Por Egberto Vogel, Fabrício Penido Marques, Igor Raposo Rocha, Ricardo Canabrava Oliveira e Cláudia C. S. Saraiva

Introdução

Nos últimos anos houve um grande avanço no desenvolvimento de técnicas e tecnologias nas áreas de agrimensura, topografia, geodésia, cartografia geoprocessamento, sensoriamento remoto, aerofotogrametria etc. proporcionando grande desenvolvimento as ciências geomáticas. Deste modo, as metodologias e técnicas utilizadas nos trabalhos topográficos, geodésicos e cartográficos, têm sofrido constantes evoluções nos seus planejamentos e execuções.

Essas constantes evoluções e atualizações dos equipamentos aplicados aos levantamentos topográficos e geodésicos vêm aperfeiçoando os métodos de medições sejam eles convencionais, com teodolitos, níveis, estação total, receptores GNSS etc. e ou remotos com restituições aerofotogramétricas, restituições por imagens orbitais, laser scanning terrestre e aerotransportado etc.

Com essas evoluções e atualizações inúmeras situações e características influem na qualidade e no custo final de um levantamento topográfico e geodésico, podendo assim gerar dados e informações não fidedignas e até mesmo fora da realidade do local levantado, bem como não proporcionar lucro ou até mesmo gerar prejuízo ao profissional ou empresa executante.

Assim, criou-se a necessidade de analisar a qualidade dos dados levantados e o melhor custo/benefício entre as principais metodologias e técnicas utilizadas atualmente para os levantamentos planialtimétricos. Desta forma, através de um estudo de caso, optou-se em analisar e comparar um levantamento da altimetria de uma mesma área, levantado através do uso de estação total com prisma e de um laser scanning terrestre.

Neste trabalho, para a comparação da qualidade dos dados topográficos foi feito um estudo de caso onde foram calculados os volumes de corte e aterro entre a topografia atual do terreno levantada com uso de uma estação total e de um laser scanning terrestre, em relação a uma topografia projetada, simulando, por exemplo, bancadas de um projeto de engenharia. E para a definição do melhor custo/benefício são comparados os dados quantitativos de tempo e custo, bem como os dados qualitativos das diferenças volumétricas encontradas entre o levantamento realizado com a Estação Total e com o Laser Scanning.

Metodologia

O estudo de caso foi feito em uma área total de 20 hectares (400 x 500m), localizada na região metropolitana de Belo Horizonte, nas divisas municipais de Ibirité, Sarzedo e Brumadinho, na serra dos Três Irmãos – vide figura 01.

Figura 1
Figura 01 – Mapa de Localização da Área em Estudo Fonte: Mapa gerado pelos autores.

Os quatro vértices limítrofes da área estão georreferenciados pelo sistema geodésico brasileiro, na projeção Universal Transverso de Mercator – UTM, datum SIRGAS-2000, meridiano central 45° W.Gr., com coordenadas: 597.402,31E e 7.779.704,99N; 597.741,90E e 7.779.916,35N; 598.006,13E e 7.779.491,87N e 597.666,54E e 7.779.280,49N.

A área de estudo está posicionada na vertente norte da serra dos Três Irmãos. O relevo local é, portanto montanhoso, com topografia extremamente acidentada e declividades íngremes (quase metade da área tem declividade acima de 45%). A variação altimétrica na área de estudo é de 252 m, sendo a menor cota é de 1.140 m e a maior 1.392 m (altitudes elipsoidais).

A porção norte da área, da base da serra à meia encosta, encontra-se predominantemente antropizada, com inúmeras bancadas abandonadas, taludes de corte e uma estrada vicinal, com fácil acesso a mesma. Já a porção mais ao sul, da meia encosta ao topo da serra, apresenta pouco antropizada, com topografia mais homogênea, fortes declives e acidentes naturais, com difícil acesso em grande parte da mesma – vide figuras 02 e 03.

Figura 2
Figura 02 - Imagem Orbital da área em estudo com vista em planta e em 3D. Fonte: Mapa gerado pelos autores.
Figura 3
Figura 03 – Vista geral da área em estudo. Fonte: Fotografia gerada pelos autores

O levantamento topográfico da área em estudo foi realizado através de duas metodologias distintas: na primeira foi realizado um levantamento convencional utilizando uma estação total e duas miras; na segunda delas foi realizado um levantamento com o Laser Scanning terrestre.

