GIS é ferramenta importante para planejamento e controle produtivo do setor, que hoje representa 42% das exportações do País
Responsável por 34% do PIB, 42% das exportações e 37% dos empregos gerados no país, o setor de Agronegócios – no qual se encaixa também o setor Florestal – tem contribuído bastante ao longo dos últimos anos para o crescimento do saldo da balança comercial brasileira. Esse crescimento se deu graças às sólidas políticas de investimento em pesquisa e tecnologia, o que aumentou a produtividade das lavouras, modernizou fábricas e equipamentos de campo e exigiu uma gestão da informação mais eficiente e integrada.
O uso do GIS (Geographic Information System – Sistema de Informações Geográficas) auxilia no planejamento estratégico e controle de toda a cadeia produtiva do agronegócio, apoiando a sustentabilidade econômica, ambiental e social das atividades. O grande desafio é construir uma solução que esteja alinhada com as necessidades de negócio, integrada aos demais sistemas existentes e a um custo que seja compatível com a realidade da organização.
As principais decisões estratégicas do agronegócio exigem uma grande quantidade de informações, que podem ser mais facilmente analisadas com o uso do GIS, tais como: tipo de solo, relevo, clima, hidrografia, restrições ambientais, mão de obra qualificada, mercado consumidor, legislação local, fornecedores de insumos e serviços, locais de estocagem e vias de escoamento da produção. De posse destas informações podem ser realizadas várias análises no GIS para decidir sobre:
– Escolha da cultura a ser implantada;
– Definição de local de plantio;
– Avaliação de compra de terras;
– Incentivo à formação de mão de obra e fornecedores locais (localização de universidades, – centros técnicos, distância em relação aos centros de produção, etc.);
– Investimentos em pesquisa e melhoramento genético;
– Análise de mercado consumidor e estratégia comercial – aplicação de técnicas de Geomarketing;
– Análise de Custos de Produção.
O GIS também pode ajudar na operacionalização do plano estratégico e controle das atividades do dia-a-dia, tais como:
Cadastro e Controle do Uso do Solo: é essencial conhecer em detalhes as áreas da empresa. A localização das áreas de produção, preservação, reservas, recursos hídricos e estradas devem ser acompanhadas das características de cada área, tais como data de plantio, espécie, rotação, tipo de solo, declividade e clima. A partir daí podem ser montados inúmeros mapas temáticos (figura 1) que irão auxiliar na execução e controle operacional. O uso cada vez mais difundido de fotos aéreas e imagens de satélite de alta resolução (figura 2) melhora a qualidade das análises realizadas;
Gestão Patrimonial: Além do controle do uso do solo, é necessário cruzar esses dados com os registros de terras, para que seja possível cumprir todas as condicionantes legais e ambientais referentes às propriedades da empresa. O mapeamento de áreas de preservação permanente e reserva legal é fundamental para manter a sustentabilidade ambiental. A compensação de áreas de reserva legal em uma mesma bacia hidrográfica pode ser mais facilmente explorada no GIS. A localização das áreas próprias e arrendadas também pode ser acompanhada no GIS, fornecendo dados necessários para o planejamento e administração dos contratos, como o pagamento de impostos baseados em valor de área utilizada;
Monitoramento Ambiental: estudos de biodiversidade, controle de pragas e doenças, recuperação de áreas degradadas, formação de corredores ecológicos e monitoramento de incêndios são apenas alguns exemplos do uso do GIS para monitoramento ambiental;
Logística de Escoamento da Produção: Os custos com transporte representam uma parte significativa dos custos de produção. As más condições das estradas são um entrave ao crescimento do setor, portanto é fundamental ter um bom planejamento de transporte. Tudo começa pela demanda de mercado, que gera uma previsão de produção. Para se alcançar as metas estabelecidas é necessário definir uma sequência de colheita, a partir da qual será feita toda a programação de operações de campo. O GIS também pode ser usado para auxiliar o planejamento de manutenção de estradas, alocação de equipamentos e mão de obra.
Figura 1 – Mapa Temático de Uso do Solo
Figura 2 – Imagem de Satélite de Alta Resolução
Manutenção da Base Cartográfica
Para auxiliar o planejamento e tomada de decisão de forma ágil e precisa é necessário manter uma base cartográfica atualizada, integrada e de fácil acesso, conforme mostra a figura 3.
