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Wikimapa: a voz do morro

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O projeto Wikimapa, realizado pelo Programa Rede Jovem, conta com grande veiculação na mídia nacional e internacional, além do apoio de articuladores da internet espalhados por todo o mundo e, em menos de um ano, já rendeu ao Programa matérias nos principais veículos de mídia. De jornais locais a grandes redes de TV internacionais, todos quiseram veicular a novidade de mapeamento participativo.

A Rede Jovem, programa social que há 10 anos promove a participação social da juventude de baixa renda, através do acesso às novas tecnologias, iniciou sua atuação com a implantação de telecentros comunitários, contando com uma metodologia de gerenciamento que considera a juventude local a mola mestra para garantir a utilização da tecnologia como instrumento para a resolução de questões locais.

Desde a sua concepção e em sinergia com valores compartilhados entre os programas da Comunidade Solidária, âmbito em que a Rede Jovem foi idealizada pela insubstituível Drª Ruth Cardoso, a equipe de coordenação realiza grupos focais com a juventude para estimular a reflexão e identificação das vocações locais, ao realizar parcerias com instituições comunitárias. A juventude sempre foi estimulada a identificar os ativos locais, de forma a garantir a valorização da comunidade e o fortalecimento do senso de identidade a partir das potencialidades e vocações identificadas, através do uso de ferramentas virtuais e da participação em rede.

Wikimapa

Com o Wikimapa, a intenção é dar dinamismo a essa metodologia de trabalho e garantir a criação de um mapa online em que as potencialidades são georreferenciadas, garantindo visibilidade ao que de bom as comunidades de baixa renda têm a oferecer, e não somente apontar as áreas de violência e locais a serem excluídos da visão dos interessados em navegar e conhecer – mesmo que virtualmente – as favelas do Rio de Janeiro e de outras cidades do Brasil.

A intenção era utilizar uma base cartográfica existente para estimular a juventude residente de comunidades de baixa renda do Rio de Janeiro a utilizar celulares para a inserção de serviços e estruturas disponíveis localmente, e desenvolver um sistema web wiki, que permitisse a edição de informações e uma construção colaborativa. No entanto, o escopo do projeto sofreu grande aumento, quando a Rede Jovem se deparou com uma questão maior do que a falta de visibilidade de oportunidades existentes em áreas de baixa renda: a impossibilidade técnica de marcação de locais em função da inexistência das favelas e áreas de baixa renda na geografia e cartografia oficial. Com tal identificação, a Rede Jovem passou a ter uma missão maior com o Wikimapa: garantir a criação de uma nova base cartográfica, sobrepondo a oficial, inserindo ruas principais e secundárias para o posterior mapeamento de locais de interesse público e serviços oferecidos localmente.
WikiMapa
Ao executar o projeto, a equipe foi alvo de críticas e questionamentos. Dentre eles o mais latente, a necessidade de justificar o uso de aparelhos celulares de ponta para mapeamento participativo de comunidades de baixa renda. No entanto, pesquisas demonstram que o jovem de baixa renda aspira e detém os aparelhos celulares mais modernos do mercado. O telefone celular é, hoje, o maior símbolo de status entre jovens, sem discriminação de classes. Ter um celular com GPS, internet e todos os serviços disponíveis no mercado, significa estar conectado com o mundo ou estar à espera que o mundo os conecte. Essa busca por conexão com o mundo é um dos problemas enfrentados pelo Wikimapa, a partir da promoção do jovem enquanto agente de transformação, fornecendo subsídios tecnológicos que potencializam o uso desses aparelhos em prol do desenvolvimento local.

