Integrar capacidade de raciocínio espacial aos computadores é um grande desafio
Outro dia minha filha teve que fazer uma pesquisa para a escola. Ela estava estudando um animal chamado Platypus, ou seja, o ornitorrinco. Eu não tenho uma enciclopédia em casa, então a solução foi procurar na Internet. Após algumas tentativas, nós acabamos achando uma página de um estudante de biologia na Austrália. Este menino gosta do ornitorrinco e decidiu fazer uma página com todas as informações que ele tinha sobre o bicho. Ficou uma página bem feita, com um texto bem escrito e com diversas ilustrações. E, o que é mais importante, resolveu meu problema. Este fato nos leva a duas perguntas:
1. O que leva as pessoas a colocarem informações na Internet?
2. Já que o ornitorrinco vive na Austrália, será que minha pesquisa na Internet seria mais bem sucedida se eu procurasse por páginas que tenham uma relação geográfica com o meu tema, neste caso ornitorrinco – Austrália?
Para responder a primeira pergunta temos de pensar no modelo da Internet. Do jeito que está, hoje qualquer pessoa pode dar sua contribuição. É a melhor forma de se publicar seus trabalhos e suas idéias. Nós temos hoje vários grupos, empresas, países, pessoas, todos procurando divulgar suas idéias neste meio de custo razoável. Dependendo do grupo ao qual você pertence, você pode publicar de graça ou quase de graça. Para publicar você tem de comprar seu espaço de um provedor de serviços e então colocar lá seu trabalho. De qualquer maneira é mais barato do que publicar através de papel e o seu alcance é muito maior. Mas eu acho que ainda não respondi a parte mais interessante desta primeira pergunta: o que leva um estudante da Austrália a gastar seu tempo e conhecimento colocando informações sobre o ornitor-rinco na Internet? A resposta a esta pergunta é que eu não sei, mas que é uma pergunta interessante, isto é sem dúvida. Agora abordando a segunda parte da questão: seria importante relacionar o tema à localização geográfica antes de se fazer a pesquisa? Por exemplo, vamos procurar por imagens de uma cidade no Brasil, por exemplo, Belo Horizonte. Vamos usar o Google como ferramenta de pesquisa. Então entre no Google (www.google.com.br), peça a opção de imagens e digite "Belo Horizonte". De fato, a gente encontra resultados interessantes. Eu achei umas bonitas imagens de minha cidade querida, mas também achei outras imagens que não estavam relacionadas a Belo Horizonte. Por exemplo, achei algumas páginas em Portugal, e até uma na Itália que era de uma equipe de ciclismo que fez uma viagem a Belo Horizonte. A pergunta então é: se você tivesse a opção de procurar imagens de Belo Horizonte em páginas localizadas apenas no Brasil, Minas Gerais ou Belo Horizonte, seus resultados seriam melhores?
Bem, esta é uma das opções de pesquisas geográficas na Internet que estão começando a aparecer agora. Ferramentas de busca especializadas estão cada vez mais na moda. Com o aumento exponencial da quantidade de informações na Internet são necessárias mais opções para que se alcance algum resultado positivo. A expressão "Geographic Search Engine" (buscador de informações geográficas) retorna 2.970 resultados no Google.
Um dos problemas que está sendo muito estudado agora se chama "The Semantic Web", uma Internet que faça sentido. Uma Internet que entenda sua pergunta e te devolva resultados mais significativos. Mas isto é muito complicado. Fazer o computador pensar como a gente é uma quimera que vem sendo perseguida há muitos anos. Ensinar ao computador coisas que nós aprendemos na escola, como contas de multiplicar, por exemplo, é fácil. Ensinar ao computador como entender linguagem ou interpretar o conteúdo de imagens é muito mais difícil.
A idéia de computadores inteligentes é ainda muito forte. A ilusão que tivemos que os computadores poderiam "pensar" um dia ainda assusta muitas pessoas e faz parte do estereótipo que estas máquinas ainda carregam. Outro dia, em um artigo sobre inteligência artificial, um repórter do New York Times escreveu que o computador era muito bom para alguns tipos de operações mas para outras até um menino de 5 anos podia superá-lo. Esta comparação é muito interessante e até injusta. Você lê o artigo e fica pensando o que significa a expressão "até um menino de 5 anos"? O cérebro humano, esta maravilha que gastou milhões de anos de evolução para chegar ao que é, comparado com uma máquina que basicamente só conhece duas opções, verdadeiro ou falso, 0 ou 1. O cérebro de uma criança de 5 anos é capaz de executar operações sofisti-cadíssimas, está equipado com sistemas de sensoriamento de alta precisão, como a visão e audição, e o principal, a linguagem. A comparação foi definitivamente injusta para o computador.
O componente geográfico da informação é muito importante. Como integrar nossa capacidade de raciocínio espacial aos computadores é um grande desafio que a comunidade de inteligência artificial ainda tem que vencer. E o desafio é duplo. Primeiro achar informações geográficas na Internet, e segundo usar o raciocínio espacial para melhorar os resultados de busca na Internet.
Frederico Fonseca é doutor em Ciência da Informação Espacial pela Universidade do Maine e atualmente é professor na Escola da Ciência da Informação e Tecnologia da Penn State University nos Estados Unidos. fredfonseca@ist.psu.edu