Dispositivo é formado por um conjunto de sensores submersos instalados em vários pontos do rio sujeitos a alagamentos

A cena se repete a cada verão. As chuvas que caem durante essa época do ano elevam o nível dos rios e causam enchentes, colocando em risco vidas humanas e gerando prejuízo para quem vive às margens dos cursos d’água.

No último período chuvoso, entre novembro de 2016 e abril de 2017, ocorreram 55 inundações em São Paulo, média de uma a cada três dias, segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) da prefeitura. Os alagamentos não afetam apenas os moradores da capital paulista. Belo Horizonte, Recife, Campinas e muitas outras cidades brasileiras sofrem com os transbordamentos.

Para lidar com o problema, órgãos de defesa civil e gestão de recursos hídricos, como a Agência Nacional de Águas (ANA), empregam um conjunto de ferramentas para monitorar o nível e a vazão dos rios e alertar a população para o risco de alagamentos. Esse aparato é composto por radares meteorológicos, imagens de satélite, pluviômetros, modelos numéricos de previsão de chuvas e plataformas de coleta de dados para medição do nível de cursos d’água.

A fim de contribuir para esse sistema de prevenção e alerta, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) criaram o e-Noé, uma rede de sensores sem fio para monitorar rios e córregos urbanos.

O dispositivo, já operacional, é formado por um conjunto de sensores submersos instalados em vários pontos do rio sujeitos a alagamentos. Conectados entre si por uma rede sem fio, esses sensores detectam alterações na altura da coluna d’água. Paralelamente, câmeras fotografam o leito do rio, registrando o nível das águas. As imagens e as informações dos sensores são enviadas por sinal de celular para uma infraestrutura de nuvem, onde são acessadas pela Defesa Civil da cidade.

“Diferentemente da hidrometria convencional, em que os dados só são coletados quando o usuário vai até a estação para extraí-los, numa rede de sensores sem fio, como a nossa, as informações são transmitidas em tempo real para os interessados. O próprio sistema pode emitir automaticamente alertas de enchentes”, afirma o cientista da computação Jó Ueyama, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP de São Carlos e coordenador do projeto. “O nosso modelo, diferentemente de alguns similares importados, também faz previsão de enchentes usando mecanismos de inteligência artificial, como as redes neurais, e permite incorporar sensores de poluição, o que pode ser de grande valia para monitorar a qualidade da água.”

Segundo Ueyama, o e-Noé já foi testado com bons resultados nos córregos Monjolinho e Tijuco Preto, de São Carlos, que costumam transbordar, e continua sendo aprimorado. “Vamos investir em energia solar e em baterias de alta capacidade para garantir o fornecimento de energia ao sistema. Estamos em contato com o Instituto Eldorado, de Campinas, que demonstrou interesse em fazer essas adaptações e comercializar o equipamento”, conta. O sistema completo, com sensor de pressão, câmera, software para processamento das informações, rede sem fio e modem de telefonia 4G, deverá custar R$ 15 mil, segundo estima Ueyama. “Para cada ponto com risco de alagamento, é preciso instalar um sensor”, diz o pesquisador, acrescentando que administrações municipais ou estaduais, responsáveis pelo monitoramento de rios urbanos, e a ANA, encarregada da gestão dos recursos hídricos, são os potenciais clientes da tecnologia.

Não há dispositivos comerciais semelhantes fabricados no país, somente modelos feitos no exterior. “Os importados são produtos de prateleira, prontos para uso. Não é fácil alterar a programação de seus sensores. Já o e-Noé pode sofrer ajustes facilmente”, diz Ueyama. Ele explica que as ribanceiras onde os sensores são instalados têm características específicas, e essas informações devem ser inseridas na programação para melhorar a previsão e a detecção. “O e-Noé permite integrar o monitoramento com a modelagem e a tomada de decisão”, salienta Ueyama.

O Sistema de Alerta a Inundações de São Paulo (Saisp), que faz o monitoramento de chuvas e rios que cruzam a Região Metropolitana de São Paulo, também tem um sistema análogo ao e-Noé, projetado pelo próprio órgão. “É um hardware para uso próprio. Não está à venda, mas comercializamos os serviços de monitoramento, alertas e previsões de inundações”, esclarece o engenheiro eletricista Flavio Conde, coordenador do Saisp. “Assim como a nossa tecnologia, o sistema da USP pode ser interessante para a detecção de inundações por ser de fácil implantação.”

Para o engenheiro Eurides de Oliveira, superintendente adjunto de Gestão da Rede Hidrometeorológica da ANA, tecnologias como o e-Noé e a do Saisp têm bom potencial de uso no Brasil. “Modelos de baixo custo e difusão simples são ideais para atender regiões urbanas que precisam de rápida resposta a eventos como inundações”, observa. As estações fluviométricas usadas pela ANA para medir nível e vazão de cursos d’água, esclarece Oliveira, são dedicadas ao monitoramento de rios em bacias hidrográficas normalmente fora de áreas urbanas. “São plataformas de coleta de dados importadas e que usam principalmente sinais de satélite para o envio das informações aos centros de controle.” Esses aparelhos custam cerca de R$ 50 mil.

Detecção por imagem

Uma novidade do e-Noé em relação aos dispositivos em operação no país é o uso de imagens para detectar e prever enchentes automaticamente, sem intervenção humana – o software faz isso comparando as fotos tiradas pela câmera com imagens do rio em seu nível normal armazenadas na memória do sistema. Outra inovação do protótipo é que ele segue o modelo da Internet das Coisas (IoT). “Além de estarem à disposição das autoridades, os dados sensoriais poderão ser acessados por qualquer usuário conectado à internet. A população poderá receber alertas sobre inundações diretamente no celular”, esclarece Ueyama.

O emprego intensivo de sistemas de monitoramento de rios, aliado a outras tecnologias atualmente em uso, como rede de pluviômetros, estações meteorológicas, radares e satélites, segundo o engenheiro de recursos hídricos Eduardo Mario Mendiondo, ex-coordenador de pesquisa do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), fortaleceria os serviços de alerta a inundações no país. “Existem no Brasil quase 40 mil áreas sujeitas a enchentes, alagamentos, enxurradas e deslizamentos que apresentam riscos à população. Menos de 3% delas contam com monitoramento tradicional”, ressalta o pesquisador, professor da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP e parceiro de Ueyama no desenvolvimento do e-Noé.

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