Antes de sair em campo para o trabalho de levantamento de comunidades quilombolas no estado, o pesquisador José Nascimento Santos, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), conseguiu levantar informações atualizadas sobre solos, vegetação e potencialidade produtiva daquela região. Essa preparação foi possível graças ao Sistema de Observação e Monitoramento da Agricultura no Brasil (Somabrasil), um integrador de dados sobre a agricultura que reúne, num único ambiente com acesso amigável e interatividade, informações produzidas por diferentes fontes.

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Fonte: Embrapa

As ferramentas do Somabrasil chegaram ao conhecimento de entidades públicas e privadas de todo o País e, hoje, são consultadas por pesquisadores, gestores, analistas, consultores ambientais e estudantes de graduação e pós-graduação. O sistema segue um processo contínuo de desenvolvimento e já tem cadastrados aproximadamente quatro mil usuários de diferentes setores ligados à agropecuária, do Brasil e de mais de 20 outros países.

“Hoje o Somabrasil reúne em seu banco de dados cerca de quatro milhões de registros relacionados às produções agrícola e pecuária municipais desde 1990, além de bases político-administrativas; relevo, hidrografia, biomas, solos e potencial agrícola; áreas protegidas e desmatamento na Amazônia; logística e clima”, explica o pesquisador da Embrapa Monitoramento por Satélite, Daniel de Castro Victoria, um dos coordenadores do projeto. O sistema integra dados gerados, por exemplo, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e Embrapa. A ferramenta está disponível na internet , não requer software nem usuários especializados e foi construída com base em tecnologia de código aberto, ou seja, software livre.

A Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SPA/Mapa) é um dos principais usuários governamentais do Somabrasil. Um acordo de cooperação firmado com a Embrapa estreitou essa parceria e vem contribuindo para o desenvolvimento de ferramentas para a gestão de análises de riscos aos quais as lavouras estão sujeitas. Essas ferramentas estão sendo integradas ao Somabrasil e possibilitam gerar mapas, cruzar dados, realizar consultas e análises para apoio à tomada de decisão e ao direcionamento de políticas públicas já estabelecidas, como o zoneamento agrícola de risco climático e o seguro rural.

Aplicação em diferentes áreas

As consultas ao banco de dados do Somabrasil auxiliaram programas de entidades do terceiro setor, como no caso do “Mais Inovação”, programa de consultoria técnica focado em áreas degradadas desenvolvido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural do Mato Grosso do Sul (Senar/MS). “Por meio dele, conseguimos informações complementares para verificar o que acontecia fora do estado, quais as outras culturas, quais as tendências de mercado, onde poderíamos avançar em inovação e como poderíamos avançar na recuperação de áreas degradadas”, afirmou a consultora da Federação de Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul), Daniele Coelho.

Ieda Del’Arco Sanches, pesquisadora do Inpe, afirma que o webgis desenvolvido pela Embrapa também auxilia em seu trabalho. “Ele faz uma análise temporal das culturas e consigo espacializar esses dados, integrando tudo numa plataforma só. Em sites do IBGE, por exemplo, as consultas geram mapas em plataformas diferentes. São coisas soltas, separadas. No Sistema, consigo ver tudo junto. É tudo mais útil e rápido, ao invés de ficar abrindo várias plataformas de acesso, ficando muito mais dinâmico”, elogia.
O universitário Klever Fidler conheceu o Somabrasil por meio de buscas na internet no início de 2014. Aluno de agronomia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), ele procurava analisar os diferentes tipos de solos na região do oeste do estado para um trabalho do curso e chegou até o endereço do Somabrasil. Gostou tanto que, desde então, vem usando o webgis para outras consultas, como de regime pluviométrico, áreas planas do terreno e o ícone de aptidão agrícola. “O Somabrasil me ajudou significativamente no trabalho e me impressionei demais devido à facilidade de interagir nesse programa”,  argumenta Klever.
O Somabrasil também tem sido utilizado para trabalhos de inspeções rurais. Jairo César Lopes, extensionista agropecuário da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), trabalha na inspeção de propriedades rurais de Minas Gerais. Jairo usa o sistema semanalmente para fazer consultas sobre cobertura vegetal, áreas desmatadas e de pasto.

