Por Alessandro Diniz

O emprego da informação espacial na gestão pública e seus benefícios não são novidade. Assim como vem acontecendo com outros sistemas de informações gerenciais, os Sistemas de Informações Geográficas (GIS, na sigla em inglês) vêm recebendo especial atenção dos gestores públicos. A novidade, que já nem é mais tão novidade assim, é a forma como esses sistemas são organizados, resultando no aumento significativo da compreensão do todo, seja em abrangência ou em profundidade.

Como um mecanismo vivo e complexo, nosso planeta precisa ser estratificado e analisado sob diferentes perspectivas para ser mais bem compreendido. Imagine que cada GIS implementado por uma comunidade, seja ela pública ou privada, tenha por função detalhar ao máximo a geografia, sob sua perspectiva de interesse. Agora imagine a união ordenada desses sistemas. O resultado é o detalhamento das atividades humanas, sobre uma rica “maquete virtual” onde as informações existem de forma contínua, assim como é o espaço geográfico.

A articulação desses sistemas em portais geográficos, e a utilização do conhecimento resultante pelas diferentes esferas do governo, é o tema central deste artigo, mas antes de tratar do assunto em si, proponho passarmos por alguns conceitos.

O que são portais geográficos?

Diferentemente de um portal de conteúdo, como os sites populares de internet, um portal geográfico reúne não apenas dados, mas também aplicações e serviços, que definem a forma como os dados serão acessados e transformados em informação. Um portal geográfico, ou uma Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE), como também é conhecido, tem por objetivo justamente isso: promover o acesso facilitado às informações espaciais. Para compreender melhor um portal geográfico, vamos decompô-lo em três fatores essenciais.

Política e cultura colaborativas: a elaboração de um portal geográfico, na iniciativa pública ou privada, é uma decisão estratégica. Sobretudo na administração pública, onde as vaidades individuais se sobressaem com freqüência às necessidades comuns, esses acordos costumam ser difíceis e restritivos. Os acordos definem as responsabilidades de cada participante, bem como as formas de intercâmbio e os aspectos que dizem respeito à qualidade dos dados.

Padrões (interoperabilidade): os padrões exercem um importante papel na elaboração de um portal geográfico, e embora muitos associem padronização à plataforma tecnológica, o assunto é bem mais amplo. A padronização acontece quando os participantes estabelecem uma forma comum de realizar as atividades em torno de um propósito. Se esse propósito é a elaboração de um portal geográfico, a padronização deve contemplar a estrutura de captura, armazenamento, atualização e distribuição dos dados espaciais.

Tecnologia: ao contrário do que se pode imaginar, esta talvez seja a parte mais bem resolvida entre os três fatores. Especialmente em nosso tempo, a tecnologia da informação se apresenta rica em recursos e favorece a implementação de sistemas distribuídos com segurança, confiabilidade e desempenho cada vez mais adequados.

A evolução dos portais geográficos

Desde sempre, os portais geográficos tiveram como objetivo a distribuição ordenada de dados espaciais. Ao longo dos anos, a tecnologia da informação exerceu grande influência na arquitetura dos portais geográficos. A Figura 1 apresenta a evolução dos portais geográficos no tempo, e mostra como a arquitetura e o foco se modificaram com o passar dos anos.

Evolução dos geoportais
Figura 1 – Evolução dos portais geográficos no tempo

A anatomia dos portais geográficos

Os portais geográficos, em especial os mais recentes, funcionam em modelo distribuído, como a Web. A figura abaixo ilustra o arranjo entre os três componentes de um portal.

Componentes de um geoportal

Catálogo de metadados: contém a descrição de conteúdo colocado à disposição pelos publicadores. Funcionam como índices em uma grande e diversificada biblioteca. Antes de acessar o conteúdo, o usuário se dedica a encontrá-lo. Os catálogos de metadados contêm informações que orientam as buscas por conteúdo.

Usuários GIS: os usuários podem atuar como consumidores ou publicadores de conteúdo geográfico.

Conteúdo: são os dados, as aplicações e os serviços elaborados e colocados à disposição da comunidade por meio do portal geográfico. O modelo de distribuição varia conforme os objetivos e a natureza da existência do portal. Mesmo em um portal promovido pelo governo, é possível ter conteúdo disponível somente mediante pagamento.

