Definição para levantamento georreferenciado de imóvel rural – competência legal e procedimento

Este texto é uma consulta enviada ao IRIB relacionada ao levantamento georreferenciado de imóveis rurais que se encontram localizados nas zonas limítrofes de dois ou mais municípios do Estado de São Paulo, exigindo do geomensor a definição de qual circunscrição municipal se encontra o imóvel, se próximo à linha divisória, se coincidente com esta ou se a superfície do bem imóvel abrange o território de mais de um município.

Portanto, as hipóteses que compõem este estudo são as seguintes:
a) imóvel localizado inteiramente em um município, bem próximo da divisa intermunicipal;
b) imóvel localizado inteiramente em um município, mas confrontando com o território de outro município; e
c) imóvel localizado em mais de um município.

Na figura 1, o Sítio Fundo, como se encontra inteiramente no Município “A” e nem confrontação faz com o Município “B”, seu registro foi corretamente efetivado na circunscrição imobiliária A.

Situação simples que não causa qualquer dúvida. A Fazenda Chicus está inteiramente localizada no Município “B” (apesar de algumas de suas perimetrais coincidirem perfeitamente com a linha limítrofe entre os dois municípios) e está matriculada no registro imobiliário do mesmo Município “B” (Mat. 18.876). 


Figura 1 – Hipóteses relacionadas aos limites municipais

O Sítio Ary Pires, por estar localizado nos dois municípios, está registrado em ambas circunscrições imobiliárias (Matrícula nº 45.986 no Registro Imobiliário do Município “A” e Matrícula nº 9.812 no Registro Imobiliário do Município “B”), sendo idênticas as duas descrições tabulares, que declaram que o referido imóvel encontra-se localizado em ambos os municípios.


Figura 2 – Divisão legal dos municípios

Essa é a situação juridicamente correta dos imóveis exemplificados na Figura 1. Entretanto nem sempre os dados do registro imobiliário e do cadastro do Incra estão coerentes com a realidade fática.

A importância desse estudo está na dificuldade de identificação dos pontos formadores dessa linha divisória entre os entes municipais, principalmente agora que os imóveis rurais estão sendo georreferenciados por imposição legal.

As prefeituras, de uma maneira geral, não dispõem desses dados. Os geomensores, quando se deparam com imóveis nessas situações, sentem enorme dificuldade em definir os pontos georreferenciados referentes a esses limites, pois não encontram informações seguras que lhes garantam o desempenho de suas funções sem potencialidade de danos a terceiros, situação que os deixam sujeitos a responsabilização administrativa, civil e criminal por seus atos. Em suma, prevalece a indefinição.


Figura 3 – Divisão conforme registro imobiliário

1. Histórico

A maneira como o território brasileiro foi ocupado e a forma como se deu o ingresso dos títulos de domínio nos primórdios do registro imobiliário são circunstâncias suficientes para concluir que a grande parte dos imóveis localizados nessa zona limítrofe tiveram sua localização municipal definida por simples declaração do proprietário, sem a existência ou mesmo preocupação por qualquer sistema de controle.

Os imóveis, anteriormente de áreas imensas, foram sendo paulatinamente desmembrados e alienados, formando outros de menor tamanho que, por sua vez, eram também parcelados e alienados.

Nesses parcelamentos, dificilmente efetivados mediante técnicas de agrimensura, competia ao proprietário definir a nova descrição, a área e a localização de seu pedaço de terra. A conseqüência disso é o conturbado cenário atual tanto do cadastro imobiliário (a cargo do Incra) como do registro imobiliário.

A situação demonstrada na figura 2 é a juridicamente correta, estando cada imóvel registrado em sua competente circunscrição imobiliária, conforme sua localização espacial no território de um ou de outro município.

No caso de um dos imóveis (Sítio Ary Pires, que está hachurado), por sua superfície abranger o território de mais de um ente municipal, seu registro está efetivado em ambas as circunscrições.


Figura 4 – Imóvel próximo ao limite do município

Entretanto, devido aos problemas históricos já mencionados, a situação normalmente verificada nas zonas limítrofes de municípios é que cada imóvel está registrado na circunscrição imobiliária que o proprietário da época do desmembramento julgou estar localizado seu pedaço de terra.

Assim há imóveis integralmente localizados no Município “B” que estão registrados como se estivessem localizados no território do Município “A” e vice-versa.

Basta uma simples busca nas matrículas dos imóveis localizados nessa zona limítrofe para constatar essa situação.


Figura 5 – Imóvel confrontando com o limite intermunicipal

As falhas demonstradas na figura 3 são as seguintes:

O Sítio Fundo, localizado no Município A, está registrado como se estivesse localizado no Município B.
A Fazenda Chicus está registrada como se sua área abrangesse ambos os territórios, apesar de estar localizada inteiramente no Município B.
O Sítio Ary Pires está registrado como se estivesse localizado apenas no Município A, apesar de a verdadeira divisa intermunicipal cortá-lo ao meio.

Essa situação hipotética representa muito bem a real situação dos imóveis localizados nas proximidades das divisas intermunicipais.

