Na Reserva de Desenvolvimento Mamirauá, cientistas e ribeirinhos organizam o turismo de observação das onças-pintadas. Na época das cheias, os animais se abrigam na copa das árvores, o que facilita a visualização dos animais.

Pesquisadores do Instituto Mamirauá encontraram no turismo científico uma alternativa para fortalecer as pesquisas sobre as onças da Amazônia. Nos meses de maio e junho, quando o nível dos rios sobe e inunda as florestas, as onças-pintadas revelam um comportamento único: com a falta de terrenos secos, elas buscam as copas das árvores para se abrigar. Esse momento é considerado ideal para o turismo de observação na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, uma área de 11 mil quilômetros quadrados no interior do Amazonas. O turismo é feito em roteiros orientados por especialistas da unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

“Para conservar, é preciso conhecer e amar”, afirma a pesquisadora Wezddy Del Toro, do Grupo de Pesquisa em Ecologia e Conservação de Felinos da Amazônia. “O turismo de observação é uma forma de envolver os comunitários nas atividades turísticas e científicas e coletar dados durante as atividades para pesquisas.”

Para entender os hábitos do animal nas florestas alagadas e realizar o turismo de observação, os pesquisadores monitoram as onças durante o ano inteiro. Para isso, contam com tecnologias, como as armadilhas fotográficas instaladas na floresta e os colares telemétricos, colocados nos pescoços dos animais durante as expedições de campo. Cada aparelho possui GPS (Global Positioning System), que transmite coordenadas geográficas via satélite, além de um sistema que emite um sinal para antenas (VHF), como um rádio. Este último método recebe o nome de telemetria.

Equipados com antenas e receptores de frequências, os cientistas partem para o monitoramento que antecede o turismo de observação. Para rastrear as onças, os pesquisadores fazem um sobrevoo na reserva. Captados de cima, os sinais de telemetria chegam melhor aos ouvidos, porque não sofrem a interferência dos troncos de árvore e outros obstáculos naturais da floresta.

“O sobrevoo deste ano foi um sucesso. Conseguimos achar as três onças que estamos monitorando atualmente”, diz o coordenador do grupo de pesquisa, Emiliano Ramalho, em referência a Fofa, uma fêmea de onça-pintada com filhote; Django, uma onça preta; e Galego, registrado recentemente pelo grupo como a maior onça-pintada já capturada na várzea amazônica, com 72 quilos. “Todos os animais estão perto um do outro e próximos à Pousada Uacari, o que é excelente para o turismo de observação”, acrescenta.

Na várzea

Depois de marcar os pontos de localização das onças pela busca aérea, parte do grupo de pesquisadores segue pela floresta até a Reserva Mamirauá para tentar avistar as onças monitoradas.

Nas florestas alagadas, os cientistas contam com a ajuda dos comunitários para caminhar na floresta. Um desses assistentes de pesquisa é Valciney Martins, nascido na Boca do Mamirauá, uma das comunidades que fazem parte da história de implantação da reserva, em 1996.

“Ouviu esse barulho? É o Galego”, avisa Valciney.

Alertados pelos sons do animal na mata e pela frequência do colar telemétrico, os pesquisadores acompanham o deslocamento de Galego pela Ilha do Embaubal, uma das centenas de ambientes inundados, conhecidos como restinga alta. “Ele escolheu esse lugar pra se alimentar porque aqui é cheio de macacos e preguiças”, explica o assistente de pesquisa.

Subindo a Aparinha do Jaquiri, outra área alagada da floresta, uma surpresa para a equipe de observação: Fofa é vista cuidando de um filhote recém-nascido, com aproximadamente um mês de vida. A última cria da onça de que os pesquisadores tinham conhecimento era um animal de um ano, e nenhuma outra gestação de Fofa tinha sido registrada.

“O que nos impressionou é que a Fofa tenha tido outro filhote em tão pouco tempo. Geralmente, as onças fêmeas esperam o crescimento de um filhote para acasalar de novo. Esse fato leva a novas perguntas e hipóteses sobre o animal”, ressalta a pesquisadora Wezddy Del Toro.

Turismo de observação 

Chamado “Expedição Onça-Pintada”, o projeto é desenvolvido pelo Instituto Mamirauá em parceria com a Pousada Uacari, hospedagem flutuante de turismo de base comunitária. O terceiro ano de atividades, encerrado em maio, teve três pacotes turísticos de duração de uma semana cada. “Um sucesso”, diz o pesquisador Emiliano Ramalho. “Os turistas puderam ver as onças-pintadas em situações distintas, como uma mãe um filhote e machos e fêmeas de onças juntos”.

Cada pacote turístico tem limite de um a seis visitantes por excursão. O número reduzido de turistas é intencional: as atividades são planejadas para o menor impacto ou interferência no ambiente das onças-pintadas, em sintonia com o ritmo e a vida desses animais na várzea. “A porcentagem de venda foi bastante satisfatória, gerando renda para colaborar com atividades da pesquisa e para o fundo dividido entre as dez comunidades que atuam com a Pousada Uacari”, comemora o coordenador do Programa de Turismo de Base Comunitária do Instituto Mamirauá, Pedro Nassar.

Além da observação das onças, os pacotes incluem palestras com pesquisadores sobre a biologia, a ecologia e a conservação da espécie.