Por Luiz Eduardo Faria
Para responder essa pergunta, vamos fazer algumas considerações iniciais, posteriormente faremos algumas contas e, para finalizar, vamos mostrar o que quem realiza o CAR (Cadastro Ambiental Rural) deve entender para ser profissional e evitar o pior para seu futuro.
Trágico, não?
Mas é exatamente isso, precisamos entender quanto custa para fazer o CAR de maneira profissional.
A princípio falaremos sobre o erro que vem sendo cometido quando se divulga que o CAR é gratuito e que qualquer produtor rural pode fazer, sem a contratação de profissionais específicos.
Essa informação poderia ser verdadeira se considerarmos que o CAR é só o cadastramento propriamente dito, mas isso não é verdade. O CAR não é só isso. Ele envolve várias etapas que ocorrem antes, durante e depois da inserção das informações no sistema de cadastro.
Tudo começa com as informações que o profissional contratado recebe do proprietário. Tendo ao menos o perímetro da propriedade, é possível iniciar um processo de diagnóstico, onde através de imagens de satélite atuais mapeia-se a vegetação nativa e as áreas abertas existentes na propriedade.
Para dividir a vegetação nativa mapeada em APP e RL, devem-se mapear os rios e nascentes da propriedade e é neste momento que planejaremos a ida ao campo. Para fazer este mapeamento em campo, pode-se fazer uso do geoprocessamento, que estima a localização das nascentes e rios, de acordo com a declividade da propriedade, tudo de forma remota. Esse tipo de preparação facilita (e muito!) o trabalho de campo, pois será necessária apenas a conferência do que já foi mapeado no escritório, chegando rapidamente ao destino desejado com a utilização de GPS.
Há casos, em que o trabalho de campo se faz desnecessário, como por exemplo, em propriedades que não possuem nascente ou rios em seus limites e que proprietário já possua o perímetro do imóvel.
Trabalho de campo feito, hora de voltar para o escritório e descarregar as informações coletadas. Uma pergunta: com as informações de campo já conseguimos dividir a vegetação nativa em APP e Reserva Legal?
A resposta é não! Ainda falta mapear a área consolidada e é nesta hora que muitos profissionais têm dificuldade. A única forma de garantir veracidade das áreas consolidadas é através de imagens de satélite de duas datas: 2008 (mais precisamente 22 de julho de 2008) e a mais atual (de preferência, de 2014).
A primeira data separa os que têm anistia ou não pelos desmatamentos ocorridos dentro da sua propriedade e isso é extremamente importante,pois as regras para delimitar as APP se modificaram com o Novo Código Florestal para áreas consolidadas.
Áreas consolidadas mapeadas é hora de dividir a vegetação nativa em RL e APP, contabilizar o passivo e também os excedentes de vegetação existentes que poderão ser comercializadas na forma de CRA – Cotas de Reserva Ambiental. Aqui vale uma dica: muitas vezes há passivo em áreas de APP e excesso de vegetação na RL, o que faz com que essas áreas possam ser comercializadas.
APP e RL mapeadas e contabilizadas, já podemos fazer o cadastramento no SiCAR? Ainda não, mas já passamos a etapa mais difícil. Agora é hora de saber se existem informações georreferenciadas que ainda precisam ser cadastradas como Cobertura do Solo, Servidão Administrativa e área de uso restrito.
E agora, vamos para o cadastro das informações?
Ainda não.
Mas falta bem pouco! Basta só levantar os documentos pessoais dos proprietários. Feito isso,agora sim vamos para o cadastramento propriamente dito.
Antes, deixamos uma reflexão: ainda não começamos fazer cadastro nenhum no SICAR e perceba quantas atividades já ocorreram. Quanto vale o serviço feito antes do cadastro no sistema? Quanto tempo (em horas) uma empresa ou um profissional gasta para realizar a preparação dos arquivos e informações detalhada neste post?
Pois bem. O trabalho de escritório pode ser mais fácil de estimar, mas e o campo? É muito difícil estimar o tempo gasto em campo sem antes realizar o diagnóstico no escritório. Fato é que fazer o serviço de uma propriedade com 4 nascentes preservadas e com vegetação nativa remanescente é muito mais trabalhoso para mapear do que uma sem nascente. Mapear rios em campo, quando não conseguimos mapear através de imagens de satélite, também é trabalhoso.
Pronto, com todas as informações em mãos, é hora de inscrever e cadastrar diretamente no SICAR, de seu estado ou no Federal, já que em alguns estados o sistema ainda não foi integrado ou liberado para o cadastro.
