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Geólogo da Unicamp usa técnica para gerar mapas mais precisos

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GeoprocessamentoO geólogo Cleyton de Carvalho Carneiro, pesquisador colaborador do Departamento de Geologia e Recursos Naturais (DGRN) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, aplicou pela primeira vez no Brasil a técnica denominada Self-Organizing Maps (SOM) para gerar mapas geológicos mais detalhados e precisos do que os elaborados por métodos convencionais. Carneiro validou a ferramenta em estudo desenvolvido na Província Aurífera do Tapajós, localizada nos estados do Pará e Amazonas. “Os resultados do trabalho reforçam o entendimento de que a técnica SOM é um recurso acessível e adequado para aperfeiçoar a rotina de elaboração de mapas geológicos”, afirma o autor da pesquisa.

Desenvolvida originalmente pelo engenheiro finlandês Teuvo Kohonen, em 1982, a técnica SOM levou alguns anos até ser difundida em termos de aplicações. Há algum tempo a técnica tem despertado o interesse de cientistas, nos diversos campos das engenharias, das geociências ou até mesmo na medicina. As amplas aplicações possibilitam, por exemplo, desde o refinamento de buscas em sites na internet, até complexas análises de neuroimagens. Por meio da ferramenta é possível, por exemplo, promover a diferenciação de tecidos em função de suas constituições, o que auxilia os médicos a identificarem eventuais tumores. A partir das possibilidades proporcionadas pela técnica, Carneiro decidiu utilizá-la para gerar mapas geológicos, tendo por base dados aerogeofísicos.

O pesquisador do IG começou a tomar contato com o tema por ocasião do seu doutorado, sob a orientação do professor Alvaro Penteado Crósta. Parte dos estudos foi realizada no Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation (CSIRO), na Austrália, sob a supervisão do pesquisador Stephen Fraser, que desenvolveu, a partir dos conceitos propostos por Kohonen, um software para ser aplicado na área da geologia. Também atuaram como co-orientadores de Carneiro no doutorado os professores Adalene Silva (UnB) e Eduardo Barros (UFPR). Na ocasião, a equipe escolheu uma área próxima ao município de Anapu (PA) para promover as análises por imagens e a coleta de informações de campo.

O trabalho deu origem a um artigo científico publicado na revista Geophysics, uma das mais respeitadas do segmento, que comprovou que a técnica SOM poderia aperfeiçoar a elaboração de mapas geológicos. “A escolha das variáveis, bem como o estudo estatístico dos resultados produzidos, permitiu classificar as rochas conforme suas características composicionais”, explica Carneiro. As pesquisas estão tendo prosseguimento no pós-doutorado do geólogo, desenvolvido no Instituto de Geociências (IG) da USP, sob supervisão do professor Caetano Juliani, em parceria com o IG-Unicamp.

Desta feita, a área escolhida para validar a ferramenta computacional foi a Província Aurífera do Tapajós, que detém uma das maiores reservas de ouro do Brasil. “O nosso objetivo, além de gerar novos conhecimentos nessa região, é prover dados que possam identificar áreas que possuam reservas minerais de interesse comercial”, diz o professor Alvaro Crósta. Ele assinala que o Brasil ainda conhece pouco sobre a geologia da Amazônia, por causa principalmente das características da região. O docente lembra que, no mapeamento geológico convencional, o geólogo vai ao campo, coleta as amostras de rochas e as leva para o laboratório para análise. “Na Amazônia, esse trabalho é difícil de ser realizado. Primeiro, porque há uma extensa cobertura vegetal. Além disso, não há afloramentos em todos os locais, o que significa que muitas vezes as rochas ficam escondidas sob o solo”.

Essas peculiaridades, continua o docente do IG, interferem também no sensoriamento remoto. “Quando se passa com o sensor convencional sobre a Amazônia, a bordo de um avião ou satélite, o que se vê são as árvores”, esclarece. Por isso, Alvaro Crósta considera que a técnica SOM, aplicada a dados geofísicos tomados por avião, é especialmente indicada para o mapeamento de áreas com essas características, por apresentar uma série de vantagens sobre os métodos usuais. “E se funciona bem na Amazônia, funcionará ainda melhor em outras regiões”, destaca. Mas, afinal, que atributos diferenciam a técnica SOM do mapeamento geológico convencional?