2. Situações hipotéticas

2.1 Imóvel localizado em um município, próximo à divisa intermunicipal
Situação: o imóvel está inteiramente localizado em um único município; sua superfície não alcança a linha limítrofe com o município vizinho, apesar de relativa proximidade.
O Sítio Fundo, conforme demonstra a figura 4, está localizado no Município “A” e deve estar matriculado na circunscrição imobiliária que abrange esse município.

2.2 Imóvel localizado em um município, mas confrontando com outro município
Situação: a Fazenda Chicus está localizada integralmente no Município “B”, apesar de estar confrontando diretamente o território do Município “A”, significando que algumas de suas perimetrais coincidem perfeitamente com a linha da divisa intermunicipal.
Sua localização, portanto, é o Município “B” e deve o referido imóvel ser matriculado exclusivamente na serventia imobiliária que tenha competência territorial sobre esse município.

2.3 Imóvel localizado em mais de um município
Há três formas de tratar o assunto:

A primeira, que seria a mais coerente, é o desmembramento do imóvel, de forma que cada parcela resultante (imóvel autônomo, matriculado) fique integralmente no território de um município. Evitaria uma série de problemas, principalmente os relativos às competências administrativa, tributária, jurisdicional, registral, etc.

A segunda forma, também bastante coerente, é a utilização de uma descrição tabular completa (do todo) e das duas descrições referentes às parcelas de acordo com a competência territorial (em seguida à descrição do todo ou por intermédio de uma averbação). Apesar de continuar sendo um único imóvel, a descrição exata das parcelas localizadas em municípios distintos além de prevenir uma série de problemas, colabora com os órgãos estatísticos do governo para a definição de suas políticas públicas.

A terceira opção, a mais tênue dentre elas, resume-se na descrição do todo e na mera declaração de que tal imóvel está localizado em dois ou mais municípios, sem definir as áreas de cada parcela ou a linha divisória entre elas. Há descrições antigas que trazem apenas a área de cada parcela sem definir os limites. Nesses casos, ou a área declarada foi arbitrada sem qualquer cálculo matemático aceito pela agrimensura (hipótese geral) ou o cálculo da área foi efetivado com base na linha limítrofe entre os municípios, sem contudo declarar na matrícula a sua descrição (hipótese praticamente inexistente). Para fins didáticos ligados a este estudo, será considerada apenas a hipótese 2 (descrição do todo e das parcelas).


Figura 6 – Imóvel com área localizada em 2 municípios

Estando o imóvel localizado em dois ou mais municípios, deve-se verificar se a circunscrição imobiliária desses municípios é a mesma ou não.

Se ambos os municípios pertencem à mesma circunscrição, haverá apenas uma matrícula referente a esse imóvel, com descrição tabular do todo e de cada uma de suas parcelas.

Se a competência registral imobiliária também for distinta, o assento registral deve ser igualmente efetivado nos dois ofícios, conforme determina a Lei dos registros Públicos:

LRP – Art. 169 – Todos os atos enumerados no artigo 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no cartório da situação do imóvel, salvo:

II – os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, que serão feitos em todas elas, devendo os Registros de Imóveis fazer constar dos registros tal ocorrência.

Até agora o assunto foi tratado conforme a vontade da lei e a lógica do sistema. Exclusivamente sob esse prisma, a definição de como descrever os imóveis e de como proceder seu registro são tarefas de fácil padronização.

Entretanto, há uma variável, de extrema importância, que ainda não foi estudada: onde fica a linha limítrofe dos municípios?

3. Definição da divisa intermunicipal

O município, pessoa jurídica de direito público interno, é hoje um ente político autônomo finalmente reconhecido pela Constituição de 1988:

CF – Art. 18 – A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Antes da atual Constituição, a competência da organização interna do município era atribuição do Estado. Hoje, apesar de ser uma circunscrição do território estadual, compete ao próprio município elaborar sua lei orgânica, a qual deverá respeitar todos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na Constituição de seu Estado.

A criação de município depende hoje de lei estadual precedida de consulta plebiscitária às populações dos municípios envolvidos, após a realização de estudos de viabilidade municipal, nos termos do §4º do artigo 18 da Carta Magna (com redação dada pela Emenda Constitucional nº 15, de 1996): 

§4º – A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por lei complementar federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei.

No Estado de São Paulo, a legislação que cuida do quadro territorial-administrativo do Estado é a Lei nº 8.092, de 28 de fevereiro de 1964, cujo anexo nº 2 descreve sistematicamente as divisas intermunicipais: 

Artigo 3º – O Quadro Territorial, Administrativo e Judiciário do Estado compreende 242 comarcas, 573 municípios e 871 distritos conforme os anexos nº . 1 e 2, que ficam fazendo parte integrante desta lei. 

§ 1º – No anexo nº 1  feita a relação sistemática e ordenada de todas as circunscrições administrativas e judiciárias da divisão territorial, com indicação de categoria das respectivas sedes, que tem a mesma denominação da própria circunscrição. 

