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GPS 21

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A ionosfera e as redes de referência ativas GPS

Marcelo Carvalho fala de como lidar com o atraso do tempo de propagação sofrido pelos sinais GPS ao cruzarem a atmosfera.

Tem havido, ultimamente, a implantação de um número cada vez maior de pontos ou redes de referência ativas GPS pelo Brasil. Estamos chamando de ponto ou rede de referência ativa GPS a pontos cujas coordenadas devam ser conhecidas com a melhor precisão possível, ocupados permanentemente por antenas GPS, e cujas observações se tornem disponíveis, quer gratuitamente ou não. Já existe a prática de tais pontos ou redes em outros países, principalmente nos Estados Unidos, onde, geralmente, as observações são disponibilizadas via Internet.

No Brasil, a mais importante rede de referência ativa é a RBMC, mantida pelo IBGE. Outras redes ativas existem ou estão em processo de implantação, como a rede do INCRA, e pontos ativos, como alguns mantidos por empresas privadas. Algumas das diferenças que existem entre elas dizem respeito às observáveis disponibilizadas (se somente código ou código e fase da portador; se somente uma ou duas freqüências) e quanto à forma de acesso às observações, se gratuitamente ou não. Estes pontos ou redes de referência ativas GPS no Brasil podem se constituir em algo bastante interessante e útil para os usuários.

A princípio, usuários podem usar apenas um receptor GPS para efetuar um levantamento relativo a algum ponto de referência. Este procedimento será válido dependendo da distância entre o ponto de referência e os pontos a serem levantados e da geometria a ser formada entre eles. Neste artigo, iremos dar atenção à questão da distância para o ponto de referência, relacionada a perturbação provocada pela ionosfera.

Os sinais transmitidos pelos satélites durante a sua propagação em direção à antena receptora, ao cruzarem a atmosfera são refratados, provocando um atraso no tempo de propagação. Este atraso afeta tanto a medição da pseudo-distância quanto a medição da fase da portadora. Para nosso propósito, a atmosfera é dividida em duas camadas, chamadas de ionosfera e troposfera, cada qual com suas características próprias.

Na camada superior da atmosfera, a ionosfera, gases são ionizados, primordialmente, pela radiação ultravioleta proveniente do sol. A ionização libera elétrons livres, que afetam a propagação dos sinais GPS, causando um atraso positivo na medida da pseudo-distância e um atraso negativo na medida da fase (avanço da fase).

O valor deste atraso ionosférico é variável de acordo com o horário do rastreamento (maior durante o dia), com a estação do ano (maior no verão), com a posição geográfica do ponto de observação (se dentro de área de perturbação magnética), com o ângulo de elevação do satélite com respeito ao horizonte, e com o ciclo solar. É difícil se determinar um horário durante o dia durante o qual o atraso ionosférico seja mínimo, pois todos os efeitos se combinam. O valor do atraso ionosférico varia de 5 a 150 m.

Algumas palavras sobre a posição geográfica do ponto de observação e sobre o ciclo solar. O Brasil é particularmente afetado por zonas de perturbação geomagnética. O país é cruzado pelo equador geomagnético, que acompanha aproximadamente o equador geográfico, mergulhando no Brasil, com um sentido nordeste-sudoeste.

O equador geomagnético é cercado por dois cinturões, com várias centenas de quilômetros de largura, conhecidos como eletrojato. Esta região de perturbação geomagnética cobre boa parte do Nordeste, Norte e Centro-Oeste. Outra região de perturbação geomagnética fica próxima ao Sul do país, conhecida como Anomalia Geomagnética do Atlântico Sul (SAGA).

Atenção especial quanto ao ciclo solar. O sol possui um ciclo no qual sua intensidade atinge máximos e mínimos. No período entre Janeiro e Março de 2.000 atinge-se o pico do ciclo número 23, com um número de manchas solares previstas para algo em torno de 160. Este número deverá decrescer para algo próximo a uma dezena em meados de 2.005.

Assim sendo, estamos hoje no máximo da atividade solar, cuja diminuição é lenta. Um aumento da atividade solar resulta em um aumento do atraso ionosférico. Além do atraso propriamente dito, um aumento da atividade solar acarreta em uma maior incidência de saltos de ciclo, principalmente na freqüência L2, e em maior dificuldade na resolução da ambigüidade.

Existem várias estratégias para se lidar com o atraso ionosférico. Um usuário que possua receptor GPS de apenas uma freqüência é o mais afetado pelo atraso ionosférico. Este usuário possui duas alternativas. Ele pode usar um modelo ionosférico, como o de Klobuchar, cujos coeficientes são transmitidos na mensagem dos satélites GPS.

Ou então, trabalhando com o posicionamento relativo, formar linhas de base curtas, de, no máximo, 30 km. Usuários trabalhando com receptores de duas freqüências podem combinar medidas de fase nas portadoras L1 e L2, formando a combinação linear "livre da ionosfera" geralmente referido na literatura em inglês como combinação ionosphere-free, e não possuem limitação em termos de comprimento de linha de base.

Então, ao se usar dados oriundos de algum ponto ou rede de referência, o usuário deverá decidir a estratégia a adotar, em função do tipo de observáveis que ele têm à sua disposição. Se o ponto de referência somente disponibilizar dados GPS na freqüência L1, o usuário, mesmo que tenha um receptor de duas freqüências, deverá adotar procedimentos como se ele tivesse também um receptor de uma freqüência. A limitação, neste caso, vem do ponto de referência. Ou seja, deve-se respeitar o limite de 30 km, principalmente considerando o fato de estarmos em época de alta atividade solar.

Mas, o que fazer se a região de interesse se encontra além desta distância? Um procedimento mais rigoroso seria o de determinar as coordenadas de um ponto no centro da região de interesse usando dados de dupla freqüência, do ponto de referência ativa e no ponto a determinar, coletados por várias horas, e usar este ponto como um ponto de referência local.

A desvantagem desta abordagem é a necessidade de se usar mais do que um receptor para o levantamento a ser feito na região de interesse. A vantagem é o controle da qualidade da solução. Espera-se, contudo, que a proliferação de pontos ou redes de referência venha a fazer com que a densidade de pontos de referência ativos aumente, principalmente nas regiões de maior atividade econômica.

Para finalizar, devemos esclarecer que neste artigo não nos detivemos nos chamados "serviços de DGPS". As correções diferenciais transmitidas por estes serviços são também afetadas pela ionosfera. Nesse caso, vale a regra geral de que quanto maior for a distância da estação DGPS, maior o erro no posicionamento provocado pela ionosfera.

Marcelo Carvalho dos Santos é Ph.D. em Geodésia e Engenharia Geomática pela Universidade de New Brunswick, Canadá, onde é professor adjunto e membro do Laboratório de Pesquisa Geodésica. E-mail: msantos@unb.ca

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