A Nova Norma Land Administration Domain (LADM) e sua incidência nos cadastros brasileiros
Em primeiro de novembro de 2012 foi aprovada a ISO 19152, o novo padrão que define um modelo para o âmbito da gestão territorial, (conhecido como LADM, ou acrônimo em inglês da expressão Land Adminstration Domain Model). A motivação desta norma surgiu por iniciativa da Federação Internacional dos Agrimensores (FIG) e do programa para os assentamentos humanos da ONU UN-Habitat, e posteriormente foi desenvolvido pela ISO até alcançar a versão final.
A gestão do território é um campo muito amplo e a LADM não pretende cobri-lo em toda a sua extensão. De maneira concreta, esta norma consolida a relação entre o elemento físico (lote, apartamento, etc.) e o elemento jurídico (direito de propriedade, de usufruto, etc.), continuando a tendência já estabelecida na Infraestrutura de Informação Geoespacial na União Europeia (Inspire). Como consequência, o lote aparece como o elemento espacial onde se materializa o direito de propriedade e outros direitos, seguindo a posição amplamente definida nas legislações sobre cadastro e registro da propriedade.
LADM é um esquema conceitual e, como tal, se limita a descrever formalmente conceitos básicos que podem ser assumidos em todos os países do mundo, independentemente das singularidades nacionais existentes, sendo estes conceitos básicos os seguintes:
• Parte: sujeito (em geral, interveniente)
• DRR: Direito/Restrição/Responsabilidade
• Unidade administrativa: objeto territorial registrado (ainda de maneira informal) ou suscetível de sê-lo
• Unidade espacial: aspectos espaciais de um objeto territorial
No que diz respeito aos direitos, LADM distingue entre:
• Direitos: propriedade, usufruto
• Restrições que limitam o exercício destes direitos: hipoteca, servidões, etc., mas também imitações de domínio público (por exemplo, área de proteção ambiental)
• Responsabilidades derivadas dos mesmos: obrigação de limpar um canal, manutenção de edifício histórico, etc.
• Fonte administrativa ou título: escritura de compra e venda, hipoteca
• Parte ou titular de direito: com independência de que seja uma pessoa física ou jurídica
• Parte múltipla, quando são vários titulares de direito ou o são em um percentual do mesmo: casamento em comunhão de bens, herdeiros
Destaca-se o conceito de “unidade administrativa”, entendendo como tal o objeto territorial registrado (ou ainda de maneira informal) ou passível de sê-lo. Uma unidade administrativa pode englobar várias unidades espaciais (exemplo: um apartamento e sua respectiva garagem). Assim mesmo, uma unidade administrativa por um direito concreto (exemplo: a titularidade do direito de passagem a um determinado lote), se vincula indissoluvelmente a outra parcela.
O conceito de “unidade espacial” integra os aspectos espaciais de um objeto territorial. Uma unidade espacial pode conter outras unidades espaciais (exemplo: as sub-parcelas), e assim mesmo várias unidades espaciais podem agrupar-se (exemplos: o polígono, a quadra ou o município). Distingue-se pelo nível da unidade espacial (exemplo: urbano, rústico), assim como se trata de um espaço edificado (exemplo: casa, piso, local, etc.) ou de um espaço de rede de serviço (exemplo: esgoto). A geometria de uma unidade espacial pode ser especificada por distintas formas e descrita mediante texto, polígonos, poliedros, etc., sendo também diversas as fontes que são capturadas estas unidades (exemplos: croquis, observações GNSS, ortofotos, mapas topográficos).
Finalmente, a LADM nasce plenamente coordenada com outras normativas que também têm a intenção de padronizar, e especialmente com a Inspire, Land Parcel Identification System (LPIS) e Social Tenure Domain Model (STDM).
Cada país deve personalizar o esquema LADM para adequá-lo a suas necessidades, eliminando alguns elementos, refinando outros, ou acrescentando novos. Vários países têm desenvolvido seus perfis nacionais: Portugal, Austrália, Indonésia, Japão, Hungria, Países Baixos, Coréia, Chipre, Rússia.
No Brasil, as iniciativas para padronização de dados espaciais estão inseridas em um processo de políticas, normas de desenvolvimento e implantação da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde), desde o nível nacional, estadual e municipal, e vem se consolidando através de um Plano de Ação, elaborado pelo Comitê de Planejamento da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Cinde) do Comitê de Cartografia (Concar).
Diante das distintas esferas de governo, são evidentes os desafios para a Inde quanto à orientação e suporte que necessitam as administrações na implantação de padrões de informações, esquemas de integração e compartilhamento de dados. Nesse sentido, o conteúdo de uma Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE) pode ter especificidades em cada esfera de governo ou em uma determinada instituição. Considerando o caso brasileiro, o protagonismo e responsabilidade das administrações locais quanto à gestão territorial, há a necessidade em se contemplar as particularidades referentes aos diferentes temas de políticas públicas relacionados ao território, como desenvolvimento sustentável, saúde, educação, administração pública, cadastro e outras aplicações de benefício à sociedade.
Em relação ao cadastro, a portaria publicada no ano de 2009 pelo Ministério das Cidades estabelece diretrizes para a criação, instituição e atualização do Cadastro Territorial Multifinalitário (CTM). Define conceitos básicos, além de fortalecer o papel do CTM na gestão plena do território como instrumento para o planejamento, parcelamento e ocupação do solo.
Para atender as diferentes necessidades e assim lograr a multifinalidade, o CTM deve ser modelado em um sistema de referência e identificador único. Assim se reconhece a parcela cadastral como parte da informação básica sobre a qual se poderá gerar toda a infraestrutura de dados espaciais. A resolução orienta que os sistemas cadastrais dos municípios atendam as especificações técnicas produzidas no âmbito da Cinde para a estruturação de dados geoespaciais vetoriais e para a padronização da cartografia.
Um dos fundamentos da resolução é o conceito de parcela, definida como a menor unidade cadastral com superfície contígua e sob um único regime jurídico. Esse conceito permite que um imóvel contenha uma ou mais parcelas, conforme as restrições de uso e ocupação, como por exemplo, são identificadas como parcelas as restrições ambientais, concessões de uso em áreas públicas. Assim, neste conceito a parcela permite uma flexibilidade na modelagem do cadastro em distintos aspectos: jurídicos, fiscal, etc..
As informações oriundas dos sistemas cadastrais tendem a ser cada vez mais usadas nas políticas territoriais e, portanto, irá exigir mais qualidade dos dados cadastrais, bem definidos através de metadados e avaliados de acordo com as normas acordadas como a LADM e a Inde.
Podemos concluir que a adoção de normas e a utilização de padrões, componentes estruturantes para os sistemas cadastrais, possibilitarão a disponibilidade, acessibilidade, integração e fomento à distribuição de informações para a gestão do território.
Diretor do Centro Especialista de SIG e Cadastro
Informática el Corte Inglés (IECISA)
ignacio_duran@ieci.es
Doutoranda em SIG- Unicamp
Arquiteta – Prefeitura Municipal de Campinas
daniella@sigmanet.com.br
Documentos consultados
Portaria Ministerial 511, de 7 de dezembro de 2009
Manual de Apoio – CTM: Diretrizes para a criação, instituição e atualização do cadastro territorial multifinalitário nos municípios brasileiros / Organizadores: Eglaisa Micheline Pontes Cunha e Diego Alfonso Erba – Brasília: Ministério das Cidades, 2010