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Geoprocessamento: muito mais que ferramenta de arrecadação

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Geotecnologias devem ser utilizadas de forma ampla para melhorar a gestão pública e prestação de serviços

A difusão da tecnologia de geoprocessamento no setor público tem levado muitas prefeituras a implantar sistemas de informações geográficas (SIG), freqüentemente com foco na arrecadação tributária, o que limita a concepção de um projeto com uma abordagem mais sistêmica. Esta percepção tem apelo junto aos gestores públicos que vêem na implantação do SIG uma alternativa para superar as dificuldades financeiras, comuns à maioria das administrações. Este conceito, porém, pode comprometer a estruturação do projeto, priorizando uma visão pontual em detrimento de uma visão mais ampla que contemple características de matricialidade, o que potencialmente poderia gerar benefícios maiores, mais abrangentes, além de melhorar a eficiência na prestação de serviços.

A implantação de SIGs tendo como objetivo principal o aumento de arrecadação está ligada a dois fatores. O primeiro está relacionado à facilidade de angariar simpatia dos gestores públicos com a perspectiva de aumentar os recursos financeiros para investimentos. Dada a generalizada situação de escassez de recursos e grandes demandas sociais em todas as esferas da administração pública, é compreensível que qualquer tecnologia que prometa melhora do controle e redução da evasão da arrecadação tem forte apelo junto aos gestores públicos, gerando expectativas de curto prazo de uma favorável relação investimento – arrecadação. O segundo fator está relacionado aos programas federais que financiam as administrações públicas nas áreas de modernização administrativa e tributária, todos voltados para uma máquina arrecadadora mais eficaz.

A grande fragilidade da preponderância da ótica de arrecadação na implantação de um SIG reside na conseqüente estruturação focada na área de cadastro fiscal. Isso pode resultar em um banco de dados que contemple quase que exclusivamente as necessidades da área de cadastro, inserindo dados e informações de interesse baseados nas demandas desse setor. Isto limita a utilização da base georreferenciada nas demais áreas da prefeitura. É importante estruturar o projeto visando à melhoria da gestão pública e da qualidade da prestação de serviços, ou seja, deve-se introduzir o geoprocessamento como ferramenta estratégica no processo de modernização da gestão municipal contemplando as demandas de um número expressivo de áreas de uma prefeitura. Não deve ser um projeto de uma secretaria, de uma área, mas, ao contrário, ter um contexto mais amplo de projeto de governo, incorporado pelo corpo técnico e político da prefeitura e estruturado de forma matricial.

Algumas das diretrizes estratégicas e importantes para garantir a eficácia e continuidade a longo prazo são:

• Sustentação política – convencimento dos gestores com poder de decisão;
• Visão sistêmica do projeto;
• Definição de objetivos claros;
• Formação de equipe multidisciplinar;
• Implantação preferencialmente no primeiro ano de governo para obtenção de resultados na mesma administração;
• Reestruturação e racionalização de procedimentos internos;
• Definição de estratégia de implantação priorizando as feições que possibilitem resultados a curto prazo, implementando paralelamente as demais feições;
• Garantir principalmente resultados a curto prazo para possibilitar a continuidade do projeto.

Além de mudar o paradigma na concepção do projeto, existe uma questão presente nas estratégias de implantação de SIGs municipais. O ponto refere-se ao modelo de banco de dados mínimo, que atenda às necessidades de uma prefeitura e que seja capaz de atender a um grande número de áreas dessa instituição. O ideal seria o estabelecimento de um modelo de banco de dados mínimo que pudesse ser replicado em qualquer município, reduzindo a escala dos investimentos necessários, evitando a duplicidade de trabalho, otimizando o uso do recurso público e facilitando o monitoramento por parte dos agentes financiadores. Embora para um país de dimensão e diversidade como as do Brasil possa parecer um desafio muito grande, essa ação é possível. Todos os municípios brasileiros estão sujeitos a um mesmo conjunto de legislações e dispositivos legais nas áreas de educação, saúde, assistência social, tributária, fiscal, etc.. A idéia de propor um banco de dados com informações mínimas pode ser o primeiro passo para a padronização dos projetos de SIG que apresentem as mesmas finalidades.

Proposta de um banco de dados mínimo

Considerando a utilização de geoprocessamento na perspectiva de programa de melhoria da gestão municipal como um todo, Domingues (2005) propôs uma concepção mínima de banco de dados com informações necessárias à grande maioria das áreas de uma prefeitura que visa otimizar a utilização dos recursos financeiros na implantação e tem como objetivo final aplicações cadastrais. A proposta inclui:

• Obtenção de base cartográfica digital atualizada na escala 1:1.000. É importante salientar que a escolha do melhor método e técnica de aquisição de dados vai depender da finalidade para qual a base cartográfica digital foi solicitada;
• Restituição dos limites básicos como municipal, bairros, regionais, setores .fiscais, quadras (chegando à informação de lote se os recursos financeiros permitirem), eixo de logradouros, sistemas de transporte, altimetria, edificações representativas e toponímias das feições acima mencionadas;
• Inserção de informações mínimas na base de dados alfanumérica e ampliação das informações na medida das necessidades e da capacidade de atualização da prefeitura – implementação por módulos, como propõe Françoso (1997).


Informações mínimas. Fonte: Domingues, 2005

Conclusão

A concepção de um projeto centrado no aumento da arrecadação de tributos limita as alternativas de utilização e compromete a estruturação do SIG com uma visão sistêmica. Mudar o paradigma é entender o geoprocessamento como ferramenta estratégica na recuperação da capacidade gerencial da administração. Aliar a isto uma proposta mínima de banco de dados é o primeiro passo para a criação de um instrumental básico de implantação. Isto direciona os esforços dos gestores na obtenção de resultados que assegurem a continuidade do projeto e auxilia os programas financiadores no monitoramento das implementações. Utilizar o SIG como ferramenta na reestruturação organizacional da instituição racionalizando os procedimentos, moderniza a gestão pública e consolida uma nova maneira de trabalhar e analisar o território, revisando os sistemas públicos de tomada de decisão.

Referências Bibliográficas

DOMINGUES, Cristiane Vaz. Aplicação de Geoprocessamento no processo de Modernização da Gestão Municipal. 2005. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) – Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo – UNICAMP, Campinas.

FRANÇOSO, Maria Teresa. Diretrizes para planejamento assistido por computador em prefeituras de médio porte. 1997. 236 p. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo.

Cristiane Vaz Domingues
cristiane@iff.org.br

Arquiteta, Mestre pela Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo – FEC da UNICAMP, atua na área de geoprocessamento, modernização administrativa, implantação de políticas públicas, revisão de processos, é Consultora e membro do Conselho Consultivo do Instituto de Políticas Públicas Florestan Fernandes – IFF.

Maria Teresa Françoso
mteresa@fec.unicamp.br

Engenheira Civil, Professora do Departamento de Geotécnica e Transportes da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp. Mestre e Doutora em Engenharia de Transportes pela Universidade de São Paulo. Ministra aulas de Topografia e Geodésia e concentra sua pesquisa na área de geomática, com aplicações em Engenharia de Transportes.

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