Um aplicativo chamado Agrotag permitirá que agricultores de qualquer lugar do Brasil acessem e atualizem pelo celular um banco de dados colaborativo sobre o uso do solo. Por meio da ferramenta, será possível acessar e carregar informações tais como área da propriedade ocupada por sistemas integrados de produção, pastagens degradadas, áreas de preservação, tipos de lavoura existentes e outras, sempre com apoio de mapas e imagens de satélite. O sistema, que está em fase de alimentação do banco de dados e de validação, vai estar à disposição dos agricultores a partir de outubro.

O aplicativo é a primeira ferramenta desenvolvida sob a ótica de geotecnologias de última geração e que integra ações colaborativas de usuários e dados geoespaciais exclusivos e de alto nível, como o Rapideye, fornecidos pela Embrapa e instituições governamentais.

O Agrotag é um aplicativo multitarefa, capaz de agregar dados geoespaciais multifonte, de campo, bases institucionais e de diferentes sensores remotos à facilidade de sistemas mobile. Essas características o tornam passível de apoiar diversos projetos de pesquisa científica em rede, além de ser útil para inúmeras atividades como análise de crédito rural, apoio a políticas públicas, auxílio a cooperativas e monitoramento ambiental, por exemplo.

O banco de dados está sendo construído de maneira colaborativa por meio de técnicos credenciados e, posteriormente, com a participação dos produtores rurais. Nesta primeira etapa, o aplicativo está sendo utilizado por parceiros da Rede de Fomento de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (Rede ILPF).

O software, que deve revolucionar a forma de coleta, armazenamento e disponibilização de dados e informações agropecuárias no País, foi desenvolvido pela Embrapa com apoio da Rede ILPF, Instituto de Pesquisas Eldorado e da Plataforma Multi-institucional de Monitoramento das Reduções de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Plataforma ABC).

Mas a sua principal missão é dar sustentabilidade à rede de monitoramento sistemático da adoção e qualificação de sistemas de ILPF, bem como organizar um amplo banco de dados com informações de uso de terras agrícolas no Brasil.

Por essa razão, o Agrotag foi projetado para receber um conjunto de informações na coleta de dados das propriedades que, uma vez processadas na base de operações, retornam aos diversos atores da cadeia produtiva ou interessados em agricultura de baixo carbono em forma de informações estratégicas diretamente nos celulares ou tablets.

Para o pesquisador da Embrapa Meio Ambiente e coordenador da Plataforma ABC, Celso Manzatto, a disseminação e adoção progressiva do uso dessa ferramenta colaborativa com diversas instituições e agricultores permitirá, incialmente, a identificação e qualificação dos sistemas ILPF, como estratégia para regionalização das ações de transferência de tecnologia da Rede ILPF, das estimativas de redução das emissões de gases de efeito estufa pela Agricultura de Baixa Emissão de Carbono e, em uma terceira etapa, a diferenciação e certificação de propriedades rurais e tecnologias que proporcionem a redução ou sequestro de carbono no solo.

“Em outras palavras, o Agrotag viabiliza o desenvolvimento progressivo de um sistema colaborativo de monitoramento multiescalar de baixo custo, com metodologia reconhecida pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (IPCC)”, conta Manzatto. Essa metodologia é conhecida como MRV (medição relatório e verificação) e permite desde a estimativa do balanço das emissões na propriedade rural e a sua certificação, bem como o monitoramento em larga escala da redução das emissões em escala regional e nacional. O uso da metodologia do IPCC permitirá a contabilização dos dados coletados por meio do aplicativo no Inventário Nacional de Gases de Efeito Estufa, documento oficial que consolida as emissões de cada país.

Na primeira etapa, o aplicativo será voltado para um grupo de profissionais da Embrapa e parceiros da Rede ILPF, que agrega as empresas Cocamar, Dow AgroScience, John Deere, Parker, Syngenta e a própria Embrapa.  Os especialistas deverão alimentar um banco de dados para uso comum. “Após a primeira fase, de validação, o aplicativo estará disponível para outros parceiros institucionais, como instituições de ensino e pesquisa, extensão rural, Secretarias de Agricultura e Plano ABC dos Estados, bem como profissionais da cadeia produtiva e produtores”, conta o pesquisador da Embrapa, informando que o lançamento oficial está previsto para outubro deste ano, embora já se encontre em uso para fins de validação.

Cumpridas as etapas de validação, os atores da cadeia produtiva que se associarem ao sistema terão como contrapartida acesso a um grande escopo de informações referentes à sua região.

O aplicativo pretende inaugurar uma nova etapa no processamento de dados e informações da agropecuária brasileira. Em breve, será possível acessar, em tempo real, os níveis de degradação de pastagens, as espécies de forrageiras recomendadas para determinada região, o tipo de uso da terra, tecnologias de sequestro de carbono recomendadas pela Embrapa para determinado bioma, dentre outras informações.

“Mais adiante, técnicos de instituições público-privadas e produtores estarão convidados a participar da formação de um grande banco de dados colaborativo, com informações precisas sobre as diversas atividades agropecuárias. Esses dados servirão até para a comprovação e diferenciação de produtos em mercados nos quais a sustentabilidade e a certificação sejam o diferencial, alinhada com as novas diretrizes da Rede de Fomento ILPF,” acredita Manzatto.

O aplicativo

O sistema admite integração remota com informações do ambiente WebGis, o que permite a composição de uma ampla rede colaborativa de dados, na qual se destaca a perspectiva de acesso remoto de bases já disponíveis do acervo interinstitucional e governamental, como mapas de uso da terra ou cobertura nacional de imagens de satélite.