Com o mapeamento colaborativo de ruas, foi possível identificar uma considerável mudança na relação que os moradores das comunidades passaram a estabelecer com o território onde residem. A sensação de marginalidade, ao visualizar mapas virtuais e não encontrar referências que denotem seu espaço no mundo, deu lugar ao brilho no olhar de jovens que, ao identificarem suas ruas, escolas e uma série de serviços oferecidos em suas comunidades, recriam seus conceitos sobre o território e fortalecem sua identidade, elevando sua auto-estima e promovendo a valorização local.
Ao iniciar os mapeamentos, a equipe do projeto identificou que os jovens importavam discursos criados pela opinião pública, reforçando, sem perceber, pré-conceitos que aumentam o abismo social que os afasta da cidade, fortalecendo a dicotomia “morro x asfalto”. Realidade que vem mudando com o despertar de uma nova visão sobre a favela, que transpõe barreiras culturais e o imaginário popular produzido pela mídia. Isto fica claro nas palavras da Wiki-repórter do morro Santa Marta, Rafaela Gonçalves, que outrora se apresentava como moradora do bairro e agora diz, com orgulho, morar no Morro Santa Marta, em Botafogo, e fala sobre sua comunidade com entusiasmo.

O mapeamento das ruas trouxe à tona uma série de memórias de personalidades que contam a história das comunidades. Na Cidade de Deus, há casos como o da Praça do Tucão, nomeada em homenagem ao morador que promovia festas no local, e da “Rua Zilá”, conhecida localmente pelo nome de “Rua Botafogo” por ter o brasão do clube estampado em muros e orelhões da rua, por um torcedor local. Histórias que definiram a identidade e cultura local vêm se perdendo em meio à desvalorização impulsionada pelo estereótipo criado sobre a favela e reforçado pela nova geração de moradores.

A intenção do Wikimapa não é criar um mapa das áreas de baixa-renda e favelizadas, mas sim integrar e incluir tais áreas ao mapa, proporcionando uma nova construção de identidade local.

O desafio foi grande, mas o projeto contemplou um planejamento minucioso com eficazes estratégias de comunicação, uma longa etapa de mobilização comunitária, seleção e treinamento de jovens, além da articulação de parcerias estratégicas.

Em função dos resultados alcançados, a Rede Jovem vislumbra a expansão e o atendimento às demandas recebidas de adaptação e versionamento, para garantir a replicação e apropriação da metodologia desenvolvida. Com isto, o Wikimapa será utilizado como ferramenta de transformação social em todo o mundo, por instituições e pessoas comprometidas com a produção de uma geografia inclusiva para substituir a oficial, que desconsidera uma enorme parcela da população que não dispõe de poder aquisitivo suficiente para contar com a infraestrutura básica que garante o acesso à cidadania.

Em pouco tempo de existência, o projeto já conta com mais de 500 voluntários cadastrados no site para realizar mapeamentos no Brasil e no mundo. Grande parte destes realizou o download do aplicativo, adotando o Wikimapa como ferramenta para o mapeamento de locais de interesse público.

Por não se tratar da única iniciativa criada para o enfrentamento desse grave problema, comum em áreas de baixa renda, a equipe de coordenação passou a fazer parte de algumas redes de compartilhamento de ferramentas e soluções de baixo custo e fácil acesso que possibilitem o mapeamento participativo e a criação de uma base cartográfica fidedigna, que permita dar voz e identidade aos moradores de áreas desfavorecidas em todo o mundo.

Toda esta articulação foi possível em função da cobertura de mídia realizada e da visibilidade concedida em função de destaques, como o prêmio internacional recebido este ano pela melhor utilização da tecnologia móvel para promover a transformação social – o Mobile Premier Award in Social Change. Katrin Verclas, diretora da MobileActive.org, instituição responsável pela seleção, apontou que a inovação demonstrada pela Rede Jovem, ao utilizar telefones celulares para o compartilhamento de historias de vida e mapeamento das favelas do Rio de Janeiro, mostra efetivamente como os celulares podem ser utilizados por jovens, para a inclusão e para sua participação política e social.

Patricia Azevedo
Coordenadora estratégica do Programa Rede Jovem. Antropóloga com formação em gerenciamento de projetos pela metodologia PMI. Responsável pelo desenvolvimento e gerência de projetos voltados para o uso da tecnologia virtual e móvel com fins sociais
patricia.azevedo@redejovem.org.br

Natalia Santos
Geógrafa com especialização em gerenciamento de projetos e atua como coordenadora executiva da Rede Jovem, programa social de estímulo à participação social por meio do acesso às novas tecnologias
natalia.santos@redejovem.org.br

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