Especialistas canadenses fazem análise detalhada das características e limitações do satélite que surpreendeu o mercado
Por Thierry Toutin, Phd (CCRS) e Philip Cheng, Phd (PCI Geomatics)

O IKONOS, satélite de mais alta resolução comercialmente disponível hoje, foi lançado ao espaço com sucesso em setembro de 1999. O sensor que o satélite carrega a bordo pode gerar imagens pancromáticas com resolução de 1m e multispectrais com resolução de 4m, com uma visada off-nadir de até 60º em qualquer azimute, que o torna capaz de oferecer um período de revisita reduzido e a capacidade de gerar pares estereoscópicos. As imagens de alta resolução geradas pelo IKONOS terão, teoricamente, uso "ilimitado" em diversos mercados (incluindo governos locais e estaduais) e em várias aplicações como mapeamento, agricultura, manejo florestal e resposta a emergências. Em substituição a fotos aéreas, pode-se utilizar este dado para atualizar, com facilidade e rapidez, mapas altamente detalhados de países inteiros. Agricultores podem monitorar a saúde de seus cultivos e estimar safras com maior precisão e em intervalos menores. Cientistas podem observar ecossistemas frágeis e fazer previsões com maior grau de certeza. Agências governamentais podem monitorar e planejar mais claramente as políticas de uso da terra e urbanistas podem expandir o desenvolvimento de novas comunidades habitacionais com maior precisão e cuidado. Resumindo: os usos potenciais para as imagens IKONOS são limitados apenas pela nossa imaginação.

Imagem IKONOS de Richmond Hill, Ontario, Canadá.

O que esperamos do IKONOS?
Baseado em resultados extrapolados de sistemas similares montados em aeronaves ou ônibus espaciais, as imagens do IKONOS têm demonstrado um alto potencial em relação a mapeamentos nacionais. O principal atrativo para a comunidade de usuários é o pixel de 1 metro, que permite a identificação da maior parte das feições representadas nos produtos cartográficos digitais. Os usuários podem esperar obter exatidão inferior a um pixel (como conseguido com outros satélites como SPOT e Landsat), mas serão estas expectativas excessivamente grandes? A capacidade de visada off-nadir é também uma característica importante do IKONOS, uma vez que melhora o período de revisita sobre a mesma área para algo entre dois e três dias e também permite (teoricamente) a geração de pares estereoscópicos. Aos usuários caberia então aplicar as técnicas tradicionais da fotogrametria a estas imagens e extrair as informações planimétricas e altimétricas, como modelos digitais de elevação (DEMs). Estariam estes pares estereoscópicos disponíveis?

O que obtemos do IKONOS?
As imagens do IKONOS são produzidas segundo cinco diferentes níveis de processamento, que correspondem a cinco diferentes custos de aquisição. A Tabela 1 mostra um exemplo do produto pancromático básico. Produtos ou serviços especiais são cobrados à parte. As imagens são distribuídas em formato GEOTIFF de 8 ou 11-bit e acompanhadas de um arquivo de metadados em ASCII (que contém os parâmetros do pedido e também arquivos de descrição da origem da imagem e dos produtos). O pedido mínimo é de US$ 1.000,00 para a América do Norte e US$ 2.000,00 para os demais países. A partir da confirmação, a entrega dos produtos disponíveis em arquivo leva de alguns dias a pouco mais de uma semana. A entrega de dados novos leva normalmente duas ou três semanas a mais, dependendo do tamanho do pedido, das condições meteorológicas, da precisão e do tempo de geração do DEM e levantamento dos pontos de controle no terreno (GCPs).

Tabela 1: Preços detalhados para o produto pancromático básico – Space Imaging Website (http://www.spaceimaging.com/).

Nota: CE90 é a exatidão posicional circular com um nível de certeza de 90%. Os preços estão em Dólares Americanos por Km2.

O produto Geo, mais barato e com menor precisão, não é corrigido das distorções do relevo. Possui uma exatidão de 50m CE90, o que significa que qualquer ponto dentro da imagem está dentro de um raio horizontal de 50 metros a partir de sua posição verdadeira na superfície da Terra, em 90% dos casos. A exatidão torna-se pior em áreas montanhosas se as imagens forem adquiridas com uma visada off-nadir, o que é bastante comum para dados do IKONOS. Disto podemos concluir que o produto só atenderá aos requisitos geométricos de um mapeamento na escala de 1:100.000. Além disso, imagens estéreo de produtos Geo não são distribuídas para usuários e as imagens brutas (preferidas pela comunidade de fotogrametria) também não estão disponíveis.

O produto Precision é o mais caro, porém oferece a maior exatidão (4m CE90). Para obter tal produto, o usuário deve fornecer GCPs e um DEM à Space Imaging para que esta gere uma imagem ortorretificada. Em função de muitas imagens serem adquiridas em visadas off-nadir, a precisão dos GCPs deve ser igual ou menor que um metro e o DEM deve ter precisão igual ou menor que 5 metros. A exatidão de sub-pixel (como as obtidas para imagens Landsat e SPOT) não podem ser alcançadas para imagens IKONOS, mesmo em terrenos planos.