§ 2º – O anexo nº 2 descreve sistematicamente as divisas intermunicipais e as divisas interdistritais e, bem assim, consigna o ano de criação de cada município. 

§ 3º – Além dos anexos referidos, fica também fazendo parte integrante desta Lei o anexo nº 3, que contém a descrição sistemática das divisas intersubdistritais.  

Na década de 90, houve uma enorme alteração territorial-administrativa, com a criação de mais de 1.200 municípios em todo o País. Somente no Estado de São Paulo, foram criados 73 novos municípios pelas seguintes leis estaduais: 

a) Lei nº 6.645/90;

b) Lei nº 7.664/91;

c) Lei nº 8.550/93; e

d) Lei nº 9.330/95. 

Todas essas leis, além de definirem as divisas intermunicipais dos novos entes políticos, também complementaram os anexos 1 a 3 da Lei nº 8.092/64. 

Em decorrência, todo município paulista possui sua descrição perimétrica aprovada por lei estadual (anexo nº 2 da Lei nº 8.092/64 englobadas as alterações posteriores), o que a torna a descrição oficial que deve ser por todos observada, independentemente dos interesses dos entes municipais envolvidos ou mesmo dos proprietários de imóveis localizados na zona limítrofe.

 

4. Competência para definir a divisa intermunicipal 

No Estado de São Paulo, compete ao Instituto Geográfico e Cartográfico – IGC, órgão subordinado à Secretaria de Economia e Planejamento, estudar questões sobre limites estaduais, divisas intermunicipais e distritais, bem como executar a necessária demarcação, implantação e conservação dos marcos divisórios (artigo 28, Inciso II, do Decreto nº 49.568/2005).

Tal atribuição remonta da própria lei que dispõe sobre o quadro territorial, administrativo e judiciário do Estado, a Lei nº 8.092/64: 

Artigo 13 – Cabe ao Instituto Geográfico e Geológico da Secretaria da Agricultura: 

a) organizar os mapas dos novos municípios, bem como os daqueles que sofreram alteração em seus territórios; 

b) proceder a demarcação das divisas fixadas nesta Lei, sempre que necessário.

§ 1º – Na organização dos mapas, serão interpretadas as divisas descritas no anexo nº 2.

§ 2º – Os nomes dos acidentes geográficos fixados por esta Lei, uma vez registrados nas cartas topográficas do Estado serão definitivos, não podendo ser mudados senão por nova Lei. 

O Decreto Estadual nº 49.568, de 26 de abril de 2005, que reorganizou a Secretaria de Economia e Planejamento, detalhou melhor as atribuições do IGC perante o quadro territorial-administrativo do Estado, cabendo à Gerência de Apoio Técnico a maior parte das atribuições: 

Artigo 32 – A Gerência de Apoio Técnico à "Divisão Administrativa e Territorial" tem as seguintes atribuições:

I – propor a divisão administrativa e territorial do Estado;

II – supervisionar a confecção de mapas municipais, distritais e subdistritais;

IIImanter cadastro atualizado dos limites, divisas e demarcações;

IV – elaborar e organizar mapas municipais, distritais e subdistritais;

V – proceder à revisão periódica e atualização dos mapas elaborados sob sua responsabilidade;

VI – por meio da Subgerência de Limites, Divisas e Demarcações:

a) realizar estudos específicos com vista à divisão administrativa e territorial;

b) produzir trabalhos relacionados com a divisão territorial;

c) proceder à descrição das divisas municipais, distritais e subdistritais, subsidiando a elaboração de lei ou decreto;

d) proceder à demarcação de divisas e limites;

e) cooperar com a Comissão de Revisão Administrativa e Territorial do Estado;

VII – por meio da Subgerência de Fornecimento de Documentação Técnica:

a) proceder ao cálculo de área, atendendo a estudos de revisão administrativa e territorial;

b) efetuar vistorias, esclarecendo a localização de elementos geográficos, divisas e glebas;

c) fornecer certidões de limites, divisas e demarcações;

d) proceder à localização, em plantas e fotos aéreas, de acidentes geográficos, divisas e glebas;

e) catalogar e arquivar documentos geográficos. 

Resumindo, compete ao Instituto Geográfico e Cartográfico – IGC as seguintes atribuições no tocante ao quadro territorial-administrativo do Estado de São Paulo:

a)     proceder à demarcação de limites e divisas;

b)     proceder à descrição das divisas municipais, distritais e subdistritais;

c)     manter cadastro atualizado dos limites, divisas e demarcações; e

d)     fornecer certidões de limites, divisas e demarcações.

Conclui-se, portanto, que o órgão com competência legal para definir a linha divisória entre os municípios paulistas é o Instituto Geográfico e Cartográfico – IGC.

5. Descrição da divisa intermunicipal

As descrições perimétricas das divisas intermunicipais de São Paulo, que compõem o anexo nº 2 da Lei nº 8.092/64 e o teor das leis mais recentes de criação de municípios, são um tanto vagas e, conseqüentemente, de pouca acurácia. 

