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Cartografia: oportunidade ou necessidade?

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Pela união dos engenheiros e fortalecimento do setor geoespacial

Atuando na área de aerolevantamentos e geoinformação por mais de 35 anos, permaneço com a sensação dúbia do vendedor de calçados da empresa que sondava o mercado africano: na visão pessimista lá não havia mercado, pois todos andavam descalços; na visão otimista lá seria o lugar ideal para se investir, porque todos andavam descalços.
O Brasil continua um grande buraco cartográfico e carente de todo o tipo de geoinformação, portanto há muito por fazer e produzir. Ponto para o otimismo!

Por outro lado, enquanto na ONU e nos países desenvolvidos, hoje, considera-se a geoinformação como uma importante ferramenta para o controle do desenvolvimento sustentado e para a prevenção e mitigação de acidentes naturais, aqui discutimos se geoinformação é um termo adequado, semanticamente correto, mais importante ou não do que cartografia; e se devemos extinguir a Comissão Nacional de Cartografia (Concar) e criar o Conselho Nacional de Geoinformação (Congeo).

Lá fora estão pensando em geoinformação, pois estão todos preocupados com soluções para problemas reais de subsistência e de segurança, sendo que a cartografia deixou de ser preocupação há muito tempo, pois está disponível na forma adequada e atualizada.

Aqui, por sua vez, ficamos discutindo se geoinformação é mais importante do que cartografia, se o assunto continuará sendo conduzido no âmbito da Concar ou se será criada uma agência específica para tal; quem deve ser o responsável por uma coisa ou outra, numa disputa antecipada de poder sobre o nada. Já que nada existe e nada se faz!
Sob este aspecto, entendo que o atual governo já tenha se dado conta que algo há de se fazer para acabar com o impasse existente entre o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e a Diretoria de Serviço Geográfico do Exército (DSG), onde, na minha opinião, a superposição de atribuições só atrapalha e emperra o desenvolvimento da cartografia e da geoinformação no país.

Continuo pensando que se a cartografia é uma atribuição do Estado (algo para se pensar), então que um único órgão se responsabilize por ela, assumindo as tarefas de normatizar, especificar e validar. O que não é pouco!

Ao IBGE eu delegaria os Censos, as Estatísticas, o e-government, a gestão da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde); e as atribuições do geógrafo em geral. Eventualmente, manteria com o IBGE as atribuições pela manutenção da rede Geodésica de Primeira Ordem, bem como a Gravimétrica. Quanto à produção da cartografia terrestre, eu a concentraria totalmente na DSG, por ter um histórico de procedimentos e normas escritas, além de uma estrutura produtiva.

Por outro lado, defendo há anos a participação da iniciativa privada como força agregada à capacidade de produção do Estado, aumentando em muito a quantidade de produtos passíveis de serem gerados e disponibilizados de forma mais célere para a sociedade tão carente desta informação. Neste caso, caberia ao órgão oficial – a DSG – como citado acima, especificar e validar os produtos.

Há anos as empresas privadas vêm atendendo o mercado cartográfico em projetos e serviços em escalas cadastrais. Administrações municipais são grandes demandadores, pois são conscientes de que os investimentos feitos nesta área se revertem em vantagens na forma de aumento de arrecadação de tributos. Empresas como Petrobras; geradoras e distribuidoras de energia elétrica; de saneamento; reflorestadoras; mineradoras e outras de infraestrutura, mais e mais se valem de bases cartográficas para subsidiar seus projetos.

É chegada a hora dos estados partirem para mapeamentos em escalas desenvolvimentistas (por exemplo, 1:10.000), a fim de lastrear atividades de planejamento e gestão. Não há mais espaço para administrar na base do “feeling”, do improviso, ou do “jeitinho”. Uma boa base cartográfica planialtimétrica, elaborada segundo preconiza o estado da arte, atenderá perfeitamente todas as ações de governo, em particular o cadastramento rural, o georreferenciamento dos imóveis rurais (até hoje com poucos avanços), o cadastro ambiental rural; o Imposto Territorial Rural; e ainda as áreas da saúde, educação, segurança e serviços.

Os avanços que testemunhei como representante da Agência Nacional de Empresas de Aerolevantamento (Anea) na Concar ao longo dos últimos 10 anos foram poucos e lentos. Contudo, destaco a importância da concepção da Inde e suas normas técnicas, como a Estrutura de Dados Geográficos Vetoriais (EDGV) e a Estrutura de Dados Geográficos Raster (EDGR) que permitirão, com mais facilidade e inteligência, elaborar, disponibilizar e compartilhar informações cartográficas.

Como empresário da iniciativa privada, sofro com as sazonalidades do mercado, com a falta de planejamento, tanto estatal como na iniciativa privada (ex.: concessionárias de serviços públicos); com a elevada carga tributária; com os pesados encargos trabalhistas; e com o alto custo Brasil de um modo geral, onde o simples ato de enviar um equipamento para ser reparado ou calibrado pelo fabricante (estrangeiro) torna-se um demorado martírio burocrático.

Temo que a política atual de contratação, predominantemente através de pregão eletrônico – onde prevalece somente o menor preço, leve a indústria do aerolevantamento e da geoinformação ao colapso, pela simples falta de condições de arcar com todos os custos a que estão sujeitas. Custos estes agravados pela necessidade de acompanhar o desenvolvimento tecnológico, hoje praticamente ditado pela lei de Moore (ex-presidente da Intel que preconizava que a cada dois anos a capacidade de processamento dobra, mantendo os preços atuais).

Entendo que este seja um mal de quase todas as atividades de engenharia, pois há forte tendência de se menosprezar o conhecimento técnico, a experiência pregressa, bem como a estrutura produtiva das organizações, resumindo tudo a uma questão de menor preço. Não percebo esta tendência na contratação de serviços médicos (embora a classe médica esteja ainda digerindo a imposição governamental, sem o devido revalida, dos médicos estrangeiros) ou de serviços advocatícios.

Penso que é chegado o momento dos profissionais que atuam na área de engenharia se unirem. Estejam eles atuando como produtores, demandadores/fiscais, ou como acadêmicos na formação de mão de obra básica e de especialistas. O enfraquecimento ou o afastamento demasiado de uma das pernas deste “tripé geomático” (produtores, demandadores e acadêmicos) prejudicará a todos e ao país consequentemente.

Renato Asineli Filho
Engenheiro Civil formado em 1977 pela UFPR com especialização em aerofotogrametria e geodésia pela mesma universidade. Sócio fundador da Engefoto e atual diretor presidente, tendo atuado nestes 35 anos de vida profissional em mais de mil contratos envolvendo geomática e projetos viários.

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