Foto aérea 1:8.000 de Richmond Hill, Ontario, Canadá.

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Imagem IKONOS de Richmond Hill, Ontario, Canadá.

Quais são os problemas?
Diferentemente de outros satélites comerciais, o IKONOS não fornece informações orbitais detalhadas. Além disso, o fornecimento de GCPs e DEM à Space Imaging para se obter produtos ortorretificados precisos pode representar um atraso no uso do produto. Este fato também pode apresentar um problema para usuários que não têm permissão para enviar ao exterior informações cartográficas de seu país. Finalmente, os preços dos produtos Precision são muito altos em comparação ao produto Geo. Todos estes aspectos podem desencorajar usuários a adquirir dados IKONOS ou a usá-los apropriadamente. Contudo, seria possível para os usuários comprar o produto Geo (cerca de 5.5 vezes mais barato que o produto Precision) e corrigi-lo? A resposta curta é sim. Os usuários irão economizar tempo, dinheiro, irão enfrentar menos problemas administrativos relativos ao envio de GCPs e DEMs ao exterior e ainda usarão esta nova fonte de dados de maneira mais apropriada.

Quais são as soluções?
Três métodos podem ser utilizados para corrigir os dados IKONOS Geo: O método polinomial simples, o método polinomial proporcional (rational) e o método do modelo rigoroso (ou paramétrico). O propósito deste artigo é aplicar estes três métodos a um produto (rational) e o método do modelo rigoroso (ou paramétrico). O propósito deste artigo é aplicar estes três métodos a um produto IKONOS Geo e comparar os diferentes resultados.

Freqüentemente considerado ultrapassado, o método polinomial simples é um método de correção de imagens bastante descomplicado. Ele corrige distorções planimétricas básicas nas proximidades dos pontos de controle. Uma vez que este método não leva em consideração a elevação do terreno, está limitado a áreas pequenas e planas.

O método polinomial proporcional é similar ao método polinomial simples, exceto pelo fato de que envolve uma razão de transformações polinomiais e leva também em consideração a elevação do terreno. Portanto, este método pode ser útil para áreas com terreno suave. Tanto o modelo polinomial simples como o proporcional não necessitam de informações do sensor nem do satélite. Uma vez que ambos os métodos não são rigorosamente modelados, eles requerem muitos pontos de controle e somente realizam a correção nas vizinhanças dos mesmos. As distorções geradas entre os pontos não são completamente eliminadas.

Foto aérea 1:8.000 de Richmond Hill, Ontario, Canadá

Modelos rigorosos, ou paramétricos, refletem a realidade física da geometria de visada completa e corrigem distorções resultantes da plataforma, do sensor, da Terra e, algumas vezes, das deformações devidas à projeção cartográfica. São levadas portanto em consideração as informações satélite-sensor. Quando comparado aos métodos polinomiais simples e proporcional, o método do modelo rigoroso produz resultados de maior exatidão com relativamente poucos pontos de controle.

O problema que resta é que informações detalhadas do sensor do satélite IKONOS ainda não foram liberadas. Apesar disto, o autor deste artigo (pesquisador senior do Centro Canadense de Sensoriamento Remoto – CCRS, Recursos Naturais do Canadá) desenvolveu com sucesso um modelo rigoroso do IKONOS, usando informações básicas dos arquivos de imagem e de metadados. Por exemplo, os ângulos de visada aproximados do sensor podem ser computados usando-se um conjunto de elevações nominais e a resolução nominal no terreno nas direções longitudinal e transversal à direção de varredura. O modelo do CCRS está baseado em princípios relacionados a orbitografia, fotogrametria, geodésia e cartografia. E tem sido aplicado com sucesso, usando poucos pontos de controle (3-6), em dados coletados no visível e infravermelho (VIR) (Landsat 5 & 7, SPOT, IRS, ASTER e KOMPSAT), assim como para dados SAR (ERS, JERS, SIR-C e RADARSAT). Com base em pontos de controle de boa qualidade, a exatidão deste modelo comprovou estar dentro de um terço de pixel para imagens VIR e uma célula de resolução para imagens SAR.

Experimentos
Para testar os três diferentes métodos, um produto IKONOS Geo foi adquirido em abril de 2000, cobrindo a cidade de Richmond Hill, localizada no norte de Toronto, Ontario, Canadá. Esta área de estudo possui elevações variando entre 180 e 240 metros. O dado foi entregue dentro de 30 dias a partir da confirmação do pedido e o arquivo de metadados foi processado para computar os parâmetros dos satélite para o método do modelo rigoroso. Trinta (30) GCPs foram coletados uniformemente sobre a imagem e as coordenadas de mapa foram obtidas de ortofotos de 20 cm e de um DEM com espaçamento de 2 metros.

Para testar o processo de correção geométrica, o software PCI OrthoEngine Satellite Edition V7.0 (um produto que suporta todos os três métodos de correção mencionados) foi usado. O PCI OrthoEngine Satellite Edition V7.0 também suporta a leitura de diferentes dados de satélite, coleta de pontos de controle, modelagem geométrica, ortorretificação e geração manual ou automática de mosaicos.