A própria lei complementar paulista que dispõe sobre a criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios (Lei Complementar nº 651, de 31 de julho de 1990) prevê, em seu artigo 3º, o aproveitamento de acidentes naturais para a composição da descrição, nem que isso signifique alteração dos limites que já eram aceitos: 

§ 2.º – As divisas do novo Município serão definidas pelo órgão técnico competente do Estado, preferencialmente acompanhando acidentes naturais ou segundo linhas geodésicas entre pontos bem identificados.

§ 3.º – Para aproveitar os acidentes naturais, deslocar-se-á linha divisória até duzentos metros entre o Município desmembrado e o novo, desde que não acarrete a este prejuízo financeiro apreciável.

§ 4.º – Deslocando-se a linha divisória, nos termos, do parágrafo anterior, e havendo mais de cem moradores na faixa de terreno acrescida, será realizada consulta plebiscitária posterior à demarcação da linha, cujo resultado não terá influência no plebiscito anteriormente realizado no território já emancipado. 

Todos os municípios paulistas possuem descrições de suas divisas que privilegiam os acidentes naturais, mas com grande carência de detalhes, o que torna muito árdua a tarefa de avivamento dos marcos divisórios. 

Um exemplo de descrição municipal:

Lei nº 9.330/95, artigo 2º:

III. Município de Jumirim: com sede no distrito de Jumirim e com território deste mesmo distrito, do Município de Tietê, tendo as seguintes divisas: 

a) Com o Município de Laranjal Paulista:

Começa no salto do Rio Sorocaba, situado cerca de 3 quilômetros a jusante da Usina do Guedes; desce pelo Rio Sorocaba, até a ponte dos trilhos da FEPASA; daí, segue, em reta, à foz do Córrego da Curva, no Rio Tietê. 

b) Com o Município de Tietê:

Começa no Rio Tietê, na foz do Córrego da Curva; sobe pelo Rio Tietê, até a foz do Córrego da Estiva ou do Taquaral, pelo qual sobe até a foz do Córrego Distrital. 

c) Com o Município de Cerquilho:

Começa no Córrego da Estiva ou do Taquaral, na foz do Córrego Distrital; sobe por este até sua cabeceira mais meridional, próximo aos trilhos da FEPASA, no espigão Tietê-Sorocaba; alcança na contravertente a cabeceira do Córrego da Vereda, pelo qual desce até sua foz no Rio Sorocaba; desce por este até o salto situado a cerca de 3 quilômetros a jusante da Usina do Guedes, onde tiveram início estas divisas. 

O avivamento de marcos de descrições que se utilizam de acidentes naturais pode ser tanto uma atividade muito fácil como bastante penosa. Tudo depende dos acidentes naturais existentes na divisa, se de fácil definição ou não. Seguir os trilhos da Fepasa até uma determinada ponte ou descer um rio até sua foz não causa dificuldade alguma, mas definir a linha que une “a cabeceira mais meridional do córrego Distrital” até a “cabeceira do córrego da Vereda, na contravertente”, não é tarefa que se possa desempenhar fielmente, sem as variações geradas pelo necessário arbítrio do agrimensor. 

Aqui, portanto, está o problema. Como definir essa linha divisória nos levantamentos georreferenciados dos imóveis rurais que se encontram na zona limítrofe dos municípios? Como precisar esses dados? A quem compete tal definição? Quais são as responsabilidades decorrentes? 

A definição se um imóvel rural se encontra localizado em um ou outro município pode parecer de pouca importância, uma vez que, à primeira vista, a única conseqüência prática seria o desvio do repasse de parcela do ITR arrecadado pela União (de valor muito baixo) para o outro ente político.

Entretanto, com muita propriedade tem salientado o Dr. Roberto Tadeu Teixeira, chefe do setor de cadastro do Incra-SP, em suas palestras sobre o georreferenciamento: “a história muda se nesse imóvel é encontrada uma grande jazida de petróleo ou ali venha a funcionar uma grande fábrica com enorme potencial de receita tributária em favor do município competente”.

6. Retificação da descrição tabular do imóvel localizado na zona limítrofe

As alterações efetivas na Lei dos Registros Públicos pela Lei nº 10.267/2001 gerou a obrigação de georreferenciar todos os imóveis rurais do País, o que está sendo efetivado paulatinamente, em obediência aos prazos carenciais previstos no Decreto nº 4.449/2002.

A acurácia da descrição georreferenciada não se compatibiliza de forma alguma com as descrições antigas que se utilizavam tão-somente da indicação de acidentes naturais ou obstáculos artificiais de fácil visualização, como pontes, estradas e marcos de concreto. 

Dessa forma, o levantamento de um imóvel rural localizado na zona limítrofe entre municípios poderá causar uma série de dúvidas, não quanto à sua localização física no planeta (o que, de certa forma, está garantida pelo sistema GPS), mas sim quanto à sua localização jurídico-administrativa, ou seja, poderá o geomensor não ter certeza a qual município pertence aquele pedaço de terra, principalmente se a divisa intermunicipal daquela zona limítrofe for precária e de difícil definição. 