Renan Nunes, engenheiro-agrônomo da empresa Hebersat, também acessa o Somabrasil semanalmente. Segundo ele, o ponto forte da ferramenta são os mapas interativos, com várias camadas de dados. Além disso, ele complementa, a plataforma difere de outros webgis por possibilitar pesquisas mais amplas, por exemplo, em níveis municipais e estaduais.

Mapas dinâmicos

Um aplicativo ainda em fase de protótipo para uso restrito da SPA/Mapa está utilizando dados do seguro rural para possibilitar análises espaciais envolvendo, por exemplo, número de apólices, valores do prêmio, área total e ocorrência de sinistros nos municípios brasileiros. A coordenadora técnica do zoneamento agropecuário, Raíssa de Almeida Papa, explica que hoje esses dados são analisados a partir de planilhas. “Ao espacializar os dados do seguro rural na forma de mapas dinâmicos, com opções diferentes de cruzamento e consulta, consegue-se realizar estudos e fornecer subsídios à política agrícola de maneira mais ágil e eficaz”, ressalta.

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Fonte: Embrapa

O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural, implementado pelo governo federal em 2005, oferece ao agricultor a oportunidade de segurar sua produção por meio de auxílio financeiro, o que reduz os custos de contratação da apólice. O Plano Agrícola e Pecuário para o período 2014/2015 prevê um total de R$ 700 milhões em recursos para esse programa e alcança cerca de 10 milhões de hectares e mais de 80 mil produtores nas modalidades agrícola, pecuária, florestal e aquícola.

Um banco de dados foi estruturado no Somabrasil para permitir a análise espacial das estatísticas relacionadas ao seguro rural contratado junto a seguradoras habilitadas pelo Ministério da Agricultura. O sistema oferece uma série de possibilidades de consulta em nível municipal ao combinar parâmetros como cultura agrícola ou atividade rural, área e importância segurada, taxa da seguradora, nível de cobertura e valor da subvenção concedida pelo governo federal. Também podem ser consultados a área de ocorrência de sinistros e o valor pago nesses casos, além dos tipos de evento ocorridos, como geada, seca, incêndio, granizo, entre outros. Uma próxima fase de desenvolvimento incluirá a integração com dados do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), destinado aos produtores que contratam financiamento do crédito agrícola para custeio e proteção contra prejuízos em casos de ocorrência de fenômenos naturais, pragas e doenças.

Risco climático

Outro produto já implementado no âmbito do convênio com o Ministério da Agricultura foi a visualização, na forma de mapas dinâmicos, das informações do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), que avalia os riscos aos quais as lavouras estão expostas e que provocam perdas na produção. Desde a safra de 1996, o Zarc é revisado anualmente e publicado na forma de portarias, no Diário Oficial da União e no site do Ministério. A metodologia foi desenvolvida pela Embrapa Informática Agropecuária. Os riscos são quantificados e uma lista apresenta as cultivares indicadas para as regiões e os municípios e os calendários de plantio. São tabelas e notas técnicas que, agora no Somabrasil, podem ser consultadas na forma de mapas dinâmicos para 58 culturas agrícolas, como soja, milho, trigo, arroz, algodão, feijão, uva, palma, cacau, maracujá, pimenta-do-reino, entre outros, em 5.205 municípios brasileiros.