Análise visual

Quem responde é Carneiro. De acordo com ele, a maior parte dos mapas geológicos usuais é produzida a partir da análise visual de uma imagem colorida, na qual são utilizadas somente três variáveis, como potássio, urânio e tório, elementos detectados pelos aerolevantamentos geofísicos, que configuram, por assim dizer, a assinatura de determinadas rochas. Estas, por sua vez, podem estar relacionadas à presença em determinado local de minerais de grande valor comercial, como o ouro. Assim, com base nessa composição ternária, os geólogos desenham o contorno das unidades de rochas, baseados na interpretação visual das diferentes tonalidades de cores observadas. Ou seja, além de demandar maior tempo e ser menos precisa, esse tipo de técnica está sujeita a avaliações permeadas pela subjetividade. “Quando dois geólogos produzem mapas a partir desses dados de maneira independente, muito provavelmente cada um fará uma interpretação diferente dele”, assinala Carneiro.

Entretanto, quando a classificação deixa o domínio do espaço geográfico e passa para o das variáveis, tudo muda de figura, sem trocadilhos. “O espaço das variáveis é o que classificamos como n-dimensional. Ou seja, em termos matemáticos, nós podemos trabalhar com um número infinito de parâmetros, o que refina o mapeamento e faz com que cheguemos mais próximo da realidade”, pontua Alvaro Crósta. Para esclarecer como se dá esse refinamento, Carneiro usa como analogia uma fotografia, composta por pixels. “A aerogeofísica funciona como uma fotografia na qual se pode enxergar a abundância de um determinado elemento constituinte das rochas. Dessa maneira, se tomarmos uma mesma área geográfica como referência, cada fotografia de um dado elemento consistiria em uma variável”, afirma Carneiro. Conforme o geólogo, na técnica SOM cada pixel da imagem é plotado em função do valor correspondente à concentração dos elementos que constituem as rochas.

Desse modo, em vez de relacionar os pixels ao espaço geográfico, a ferramenta os associa ao domínio das variáveis. “Tomemos como exemplos o granito e o granodiorito, que são rochas muito próximas. No modelo convencional, eu poderia ter dificuldade de diferenciá-las a partir da análise visual, feita no domínio do espaço geográfico. No entanto, quando consigo relacionar os parâmetros de constituição dessas rochas ao domínio exclusivo das variáveis, eu obtenho uma classificação muito mais detalhada e precisa do que no domínio do espaço. Ou seja, eu abandono a generalização e passo a ser muito mais específico”.

O professor Alvaro Crósta observa que essa classificação é denominada de “não-supervisionada”, pois sofre interferência mínima do usuário. “A única ingerência, nesse caso, está relacionada à escolha das variáveis a serem consideradas para alimentar o programa. Entretanto, o usuário não tem como conferir pesos diferentes a elas. Com isso, temos um grau de subjetividade muito menor envolvido nessa tarefa”, reforça Carneiro. Os dois cientistas assinalam que, depois de feita a classificação, é possível voltar ao domínio geográfico para aplicar os resultados, o que permite enfim gerar o mapa geológico. “Vale lembrar que esse tipo de técnica não elimina o trabalho de campo feito pelo geólogo. Ele ainda precisa continuar indo a campo para coletar amostras para análises, que serão confrontadas com as informações cartográficas. Mas, o trabalho de mapeamento poderá ser feito de maneira muito mais eficiente e em prazo consideravelmente menor”, diz o autor do trabalho de pós-doutorado.

Ao promover a comparação dos mapas geológicos gerados pelo método usual e pela técnica SOM é possível identificar facilmente o nível de detalhamento proporcionado pelo segundo. Nele, os grupamentos que representam os diferentes tipos de rocha surgem de maneira pormenorizada. Os limites entre as unidades de rochas são identificados com maior precisão. Carneiro comenta, porém, que a ferramenta validada por ele tem limitações. Segundo o pesquisador do IG, às vezes uma unidade classificada tem a mesma constituição geofísica de outra dentro do mapa, mas isso não significa que ambas pertençam à mesma formação rochosa. “Com frequência, as rochas podem ter uma composição mineralógica similar, mas apresentarem idades diferentes. Uma pode ter, por hipótese, alguns milhões de anos a mais do que a outra. A identificação da idade e de outros parâmetros só pode ser feita a partir do trabalho do geólogo, que precisa ir a campo”, reafirma.

Segundo o professor Alvaro Crósta, a ferramenta computacional já está disponível para ser utilizada na elaboração de mapas geológicos mais precisos. A licença do programa SiroSOM, utilizado nas análises, pertence à instituição australiana CSIRO. O próximo passo do trabalho cooperativo entre a Unicamp e a USP é testar a técnica SOM em mapas do Serviço Geológico do Brasil (CPRM). “Nossa intenção é estabelecer uma rotina que proporcione a geração de mapas geológicos que sirvam de modelo inclusive para outros países. Atualmente, não tenho conhecimento de outro país que utilize a técnica SOM para essa finalidade”, conclui Carneiro, que conta com bolsa de estudos concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Fonte: Jornal da Unicamp – 5 a 11 de novembro de 2012 – nº 545. Texto: Manuel Alves Filho


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