Ambos os levantamentos foram georreferenciados pelo sistema geodésico brasileiro, utilizando um par de receptores geodésicos da Topcon, modelo Hiper Lite (dupla freqüência + RTK).

Para correção diferencial das coordenadas obtidas no levantamento foram determinadas primeiramente as coordenadas geodésicas da estação utilizada como base pelo método relativo, tendo como referência as estações da Rede de Monitoramento Contínuo (RMBC) de Belo Horizonte, Viçosa, Governador Valadares, Inconfidentes e Rio de Janeiro.

Após a determinação das coordenadas da base, as coordenadas das demais estações de trabalho foram determinadas em tempo real com uso de receptor GNSS L1/L2 e RTK nestes locais foram instalados a estação total e o Laser Scanning.

A estação total utilizada é da marca Topcon, modelo GTS-239W, que tem como principais características: leitura direta de 1” e precisão de 9”, alcance de 2.000 metros com 1 prisma e 2.700 metros com 3 prismas, precisão linear de 3mm + 3ppm, com compensador simples, coletor de dados interno com memória para 8.000 pontos com todos atributos ou 16.000 pontos de coordenadas e medição de pontos inacessíveis.

Já o Laser Scanning utilizado é fabricado pela Riegl, modelo LMS-Z620, que tem como principais características: alcance máximo de 2000m, precisão de 10mm até 100m, taxa de medição de até 11.000 pontos por segundo, base inclinatória, campo de visão de 360° horizontal e 80° vertical, compensador de até 10°, autonomia de 08 horas/01 bateria e câmara digital acoplada (destacável).

Para melhor análise dos dados levantados em campo, dividiu-se a área total levantada (20 hectares) em 04 partes iguais, subdividindo assim, em áreas contíguas de 5 hectares (200 x 250m), no intuito de comparar os resultados finais dos levantamentos topográficos realizados com Estação Total e com o Laser Scanning, observando as características topográficas individuais de cada área,  vide figura 04.

Um controle estatístico básico foi realizado a fim de averiguar as diferenças altimétricas entre o modelo digital de terreno gerado do Laser Scanning e os pontos topográficos irradiados pela Estação Total.

Assim, considerando os pontos topográficos obtidos com a Estação Total como pontos de controle, e ao compará-los com as coordenadas mensuradas pelos pontos obtidos pelo Laser Scanning, verificou-se que aproximadamente 20% dos pontos topográficos da Estação Total coincidiram com os pontos do Laser Scanning em uma distância inferior a 30 cm, sendo que nestes pontos amostrados a diferença média altimétrica é de 12,252 cm.

Figura 4
Figura 04 – Vista da Área em Estudo dividida em 04 (quatro) partes iguais Fonte: Mapa gerado pelos autores.

Nos levantamentos realizados com a Estação Total e com o Laser Scanning foi necessária a instalação dos equipamentos em 12 (doze) estações de trabalho. A partir daí foram irradiados um total de 816 (oitocentos e dezesseis) pontos com a Estação Total, em 27 (vinte e sete) horas de trabalho (3 dias), com 03 profissionais (01 topógrafo e 02 auxiliares). Enquanto que o Laser Scanning mensurou um total de 147.284 (cento e quarenta e sete mil e duzentos e oitenta e quatro) pontos topográficos (quantidade final após filtragem e limpeza da nuvem de pontos bruta), em 06 (seis) horas de trabalho, com apenas 01 (um) operador, vide tabela 01.

Atualmente, o preço médio da diária cobrado pelas empresas de locação de aparelhos topográficos, em Belo Horizonte, para a Estação Total do modelo utilizado é de R$ 70,00 (setenta reais), enquanto que a diária de um Laser Scanning utilizado é de R$ 2.500,00. Já os topógrafos, que atuam na região, tem cobrado entre R$ 600,00 (seiscentos) a R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos) a diária, para realização de levantamentos topográficos similares, vide tabela 01.