Dois exemplos de descrições de difícil definição (Lei nº 9.330/95, artigo 2º):

VII – Município de Paulistânia, com sede no distrito de Paulistânia e com território deste mesmo distrito, do Município de Agudos, tendo as seguintes divisas:

b) Com o Município de Piratininga:

Começa no divisor Turvo-Alambari, na cabeceira sudoriental da Água do Poço; segue por este divisor até a cabeceira mais ocidental do Córrego Areia Branca ou Espraiado; desce por este até o Ribeirão do Barreiro; segue pelo contraforte fronteiro entre a Água do Faxinal e o Córrego Corredeirinha até o divisor entre as Águas do Ribeirão do Barreiro, à esquerda, e as do Rio Turvo, à direita; segue por este divisor até a cabeceira mais setentrional da Água da Geada.

IX – Município de Trabiju, com sede no distrito de Trabiju e com território deste mesmo distrito, do Município de Boa Esperança do Sul, tendo as seguintes divisas:

c) Com o Município de Dourado:

Começa no Córrego Três Barras, no ponto onde é cortado pela reta que vai da foz do Córrego da Fazenda Nova Cintra, no Córrego da Vargem, à foz do Córrego da Fazenda São José, no Ribeirão do Potreiro; prossegue por esta reta até a foz do Córrego da Fazenda São José, no Ribeirão do Potreiro; desce pelo Ribeirão do Potreiro até a foz do Córrego das Barracas, onde tiveram início estas divisas.

Não há outra forma de definir grande parte dessas divisas sem o prudente arbítrio do geomensor. O problema é que, pelas conseqüências que poderão advir da definição desses limites, que poderá causar sérios prejuízos a um ente público e, em contrapartida, vantagens significativas ao outro município, há que se definir competências e procedimentos que sejam, ao mesmo tempo, seguros, possíveis e jurídicos. 

A retificação da descrição tabular do imóvel, quer pelo sistema do georreferenciamento ou mesmo por outra descrição técnica aceita pela Agrimensura, tem por objetivo aprimorar a especialidade objetiva do imóvel matriculado, conferindo maior confiabilidade ao registro público e gerando a necessária segurança jurídica aos direitos reais ali assentados. Portanto, a segurança jurídica é um dos pilares que devem sustentar a solução para esse impasse. 

Por outro lado, as recentes alterações legislativas no tocante ao registro imobiliário têm apontado para a necessária instrumentalidade e celeridade nos procedimentos de correção de falhas e inclusão de informações atualizadas sobre os imóveis. Um dos princípios que informa essa nova onda é o princípio da razoabilidade, mediante o qual as exigências a serem feitas ao interessado para a solução dos problemas envolvendo o registro de seu bem de raiz devem ser viáveis e de fácil execução. 

E, por fim, toda solução procedimental que tenha potencialidade para gerar alterações nos direitos de terceiros deve estar inteiramente baseada em aspectos jurídicos que permitam sua utilização, sob pena de responsabilização civil, criminal e administrativa daquele que agiu fora desses parâmetros.

7. O procedimento de retificação

Ao efetuar o levantamento georreferenciado do imóvel rural na zona limítrofe municipal, o geomensor poderá se deparar com diferentes situações. 

1. imóvel localizado inteiramente em um município, bem próximo da divisa intermunicipal:

Se a matrícula estiver com a informação correta e o geomensor não tiver dúvida quanto a isso, não haverá problema algum. Basta efetuar o levantamento georreferenciado de acordo com a legislação em vigor.

O Conselho Superior da Magistratura já decidiu que, sendo possível localizar os imóveis e as divisas das circunscrições imobiliárias por mapa oficial, não se pode exigir a participação do IGC para solucionar a questão, bastando para tanto o registrador confrontar a localização do imóvel com a legislação que fixou tais divisas (Ap. Cível nº 268.526, São Paulo-SP, de 5/6/1978).

Se até para o registrador é possível definir juridicamente essa situação, com maior razão poderá o geomensor solucionar o caso, desde que a descrição legal da divisa intermunicipal seja clara o suficiente para que seu avivamento seja isento de dúvidas.

Entretanto, se a descrição tabular estiver incorreta (declarando que o imóvel está em outro município ou que a sua superfície abrange ambos os territórios), a correção desse dado estará subordinada a uma série de precauções (que serão tratadas mais adiante).


2. imóvel localizado inteiramente em um município, mas confrontando com o território de outro município:

Como o imóvel faz confrontação com outro município, parte de sua descrição tabular deverá coincidir com a descrição da linha divisora municipal. Como adequar a descrição precária da legislação paulista com a descrição georreferenciada sem risco de prejudicar a descrição oficial?

Neste caso, tanto faz a informação do registro estar equivocada ou correta. Como a nova descrição fixará os pontos delimitadores dos municípios, a potencialidade de danos para qualquer um deles é patente.

Portanto, a elaboração da descrição georreferenciada dessa perimetral também estará subordinada a uma série de precauções (que serão tratadas mais adiante).


