Discussões sobre o tema vão muito além da integração de dados. Evento MundoGEO#Connect abordou o assunto em seminário

Por Viviane Prestes

O Cadastro Territorial Multifinalitário (CTM) roubou a cena do terceiro dia do MundoGEO#Connect, que aconteceu de 14 a 16 de junho em São Paulo. Palestras e debates sobre o uso das geotecnologias na gestão municipal, na qual o CTM foi abordado por acadêmicos, representantes de municípios e pelo Ministério das Cidades, duraram todo o dia.


Baixe os arquivos pdf das apresentações em http://bit.ly/rhaBiL


O CTM é uma forma de registro de todos os dados referentes a uma cidade – inclusive através de mapeamento de lotes, terrenos e vias – para auxiliar na parte jurídica, com os trâmites imobiliários e limites de terrenos, integrando essas informações em uma única base.

Pela multifinalidade e abrangência de áreas, o CTM passou a tomar conta das discussões sobre planejamento de cidades, tornando-se pauta obrigatória em reuniões de prefeituras brasileiras. O que se fala muito é a questão da organização de dados de vários órgãos, que se mantêm dispersos, dificultando o trabalho e comprometendo a agilidade nos processos de regularização de terrenos, por exemplo.

Eglaísa Cunha_MundoGEO#Connect
Eglaísa Cunha

Segundo Eglaísa Cunha, gerente de capacitação do Ministério das Cidades, “em 2003 foi diagnosticado que os municípios ainda têm uma necessidade grande de organização das suas informações, por ocasião da elaboração dos planos diretores, que é uma prerrogativa do Estatuto da Cidade”. Por isso, nesse mesmo ano o órgão lançou o Programa Nacional de Capacitação das Cidades (PNCC). “Trabalhamos em várias frentes de capacitação para disseminar os conceitos de CTM, ou seja, temos uma base única de mapeamento de território para que todos os agentes do município possam utilizar em benefício das suas políticas públicas”, explica.

Recentemente, o Ministério das Cidades, com o apoio do Lincoln Institute of Land Policy, que está ligado às políticas territoriais, lançou um manual de apoio à implementação das Diretrizes do CTM, para auxiliar as ações municipais, pois permite a integração dos dados sociais, econômicos, jurídicos, físicos e ambientais, entre outros, dando suporte à sistematização da informação para gestão do território.

Colocando pingos nos “is”

As diretrizes para o CTM não são impostas, como explica Eglaísa, mas trazem benefícios para a elaboração do cadastro territorial. “As diretrizes do CTM não são obrigatórias, mas elas estabelecem alguns conceitos que estão dispersos pela legislação de uma forma geral, com um objetivo mais didático de dotar o município de uma estruturação mais amigável para que ele possibilite encaminhar essa proposta de elaboração do cadastro”, esclarece.


Nas Diretrizes Nacionais para o CTM ficou estabelecido que:

» O CTM deve atender às necessidades sociais, ambientais e econômicas da administração pública e de segurança jurídica
» Deve contar com um arquivo de documentos originais de levantamento cadastral em campo, além de uma Carta Cadastral, que se refere à representação cartográfica do levantamento sistemático territorial do município
» Deve obedecer os padrões da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde) e o sistema de projeção UTM
» Deve atender a vários usuários
» Deve atualizar avaliações cadastrais em relação aos valores de mercado
Você pode ler mais disposições sobre as Diretrizes para o CTM no site do MundoGEO#Connect, na palestra apresentada por Eglaísa Cunha
http://ning.it/nnhjkx


O caso de Belo Horizonte

Uma das cidades que conta com o CTM é Belo Horizonte (MG). Roberto Freitas é gerente de Cadastros Tributários da capital mineira e esteve presente no seminário sobre gestão municipal. Freitas explicou como o município implantou as ações de cadastramento, já no início da década de 90.

“O cadastro técnico municipal já está presente nas atividades de Belo Horizonte desde 1991, graças ao pioneirismo da empresa de informática Prodabel na utilização da cartografia digital. Por esse motivo, os administradores e planejadores municipais já utilizam a base geográfica do CTM para saber como as iniciativas da prefeitura estão distribuídas pelo espaço urbano, além de identificar como elas se relacionam com a população em cada região da cidade e para determinar onde é mais necessária a ação do poder público”, conta.

