Por Rogerio Galindo

Debate promovido pela Espaço GEO em Curitiba durante o ExpoGEO Brasil 99 discute o papel de cada profissional no mercado das geotecnologias

Responda rápido: qual é a diferença entre um engenheiro agrimensor e um engenheiro cartógrafo? Se você também ficou em dúvida, não se preocupe. Esta é uma pergunta difícil de responder mesmo para especialistas na área.

A própria legislação do sistema CONFEA/CREA, responsável pela definição de atribuições profissionais de engenharia, não ajuda muito a elucidar a questão. De acordo com o Conselho Nacional e com os Conselhos Regionais de Engenharia e Arquitetura, a única diferença entre os dois profissionais é que os engenheiros agrimensores podem fazer alguns tipos de locações que não constam das atribuições dos engenheiros cartógrafos.

Na verdade, a separação entre as duas categorias é uma invenção brasileira das décadas de sessenta e setenta que não tem paralelo em nenhum outro país do mundo. Em nenhum outro lugar existem dois profissionais encarregados dos serviços executados no Brasil por agrimensores e cartógrafos. E o pior é que esta divisão só veio complicar uma situação ainda mais antiga, criada pela confusão de algumas atribuições entre agrimensores e geógrafos. Para debater este problema, causador de discussões intermináveis entre as várias partes envolvidas, a Espaço GEO promoveu um encontro de profissionais respeitados de todas estas áreas. Mediado pelo engenheiro civil Fernando César Ribeiro, consultor da empresa curitibana de topografia Manfra, o debate "Qual o papel do cartógrafo, do agrimensor e do geógrafo no mercado das geotecnologias?" levantou questões fundamentais para o futuro destas profissões dentro do mercado da geoinformação.

Debate durante o ExpoGEO Brasil99

Mercado

O palestrante que abriu o debate não pertence originalmente a nenhuma das três profissões diretamente envolvidas no debate. Amauri Brandalise, diretor de Esteio (uma das maiores empresas de aerofotogrametria do país) é engenheiro civil de formação. De acordo com ele, o fator principal para contratação dentro de uma grande empresa hoje não é necessariamente o passado acadêmico do candidato ao cargo.

"Conhecer GPS, rastreio cinemático, restituição digital e modelos por varredura laser e outras atividades é fundamental hoje. Mas queremos um profissional que também saiba informática, Internet, programação de computadores, línguas, que saiba se relacionar com outras pessoas", afirmou Amauri. Assim, a formação acadêmica não é sempre o fator decisivo na escolha dos funcionários. Apesar disso, Amauri disse que o quadro técnico da Esteio é formado por 15 cartógrafos e nenhum agrimensor. Há apenas um estagiário agrimensor na empresa. Mas isso talvez tenha sua explicação no fato de que Curitiba, cidade em que fica a sede da Esteio, tem um curso de Engenharia Cartográfica e nenhum de Engenharia de Agrimensura.

Unificação

A unificação das profissões foi o tema da exposição de Irineu Idoeta. Presidente do Subcomitê da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) responsável pelas normas de topografias, Irineu atua como engenheiro agrimensor há trinta e oito anos, dos quais mais de trinta dedicados à aerofotogrametria. Na visão de Irineu, não existe nenhum motivo que impeça que os três cursos (cartografia, agrimensura e geografia) sejam unidos em um só.

Seria formado desta maneira um único profissional, que para Irineu poderia usar a designação dos antigos responsáveis por estas tarefas no Brasil: engenheiro geógrafo. Irineu ressaltou as semelhanças entre as profissões, dizendo que apesar de uns estarem mais voltados a levantamentos geodésicos ou topográficos, outros prestarem mais serviços de mapeamento e aerofotogrametria ou fazerem mais análise de dados, todos têm capacidade de resolver os mesmos problemas.

Marcelo Carvalho dos Santos, professor da Universidade Federal do Paraná e colunista de infoGEO, no entanto, discorda que os geógrafos devessem participar desta união. "O curso de geografia hoje dá uma visão ampla, que inclui demografia, estatística, sociologia. E talvez perdesse essas qualidades para poder dar os dois primeiros anos que um curso de engenharia exige", disse Marcelo. Quanto aos outros dois cursos, Marcelo acredita que a criação de uma área de Geomática com a manutenção dos dois cursos seria a maneira mais prática e menos traumática de unir as duas profissões. Já segundo Idoeta, o ideal seria um curso unificado até o terceiro ou quarto ano com uma habilitação feita no final da graduação.
O geógrafo Lindon Fonseca, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) no Paraná, acredita que o fundamental é fazer com que os três profissionais possam se comunicar entre si."As geotecnologias exigem uma transdisciplinaridade (sic). É preciso que cada profissional saiba falar não só o seu idioma técnico, mas também o dos outros", afirmou Lindon.

Força

A união dos profissionais das três categorias, contudo, não depende apenas da unificação de cursos e profissões. Para ter representatividade em conselhos e associações de profissionais, o caminho mais curto pode ser o entendimento entre os diversos representantes.

De acordo com Irineu Idoeta, na última eleição para o CONFEA foi a união de engenheiros agrimensores, geógrafos e engenheiros cartógrafos que garantiu que a classe conseguisse representatividade. "Se estivéssemos sozinhos, não conseguiríamos nenhuma vaga, como nos unimos, hoje temos três representantes no CONFEA" afirmou Idoeta.

A formação de Câmaras Regionais também é uma amostra do que a colaboração entre os profissionais de diferentes áreas pode fazer por eles. "Não é em todo o país que existem engenheiros agrimensores ou cartógrafos. Mas sempre vai haver profissionais de uma das três áreas, já que geógrafos estão por todo o país. Se os três grupos se unirem, será sempre possível formar câmaras, aumentando a representatividade", lembrou Irineu.

Esta poderia inclusive ser uma arma para evitar que pessoas de áreas mais distantes acabem realizando os serviços que são atribuídos a engenheiros e geógrafos. Idoeta contou que recentemente para resolver um problema pediu que se contassem quantos profissionais têm entre suas atribuições serviços de topografia.

"São 17, no total", comentou Irineu, lembrando que em muitos casos isso quer dizer apenas que o profissional pode usar a topografia para solucionar um problema ligado à sua própria área. "Mas quando falta trabalho, o sujeito acaba fazendo de tudo",complementou.

Segundo Emerson Zanon Granemann, engenheiro cartógrafo e editor da revista infoGEO, "a questão é não estimular conflitos e sim tentar aproximar os profissionais, tornando os pontos em comum fatores de integração e fortalecimento".

"Os avanços tecnológicos têm criado muitas profissões e provocado a transformação de muitas outras. Os constantes ajustes de currículos de cartógrafos, agrimensores e geógrafos, necessários para atender o mercado, fará com que estas profissões fiquem cada vez mais próximas de uma possível futura união, mas mantendo ao final do curso opções para escolha pelas áreas de levantamentos, organização e processamento de dados geográficos", completa Emerson.

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