Figura 3 – O processo de manutenção da Base Cartográfica
O processo pode ser dividido em 2 etapas:
Atualização: consiste na coleta de dados (GPS, sensoriamento remoto, Aerofotogrametria, aquisição de bases prontas, etc.) e no processamento e atualização das informações em um banco de dados corporativo. Necessita de especialistas GIS para a execução;
Consulta: consiste no uso da informação previamente cadastrada, preferencialmente com o auxílio de mapas prontos, realizado pelos usuários finais, que não possuem conhecimentos específicos de GIS.
É importante separar o usuário especialista – que conhece de Cartografia, ferramentas GIS, edição de bases cartográficas, GPS e sensoriamento remoto, dentre outras tecnologias – do usuário final, seja do nível operacional ou estratégico. Muitos projetos de geoprocessamento fracassam justamente por não levar em conta esse detalhe, já que os especialistas são minoria na organização.
Para os usuários especialistas, são necessárias ferramentas que agilizem o processamento e atualização da base cartográfica (figura 4), realizando as consistências necessárias e mantendo o rigor cartográfico da base. Uma boa ferramenta de atualização deve possuir algumas das seguintes funcionalidades:
Atualização em Tempo Real: assim que uma atualização é realizada os dados já estão disponíveis para visualização. Isso pode ser implementado com uma base centralizada, conforme será explicado adiante;
Controle de Transações: é importante ter a rastreabilidade de todas as alterações realizadas na base (Quem? Quando? Por quê?) de forma a diminuir a possibilidade de falhas;
Controle de Histórico: Se uma área é atualizada é importante manter o histórico (espacial e atributos), para que seja possível no futuro realizar análises temporais com os dados e verificar tendências, tais como a melhor adubação praticada, o clone mais produtivo, a melhor época para plantio e colheita e a sequência de operações ideal;
Integração Operacional: a informação básica que o GIS fornece para o planejamento operacional é o valor da área disponível para plantio. Se um talhão sofre alteração é necessário reprogramar todas as operações previstas, o que impacta na quantidade de insumos, pessoas e equipamentos necessários. Portanto é importante detectar automaticamente as alterações de áreas, transferir custos de propriedade e produção entre os talhões e atualizar os temas de maior nível no cadastro (glebas, projetos e regionais);
Topologia (restrições espaciais): as ferramentas de topologia permitem manter a integridade espacial da base, garantindo maior precisão aos dados. Tarefas como fechamento de polígonos, verificação de nós redundantes, limites externos coincidentes entre diversos temas, eliminação de pequenos polígonos e sobreposições geradas por imprecisão cartográfica são importantes para se manter a base espacialmente íntegra. Alguns softwares GIS possuem recursos nativos de topologia, já em outros é necessário programar as regras topológicas.
Figura 4 – Ferramenta de Atualização
Para os usuários finais, que em sua maioria não são especialistas GIS, o mais adequado é disponibilizar os mapas num ambiente WEB, com uma interface simples e intuitiva, diminuindo as barreiras existentes. Para a organização o uso de um WebGIS (figura 5) também se traduz em redução de custos com licenças de visualização, pois com uma única instalação é possível atender a toda uma organização. No caso da opção por software livre não é necessário nem a compra da licença, pagando-se apenas os custos de implantação e suporte. Em um ambiente corporativo é interessante implementar uma solução totalmente WEB, sem a necessidade de instalação de plug-ins na máquina do usuário, o que torna a aplicação mais leve e facilita o acesso direto aos mapas, pois de qualquer computador com acesso à internet é possível entrar e consultar o mapa de uma fazenda, por exemplo.
Figura 5 – Exemplos de WebGIS
Outro ponto de destaque no tocante à tecnologia é o uso de um banco de dados geográfico centralizado e único, contrapondo o modelo dual (atributos no banco de dados e informação espacial em arquivos no disco). Dessa forma os seguintes benefícios são alcançados:
Multi-Edição: permite vários usuários atualizando simultaneamente, o que é muito útil se o volume de atualizações é grande e constante;
Melhoria de performance: os bancos de dados contam com poderosos mecanismos de índices e consultas espaciais, o que melhora a performance do ambiente GIS;
Maior facilidade de integração: como os dados estão todos em um mesmo banco de dados é mais fácil integrar informações de diferentes sistemas;
Maior interoperabilidade de ferramentas: o uso de um formato padrão de mercado, como o PostGIS® ou o Oracle Spatial®, permite que se utilize várias ferramentas para acessar uma mesma base, diminuindo o impacto de uma possível troca de ferramentas;
Maior segurança: o banco de dados oferece uma camada de segurança extra em relação ao sistema de arquivos;
Uma tendência de mercado cada vez mais difundida é o uso de ferramentas de processamento no próprio campo, diminuindo o retrabalho de medições com a validação de regras de negócio no momento da coleta de dados, reduzindo assim custos de operação. Já existem coletores de dados equipados com GPS que permitem a criação de aplicativos específicos para esta finalidade. O objetivo é levar a informação do escritório para o campo e devolver essa informação de uma forma mais ágil, contribuindo para manter a base atualizada.