3. imóvel localizado em mais de um município:

Estando a superfície do imóvel abrangendo a área de mais de um ente municipal, a dificuldade para o geomensor será definir a divisão das duas parcelas, pois o avivamento da divisão intermunicipal nem sempre é possível de forma objetiva, sem a utilização de critérios pessoais arbitrados pelo profissional.

A determinação das duas parcelas é de grande importância, para definir competências e prevenir litígios. Basta o descobrimento de uma grande riqueza mineral nesse imóvel para comprovar essa necessidade.

7.1 Descrição da divisa intermunicipal

Em qualquer uma das hipóteses em que a linha divisora intermunicipal deva ser considerada para a descrição georreferenciada do imóvel, o geomensor deverá tomar uma série de precauções.

Primeiramente, deverá verificar se a parcela da divisa intermunicipal que afeta o imóvel objeto de seu trabalho é de definição objetiva ou não, isto é, se a descrição legal pode ser locada no terreno sem qualquer dúvida.

Se for esse o caso, compete a ele, profissional da agrimensura devidamente credenciado pelo Incra, efetuar o levantamento georreferenciado e responsabilizar-se por isso. Seu levantamento levará em conta os procedimentos padronizados da Agrimensura e da legislação existente (no caso, as normas do Incra), que comporão a juridicidade de sua nova descrição.

 

Exemplo:

1.     Fazenda Aterradinho – Alambari-SP

2.     Confrontação por 550 metros com o córrego da Divisa ou Dúvida

3.     Imóvel localizado a 4 Km da foz (onde o córrego deságua no rio Sarapuí) e a 6 km da cabeceira

4.     Descrição legal da divisa intermunicipal (Lei nº 7.664/91, artigo 2º):

XXIV – Município de Alambari, com sede no distrito de Alambari e com território desse mesmo distrito, do Município de Itapetininga, tendo as seguintes divisas:

c) Com o Município de Sarapuí:

Começa no Rio Sarapuí, na foz do córrego da Divisa ou Dúvida; sobe por este córrego, até sua cabeceira sudocidental, no divisor, que deixa, à direita, as águas do Rio Alambari, e, à esquerda, as águas do Rio Itapetininga; segue por este divisor até a cabeceira nororiental do córrego da Várzea, onde tiveram início estas divisas.

5.     Conclusão: a descrição da divida intermunicipal coincide com a descrição do córrego da Divisa ou Dúvida, ou seja, de fácil locação pelo geomensor.

Se a divisa intermunicipal não puder ser definida objetivamente, o geomensor estará impedido de aviventar a divisa intermunicipal, pelo potencial danoso que representa esse ato aliado à absoluta falta de competência legal para isso. 

A solução, neste caso, está em requerer ao Instituto Geográfico e Cartográfico – IGC uma certidão de limites e divisas intermunicipais com referência ao imóvel levantado. No site do IGC (http://www.igc.sp.gov.br/default/orientaPrestServ.htm) há indicações de como proceder e o modelo do requerimento: 

a) Apresentar requerimento dirigido ao Diretor do IGC, constando nome, RG, endereço e telefone, solicitando certidão referente a jurisdição territorial da gleba ou imóvel.

b) Ao requerimento deverão ser anexadas 3 vias de planta ou croqui do imóvel, devendo conter o máximo de elementos referenciais que possibilitem a transcrição da planta da gleba ou lote para cartas topográficas oficiais.

c) Quando da inexistência de planta ou croqui, o interessado poderá recorrer ao Instituto para a identificação da área objeto da solicitação em documento cartográfico.

d) Em outros casos de solicitação de certidão, será conveniente que o IGC seja previamente consultado.

 

DD. DIRETORA DO INSTITUTO GEOGRÁFICO E CARTOGRÁFICO

São Paulo, ___ de_____________ de____.

 

 

Eu_____________________________________R.G.nº_____________________________

residente na Rua______________________________________nº____________________

na cidade __________________Estado____Telefone_______________________________

Venho mui respeitosamente solicitar a Vossa Senhoria_______________________________

_________________________________________________________________________

e para tanto, anexo os seguintes documentos:____________________________________

_________________________________________________________________________ .

 

Nestes Termos,

P. Deferimento.

 

_________

Assinatura 

Conforme prevê a legislação paulista (Decreto nº 49.568/2005), o IGC tem o dever legal de fornecer esse tipo de certidão (artigo 32, VII, “c”), com base nos dados existentes em seu cadastro (artigo 32, III) ou com base em levantamento efetuado (artigo 32, VI, “c” e “d”) ou, ainda, mediante vistorias “in loco” (artigo 32, VII, “b”).

Uma coisa é certa: o IGC não vai efetuar o levantamento georreferenciado de todas as divisas intermunicipais. O ideal, portanto, é o geomensor efetuar a medição do imóvel de acordo com a técnica usual e apontar ao IGC onde lhe parece estar a linha divisória intermunicipal (com os dados georreferenciados, nos moldes das normas do Incra). Se o IGC confirmar essa nova descrição como divisa oficial entre os municípios, a responsabilidade é integral do órgão público competente, mesmo que, no futuro, venha a ser comprovada eventual falha daquela informação. Neste caso, salvo a existência de má-fé, não caberá responsabilização alguma ao geomensor, que estava apenas cumprindo seu dever.

