Novos serviços de localização levantam o problema da privacidade na web

Quando eu li o press-release da empresa IP2Location falando sobre seus novos serviços de localização eu achei interessante. Fui lá conferir e no sítio ip2location.com está tudo explicado. O que eles estão oferecendo é a venda da informação agregada a seu endereço IP. Para quem não sabe, endereço IP é um número único que identifica cada computador ligado a Internet. Estes números são distribuídos por regiões do mundo. Por exemplo, os números que começam com 200 pertencem a América Latina e Caribe enquanto a faixa que vai de 204 a 209 pertence a América do Norte. Assim, eles sabem mais ou menos a região em que você está. Agora então eles precisam é saber em que servidor você está ligado. Por exemplo, se você liga para o IG de Belo Horizonte, você se conecta ao computador (servidor) que está em Belo Horizonte, que por sua vez se liga ao Rio ou São Paulo e daí para o mundo. O negócio destas empresas é pegar os endereços (físicos, rua tal número tal) das máquinas servidoras e associar ao seu endereço. Isto funciona porque seu computador recebe um número de uma faixa reservada a seu servidor. Seu número IP é um sub-número IP do computador ao qual você está ligado. Uma boa página com a explicação do endereço IP é a do próprio IP2Locator (http://www.ip2location.com/README-IP-COUNTRY-REGION-CITY.htm).


Por João Crispim

Bem, eu fui no sítio da IP2Location e fiz o teste. Eu acabei levando um grande susto. O resultado está no quadro. Ele sabia meu IP, o país em que eu estava, o estado e a cidade. Sabiam até qual era o meu provedor. Eu nunca fui muito de ligar para este negócio de privacidade, que aqui nos Estados Unidos é uma obsessão. Mas desta vez, quando eu vi acontecendo "ao vivo" comigo, foi diferente. Eu já sabia deste problema da privacidade na Internet. Os tais dos biscoitinhos (cookies) que quase todas as páginas querem deixar gravado em seu computador são um problema antigo. Os cookies são pequenos arquivos que podem ser usados para ajudar a sua navegação em algum sítio. Por exemplo, eles podem guardar suas preferências para que na próxima vez que você volte ao sítio não seja preciso informar tudo outra vez. Os cookies servem também para guardar onde você está navegando e usar estas suas preferências para direcionar a propaganda de acordo com o que "eles" acham que você gostaria de comprar.
Comprar, vender, anunciar. Este é o futuro da Internet e é isto que está por trás desta nova onda de geolocalização. Eu repeti uma vez, aqui na coluna, uma frase que ouvi na escola de computação da Unicamp em Campinas em 1995. Um pesquisador da IBM deu uma palestra sobre o novo protocolo da Internet, o IPV6. A palestra foi muito boa e uma frase que ele disse ficou na minha cabeça: "A Internet é uma máquina movida a dinheiro. Você põe dinheiro na entrada e sai serviço na saída." O que ele queria dizer era que sem dinheiro e sem suporte comercial a Internet não ia melhorar nem ir para frente. Por que você acha que pode fazer tanta coisa de graça na Internet tais como ler jornais, ouvir rádios, ter correio eletrônico, páginas pessoais, e outras coisas mais? É porque quem fornece estes serviços está tentando vender algo mais a você, ou tentando fazer você ver anúncios, ou então ainda se estabelecer no mercado para no futuro poder vender estes serviços que hoje (ainda) são de graça.

Qual é o sentido de mostrar uma oferta de uma geladeira em São Paulo se você está em Manaus? Esportes também são um outro filão comercial na Internet. Se você conectou de Porto Alegre, então um serviço de transmissões ao vivo pode te oferecer o jogo do Grêmio X Inter em vez de Sport Recife X Náutico. Se você está na zona sul de São Paulo o serviço de anúncios vai te falar do novo restaurante da moda que você não pode perder.

Além da IP2Locator, também a companhia Quova está oferecendo serviços de geolocalização na Internet. A Quova conseguiu um grande contrato com a Liga de Beisebol daqui dos Estados Unidos. O beisebol para os americanos se parece culturalmente com o futebol aí no Brasil, pelo menos na minha experiência pessoal. Primeiro, é o esporte mais tradicional e mais antigo por aqui. Outra coisa que se parece com o Brasil é que durante a temporada tem beisebol todo dia na TV. Isto me lembra da época em que a TV Bandeirantes passava futebol quase todo dia. No fim de semana era o Brasileirão, mas na segunda-feira e na terça tinha de ser a segunda ou terceira divisão do futebol paulista. Beisebol aqui é assim. Tem todo dia, seja qual for a liga ou divisão. Mas voltando ao contrato da Quova com a Liga de Beisebol, o objetivo é vender transmissões de jogos ao vivo pela Internet, mas tomando o cuidado de preservar os mercados locais. Ou seja, você pode entrar na Internet e comprar qualquer jogo, menos o do time da sua cidade se o jogo for lá porque a TV a cabo e satélite tem prioridade sobre os mercados locais. Como o sistema não é perfeito, as reclamações surgidas até agora foram de torcedores que teriam o direito de ver o jogo e não conseguiram porque o sistema bloqueou.

Este sistema de saber a origem do comprador tem também sido usado, vejam vocês, para evitar vendas. Alguns produtos só podem ser vendidos em uma determinada região como, por exemplo, filmes em DVD e músicas em versão digital. Algumas empresas têm promoções especiais para algumas regiões e não querem estender estas vendas para outras regiões. Assim o geolocalizador pode tanto ajudar a direcionar a venda como bloqueá-la. É o Geo apontando o dedo para você e dizendo: "Você está AQUI!".

Frederico Fonseca doutor em Ciência da Informação Espacial pela Universidade do Maine. Atualmente é professor na Escola da Ciência da Informação e Tecnologia da Penn State University nos Estados Unidos. fredfonseca@ist.psu.edu