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A invasão dos VANTs

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Por Eduardo Freitas

A Terra tem aprontado das suas em 2010. Somente nos primeiros meses deste ano já houve abalos sísmicos e erupções vulcânicas que mexeram com a crosta terrestre, mudando até mesmo o mapa de alguns países. No final de janeiro, um Veículo Não Tripulado com Radar de Abertura Sintética (UAVSAR, na sigla em inglês), do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, capturou uma imagem da cidade de Porto Príncipe, no Haiti, atingida por um terremoto de 7 graus de magnitude.

Aeronaves como esta, batizadas de Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT, ou UAV na sigla em inglês) têm sido usadas, em todo o mundo, para os mais diversos usos, desde a resposta a desastres naturais, passando pelo monitoramento ambiental, levantamento de culturas e segurança pública.

O UAVSAR decolou do Centro de Pesquisa de Voo de Dryden, na Califórnia, no dia 25 de janeiro, em uma campanha de três semanas para a realização de aerolevantamentos na América Central. O terremoto de 12 de janeiro teve seu epicentro a aproximadamente 25 quilômetros a sudoeste de Porto Príncípe, e o vale linear que aparece na imagem mostra a localização de maior atividade na falha que ocasionou o abalo sísmico. Esta imagem foi combinada com outros dados da mesma área para medir os movimentos da superfície terrestre ao longo do tempo.

Imagem SAR da região de Porto Príncipe, no Haiti As cores na imagem refletem as três diferentes polarizações do UAVSAR: HH, VV e HV

 

Global Hawk

Em março deste ano a Nasa completou com sucesso o primeiro voo científico sobre o Oceano Pacífico usando o Global Hawk, um VANT de grandes proporções que pode voar autonomamente a altitudes acima de 18 mil metros e por uma distância de mais de 20 mil quilômetros. O voo foi o primeiro dos cinco agendados para a missão Global Hawk Pacífico (GloPac), uma campanha de coleta de dados e estudos atmosféricos sobre os oceanos Pacífico e Ártico.

Para cada missão exploratória, os operadores programaram uma trajetória e o avião voou sozinho por até 30 horas, permanecendo em contato através de comunicação via satélite ou por links de alcance direto com a estação em terra. Com 11 instrumentos para a coleta de amostras da composição química da troposfera e da estratosfera, as medições da missão GloPac cobrirão um tempo mais longo e uma distância maior do que qualquer outra aeronave científica já fez.

Global Hawk em ação

De acordo com David Fahey, cientista envolvido no projeto, o Global Hawk é uma plataforma revolucionária, pois permite o acesso a dados atmosféricos que vão além das possibilidades das aeronaves pilotadas. “Agora podemos ir a regiões que não poderíamos alcançar, ou visitar áreas previamente exploradas e estudá-las por períodos mais extensos, o que seria impossível com aviões convencionais”, afirma.

De olho no território brasileiro

Mas os VANTs não estão presentes somente no hemisfério norte. Na verdade, eles já são uma realidade no Brasil há anos, sendo usados para várias aplicações como, por exemplo, o monitoramento ambiental e o mapeamento de culturas agrícolas.

O primeiro voo autônomo foi realizado pelo projeto Aurora, sigla para Autonomous Unmanned Remote Monitoring Robotic Airship ou Dirigível Robótico Autônomo Não Tripulado para Monitoração Remota, criado em 1996 pelo Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CenPRA). Hoje, os esforços de pesquisa do projeto visam estender as estratégias de controle automático para incluir as fases de decolagem, aterrissagem e voo pairado.

Como valor estratégico, o projeto Aurora se insere no esforço de estabelecer no país um programa de VANTs, articulando de forma estruturada os centros de pesquisa, universidades, empresas desenvolvedoras e governo.No Brasil, a AGX foi a primeira empresa a realizar um voo autônomo com uma aeronave de asa fixa, com o AGplane, um projeto em conjunto com a Universidade de São Paulo (USP) e a Embrapa, que viram nos VANTs um enorme potencial para a análise de culturas no setor agrícola, pois a tecnologia permite a montagem de mosaicos com padrões muito próximos da aerofotogrametria.