Tabela 1
Tabela 01 - Comparação do Levantamento Topográfico realizado com Estação Total e Laser Scanning da Área em Estudo

A partir dos pontos topográficos levantados em campo foi gerado um modelo tridimensional do terreno – MDT, curvas de nível com eqüidistância vertical de até 1m e seção longitudinal – vide figura 05 e 06.

Figura 5
Figura 05 – Curvas de Nível geradas a partir dos pontos levantados pela Estação Total. Fonte: Mapa gerado pelos autores.
Figura 6
Figura 06 – Curvas de Nível geradas a partir dos pontos levantados pelo Laser Scanning. Fonte: Mapa gerado pelos autores.

No intuito de quantificar as possíveis diferenças entre a topografia do levantamento realizado com a Estação Total e do Laser Scanning, foi criada ainda uma topografia projetada, simulando um projeto qualquer de engenharia, como por exemplo, uma frente de lavra de atividade mineraria, com bancadas de 5 metros de altura, taludes com 60° de inclinação e plataforma com 10 metros de largura – vide figuras 07 e 08.

Assim, foi possível calcular as diferenças de volume de corte/aterro, no presente caso apenas corte, entre as topografias levantadas e a projetada. Para a cubagem dos volumes de corte entre as topografias foi utilizada a comparação entre 02 (duas) superfícies (superfície de base X superfície primitiva ou de referência), sendo o MDT gerado das topografias levantadas com a Estação Total e o Laser Scanning a superfície de base, e o MDT gerado da topografia projetada à superfície primitiva ou de referência. No cálculo de volume entre as superfícies foi utilizado o método de interpolação não linear (método dos vizinhos naturais).

Depois de calculadas as diferenças de volume de corte entre as superfícies topográficas levantadas com a Estação Total / Laser Scanning e a projetada, observou-se que a diferença na área total em estudo foi de quase 68.000 m³ ou 0,85% – ver tabela 2 com os quantitativos calculados.

Figura 7
Figura 07 – Curvas de Nível simulando bancadas em um projeto de engenharia. Fonte: Mapa gerado pelos autores.
Figura 8
Figura 08 – Seção Longitudinal com o perfil da topografia projetada e as levantadas com Estação Total e Laser Scanning. Fonte: Seção Longitudinal gerada pelos autores.

Ao se observar cada uma das 04 (quatro) áreas, a diferença foi de 0,13% na Área 01, de 0,47% na Área 02, de 2,60% na Área 03 e de 4,76% na Área 04, evidenciando que as maiores diferenças encontradas foram nas áreas com maior dificuldade de acessibilidade e conseqüentemente com o menor número de pontos irradiados no levantamento com a Estação Total.

Percebe-se ainda que mesmo nos locais com a topografia mais detalhada e heterogênea, mas com maior facilidade de acessos e maior número de pontos irradiados, como nas Áreas 01 e 02, a diferença entre os volumes calculados chegaram a ser até 36 (trinta e seis) vezes menores se comparados às diferenças encontradas nas Áreas 03 e 04.

Tabela 2
Tabela 02 - Comparação dos volumes de corte calculados entre as superfícies topográficas levantadas e a projetada

É importante salientar que mesmo que as discrepâncias de volume sejam aparentemente pequenas, onde em uma área com 200.000 m² ou 20 hectares a diferença volumétrica entre os levantamentos topográficos foram de apenas 0,85% ou 68.000 m³, se fosse calculado o volume em um projeto, por exemplo, de uma frente de lavra de minério de ferro, estar-se-ia errando no caso em aproximadamente 170.000 toneladas (cento e setenta mil), onde considerando uma densidade média de 2,5 ton/m³, valor este que poderia representar nos dias atuais uma diferença financeira de R$ 17.000.000,00 (dezessete milhões de reais), tendo em vista que o valor médio da tonelada de minério de ferro seja de R$100,00 (cem reais); ou ainda, poderia-se calcular erroneamente uma planilha de planejamento do custo final para o transporte de material de base para construção de uma grande obra, como por exemplo, uma rodovia, com uma diferença de 6.800 (seis mil e oitocentos) caminhões com capacidade de 25 (vinte e cinco) toneladas.

