se www.microsoft.com/mappoint).

Um aspecto a destacar no MapPoint são suas tecnologias de visualização e endereçamento. Pelas informações disponíveis, os mapas apresentados estão no formato matricial (imagens) e não em representações vetoriais, adotadas pela maioria de sistemas. Comenta-se que o MapPoint2000 utilizaria conceitos de fractais para permitir zoom eficiente e com boa qualidade gráfica. Como algoritmos de busca de endereço do produto, a Microsoft licenciou o Dynamap 2000 da GDT, que proporciona uma busca e localização acurada e eficiente.
Como a Microsoft resolveu o dilema de entrada e conversão de dados, pesadelo de todo usuário e desenvolvedor de GIS? De uma forma engenhosa: fazendo de conta que este problema não existe. O MapPoint2000 sai de fábrica com um banco de dados completo de estados, municípios, setores censitários e endereços para os EUA, com grande número de variáveis demográficas. Este é o único conjunto de entidades georreferenciadas disponível, e todos os procedimentos são referentes a esses dados.

Esta idéia simplifica muito a integração entre dados espaciais e seus atributos. Imaginem a situação de um usuário com uma tabela em Access. O software varre os nomes das colunas, procurando algo como City ou ZipCode ou uma coluna que parece conter um código de endereçamento. Ao encontra-la, faz desta coluna a chave de acesso para os dados geográficos já existentes. Simples, não? Quando funciona…

Como conseqüência da estratégia adotada, o MapPoint2000, em sua primeira versão, será um produto exclusivo para o mercado americano. Sua disponibilidade para outros países dependerá da sua integração com bases de dados georreferencidas confiáveis. Apesar disso, seu impacto entre nós pode ser significativo, pois a Microsoft já anunciou planos (sem dar detalhes) de oferecer mecanismos de integração com outros bancos de dados, para permitir sua implantação internacional.

Qual será o impacto do MapPoint? Dependerá muito do investimento mercadológico da própria Microsoft. Caso a Microsoft realmente acredite e invista em seu produto, versões cada vez mais aprimoradas do MapPoint passarão a ter presença significativa no mercado de desktop GIS e abrirão um grande mercado de produção de dados georreferenciados para aplicações dedicadas.
Neste caso, como ficam os concorrentes? A experiência mostra que competir diretamente com o marketing da Microsoft, mesmo com um produto melhor, não tem sido uma estratégia de muito sucesso. O impacto imediato será sentido em linhas de produtos primordialmente para desktop, como Maptitude, Atlas GIS e Autodesk World.

Para produtos que possuem grandes bases instaladas, como ESRI e Intergraph, é possível que eles procurem enfatizar suas capacidade de gestão de bancos de dados, de produção de novas informações e de geração de aplicações. Na ESRI, pode-se esperar uma ênfase reforçada em produtos como o SDE, MapObjects e Arc/Info. Já a Intergraph deverá apressar a migração do MGE para o GeoMedia, cujos objetivos são interoperabilidade e capacidade de personalização.

Para sistemas como o IDRISI e SPRING as apostas deverão ser na sofisticação de suas capacidades de análise espacial e de processamento de imagens (não por acaso, esses produtos estão lançando módulos de geoestatística em suas novas versões). E o mercado brasileiro? Como dissemos antes, a concepção do MapPoint (que exige bases de dados integradas) adiou seu lançamento entre nós. No entanto, não é impossível que empreendedores mais ousados encapsulem no produto bancos de dados geográficos para o País, antecipando assim sua chegada.

Em resumo, o MapPoint irá estabelecer novos níveis de preço, facilidade de uso e rapidez de aprendizado e gerar um reposicionamento de todos os fabricantes e usuários. A presença da Microsoft no mercado de GIS, ainda que possa ser temporária (coisa que não acredito) irá nos forçar a rever conceitos estabelecidos e posições consolidadas.

Gilberto Câmara é coordenador do programa de pesquisa em Geoprocessamento da Divisão de Processamento de Imagens do INPE, e foi um dos responsáveis pelo desenvolvimento dos sistemas SGI/SITIM e SPRING. (Página eletrônica: www.dpi.inpe.br/gilberto).