De acordo com o gerente, há vários órgãos da prefeitura que usam o CTM em suas ações. Um exemplo é o setor de urbanismo, que utiliza o cadastro para identificar e licenciar atividades, imóveis ou edificações. Assim como a área de educação, para realizar a matrícula escolar com alocação automática de alunos das redes do primeiro grau, usando o quesito de proximidade. Ainda, o setor de saúde, identificando locais de incidência de doenças, para ações mais corretas e efetivas.

Roberto Freitas_MundoGEO#Connect_CTM
Roberto Freitas

Roberto Freitas também destaca a importância da atualização da base de geo-processamento urbano, feita em 2005, através de levantamento aerofotogramétrico e perfilamento a laser, para integrar as informações entre os órgãos da prefeitura e agentes externos. “Em termos quantitativos, atualmente existem cerca de 300 camadas geográficas na base de geoprocessamento da prefeitura de Belo Horizonte. Grande parte destes dados geográficos estão armazenados em um banco de dados espacial (Oracle Spatial) e diversos softwares de SIG desktop fazem acesso aos mesmos”, conta.

Outro ponto destacado pelo gerente se refere à implantação da Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE) no município. “A IDE municipal está sendo desenvolvida exatamente para integrar os dados, diminuir a duplicação e o desperdício de recursos, aumentar a qualidade e confiabilidade do dado geográfico, apoiar o e-government, garantir segurança no acesso e atualização e para proporcionar o desenvolvimento de novas aplicações que utilizam Serviços Baseados em Localização (LBS)”, completa Freitas.

Enquanto isso, em Campinas…

A cidade de Campinas é outro exemplo de implantação do CTM, apesar do projeto ser recente. As discussões começaram em 2007 e já passaram por várias fases, desde o mapeamento até a identificação dos processos de trabalho essenciais ao cadastro, como explica Daniella Scarassatti, assessora da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano de Campinas (Seplan).

“Desde o início do projeto, trabalhamos no tratamento do legado de dados para a migração ao sistema, sejam digitais ou analógicos, tabulares e/ou geoespaciais, conversão das plantas do cadastro em formato analógico para arquivo digital raster em formato TIFF, vetorização das feições de todas as unidades territoriais urbanas constantes das plantas do cadastro (lotes, equipamentos públicos, áreas institucionais, glebas, praças e sistema viário) e acabamos de concluir a sistematização dos dados (digitação e digitalização) contidos nas fichas de propriedade”, explica.


“O Município de Campinas conta, desde o início de 2010, com uma rede de marcos geodésicos constituída de 179 pontos de referência para trabalhos topográficos. As coordenadas dos vértices foram referenciadas ao Plano Topográfico Local, tendo como origem um ponto mais central do município, conforme a NBR 14.166 com coordenadas no Datum Sirgas2000, SAD 69 e opcionalmente no Córrego Alegre, inserido no Sistema Geodésico Brasileiro, bem como articulado com as cartas 1:50.000 e 1:25.000 do mapeamento sistemático básico, de acordo com o decreto-lei 14.243/67”, afirma Daniella.


Desafios

Daniella conta que uma das maiores dificuldades encontradas pela administração pública da cidade é a multiplicidade de bases de dados cadastrais produzidas pelas diversas secretarias. “O cadastro sempre foi uma ferramenta necessária ao planejamento urbano e que auxilia o desenvolvimento de estudos para as diversas ações da administração”.

Daniela Scarassati_MundoGEO#Connect_CTM
Daniela Scarassati

Além disso, há o Projeto de Modernização do Cadastro, que visa implantar o Cadastro Físico Territorial e Ambiental (CFTA), uma definição da cidade de Campinas para o CTM. “O que se pretende é adotar um novo modelo de gestão do cadastro, que permita a consolidação de uma única base de dados”, completa.

Apesar de ser um instrumento quase indispensável, a maioria das cidades brasileiras ainda não conta com projetos sobre cadastros territoriais e mapeamentos confiáveis. Mas o desafio pode estar dentro das próprias administrações públicas.

O evento MundoGEO#Connect abriu espaço para que esse assunto fosse discutido, através de sete painéis, com a presença de profissionais diretamente ligados ao setor de planejamento urbano. Além disso, o seminário de Geotecnologias na Gestão Municipal contou com a presença de representantes de instituições internacionais, ligadas às geotecnologias, como Wolfgang Biedermann, CEO da RapidEye, e Mike Reslow, da International Society for Photogrammetry and Remote Sensing (ISPRS).