E de novo podemos fazer a mesma pergunta, quanto tempo demora-se para realizar o cadastro do SiCAR? Devemos considerar a quantidade de erros ocorridos durante o processo ou mesmo o sistema ficar fora do ar em alguns lugares.
Feitas as considerações, vamos às contas…
Primeiramente, algumas premissas: Ao fazer as contas consideramos um custo por hora trabalhada do profissional em R$50,00, o que representaria um salário liquido de R$ 3.000,00 por mês. Consideramos também que um profissional consegue realizar o trabalho de escritório, de campo e no cadastramento no SICAR em 1,5 dias (gastando 4 horas cada uma das etapas). Muitas vezes pode-se demorar mais do que apenas 4 horas para realizar cada etapa e isso faz com que os custos aumentem. Calculem bem realmente quanto tempo demora cada etapa.
Colocadas as premissas, para as etapas de escritório, campo e cadastro um custo de R$ 600,00 já foi gerado, R$ 200 em cada etapa. Mas não podemos considerar apenas o custo do trabalho realizado. Deslocamento, hospedagem e alimentação são custos que devem ser computados para o trabalho em campo. Agora adicione parte dos custos fixos como aluguel, luz, telefone e outras despesas que o profissional tenha e não se esqueça dos impostos caso o profissional trabalhe com nota fiscal ou RPA (Recibo Profissional Autônomo) o que teoricamente é obrigatório. Adicione ainda o custo da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) e contabilize. Nenhum profissional deveria estar cobrando menos que R$ 1.000,00 para realizar o CAR de qualquer propriedade.
Se você é um profissional que vende os serviços do CAR por R$ 500,00, cuidado, você está trabalhando de graça ou mesmo pagando para trabalhar. Pense nisso. Mas não para por aí. Ainda há um custo extremamente importante que deve ser levado em consideração, chamado co-responsabilidade…
O profissional que fizer o CAR para o proprietário é co-responsável pelas informações inseridas no SICAR. Caso haja erros ou informações omissas, o profissional também poderá ser processado e neste momento outros custos virão e se isso ocorrer, o profissional deve guardar uma reserva de cada cliente para poder se defender caso seja movida uma ação contra o mesmo. Um exemplo: o CAR da propriedade feita por um profissional foi considerado ativo, de acordo com as informações inseridas no CAR. Tempo depois, o banco que costuma financiar a safra do produtor recusa liberar o crédito, pois se verificou um erro no CAR, o que gerou uma pendência. O proprietário ficará feliz? Quem ele vai processar para reparar seu prejuízo? Esse foi só um exemplo, mas existem outros tantos que poderá chegar até o profissional que fez o CAR. Guarde pelo menos 30% dos valores cobrado de cada cliente para um fundo de reserva caso o profissional seja acusado de co-responsabilidade de uma pendência ocorrida no CAR.
Um bom exemplo foi a notificação recebida pelo BNDES em Março de 2010, por co-responsabilidade pelos impactos causados pela construção da Usina de Belo Monte apenas por financiar a obra (para quem não soube, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social financia 80% da obra).
A co-responsabilidade não é brincadeira e deve entrar no computo do preço cobrado do cliente. Tínhamos chegado em R$ 1000,00? Agora adicione os 30% e chegamos num valor mínimo de R$ 1.300,00. Profissional de verdade não pode cobrar menos de 1.300,00 para realizar o CAR de qualquer propriedade a não ser que o profissional demore menos de 1,5 dias para fazer todas as etapas (escritório, campo e cadastro no SiCAR).
Cobrar qualquer valor menor do que este é um prejuízo enorme para quem trabalha profissionalmente prestando serviços. Muitas vezes, pensamos em ‘ser bacana’ e cobrar uma quantia amigável para algum conhecido ou para um conterrâneo, e acabamos por sofrer as consequências.
Sendo assim, olhar para o CAR como uma coisa solitária, é o primeiro erro cometido, dificultando ainda mais para que o CAR ocorra com sucesso. Baratear o preço final para o cliente é o principal, pois valores muito baixos não cobrem as despesas, os esforços e também não serve de ressalva para possíveis problemas. Quem quer trabalhar com o CAR deve ter em mente os riscos corridos e procurar aplicar um preço justo, não somente atrativo. Senão, acaba por perder tempo, dinheiro e principalmente, o profissionalismo.
Luiz Eduardo Faria
Co-fundador da Agrosig Brasil