Mapas vão continuar a ser mapas, em meio eletrônico ou em papel. Com a tecnologia
cada vez mais avançada, quem sabe, teremos o mapa de papel eletrônico

Eu poderia começar esta coluna dizendo que foram os mapas que me levaram para o geoprocessamento. Mas isto não seria a verdade. Embora eu adore mapas, não foi por causa deles que eu entrei para o Geo. Eu resolvi começar a trabalhar com geoprocessamento quando vi pela primeira vez na tela de um computador as imagens da restituição do mapa digital de Belo Horizonte. Não me esqueço deste dia. É interessante que eu tenha começado minha carreira no Geo por causa de um mapa eletrônico, e não por causa dos mapas de papel, porque hoje vamos discutir aqui esta polêmica entre o papel e o bit de computador. Isto tudo me lembra de uma outra coisa, que é o que uso como uma resposta rápida quando me perguntam o que eu faço na vida. Eu respondo: trabalho com mapas no computador. Se a pessoa que pergunta quer saber mais, eu explico, senão fica por isto mesmo. Isto evita que eu caia na definição de chato que Chico Anísio criou: o chato é aquele que você pergunta "como vai?" e ele explica. Então eu não explico, a não ser que seja necessário.

Eu gosto muito de livros e nesta coluna de hoje vamos tratar de um assunto paralelo a isto. Já existe há algum tempo a discussão sobre se os livros eletrônicos, os e-books, vão tomar o lugar dos livros convencionais. Uma das últimas coisas que estava faltando, ou uma das coisas que impedia o avanço dos e-books, era a falta de resolução nas pequeninas telas dos livros eletrônicos. Agora este problema está resolvido ou pelo menos bem encaminhado. Os pequenos aparelhos que recebem os livros já têm uma resolução bastante boa e seu uso é simplesmente fantástico. Eu usei o aparelho para ler livros e ele é fascinante. Para quem gosta de ler (esquecendo por um minuto da polêmica papel x bits) o e-book é ótimo. Primeiramente, ele permite pesquisar o texto por palavras. Se você, caro leitor, é como eu que se surpreende com a aparição de certos personagens que já foram citados antes e você não tem a menor idéia de quem sejam, o e-book chegou para resolver este problema. Você pode marcar onde está e sair pesquisando o nome do personagem para frente ou para trás. Você pode ainda marcar o texto exatamente como faria com um marcador colorido. Outro problema, a disponibilidade dos livros eletrônicos, está sendo resolvido pouco a pouco. Eu fico pensando em um livro totalmente multimídia com conexões para todas as referências. Por exemplo, estou lendo agora "Chega de Saudade", de Ruy Castro, para matar as saudades do Brasil. Lendo este livro delicioso falando de um lugar tão lindo como o Rio, principalmente o Rio mágico dos anos 60. Imagine você lendo Ruy Castro contando com sua prosa magnifica como Tom e Vinícius escreveram Garota de Ipanema e poder clicar texto e ouvir a música imediatamente. O livro vem com um mapa de Copacabana de 1954 a 1964 (olha a pesquisa sobre o tempo no Geo). Imagine você clicando sobre o Veloso, o bar em frente do qual a garota de Ipanema desfilava, e vendo fotos do bar na década de 60. Continuando sua viagem no livro-mapa eletrônico você pede para ver como está o mesmo ponto geográfico com imagens do Rio de hoje. Mas para ver mapas precisamos de mais espaço. A tecnologia do papel expansível está sendo desenvolvida. O que quero dizer com isto é que hoje os mapas eletrônicos estão ainda presos a telinhas. Mas em algum ponto do futuro telas finas como papel e em grandes formatos estarão disponíveis. Desta forma teremos mapas em princípio bastante semelhantes aos que temos hoje (não se esqueça que mapas têm embutidos um conhecimento milenar), mas acrescidos de uma série de recursos de multimídia e informações on-line como os que vemos hoje em um página da Internet. Mas ainda não chegamos lá. Então nossa discussão hoje é sobre a utilidade dos nossos antigos e bons mapas de papel.

Para quem conseguiu finalmente ficar livre do telefone celular há três anos atrás, a possibilidade de voltar a usar um dos novos equipamentos eletrônicos pessoais não é muito animadora. Eles estão em toda parte, sem dúvida. Eu também não posso dispensar o uso de meu computador portátil, mas não tenho carregado nada mais que isto. Mas, em minha última viagem, eu senti falta de um palmtop com acesso à internet, principalmente se ele estivesse ligado a um GPS. Vou explicar por quê.

