Por Silvana Phillipi Camboim

Os mundos das IDEs e da GeoWeb são dois assuntos em franca ascensão e com fronteiras cada vez menos definidas entre si. Com a adoção, anunciada no último dia 15 de abril, do padrão KML, inicialmente difundido pelo Google Earth, pelo Consórcio Geoespacial Aberto (OGC, na sigla em inglês), começa uma nova era de união entre os padrões de mercado de massa, adotados e difundidos voluntariamente via web ao redor do mundo, e os padrões mais formais, amplamente discutidos e testados.

Representando o território espinhoso de articulações multilaterais, governamentais e financeiras, aconteceu nos dias 25 a 29 fevereiro de 2008, em Trinidad e Tobago, a 10ª Conferência da Associação para Infraestrutura Global de Dados Espaciais (GSDI, na sigla em inglês). O tema escolhido foi “Perspectivas de Pequenas Ilhas nos Desafios Globais: O Papel dos Dados Espaciais no Suporte a um Futuro Sustentável”, enfocando, além de questões tecnológicas, principalmente assuntos como desenvolvimento sustentável, redução de pobreza e a questão da posse de terras. Todos os artigos, em inglês, estão disponíveis no site www.gsdi.org/gsdiconfproceedings/gsdi-9.asp.

Já em julho, de 21 a 25, é a vez de acontecer em Vancouver, Canadá, a reunião da parte tecnológica do problema, com o tema “Infraestrutura: do Local para o Global”. É a GeoWeb 2008, organizada pela Galdos Systems com apoio de uma série de empresas, além da Gita, e com foco exclusivo, segundo o site do evento (http://geowebconference.org), na convergência de GIS e da internet, e no potencial econômico associado com a convergência do XML, web services e GIS.

Muitos temas, em ambos os eventos, são coincidentes, como a ação em resposta a desastres, as informações ligadas ao meio ambiente e a gestão municipal, mas cada um com sua abordagem específica. O fascinante é que hoje não se pensa em Infraestrutura de Dados Espaciais sem pensar também no meio auto-regulamentado, extremante dinâmico e até aparentemente anárquico, pelo menos para os outsiders, da geoinformação na web.

Analisando a GSDI 10 em seu blog (www.edparsons.com), Ed Parson, Tecnólogo Geospacial da Google, constata: “Apesar de eu ter apresentado o potencial de busca GeoWeb (veja http://code.google.com/apis/kml/documentation/kmlSearch.html) como um novo desenvolvimento tecnológico que é relevante para a criação de IDEs, praticamente todos concordam que os desafios tecnológicos são os mais solúveis, e que as questões organizacionais que restringem o compartilhamento de dados geográficos, e a complexidade e conseqüentemente o custo de desenvolver IDEs nacionais e racionais, são o que está limitando o progresso”.

Um resumo dessa convergência entre GeoWeb e IDEs está nesta frase do artigo de Justin Deoliveira, do The Open Planning Project (responsáveis pelo GeoServer): “Tecnologias e inovações em ebulição ao redor da emergente GeoWeb fazem do mundo do GeoEspacial um lugar excitante. Mas é importante não perder de vista o que é importante. Não importa o quão boa a tecnologia fique, não há substituto para bons dados. São dados de alta qualidade que fazem mapas de alta qualidade, não as ferramentas. É por essa razão que as iniciativas de IDEs são de importância crucial para criar uma verdadeira rede de informação geoespacial”.

GSDI10: Soluções em Infraestrutura de Dados Espaciais

Muitos aspectos de experiências de IDEs ao redor do mundo foram apresentados: metodologias foram propostas para comparação do estado de desenvolvimento entre Regiões (Caribe, Europa, etc.), como também para avaliação de performance de SDIs locais (a cidade de Fredericton, no Canadá, foi usada como exemplo), ou para comparação entre GeoPortais em diversos países, para estabelecer parâmetros de avaliação dos resultados obtidos. Vários outros países mostraram suas infraestruturas já em operação, como Taiwan, Austrália e Holanda. Do Canadá, foi colocada a utilização de ferramentas de gerenciamento de projetos, modelo de governança e outros conceitos de gestão aplicados para a IDE. Já a Noruega apresentou uma interessante comparação entre a implementação das IDEs de forma voluntária e de forma jurídica. Isso reflete um momento em que, depois de 12 anos da primeira GSDI, muitas organizações já têm trajetória suficiente para avaliar e repensar o futuro das suas IDEs.

