Por Antonio Luiz de Freitas
O caminho para qualquer reforma passa, necessariamente, pelo conhecimento do que se quer reformar. Poucas questões, como esta, têm um clamor nacional tão grande na sociedade brasileira. Discussões em torno do tema comprovam que a reforma agrária é uma necessidade urgente. Até mesmo representantes de setores conservadores como os grandes proprie-tários de terra (porque estariam livres da ameaça da desapropriação), desejariam a reforma, se levada a cabo por mecanismos legais adequados. Para realizar o desejo e necessidade de tantos, não seria necessário apelar para a força ou conflitos sociais.
A legislação brasileira já dispõe de um instrumento para a consecução da reforma agrária. É o Imposto Territorial Rural – o ITR. Mas para cumprir o fim citado, é preciso fazer mudanças de pulso em sua estrutura e operacionalização.
Primeiro, a responsabilidade de seu lançamento, hoje delegada à União, deve ser transferida para o município. A falta de controle do governo federal na arrecadação do imposto (de característica declaratória, correspondente a menos de 0,2 % da arrecadação federal: em 1997, pouco mais de R$ 200 milhões em todo o país) reflete o desinteresse em seu uso como instrumento de política fundiária. Com a municipalização, os 5 mil prefeitos do país seriam os mais interessados em promover maior controle na arrecadação e justiça na tributação.
O IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano, sob responsabilidade das prefeituras, é um exemplo de que o poder público que melhor conhece as cidades são os prefeitos. Hoje, mais que um simples instrumento de arrecadação, o IPTU é uma ferramenta eficaz de política urbana. Cadastros técnicos urbanos, com informações detalhadas sobre uso e tamanho das propriedades, permitem que as prefeituras contem com elementos importantes para o planejamento e a administração das cidades.
Como o IPTU representa cada vez parcela maior de receitas próprias, desperta grande interesse do município na sua administração. Isto pode passar a ocorrer com o ITR, e os prefeitos passarem a conhecer tão bem o campo quanto as cidades. A realidade é melhor conhecida por quem a vivencia de perto. Em vez de um administrador centralizador e distante, a municipalização do ITR evitaria a evasão, promoveria a justiça fiscal e distribuiria a receita para quem realmente precisa dela. Só para comparar: apenas a Prefeitura de Curitiba conseguiu arrecadar R$110 milhões de IPTU em 1997. Mais de 50% do total do ITR obtido pelo governo federal em todo o país ano passado.
A exemplo do IPTU, para que o ITR tenha a mesma eficácia, seus administradores deverão promover os cadastros rurais dos municípios, passando a conhecer cada propriedade rural com o detalhamento suficiente para estabelecer a condição de atendimento a requerimentos legais quanto à função social, além de outras necessárias à implementação de políticas agrícolas.
Um dos atributos importantes que o poder público detém com os impostos é a capacidade indutiva. Com o ITR, seria possível o proprietário rural dar o devido uso ao seu imóvel. Com estudo sobre a vocação do uso da terra em mãos o poder público poderia pressionar, por meio de aplicação de alíquotas diferenciadas (menores para quem destina a terra a sua vocação e maiores para quem se opõe a esta destinação natural), que o fazendeiro fizesse bom uso da terra.
A reforma agrária não passa, obviamente, pela simples troca de dono da terra. Passa, sim, pela mudança de seu uso. A indução pelo imposto pode até motivar a mudança do dono, mas a mudança se dará de forma legítima e legal. A municipalização do ITR pode dar resultados em médio prazo.
Sua eficiência pode ser maior ainda com o uso de ferramentas de geoprocessamento – imagens de satélite, levantamentos aerofotogramétricos, GPS, softwares geográficos, poderiam, por exemplo, ajudar a identificar e caracterizar áreas e fazer estudos sobre uso e aptidão da terra.
Qualquer ação com caráter emergencial tem apenas efeito paliativo. A sociedade não pode ser induzida a erro pelo movimento atabalhoado e barulhento de uns poucos. Sabemos que queremos ser reformistas e não revolucionários.
Antonio Luiz Teixeira de Freitas é presidente da Aeroimagem (PR). email: aeroimagem@avalon.sul.com.br