Dados geográficos: podem ser visualizados diretamente no portal ou baixados como arquivos, se estiverem online. Os dados também podem estar offline. Nesses casos, o usuário interessado obtém as informações de contato do publicador, para então solicitá-los. Exemplos: eixos de logradouros do município de São Paulo, escolas da rede pública do Estado e outros.

Aplicações: além dos mecanismos de busca, são também ferramentas disponíveis no próprio portal, que servem para que o usuário manipule os dados e os transforme em algum tipo de informação de interesse. Exemplos: visualizador com recursos de navegação, roteirização e outras análises espaciais.

Serviços: trata-se de um conceito mais recente, especialmente quando aplicado a GIS. Um sistema cuja arquitetura é orientada a serviços expõe seu conteúdo, por meio de serviços pré-definidos e documentados. Uma interface de acesso é criada no sistema de acesso, a partir dessa documentação. Exemplos: uma aplicação em um servidor do Estado solicita um dado espacial a um portal geográfico situado no município.

Portais geográficos na administração pública

A utilização da informação espacial na gestão pública é afetada diretamente pelas dificuldades na obtenção, armazenamento e manutenção dos mapeamentos cartográficos, mas ao invés de explorar comercialmente esses mapeamentos, junto às empresas privadas, de modo a financiar sua contínua atualização, o governo aprova leis que proíbem ou restringem a utilização desses dados para fins privados.

Como resultado, empresas como as concessionárias de serviços públicos se vêem obrigadas a investir na produção de suas próprias bases cartográficas, o fazem dentro de suas possibilidades e, sobretudo, de acordo com seus interesses.

Nesse modelo, no qual governo e iniciativa privada trabalham de forma isolada, não é difícil concluir que o indivíduo paga pelo mapeamento duas vezes: como cidadão e como consumidor. Isso só para mencionar um dos problemas decorrentes da falta de uma política de intercâmbio e uso compartilhado dos dados espaciais.

Um portal geográfico deve se orientar pelos mesmos princípios do governo eletrônico, e deve estar preparado para atender às necessidades de relacionamento entre cidadão e governo, entre empresa privada e governo e entre governo e governo.

Por exemplo, uma empresa que necessite de um dado já levantado pela prefeitura de um município deveria poder comprá-lo a um custo mais baixo, para download, ou ainda utilizá-lo como um serviço. Em ambos os casos, o portal geográfico seria o meio para a descoberta de que aquele dado existe e atende às suas necessidades. O valor recebido poderia ser usado na manutenção do dado.

Dentro do próprio governo, na mesma esfera ou entre esferas distintas, por quantas vezes o mesmo dado foi produzido mais de uma vez, sob contratos diferentes?

Compartilhamendo de informações entre departamentos

O compartilhamento entre departamentos de um mesmo município possibilita o desenvolvimento de aplicações corporativas. Como resultado, o tempo de retorno do investimento, feito com a aquisição dos dados, é reduzido e as decisões referentes ao espaço são tomadas com base no mesmo contexto.

Na relação entre governo e cidadão, os portais geográficos permitem possibilidades interessantes, como nos processos de matrícula escolar, que consideram a localização geográfica como critério na distribuição de vagas, elaborado pela Secretaria de Educação da cidade de Boston, nos Estados Unidos; ou ainda no sistema desenvolvido pelo município de Vila Nova de Gaia, em Portugal, que permite ao cidadão realizar um pedido para liberação do alvará de construção pela Web, sabendo quais serão os critérios de avaliação.

Como temos visto, são inúmeras as possibilidades de aplicação dos portais geográficos na gestão pública. Entretanto, a geração de indicadores de satisfação tem surgido como uma das mais criativas e também a que dá maior poder ao munícipe.

Nesse tipo de aplicação, em geral, a prefeitura abre uma linha de comunicação com o cidadão, que pode localizar suas queixas no mapa e fazer uma avaliação do governo, com face às necessidades do local onde ele vive. Dessa forma, é possível ao gestor público avaliar o seu desempenho e orientar quais os tipos de melhorias esperadas em cada região de sua cidade. ¦

Alessandro DinizAlessandro Diniz
Arquiteto de soluções da Imagem – Soluções de Inteligência Geográfica
Administrador de empresas pela Unip
Pós-graduado em tecnologia da informação pela Fiap
asdiniz@img.com.br