A história e as características de um dos principais radares imageadores do mundo.

O radar imageador representa uma das opções do sensoriamento remoto no levantamento de recursos naturais e monitoramento do planeta. Distinto dos sensores ópticos, que dependem do Sol para prover informações físico-química dos alvos, um SAR (Synthetic Aperture Radar) opera nas microondas, fornece informações geométricas e elétricas dos alvos e é o único sensor remoto com penetrabilidade na copa vegetal. Sua capacidade de prover imagens com elevada resolução espacial, independente de condições atmosféricas e iluminação solar, torna-se estratégica para aplicações no trópico úmido, onde a presença de chuvas, nuvens e fumaça impõe restrições ao imageamento óptico. Com grande parte do território coberta por floresta ombrófila densa, a aquisição de informações na Amazônia é complicada também pela extensão, dificuldades de acesso e complexidade de clima e ambiente.

A análise do cenário de programas espaci-ais revela uma presença cada vez maior de missões com radares imageadores. O lança-mento do ERS-1 em 1991 marcou o início de disponibilidade ininterrupta de dados (Figura 1). O ERS-1 e sucessores (JERS-1, ERS-2, RADARSAT-1) têm em comum a transmissão e recepção do sinal em única freqüência e pola-rização. A freqüência e a polarização controlam a interação energia/matéria (microondas incidentes no terreno) e governam a sensibi-lidade do sensor às características geométri-cas e elétricas do alvo. Conseqüentemente, freqüência e polarização têm enorme impacto no potencial de aplicações. Com o lançamento em 2002 do ENVISAT com o sensor ASAR, a capacidade de extrair informação foi ampliada com imagens multipolarizadas. O ASAR opera em banda C (5,331 GHz) com imagens no modo SDP (Selective Dual Polarization) em duas polarizações (HH+VV, HH+HV ou VV+VH). Todavia, o advento dos radares polarimétricos do ALOS/PALSAR (2005) e RADARSAT-2 (2006) reveste-se de grande expectativa, pela possibi-lidade de síntese completa dos mecanismos de espalhamento nos alvos, através da detecção dos atributos de amplitude, polarização e fase do sinal retroespalhado.(ver figura 1)

O Brasil tem experiência reconhecida em aplicações com radar na Amazônia (Programas RADAMBRASIL, SAREX´ 92, INTERA, ProRadar, SIR-C/X-SAR, JERS-1, RADARSAT-1, ADRO, GlobeSAR-2). A Alemanha é referência mundial em tecnologia SAR (MRSE, SIR-C/X-SAR, E-SAR, X-SAR/SRTM, TerraSAR-X, SAR-LUPE). O INPE e a DLR (Agência Aeroespacial da Alemanha) mantém uma colaboração de mais de 20 anos através de um acordo intergovernamental de colaboração científica-técnica (WTZ). A decisão de se iniciar um estudo preliminar de viabilidade (Pré-Fase A) do MAPSAR (Multi-Application Purpose SAR) foi estabelecida em 2001, consolidando experiências específicas e complementares das duas agências, sendo acordado que o INPE seria responsável pela plataforma e integração do satélite, cabendo à DLR a concepção da carga útil e análise de órbita. Este estudo preliminar foi finalizado em dezembro de 2002, estando em curso a fase de viabilidade detalhada (Fase A), com término previsto para 2006. Se esta viabilidade for confirmada, o MAPSAR passa a ser uma das opções consistentes de missão que utilizaria a Plataforma Multi-Missão (PMM), um projeto em desenvolvimento no Programa Espacial.

O Conceito MAPSAR

Um dos aspectos mais inovadores do MAPSAR foi a grande participação de usuários desde a sua concepção. Em abril de 2002, 83 representantes de 28 instituições públicas e privadas nacionais reuniram-se no INPE de São José dos Campos, para levantar os requisitos de aplicações dos usuários nacionais que justificasse a iniciativa (detalhes em www.obt.inpe.br/satelite/mapsar). Foram considerados prioritários nas aplicações os temas: Agricultura, Cartografia, Manejo de Desastres, Florestas, Geologia, Hidrologia, Oceanos, Zonas Costeiras, Urbanismo, Defesa e Região Antártica. Os requisitos dos usuários foram estabelecidos em função dos parâmetros do sensor (freqüência, polarização, azimute de visada, incidência, resolução espacial, faixa imageada (swath), capacidades estereoscópica e interferométrica), da configuração de órbita (polar, sol-síncrona, inclinação, tempo de revisita, controle) e outras características de missão (duração, série de satélites, formato de dados, etc.). O consenso do encontro foi de apoio à iniciativa do INPE-DLR, com recomendação para um sistema opera-cional ("application-oriented") e dedicado para mapeamentos temáticos (topografia, geologia, florestas, hidrologia, etc.) de recursos naturais (renováveis e não-renováveis) da Amazônia. Além disso, foi recomendada uma integração do MAPSAR com as atividades do SIVAM/SIPAM, devido à natureza complementar das aquisições (aeronave/espacial) e similaridade de dados (radares polarimétricos). Uma sistemática similar foi conduzida pela DLR na Alemanha, com a incorporação adicional na missão das inovações da polarimetria e interferometria no mapeamento de biomassa (regiões tropicais e boreais). Na Tabela 1 são apresentados os requisitos dos usuários dos dois países (ver tabela 1).


