Foi publicada no Diário Oficial da União, no último dia 8 de dezembro, a Portaria 511 do Ministério das Cidades que estabelece diretrizes para a criação, instituição e atualização do Cadastro Territorial Multifinalitário (CTM) nos municípios brasileiros. O documento foi concebido a partir dos resultados empíricos do Programa Nacional de Capacitação das Cidades, no que diz respeito às diversas atividades empreendidas referentes à capacitação para a implementação de CTMs nos municípios brasileiros, onde foi constatada a necessidade de maior estudo das questões referentes à regulamentação desta temática, pleito recorrente dos participantes integrantes das referidas atividades de capacitação.

Com base nessa demanda, o Ministério das Cidades nomeou um grupo de trabalho constituído por especialistas para estudar a matéria e formular uma proposta compatível com as diversas realidades dos municípios brasileiros. A proposta foi amplamente discutida e apresentada publicamente em seminários e congressos, até que se transformasse em portaria ministerial de caráter orientador e não-compulsório às cidades brasileiras.

A ideia das diretrizes é auxiliar os municípios que desejem implementar um cadastro territorial com caráter multifinalitário. O aspecto generalista do texto foi escolhido para que o mesmo possa ser adaptado às realidades locais. Os conceitos propostos estão de acordo com os melhores sistemas cadastrais e visam um futuro compartilhamento de informações por meio de sua integração a essas bases de dados espaciais, uma vez que muitos países, inclusive o Brasil, estão organizando suas infraestruturas nacionais de dados espaciais.

CTM

Definir a unidade territorial

O caráter multifinalitário do cadastro só é atendido se o mesmo contemplar, em sua implantação, características que possibilitem o compartilhamento das informações. Da mesma forma que no cadastro rural, a dificuldade inicial é a definição da unidade territorial a ser cadastrada. Os cadastros considerados eficientes adotam a parcela como unidade cadastral, definida como uma porção territorial com regime jurídico único. Apesar da Lei 10.267/2001 não citar explicitamente a adoção da parcela como unidade territorial do cadastro rural, na prática é o que tem sido adotado, considerando-se que, para o registro do imóvel, é necessária a individualização das matrículas. Embora em áreas urbanas, na maior parte das vezes, a parcela se confunda com o lote, isso nem sempre acontece, como, por exemplo, no caso dos terrenos de marinha ou de imóveis constituídos por mais de uma matrícula.

A adoção da parcela permite a publicidade da situação física e legal do imóvel ou de outras unidades territoriais que se deseje constituir a partir de conjuntos de parcelas. A transparência da situação jurídica e de fato do imóvel é muito importante para os usuários de um cadastro multifinalitário: para fins de regularização fundiária; para que se defina com maior presteza que instrumentos urbanísticos e jurídicos podem ser aplicados; para fins de desapropriação; para que se conheça os beneficiários e que tipo de benefício têm direito; para agilizar o crédito imobiliário; para controle da aplicação das restrições de caráter ambiental; enfim, em todas as aplicações que exigem o conhecimento da situação legal do imóvel, e para as quais essa informação é importante para maior eficiência em termos de tempo e custos do processo. No entanto, para que se conheça com precisão e confiabilidade a situação legal do imóvel é necessário que se estabeleça um intercâmbio de informações com os cartórios, conforme orientam as diretrizes.

A Portaria não detalha os procedimentos técnicos a serem adotados na implementação do cadastro, em respeito à diversidade dos municípios brasileiros. Algumas cidades que dispõem de recursos técnicos e econômicos privilegiados já adotam os princípios apresentados, mas mesmo aquelas que não estão nesta situação poderão construir as bases para um cadastro multifinalitário se observarem os princípios básicos desses cadastros e planejarem a sua implementação de acordo com as suas possibilidades. Conforme mencionado, optou-se por indicar as características técnicas básicas para se obter um cadastro com caráter multifinalitário.

Uma característica técnica básica, por exemplo, é o estabelecimento de um identificador único que permita a todos os usuários reconhecer o mesmo objeto em seus sistemas por meio desse número, de forma inequívoca, como o CPF de um indivíduo. Outra característica importante é a localização inequívoca de cada parcela, obtida por meio de seu georreferenciamento a um sistema de referência único. Como a adoção de padrões é necessária, a elaboração da carta cadastral deve observar a padronização estabelecida pela Comissão Nacional de Cartografia (Concar) desde a publicação do Decreto 6.666/2008, que trata da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (INDE).

Além das características técnicas, primordiais para a implantação de um sistema multifinalitário, as diretrizes contemplam também orientações práticas para a determinação do valor do imóvel, atributo importante de um cadastro, o que demonstra que este valor tem uma importância que vai além da sua aplicação fiscal.


Gestão e financiamento

O sucesso de um sistema cadastral, mesmo primorosamente planejado, depende também do seu modelo de gestão e do financiamento para a sua atualização. O Capítulo 4 da Portaria aborda esse tema, indicando ações para o sucesso da gestão, como a constituição de uma equipe técnica local especializada para a manutenção e continuidade do cadastro. Outra orientação importante, principalmente para os pequenos municípios, é a possibilidade de constituição de consórcios públicos intermunicipais, visando especialmente à redução dos custos com a implementação. Também se recomenda que parte da receita gerada pela atualização cadastral seja revertida em prol da manutenção desse cadastro.

Talvez, os que estudem ou trabalhem com cadastro concluam que as diretrizes não trazem novidades. O objetivo do documento não foi criar algo novo, mas sistematizar as informações existentes com a finalidade de orientar a aplicação dos regulamentos que devem ser utilizados pelos que pretendem implantar um cadastro territorial multifinalitário.

Para apresentar as diretrizes, de uma maneira clara e divertida, o Ministério das Cidades lançou uma história em quadrinhos que conta as desventuras de um técnico municipal às voltas com as dificuldades da falta de informação territorial confiável para atender às variadas demandas das diversas secretarias municipais. O material está disponível em meio digital no endereço www.cidades.gov.br/capacitacao-1/
publicacoes/MIOLO-Gibi.pdf, e a versão impressa pode ser solicitada ao Ministério pelo endereço eletrônico pelo email capacitacao@cidades.gov.br .

Para o ano de 2010 também está previsto o lançamento do Manual de Cadastro, que detalha os princípios propostos pelas diretrizes e exemplifica alternativas de aplicação nos municípios. O Ministério também estuda a possibilidade de incluir em suas sistemáticas anuais recursos e alternativas de financiamento para a implementação de cadastros e capacitação de técnicos municipais na área.

Eglaísa Micheline Pontes da Cunha

Eglaísa Micheline Pontes da Cunha
Gerente de Capacitação do Ministério das Cidades
eglaisa.cunha@cidades.gov.br

Andrea Flávia Tenório CarneiroAndrea Flávia Tenório Carneiro
Docente e pesquisadora do Departamento de Engenharia Cartográfica da UFPE
andreaftenorio@gmail.com