Outra tendência é o uso sistemático de imagens de satélite de alta resolução para fins de monitoramento. O grande limitador nesse aspecto ainda são os custos, mas é provável que nos próximos anos o preço caia bastante e viabilize um uso mais intensivo das imagens. Atualmente o uso maior ainda é para estudos específicos que não necessitam de um mapeamento constante.
Infra-Estrutura
Uma decisão muito importante a ser tomada é qual pacote de ferramentas usar e quais atividades terceirizar no ambiente GIS da organização.
Há alguns anos contavam-se nos dedos as ferramentas GIS existentes no mercado. As ferramentas usavam formatos de armazenamento e linguagens proprietárias, o que dificultava o intercâmbio de dados e o desenvolvimento de aplicativos personalizados. Hoje a realidade é totalmente diferente. Existe uma grande variedade de opções disponíveis, tanto ferramentas free quanto ferramentas pagas. Fatores como suporte, documentação, integração com outras plataformas, preferência dos usuários, facilidade de customização e existência de fornecedores qualificados devem ser levados em conta na decisão de qual ferramenta usar.
Para os desenvolvedores de soluções, desenvolver um sistema de informação tradicional ou um sistema de informação geográfica está cada dia mais parecido, pois as ferramentas de desenvolvimento – linguagens de programação e bancos de dados – são as mesmas, o que aumenta a produtividade e reduz custos de desenvolvimento de uma solução, permitindo focar nas necessidades específicas de cada negócio.
Outra barreira que existia antigamente e que está sendo eliminada é a dificuldade em encontrar fornecedores qualificados. A quantidade de empresas especialistas em GIS está crescendo bastante, o que abre portas para a terceirização dos serviços. Porém, o GIS isolado não agrega valor algum, é necessário dominar o negócio do cliente para que a solução esteja alinhada com as necessidades da organização. Mais especificamente no agronegócio, é importante conhecer em detalhes todas as etapas do processo produtivo – produção de mudas e sementes, plantio, manejo, colheita e transporte – e a interação entre elas, para que seja possível desenvolver soluções GIS que realmente se adaptem aos anseios da organização, cada qual com sua cultura, processos e dinâmicas próprias.
As opções de infra-estrutura são as mais variadas possíveis. Empresas de médio e grande porte têm condições de investir em servidores de aplicativos e bancos de dados próprios e adquirir licenças de ferramentas de mercado. Se a empresa possuir uma área própria de cartografia os serviços podem ser terceirizados parcialmente (desenvolvimento de aplicações e coleta de dados) ou até mesmo na sua totalidade (toda a manutenção da base terceirizada, permitindo a empresa focar nas atividades produtivas).
Já empresas menores ou mesmo cooperativas de produtores podem dividir custos de infra-estrutura e optar pela modalidade de aluguel de software, tendência de mercado em várias áreas, na qual se paga uma pequena mensalidade por um serviço que inclui toda a coleta de dados, processamento e atualização das informações e disponibilização de um link para consultas e análises aos dados via WEB. Ganha-se tempo e não se perde o foco do negócio, tudo a um preço que seja acessível. A tecnologia WEB facilita a disseminação do conhecimento geográfico e também aponta a tendência para os próximos anos.
Um caso de sucesso
Um exemplo de empresa do setor florestal cujo uso do GIS é bastante difundido é a Aracruz Celulose (www.aracruz.com.br). Líder mundial na produção na produção de celulose branqueada de eucalipto, a Aracruz investe pesado em geotecnologias, pois sabe que os benefícios são grandes. Afinal, gerenciar aproximadamente 400 mil hectares de florestas próprias e arrendadas espalhadas por quatro estados (ES, BA, MG e RS) sem o auxílio do GIS seria praticamente inviável.