“Conhecemos o Somabrasil durante evento promovido pelo Núcleo de Inteligência Territorial do Ministério da Agricultura (NIT), quando tivemos interesse em entender melhor o Sistema e discutir a integração de dados geoespaciais de interesse da Secretaria de Política Agrícola”, explica Raíssa de Almeida Papa. A inclusão dos dados no Somabrasil proporciona agilidade na obtenção de informações necessárias para a tomada de decisão. “Com o acesso ao Zoneamento no Somabrasil conseguimos nos concentrar mais na análise das demandas que chegam à coordenadoria”, completa.

Hoje, qualquer usuário é capaz de gerar um mapa que identifica rapidamente se um município ou uma região apresenta indicação de plantio para determinada cultura, de acordo com o tipo de solo e o ciclo. A consulta também permite saber a época mais indicada para o plantio, com a data de início ou fim do período. Para ter direito ao Proagro, ao Proagro Mais e à subvenção federal ao prêmio do seguro rural, o produtor deve seguir as recomendações previstas no Zarc, que também vem sendo considerado por alguns agentes financeiros para a concessão do crédito rural.

O monitoramento da produção agrícola e do risco associado à atividade, principalmente riscos relacionados ao clima, também impõe desafios para a pesquisa geoespacial. Atendendo a uma demanda da SPA/Mapa, a Embrapa vem trabalhando no desenvolvimento de métodos científicos para o acompanhamento da produção em larga escala, mapeando indicativos de anomalia e quebras de safra. São avaliados dados de sensores remotos para a detecção de áreas cultivadas, a identificação de safras ruins, normais ou boas e a sua correlação com eventos climáticos. Análises já realizadas pela Embrapa em áreas de agricultura consolidada mostraram resultados positivos, e há perspectiva de implementar a ferramenta no Somabrasil. “Esse produto propiciará uma análise objetiva do risco a que as culturas e regiões do Brasil estão sujeitas, contribuindo para a construção da matriz de risco e o monitoramento da produção e apoiando, de maneira consistente, o zoneamento agrícola e o seguro rural”, afirma Raíssa de Almeida Papa.

Desenvolvimento

Para disponibilizar o Somabrasil para consultas, foi preciso fazer uma integração de softwares livres e uma biblioteca de dados que comportasse muitos cruzamentos de informações. Davi Custódio, analista da Embrapa e programador do sistema, afirma que são poucos os sistemas de webgis no Brasil que disponibilizam consultas. “A maioria somente liga uma camada à outra. São mais ferramentas de visualização e se limitam a isso. O Somabrasil possibilitou montar consultas através do cruzamento de informações. Até internacionalmente são poucos os webgis disponíveis para consultas com tantos dados”, dimensiona. Além disso é possível inserir dados externos por meio de servidores remotos do tipo Web Map Service (WMS).

O funcionamento começa quando o usuário consulta o Somabrasil, o que gera uma solicitação para o servidor, o GeoServer. O comando é direcionado para o banco de dados, que o processa e encaminha as informações solicitadas novamente ao GeoServer. Ali, o processamento é finalizado e transformado em um mapa. A aplicação encarrega-se de colocar cada imagem no local correto. A cada consulta, é gerado um relacionamento entre as tabelas envolvidas e o banco de dados. Ele devolve a informação geográfica e o texto da pesquisa de campo, gerando mapas com informações textuais para o usuário.

Édson Bolfe, chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Monitoramento por Satélite, destaca que o usuário é capaz de interagir com os diferentes planos de informação disponíveis no Somabrasil e fazer consultas básicas e avançadas por meio de ferramentas de análises espacialmente explícitas e de visualização dinâmica.
Todos os cruzamentos dos mais de quatro milhões de registros geram mapas dinâmicos, sobrepostos em uma mesma plataforma. “Essas ferramentas contribuem para a melhor compreensão das mudanças de uso e cobertura da terra, gerando informações úteis para o zoneamento, o monitoramento espacial, a definição de prioridades para empreendimentos agropecuários, logística, pesquisa, desenvolvimento e políticas públicas”, finaliza Édson Bolfe.

Fonte: Embrapa