Conclusão

Com o grande avanço das tecnologias ocorre a cada dia uma revolução nas ciências geomáticas. Os métodos de medições e levantamentos remotos estão se tornando cada vez mais presente para complemento ou até mesmo como alternativa no levantamento topográfico em campo.

Ocorre uma forte tendência que num futuro próximo, os profissionais das áreas de topografia, geodésia e cartografia, tenham cada vez menos contato com os locais a serem levantados. “À medida que a tecnologia de levantamentos em campo avança, cada vez menos é preciso que o profissional tenha contato direto com as áreas e objetos a serem mapeados. Até mesmo em trabalhos clássicos de topografia, como levantamento “as built”, o uso de técnicas de medição à distância pode ser opção – ou um complemento – para os métodos tradicionais de topografia” (FREITAS, 2011).

Os levantamentos a laser sejam eles aerotransportados ou terrestres, vêm evoluindo e avançando a mais de 03 (três) décadas. Com equipamentos capazes de medir facilmente mais de 10.000 pontos por segundo, com altíssima precisão, associados às grandes facilidades de processamento dos dados, tem um aumento na produtividade das atividades nunca imaginado nos levantamentos topográficos convencionais. “O baixo tempo para aquisição dos dados gera ganhos de produtividade, e, além disso, há a vantagem de não necessitar de alvos refletores e de luz. O número de pontos gerados em cada levantamento é da ordem de milhares por segundo, as distâncias podem chegar a mais de dois quilômetros, com precisão milimétrica” (FREITAS, 2011).

Uma correta análise do tipo de levantamento topográfico a ser feito, avaliando o nível de dificuldade na sua execução, tempo e custo, bem como as características básicas necessárias do produto final, ainda associados aos conhecimentos técnicos do profissional executante poderão acarretar uma adequada solução na escolha de equipamentos e métodos a serem utilizados, evitando assim erros grosseiros e prejuízos financeiros. “Várias características e circunstâncias podem influir nos custos para a elaboração dos serviços de agrimensura e cartografia e, portanto, diversos são os impactos no orçamento dos mesmos. Um serviço executado sem a devida apropriação de custos, dificilmente poderá atingir os objetivos e proporcionar o lucro justo ao executante. Um profissional responsável e idôneo se verá obrigado a avaliar bem a necessidades de seu cliente e as suas antes de formular uma proposta” (BUENO, 2009).

“Informações fidedignas dependem de observações próximas à realidade. Por outro lado, de nada adianta a excelente coleta de dados sem as verificações, comprovações e um meio eficiente de comunicação com o usuário, que lhe possibilite avaliar todo o processo de produção e depreender o seu significado” (BUENO, 2009).

No estudo de caso realizado pode-se concluir que o método de levantamento topográfico utilizando o Laser Scanning Terrestre, nas circunstâncias e condições descritas, apresentou um melhor custo/benefício em relação ao levantamento convencional utilizando a Estação Total.

Em relação à qualidade entre metodologias empregadas nos levantamentos fica evidente a vantagem do uso do Laser Scanning, nas circunstâncias e condições descritas, onde pode mensurar remotamente milhares de pontos topográficos, em um tempo significantemente menor se comparadas às metodologias convencionais, independente das condições e detalhamento do relevo local.

O elevado valor da diária na locação do equipamento pode ser facilmente compensado pelo ganho de produtividade e qualidade, e conseqüentemente na lucratividade do trabalho.

É importante ressaltar, que nenhuma tecnologia e metodologia empregadas nos trabalhos topográficos, geodésicos e cartográficos, substituem integralmente uma à outra, devendo ser único e exclusivamente de responsabilidade do profissional através de suas habilidades e conhecimentos técnicos escolher o melhor método e equipamentos a serem adotados na execução de um determinado levantamento.

Referências Bibliográficas

BUENO, Régis. Consciência profissional. A importância de identificar as características que influenciam nos serviços de agrimensura e cartografia. Editora MundoGEO. Revista InfoGNSS. Ano 6, Edição n° 27, 2009. 40 p

FREITAS, Eduardo. Imagens Invadem o Campo. Dados de satélite, nuvem de pontos 3D e fotos aéreas cada vez mais presentes nos levantamentos. Editora MundoGEO. Revista InfoGNSS. Ano 6, Edição n° 35, 2011. 26 a 28 p