A qualificação de pastagens, que é uma das principais demandas de monitoramento do Plano ABC, é uma ação estratégica para compensação de carbono. Para essa tarefa, o aplicativo conta com o auxílio de fotos georreferenciadas, as quais podem ser projetadas automaticamente em mapas do local, informações de padrões de cor e altura, com todos os registros associados aos estágios de sanidade da pastagem, tipo de forrageira, presença de matéria verde, seca e ervas daninhas, ou seja, todos os parâmetros podem ser preenchidos de maneira simples e intuitiva.

Os pesquisadores da Embrapa Meio Ambiente Luiz Eduardo Vicente e Luciana Spinelli explicam que o conjunto de dados coletados pelo usuário no campo pode ser enviado automaticamente pelo aplicativo a uma base de dados geoespaciais. Com isso, serão compilados, analisados e cruzados com informações de imagens de satélite, retornando ao usuário resultados sobre o estado da pastagem com os níveis de degradação, tudo em tempo real.

Os dados das propriedades que forem inseridos terão garantia de sigilo, uma vez que as informações enviadas ao banco de dados serão analisadas de forma conjunta, não individualizada.

Qualificar a adoção de ILPF

A fim de monitorar as metas de redução de emissões assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris, a Rede de Fomento de ILPF patrocinou uma ampla pesquisa em 2016, conduzida pela Kleffmann Group, sob a coordenação técnica da Embrapa Meio Ambiente. O estudo estimou em 11,5 milhões de hectares os sistemas ILPF no Brasil. A pesquisa também visou captar informações complementares para apoiar ações estratégicas de transferência de tecnologia em ILPF da pesquisa para os produtores adotantes.

Apesar de apresentar números bastante positivos, os resultados da adoção de sistemas ILPF refletiram a percepção do produtor em relação ao que ele acreditava possuir implantado na propriedade, não sendo possível aferir a qualidade da implantação.

Diante dessa necessidade de melhor quantificação da redução das emissões de GEE promovidos pela adoção de sistemas integrados de produção, evidenciou-se a necessidade de um acompanhamento e qualificação dos sistemas implantados nas diferentes regiões do País.

Por essa razão, o aplicativo foi planejado inicialmente para apoiar a Rede ILPF no monitoramento da adoção e da qualificação de sistemas integrados de produção agropecuária no País, e, a partir de então, servir como uma ferramenta de apoio ao monitoramento da adoção da Agricultura de Baixa Emissão de Carbono.

A rede colaborativa de inserção de dados da ILPF será a primeira a ganhar o status de dados exclusivos, com mapas específicos da atividade, até mesmo de forma regionalizada por municípios.

Rapidez de coleta e apresentação de dados

O pesquisador Luiz Eduardo Vicente destaca a capacidade do aplicativo em acelerar os trabalhos de coleta de dados na propriedade e registro nas planilhas. “Um grupo de técnicos em campo poderá fazer levantamentos de maneira muito mais rápida e precisa. Na outra ponta, o uso dos dados, mapas e imagens de satélite estarão disponibilizados diretamente no aplicativo ou em site específico para o tomador de decisão,” aponta. Esse procedimento demorava semanas ou meses, até que todos os dados fossem transferidos, compilados e analisados, além de sujeito a diversos erros de preenchimento ou interpretação.

Para o líder da rede de transferência de tecnologia em ILPF, o pesquisador da Embrapa Lourival Vilela, os dados do Agrotag poderão pautar muitas ações futuras, e aumentar o impacto. “É uma ferramenta que vai facilitar o mapeamento dessas áreas com ILPF ao longo do tempo. Com isso, conseguiremos obter a noção exata da localização dessas áreas, poderemos qualificá-las e trabalhar de diferentes maneiras os resultados”, afirma Vilela.

Suporte a outros projetos em rede

O AgroTag ainda possui outras aplicações práticas. Pode municiar equipes de campo em missões de pesquisa que necessitem de dados geoespaciais específicos. Entre as informações estarão mapas de uso da terra, levantamento estratégico de dados de campo, identificação de focos de novas pragas para a implantação de barreiras sanitárias, áreas potenciais para a piscicultura, gestão das águas e bacias hidrográficas e recomposição florestal, dentre outras.

O pesquisador da Embrapa Meio Ambiente Ladislau Skorupa informa que os primeiros usos da tecnologia estarão concentrados em ações de levantamento de dados em campo voltados para a caracterização de sistemas de restauração florestal na Amazônia. O trabalho ocorrerá no âmbito do Fundo Amazônia do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e, para isso, será desenvolvido um novo módulo do aplicativo, o Agrotag Florestal.

“Trata-se de um avanço significativo de disponibilização de ferramentas geotecnológicas de fácil uso, mesmo em locais extremos, o que, na prática, possibilitará um avanço na captação e gestão de dados importantes para a pesquisa e ações de transferência de tecnologia, impactando positivamente no tempo de trabalho, ou na diminuição de custos”, ressalta ele.

Com o desenvolvimento dessas novas funcionalidades, o Agrotag Florestal poderá ser útil para registrar e monitorar a recomposição de áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal de propriedades rurais ao longo do tempo, podendo ser uma ferramenta útil tanto para os órgãos de fiscalização quanto para os produtores rurais.

Trata-se, portanto, de inciativa de baixo custo para o monitoramento, apoiando o agricultor na comprovação da regularização ambiental da propriedade e na diferenciação, alinhada ao esforço nacional na implantação de uma agricultura de baixo carbono.