Caso o IGC não emita certidão conclusiva ou declare que tal informação somente poderá ser confirmada após levantamento georreferenciado das divisas intermunicipais pelo órgão em data ainda não prevista, não haverá alternativa: prevalece a informação existente no registro.

Assim, mesmo acreditando que o imóvel esteja localizado em outro município, mas não tendo condições seguras para afirmar a localização da linha divisória intermunicipal, o geomensor deverá consignar tal situação em laudo específico, que será juntado à certidão ou documento do IGC que comprova a inviabilidade momentânea de solucionar o caso, devendo a “localização do imóvel” ser mantida nos termos do registro anterior (na dúvida, prevalece o registro anterior – presunção “juris tantum” do registro imobiliário).

7.2 Desmembramento de imóvel localizado na zona limítrofe

Problema de maior dimensão haverá nos casos de desmembramento de imóvel localizado simultaneamente em mais de um município. Não havendo como precisar a localização da linha limítrofe entre os municípios e não podendo o IGC solucionar o caso, cada imóvel resultante deverá ser declarado como localizado nos dois territórios, prevalecendo a informação registral anterior.

Figura 7 – Imóvel a ser parcelado com divisa intermunicipal incerta.

Entretanto, tal prática poderá resultar em situações esdrúxulas, principalmente após sucessivos desmembramentos:


Figura 8 – Situação esdrúxula provocada pela incerteza legal.

Entretanto, enquanto as divisas intermunicipais não forem fisicamente demarcadas, de forma clara e inconteste, o problema continuará a existir. Até hoje, tal indefinição não causou muita polêmica, mesmo porque a grande parte dos imóveis localizados nessa zona limítrofe está com descrições tabulares precárias quando não incorretas. O problema começará a ser percebido agora, com o cumprimento da lei do georreferenciamento, que definirá a posição exata dos imóveis rurais no território nacional, mas poderá causar impactos negativos quanto à definição imprecisa de suas competências administrativas.

8. Participação dos Municípios no procedimento de retificação

Outra questão que merece exame é a validade de participação dos Municípios limítrofes como anuentes no procedimento de retificação da descrição de imóvel rural em que haja modificação de competências ou que necessite da descrição pormenorizada da linha divisória intermunicipal.

Dificilmente os Municípios envolvidos estarão aptos para definir com precisão as divisas intermunicipais. Além disso, eventual discordância entre os entes políticos envolvidos sobre a localização da divisa teria o condão de obstar a retificação pretendida pelo titular do imóvel rural? E, por outro lado, a mútua concordância teria o poder de definir essa linha, mesmo equivocada?

O procedimento de retificação de registro imobiliário, tanto pelo rito do artigo 213 da LRP como pelas regras do Decreto nº 4.449/2002, privilegiam a participação daqueles que possam ser afetados pela alteração pretendida no registro público.

Em decorrência, exige-se a anuência dos confrontantes, quer sejam titulares do imóvel confinante ou meramente seus detentores.

Se algum deles apresentar impugnação fundamentada e não se conciliar com o requerente, a fase extrajudicial é finalizada, cabendo apenas ao Judiciário a solução do problema.

A impugnação deve levar em conta se a descrição do imóvel objeto da retificação prejudica ou não o direito dos imóveis confrontantes. No caso das divisas intermunicipais, a discussão é outra. A questão não se encontra na concordância ou não com a descrição das perimetrais do imóvel, mas sim a qual circunscrição municipal pertence o referido bem de raiz.

Os trabalhos técnicos estão perfeitos, a superfície declarada na planta coincide com a área real do imóvel e não prejudica os demais imóveis lindeiros. O único problema verificado é a indefinição de qual município tem competência administrativa sobre aquele pedaço de terra. Ou seja, a única descrição perimetral falha é a divisa intermunicipal, cuja competência é unicamente do Estado e independe da participação dos titulares dos imóveis por ela afetados.

Outro ponto que merece destaque é a quantificação da importância dessa informação para o registro público.

Em síntese, compete ao registro imobiliário o assento dos direitos reais relativos aos bens imóveis, conferindo-lhes autenticidade, segurança jurídica, eficácia e publicidade.

Para que essas metas sejam efetivas, o registro imobiliário é informado por vários princípios, dentre eles o da especialidade objetiva, cuja importância tem sido ampliada, principalmente após o advento da legislação do georreferenciamento.

A perfeita descrição do imóvel, em si, não representa um direito real, mas tem nítida influência nos direitos reais a ele relativos, podendo uma descrição viciada gerar até mesmo a perda de direitos que o registro público tem por missão assegurar.

O georreferenciamento apresenta-se como uma grande promessa de solução nesse caso, uma vez que as descrições dos imóveis serão de grande acurácia, dirimindo dúvidas e prevenindo conflitos.