Dos exemplos nacionais apresentados, a Colômbia se destaca novamente como uma das IDEs mais avançadas na América Latina, capitaneada pelo Instituto Geográfico Agustin Codazzi. No momento, já apresenta resultados como padrão nacional de metadados instituído, com mais 130 mil metadados cadastrados, ampla estrutura de treinamento no tema, com disciplinas incluídas nos cursos de pós-graduação e treinamentos descentralizados nas prefeituras, e também um portal de e-learning. A Colômbia também engrossou o coro do open source como parte vital para sua IDE, ao lado dos padrões OGC.

Outro caso de sucesso na América Latina é a IDE de Cuba, que já apresenta estudos avançados de interoperabilidade semântica, apresentada por Tatiana Delgado e José Luis Capote Fernández, que afirmam que a próxima geração das IDEs deverá ser orientada por semântica, de modo a trabalhar com os requisitos e linguagem dos usuários no nível máximo possível. Cada vez a fronteira entre o usuário e o produtor dos mapas fica menos definida, uma vez que é crescente a participação dos usuários no processo de criação dos mapas.

Outros destaques:

IDEs temáticas, como de Informações Marinhas, com dados batimétricos, marés, etc.. Outro tema em voga é a prevenção e resposta a desastres (exemplos da Malásia, Nigéria, Andes, Sri Lanka);

Força cada vez maior na Participação dos Usuários e gestão do conhecimento (como o exemplo de Navarra, Espanha);

A apresentação brasileira, feita pelo presidente do Inpe, Gilberto Câmara, como um dos participantes especiais do evento, foi sobre a gratuidade dos dados espaciais em escala global. Usando o bem sucedido modelo de distribuição das imagens Cbers, Câmara reforçou a idéia de que a demanda ambiental por dados de sensoriamento remoto é muito grande, e que quanto mais utilizados forem os dados, maiores os benefícios do investimento nos sensores e melhor o conhecimento do planeta como um todo;

Metadados: Dessa vez o relato vem da Jamaica (rodamos o mundo todo e lá estão os mesmos problemas). A informação sobre os dados (os metadados) são vitais para as IDEs, mas geralmente são um trabalho cansativo e pouco perceptível como importante para as organizações. Em 2006, foi lançada no país uma série de 13 especificações para metadados. No entanto, descobriu-se que, de 34 instituições, somente 14 aplicaram as recomendações. Dentre os problemas citados estava a falta de pessoal, a falta de acesso aos dados para criar os metadados e a visão destes como um processo separado na criação e manutenção dos dados em si.

Perspectivas: SDI 3D, GeoWeb e GSDI 11

Dentre as inúmeras perspectivas tecnológicas traçadas no evento, destaca-se o delineamento dos chamados SDI 3D, para atender a crescente demanda por padrões de metadados tridimensionais, de roteamento 3D, entre outros. Várias publicações e exemplos open source podem ser encontrados em www.gdi-3d.de, da Universidade de Bonn, que se propõem a trabalhar com modelos de cidades em 3D, interoperáveis e orientados a serviços.

Vários palestrantes especiais se empenharam em traçar o futuro para as IDEs. Entre eles, o Cientista Chefe da Esri, Dr. David Maguire, que afirmou: “novos avanços em tecnologia GIS distribuída estão proporcionando novas oportunidades de compartilhar informação geográfica e criar comunidades. Avanços em gerenciamento de dados espaciais, computação baseada em serviços e disseminação baseada na web são especialmente importantes. Estes avanços estão permitindo a uma nova geração de usuários provar o poder da geografia pela primeira vez”.

A próxima GSDI acontecerá em Rotterdam, Holanda, em junho de 2009, com o tema “Convergência das Infraestruturas de Dados Espaciais a Nível Global: Aproximando IDEs na Europa, América, Ásia e Pacífico e África”. Portanto, a ênfase vai ser dada para a construção da IDE Global com base na convergência das diversas IDEs existentes. Esperamos que, até lá, a nossa INDE brasileira já esteja oficialmente em operação, para podermos também fazer parte dessa criação.

Silvana Phillipi Camboim é engenheira cartógrafa e diretora da Geoplus Geotecnologia e Informática
silvana@geoplus.com.br