A viagem foi a State College, Pennsylvania, onde fica a universidade onde estou dando aulas desde 1º de agosto. O lugar é a School of Information Sciences and Technology (http://ist.psu.edu) na Penn State University. Esta nova escola dentro da Penn State tem interesse na linha de pesquisa de informações geográficas e, além de mim, conta com mais um professor nesta área: Guoray Cai (ist.psu.edu/faculty/FacultyDisplay.cfm?PeopleID=8). Nós dois também fazemos parte, como professores convidados, do departamento de Geografia (http://www.geog.psu.edu/), um dos melhores dos Estados Unidos.

Bem, fui a State College procurar um lugar para morar e esta é uma das funcionalidades básicas de um mapa eletrônico, os serviços de localização ou location services. Eu não fui previdente e não levei um mapa comigo e nem um palmtop também. Logo no aeroporto, na hora de alugar o carro, eu pedi à moça da locadora um mapa. Ela tinha uma folha A4 de xerox com um mapa (mal) desenhado a mão. Mal e mal seria possível voltar ao aeroporto para devolver o carro usando aquele esboço de mapa. Mas arrumei alguém para me levar ao hotel e lá finalmente consegui um mapa de verdade. Um mapa da região na escala adequada e do tamanho certo. E aí, quando você está com o mapa certo na mão, vem aquela admiração que nós todos temos (sejam profissionais de Geo ou não) pelos mapas. Nada como a visão de um mapa aberto para você começar a se localizar em uma cidade nova. Você logo esquece as noções de norte e sul reais e começa a usar as noções intuitivas de norte e sul, geralmente associadas com o mapa que, é claro mas nem sempre, como era o caso aqui, desenha o norte no alto da folha e o sul embaixo. A primeira coisa que fiz foi tentar entender o caminho que eu tinha feito do aeroporto até o hotel. Com o auxílio do mapa foi possível localizar todas as casas que tive interesse em alugar. A cidade é pequena e em dois dias (com a ajuda inestimável de meu mapa) já sabia me localizar, e comecei a corrigir as noções erradas de localização que eu ainda tinha de minha primeira visita (muito rápida e por apenas dois dias e sem mapas, não consegui me "localizar" geograficamente).

Mas para quem está procurando um lugar para morar, ou mesmo exercendo alguma outra atividade em que necessite visitar vários lugares em um período curto de tempo, existem algumas características que o nosso mapa eletrônico tem (ou terá) e que os mapas de papel não têm. Uma delas é a possibilidade de ver fotos do lugar antes de se visitar. Hoje já estão disponíveis fotos aéreas de qualquer lugar nos Estados Unidos. Mas combinadas com fotos aéreas é interessante ver também fotos frontais da rua e das casas, por exemplo. Mais uma característica interessante destes mapas eletrônicos em palmtops é o que está sendo desenvolvido agora na Universidade do Maine – a capacidade do mapa na tela girar enquanto você também vai girando (é necessário um GPS, é claro). Este pequeno detalhe é tão importante na hora de você se localizar, entender, e sentir as direções quando está ainda se familiarizando com a região.

Bem, mapas vão continuar sendo mapas eletrônicos ou em papel. Os mapas eletrônicos vão usar boa parte do conhecimento hoje disponível para se fazer mapas de papel. Além disto eles terão os recursos extra como fotos, sons e quem sabe até cheiros. E com a tecnologia das telas de cristal líquido cada vez mais finas, teremos o mapa de papel eletrônico. 

Vale a pena dar uma olhada em http://www.globexplorer.com/. Chegando lá, digite um CEP qualquer dos Estados Unidos e terá acesso ao mapa e à foto aérea do local. Faça um teste com o meu antigo CEP 04468-6000 em Old Town, Maine, ao lado do campus da Universidade do Maine. A interface é um pouco confusa, primeiro vem o mapa, e depois você clica na etiquetinha escrito "aerial map" para ver a foto aérea. Dê também uma conferida em www.mapquest.com e www.mapblast.com para ver um pouco do que serão os mapas eletrônicos do futuro.

Frederico Fonseca é engenheiro mecânico, tecnólogo em Processamento de Dados e mestre em Administração Pública. Participa da equipe de geoprocessamento da Prodabel, responsável pela implantação do GIS da Prefeitura de Belo Horizonte. Atualmente cursa doutorado na Universidade do Maine. email: fred@spatial.maine.edu