Segundo Adriano Kancelkis, diretor da AGX Tecnologia, o AGplane tem sido usado, desde 2005, para mapeamento de culturas, levantamentos topográficos, medição de reserva legal, entre outras aplicações. “Nós começamos fazendo o mapeamento agrícola, mas então vimos que havia um potencial para realizar também o levantamento dos limites das propriedades”, complementa.O AGplane pode voar bem mais baixo do que aviões convencionais de aerofotogrametria – a altitudes entre 250 a 400 metros, por exemplo -, o que abre um leque de novas possibilidade para o uso desses veículos, com produto final chegando à resolução espacial de 0,5 a 10 centímetros.

AGplane modelo arara

O modelo Arara do AGplane tem motor de 40cc, peso máximo de decolagem de 20 quilos, autonomia de voo de quatro horas e velocidade de cruzeiro de 100 quilômetros por hora, podendo ser operado no sistema autônomo ou remoto. Instalados a bordo ficam o receptor GPS, sensor imageador, sistema de vídeo em tempo real, altímetro, velocímetro, entre outras tecnologias embarcadas.

Antes da decolagem é feita a montagem da estação de controle em solo, para apoiar o voo, e realizados os procedimentos pré-decolagem. Depois de tudo pronto e checado, é feita a decolagem sobre veículo, que pode ser automática ou manual.

Decolagem do AGplane

O veículo faz então a navegação autônoma sobre as áreas de interesse e a coleta de dados. O controle de rota é feito com execução autônoma de missões de recobrimento de área, por meio de waypoints. Através dos sistemas de navegação e informação, o operador em solo pode acompanhar e assumir o controle da aeronave, a qualquer momento.

Feito manualmente, o pouso do VANT pode ocorrer em pistas curtas, geralmente não preparadas para aterrissagens de aeronaves maiores, e a frenagem se dá por sistema de esquis, com parada total em aproximadamente 15 metros após o toque no solo. Depois do pouso manual são realizados os procedimentos de pós-operação e gerados os produtos finais. Como exemplos de resultados estão os mosaicos, modelos digitais de terreno e mapas temáticos.


De acordo com Adriano, o tipo de sensor varia de acordo com a necessidade. “A AGX tem usado câmeras de pequeno ou médio formato – por exemplo sensores de 21 MP -, mas pode-se utilizar câmeras ópticas, digitais, termais, infravermelho, infravermelho próximo, entre outras”, afirma. Segundo ele, a novidade para daqui a alguns meses será o lançamento de um avião elétrico de baixíssimo custo, com preço inicial em torno de 30 mil reais.

Mosaico cana-de-açucar

Mas um VANT não é um aeromodelo, que você compra para o filho e coloca para voar. Antes de se fazer um levantamento é preciso obter uma autorização Notam, emitida pelos órgãos da Aviação Civil e Militar, avisando que será feito um sobrevoo a um determinado local. Além disso, esses locais não podem ser densamente habitados, o que tem sido um empecilho para algumas empresas que entraram no mercado com foco em segurança.

Recentemente a AGX firmou uma parceria com a Aeroalcool, fabricante de aeronaves, para a construção de um novo avião feito especialmente para a empresa Orbisat, com previsão de entrega até o final de 2010. Neste projeto, a AGX é a responsável pelos sistemas de posicionamento, que incluem software e hardware do VANT, que terá capacidade de 40 horas de voo e 70 quilos de carga útil. Como a nova aeronave vai transportar um sensor radar, de alto custo, o nível de segurança deve ser muito elevado.

Segundo João Moreira Neto, diretor daS Orbisat, dentre as principais vantagens de se usar um VANT, em relação a uma aeronave convencional, pode-se citar o custo mais baixo e também a facilidade de se operar em condições adversas ou em áreas onde o voo tripulado pode representar um risco muito grande para a tripulação.