Resultados e Análises
A Tabela 2 mostra o erro médio quadrático (RMS) e o resíduo máximo do cálculo com os três diferentes métodos. Transformações polinomiais de segunda ordem foram utilizadas para ambos os métodos polinomiais. Conforme pode ser visto na Tabela 2, o método polinomial proporcional gerou os melhores resíduos. Contudo, avaliar a exatidão com apenas os resíduos nos pontos de controle é tendencioso, uma vez que ambos os métodos polinomiais fazem correções na vizinhança dos pontos de controle.

Tabela 2 : Comparação dos resultados residuais com 30 GCPs usando polinomial simples, polinomial proporcional e o modelo rigoroso.

Durante a coleta dos pontos de controle, foi cometido um erro na coleta de um dos pontos. Este erro foi de cerca de 20m na direção Y. Tanto o método polinomial simples quanto o proporcional falharam em detectar o ponto errado. A Tabela 3 mostra o RMS e os resíduos deste ponto. O resíduo em Y do ponto errado no modelo rigoroso foi quatro vezes mais alto do que os RMS residuais, e foi detectado imediatamente no valor de erro e na direção.

Tabela 3 : Comparação dos resultados residuais com 30 GCPs, incluindo um ponto errado, usando polinomial simples, polinomial proporcional e um modelo rigoroso.

A validação não tendenciosa da exatidão posicional tem de ser feita com pontos de checagem independentes (ICPs), os quais não são utilizados nos cálculos do modelo. Consequentemente, 23 dos 30 pontos de controle foram transformados em ICPs no segundo teste. A segunda ordem foi utilizada para o método polinomial simples e a primeira ordem para o método polinomial proporcional devido ao reduzido número de pontos de controle. A Tabela 4 mostra o RMS e os erros máximos sobre os 23 ICPs utilizando-se os três métodos. Os erros com o método rigoroso são menores do que com ambos os métodos polinomiais e são também consistentes com os resíduos das Tabelas 2 & 3. Isto demonstra que o modelo rigoroso é estável robusto , sem gerar erros locais e sem filtrar os erros. Uma avaliação dos parâmetros de imagem, computados a partir do método rigoroso, tais como ângulos de visada, valida as suposições básicas e estimativas computadas a partir do arquivo de metadados.

Tabela 4 : Comparação dos resultados dos erros com 23 ICPs e 7 GCPs usando polinomial simples, polinomial proporcional e o modelo rigoroso.

Uma avaliação final foi realizada executando-se uma comparação quantitativa e qualitativa da imagem ortorretificada gerada a partir do método rigoroso e um DEM com ortofotos de 20cm. Isto confirma os resultados prévios sobre os ICPs de que não há erro maior que 4-5m. Consequentemente, a exatidão do modelo rigoroso está dentro da exatidão do produto IKONOS Precision.

Conclusões
Os produtos IKONOS Geo possuem uma exatidão relativamente baixa e incompatível com a qualidade do conteúdo da imagem e com mapas em escalas grandes. Os produtos Precision podem ser difíceis de se gerar fora de certos países e são caros. Consequentemente, o maior inconveniente do uso adequado e eficiente dos produtos IKONOS é a impossibilidade inerente de processar e ortorretificar as imagens por parte dos próprios usuários. Agora, os usuários podem aplicar um modelo rigoroso (disponível num ambiente operacional) para corrigir os produtos Geo de baixo custo. Quando dados precisos do terreno estiverem disponíveis, os usuários poderão produzir imagens ortorretificadas consistentes, as quais serão tão precisas quantos os caros produtos Precision. Por este motivo, esta tecnologia deve promover a aquisição e o uso desta nova fonte de dados para muitas aplicações.

O CCRS continua suas avaliações utilizando outras imagens IKONOS em diferentes tipos de relevo (especialmente em relevos movimentados) e para diversas aplicações (mapeamento, levantamento florestal, agricultura, etc.). Resultados recentes em áreas montanhosas têm se mostrado promissores para mapemaneto em escalas pequenas.

Autores: Dr. Thierry Toutin é pesquisador senior do Centro Canadense de Sensoriamento Remoto, Recursos Naturais do Canadá, Ottawa, Ontario, Canadá. E-mail: thierry.toutin@ccrs.nrcan.gc.ca.
Dr. Philip Cheng é cientista senior da PCI Enterprises, Richmond Hill, Ontario, Canadá. E-mail: cheng@pcigeomatics.com.

Este artigo foi publicado na revista Earth Observation Magazine EOM, edição de julho de 2000, páginas 17 a 21.

Mais informações relacionadas ao tema podem ser encontradas nos seguintes endereços:
www.ccrs.nrcan.gc.ca/ccrs/eduref/ref/bibpdf/4807.pdf
www.pcigeomatics.com/news/ikonos_module.htm

Todos os direitos de reprodução: Canada Centre for Remote Sensing.

A tradução foi realizada com a permissão dos autores.
Tradução: Hermani Vieira Threetek Ltda.
E-mail: threetek@threetek.com.br – Tel.: +55 – 21- 524 – 0207