As demais informações referentes aos imóveis seriam de tão grande importância para que o registro imobiliário se subordinasse à sua exata definição? Quais dados interessam ao registro e quais dados são apenas de interesse do cadastro? Até onde vai a competência do registro imobiliário nesse assunto?

Quanto mais informação sobre o imóvel houver na matrícula, melhor. Mas até que ponto o registro deve ficar preso à necessidade de se buscar tais dados? O princípio da concentração, bastante defendido no Rio Grande do Sul, serve para colaborar com o registro (permitindo o ingresso de variadas informações) ou seria um ônus adicional que poderia atravancar o sistema (exigindo o ingresso dessas informações)?

A questão é definir quais dados são de interesse do registro e quais dados são de interesse do cadastro.

a)     dados de interesse e responsabilidade exclusiva do registro imobiliário: direitos e ônus reais; titularidade; valor do negócio; vigência; etc.

b)      dados de interesse e responsabilidade exclusiva do cadastro público (Incra ou Município): destinação econômica do imóvel; valor do imóvel; tipo e capacidade produtiva do solo; tipo de construção; quantidade de moradores; distância do centro urbano; etc.

c)      dados de interesse tanto do registro imobiliário como do cadastro: especialidade objetiva, especialidade subjetiva, interconexão das informações, etc.

 

A definição das divisas intermunicipais é de interesse direto dos Municípios envolvidos, sendo um mero dado cadastral e não registral. Sua definição nada tem a ver com os direitos reais imobiliários e a declaração na matrícula em qual município se localiza o imóvel não tem o condão de alterar competências. Esse dado, na matrícula, é meramente indicativo, não gerando direitos nem deveres a quem quer que seja.

Como o dado não é de registro, sua definição não é de competência do registrador, mas sim do Estado, que possui competência legal para definir a divisa intermunicipal. Portanto, se o IGC certificar que determinado imóvel rural está localizado em outro município, não compete ao registrador questionar tal certidão, sob a alegação de que a descrição da divisa intermunicipal existente na lei não está georreferenciada o que, em tese, poderia impedir tal conclusão. A certidão do IGC tem fé pública, somente podendo ser impugnada por aqueles que demonstrem legitimidade e interesse.

Como esse dado cadastral é de extrema importância e a definição do IGC pode causar litígio entre os entes municipais, conclui-se pela necessidade de participação dos Municípios em todos os procedimentos extrajudiciais de retificação de registro envolvendo imóveis localizados na zona limítrofe, exceto nos casos em que a descrição legal for inequívoca e não resulte em alteração do dado constante do registro.

Conclusão

Diante desse quadro, para efetivar a retificação da descrição tabular de imóvel rural localizado na zona limítrofe intermunicipal, há as seguintes possibilidades:

a)     definição da linha pelo próprio geomensor;

b)     anuência expressa dos Municípios;

c)      certidão do IGC; e

d)     manutenção da informação do registro anterior.

 

Sendo clara e inconteste a divisa intermunicipal que afeta o imóvel retificando e não resultando em alteração de competência municipal, compete ao próprio geomensor defini-la unilateralmente, assumindo normalmente as responsabilidades decor­rentes de sua atividade profissional como ocorre em relação aos demais dados apresentados em seu trabalho.

Apesar de clara e inconteste a divisa intermunicipal, se a nova descrição resultar na alteração de competência municipal (alterando ou não a circunscrição imobiliária), compete ao próprio geomensor defini-la, mas com a anuência dos 2 entes municipais.

Havendo divergência entre os entes municipais ou não tendo o geomensor condições de aviventar os marcos divisórios em decorrência da precariedade da descrição legal, a definição da divisa intermunicipal deverá ser efetivada pelo IGC.

Com a certidão do IGC, órgão competente para a definição das divisas intermunicipais, a retificação da competência municipal poderá ser feita se houver concordância dos municípios envolvidos sobre esse parecer técnico. Não havendo consenso, apesar de o dado discutido ser acessório para o registro, sua solução deverá ser dada pelo Poder Judiciário, tendo em vista a potencialidade de dano da alteração ou não dessa informação na matrícula. 

A simples anuência dos municípios confrontantes com determinada descrição georreferenciada de divisa intermunicipal somente poderá gerar a retificação se estiver acompanhada de laudo do geomensor atestando que a referida linha limítrofe pôde ser levantada com segurança nos termos da descrição legal. Sendo precária a descrição legal no que se refere ao imóvel em epígrafe, o avivamento dessa linha deve contar com a homologação do IGC, em virtude de sua competência legal. 

Por fim, não havendo meios de definir com a necessária segurança jurídica a exata localização da divisa intermunicipal, com manifestação do IGC nesse sentido, o princípio da presunção relativa do registro público deve prevalecer, ou seja, mantém-se a mesma informação do registro anterior até que haja uma solução segura e jurídica para o caso.

Eduardo Augusto
Diretor de assuntos agrários do IRIB; oficial de registro de imóveis de Conchas (SP) e especialista em direito registral imobiliário pela ESADE- Barcelona, Espanha.
ri.conchas@fdnet.com.br