O setor de VANTs é muito novo no Brasil e no mundo. “No fim do ano passado saiu a primeira regulamentação sobre o assunto, a IAC 29/09. É muito interessante que se criem regras claras de utilização e operação desse tipo de aeronave, e uma regulamentação será muito importante para que se possa operar cada vez com mais segurança e profissionalismo”, afirma João.

Com a entrada nesse segmento, a Orbisat tem o objetivo de oferecer mapeamento nas bandas P e X em áreas de até 500 quilômetros quadrados, por um preço inatingível pelo radar aerotranspotado por aviões a pistão e turbo-hélice. Para isso, a empresa contou com uma subvenção da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), tanto para o projeto e construção do radar nas bandas X e P, pela Orbisat, como também para projeto e construção do VANT, pelas empresas AGX e Aeroalcool.

Concepção artística do VANT

Segundo João, a banda X já está implementada em vários VANTs, porém nenhum desses sistemas se adequa à cartografia ou ao mapeamento. “O VANT da Orbisat, com o radar nas bandas P e X, será inédito no mundo com a banda P e também o único com precisão para produtos cartográficos. Com isso, áreas em torno de 10 quilômetros quadrados, que antes eram economicamente inviáveis de se mapear utilizando o radar aerotransportado, passarão a ser viáveis com o VANT. Como a autonomia é de 30 horas, será possível mapear uma área de até 500 quilômetros quadrados, na escala 1:5.000, nas bandas X e P em um único voo”.

O projeto, que passou por quatro anos de pesquisa e deverá entrar em operação a partir de janeiro de 2011, teve investimento total de 6 milhões de reais, com mais de 30 engenheiros e 10 técnicos envolvidos. A AGX e Aeroalcool projetaram e estão fabricando o VANT, e a integração do radar com o veículo ocorrerá em setembro. Após concluído, o VANT será de propriedade da Orbisat.

Segurança

A Força Aérea Brasileira (FAB) deve iniciar, no segundo trimestre deste ano, a avaliação de um VANT na Base Aérea de Santa Maria (RS). O treinamento faz parte do projeto de VANTs iniciado em dezembro do ano passado com a criação de um grupo de trabalho para estudar a implantação desse sistema na FAB.

O equipamento em avaliação é o Hermes 450, fabricado pela companhia israelense Elbit Systems, envolvendo a participação de sua subsidiária no Brasil, a empresa Aeroeletrônica, com sede em Porto Alegre. O VANT mede 10 metros de comprimento e seis de envergadura, voa a 110 quilômetros por hora e pode atingir cerca de cinco mil metros de altitude, com autonomia de mais de 15 horas em voo. O equipamento chegou ao país em 9 de dezembro do ano passado e, desde janeiro, militares da FAB iniciaram o treinamento com o apoio de especialistas israelenses.

Hermes 450

A FAB espera concluir a etapa de avaliação até o final do ano. Nesse período, também participarão do Grupo de Trabalho representantes do Exército e da Marinha.

Existem, em todo o mundo, vastas pesquisas e desenvolvimentos sobre VANTs, baseadas em diversos tipos de aeronaves, como aviões, helicópteros e dirigíveis. Esse tipo de aparelho possui um grande campo de aplicação, podendo ser empregado no monitoramento e estudo de florestas e regiões de interesse ecológico, em levantamentos de áreas rurais de aspectos agropecuários, tais como cobertura ou uso do solo, avaliação de colheitas e de número de animais. Também pode auxiliar na medição da composição do ar e de níveis de poluição e sua dispersão em centros urbanos e industriais. Além disso, serve para a inspeção de grandes estruturas – como oleodutos, gasodutos e linhas de transmissão -, levantamento de ocupação urbana e prospecção topográfica, mineral e arqueológica.

Definitivamente, os VANTs invadiram a Terra!

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