Fig. 1 – Radares orbitais para o período 1980-2007 (adaptado de Glackin 1998).

Devido ao desempenho da PMM (massa, potência, envelope geométrico, taxa de dados) foram impostas limitações que convergiram para especificações de um SAR com freqüência única (L), altitudes de órbita entre 600 e 650 km e com a inovação de antena refletora elíptica (Figura 2). A opção pela antena refletora apresenta vantagens de peso e custo menores, mantendo-se os requisitos de polarimetria e elevada resolução espacial e com limitação de swath (máximo de 55 km). As especificações finais do MAPSAR são apresentadas na Tabela 2. (ver figura 2 e tabela 2)


Fig. 2 – Satélite MAPSAR

A partir destas especificações, estudos estão sendo conduzidos para compatibilizar opções de altitude de órbita, regiões de acesso, intervalos de incidência, performance do sistema, tempo de revisita, capacidades estereoscópica e inter-ferométrica, etc. A Figura 3 ilustra a geometria de imageamento MAPSAR para uma órbita de 620 km. A variação de incidência ocorreria através de rotação do satélite para a posição desejada e visadas à direita e esquerda da trajetória, com revisita de 37 dias. Nesta con-figuração são possíveis dez feixes com distintos modos de resolução espacial (3m, 10m e 20m), polarizações (única, dual e quad-pol) e swaths (31,6 a 54,8 km).(ver figura 3)


Figura 3.

A Plataforma Multi-Missão

A PMM foi concebida para operar como módulo de serviço para satélites na classe de 500 kg, provendo meios/recursos à operação de um módulo de carga útil pesando até 280 kg em órbitas quasi-equatorais e polares e altitudes entre 600 e 1200 km. Seu sistema de navegação (ACDH) é capaz de prover apontamento fino compatível com os requisitos de missões ópticas e radar. Atualmente, o desenvolvimento da PMM está contratado junto à indústria nacional, sendo iniciada a fase de qualificação de subsistemas, após a conclusão do ciclo de Revisões Críticas de Projeto (CDR). O final de fabricação está previsto para abril de 2006, com custo estimado de US$ 25 milhões (ver Figura 4). Ao término de uma avaliação de compatibilidade executada pelo INPE e DLR, com acompanhamento da AEB, foi constatado que, respeitadas as condições da pré-Fase A, os requisitos propostos do MAPSAR podem ser atendidos pela PMM. No momento está em execução um estudo aprofundado para demon-strar, em termos de carga útil, plataforma e atendimento dos requisitos de usuários, a viabilidade completa do Sistema MAPSAR. O custo estimado para a Missão MAPSAR (satélite, lançamento, segmento solo e operação por quatro anos) é de US$ 90 milhões, em princípio repartido entre os participantes, com seis anos para o desenvolvimento até o lançamento. Cabe ainda mencionar que em 2005, através do Programa de Aplicações SAR-SIPAM, uma fase de simulação de produtos MAPSAR será conduzida em áreas testes na Amazônia e Bahia, com uso das aeronaves R-99B do SIVAM (ver figura 4).


Figra 4:clique na imagem para amplia-la

REFERÊNCIAS
Glackin, D. L. 1998. "International Space-Based Remote Sensing Overview: 1980-2007". Canadian Journal of Remote Sensing, 24 (3); 307-314.

Schroder, R., Puls, J., Hajnsek, I., Jochin, f., Neff, T., Kono, J., Paradella, W. R., Silva, M.M.Q., Valeriano, D. M., Costa, M.P.F. 2004. "MAPSAR: A Small L-Band SAR Mission for Land Observation". Acta Astronautica (Special Issue 4th IAA Symposium on Small Satelites for Earth Observation). pp.9 (in press).


Tabela 1: Requisitos dos usuários do MAPSAR
(*prioritário, N.E. = não especificado, normal = Brasil, itálico = Alemanha).


Tabela 2: Especificações finais do MAPSAR considerando-se os requisitos dos usuários e da PMM

Waldir Renato Paradella
Geólogo (USP), Pesquisador Titular do INPE e CNPq.
waldir@ltdi.inpe.br

Mario Marcos Quintino da Silva
Engenheiro (ITA), Coordenador do Programa Satélites de Aplicação do INPE.

Informações na internet:
MAPSAR