As geotecnologias auxiliam todo o planejamento de longo, médio e curto prazo na empresa. As operações de campo são acompanhadas com mapas. O SIF (Sistema de Informações Florestais) é um sistema de gestão que controla todo o processo de produção e suprimento de madeira nos níveis estratégico e operacional, totalmente integrado com o SAP R/3®, software de gestão empresarial adotado pela Aracruz. No SAP estão as informações dos fornecedores, contratos, pagamentos, materiais, imobilizado florestal e indicadores gerenciais. Toda a informação do sistema pode ser visualizada espacialmente, pois o GIS está integrado em um único banco de dados. A preservação ambiental é prioridade, os projetos de reflorestamento são analisados no GIS para que seja mantido o equilíbro ambiental após a implantação e o manejo das florestas é amparado nos mais variados produtos cartográficos, tais como mapas, imagens de satélite e modelos digitais de terreno.
A área de cartografia conta com ferramentas personalizadas de edição e manutenção da base cartográfica, o que torna a atualização dos dados bastante ágil, aumentando o tempo disponível para análises. As ferramentas de atualização rodam dentro do ArcInfo®. Os usuários finais podem visualizar os dados em um portal de mapas totalmente WEB, desenvolvido com a tecnologia ArcIMS® e a plataforma de desenvolvimento Microsoft .NET®.
O pacote de aplicativos GIS escolhido foi o ArcGIS® (ArcGIS Desktop, ArcSDE e ArcIMS), com a base de dados totalmente dentro do banco Oracle 9i®. Os usuários especialistas acessam um servidor de aplicativos com o uso do Citrix Metaframe®, uma espécie de emulador de terminal que coloca o usuário "dentro" da área de trabalho do servidor, o que facilita a manutenção da rede e atualização das aplicações, pois os softwares são instalados no servidor e não na máquina no usuário.
Os resultados obtidos com a implantação do geoprocessamento são animadores. Segundo o coordenador de cadastro e cartografia, Marcelo Antunes Araújo, "hoje podemos afirmar que, sem um GIS estruturado da forma que temos aqui, o planejamento e o acompanhamento das atividades operacionais seria quase inviável. Devido à grande extensão da nossa base territorial, diversidade de ambientes e condições de trabalho, o uso de geotecnologias é constante em nossa atividade. E isso acontece de uma maneira quase invisível ao usuário final, quel tem acesso fácil e rápido às ferramentas simples e úteis na sua rotina de trabalho. Outro aspecto importante é o trabalho do próprio laboratório de GIS, que foi bastante facilitado em função do uso das tecnologias disponíveis, possibilitando a administração da base cadastral de forma simples e rápida com os aplicativos desenvolvidos, possibilitando à equipe uma dedicação maior em estudos internos que necessitam de tecnologia de geoprocessamento e desenvolvimento de novos procedimentos que possibilitem a otimização de recursos florestais através do uso do GIS".
Conclusão
Apesar da importância, o setor de agronegócios como um todo ainda não usa todo o potencial que a tecnologia GIS pode oferecer. Hoje podemos encontrar colheitadeiras que são monitoradas por satélite, o uso de imagens de satélite e de modelos de estimativa de safra sendo utilizados pela iniciativa privada, mas isso não é uma regra geral.
Com o barateamento dos custos espera-se que em médio prazo seja possível ter total controle de toda a cadeia produtiva do agronegócio no país, incluindo mapeamento de infra-estrutura e logística de distribuição integrada. Essa gestão em escala global, tendo como parceiros instituições públicas e privadas, evitaria uma série de transtornos que são comuns atualmente, como filas quilométricas de caminhões esperando a vez para descarregar a produção, ou ainda os desperdícios financeiros com gasto de combustível e de manutenção de máquinas e equipamentos mal posicionados no período de colheita.
As soluções ora discutidas são um caminho inevitável nesse processo, cabendo tão somente a tomada de decisão favorável à escolha das tecnologias disponíveis. Esse direcionamento pode ser o fator chave para manter o Brasil na linha de frente no setor de exportação dos produtos envolvidos na atividade.
Rodrigo Tomasi de Castro
Gerente de Projetos Florestais / GIS
rodrigo.tomasi@inflor.com.br
Luiz Amadeu Coutinho
Geógrafo e Especialista GIS
luiz.amadeu@inflor.com.br
Mais Informações: www.inflor.com.br