Hoje, grande parcela dos municípios brasileiros, principalmente os de pequeno e médio porte, possui grandes dificuldades em promover a justiça tributária através de seus impostos municipais, como um de seus principais, o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU).

Além da questão tributária, nota-se também a presença de deficiências em outras áreas do Cadastro Técnico Multifinalitário (CTMF), como no planejamento e manutenção do sistema viário, na administração da forma de uso e ocupação das parcelas territoriais e nas secretarias e setores responsáveis, principalmente pela educação, saúde e segurança pública.

No Brasil, há uma grande parcela de municípios com menos de 20 mil habitantes. Conforme o IBGE, dos 5.564 municípios do Brasil, aproximadamente 72% têm população igual ou menor a este número, podendo ser observado que a maioria deles não possui recursos suficientes para arcar com o alto investimento de um CTMF.

Desses municípios, muitos não possuem seu CTMF realizado e, dos que já efetuaram tal tarefa, geralmente apresentam suas bases de dados cadastrais desorganizadas, desatualizadas e muitas vezes em formato analógico, sejam os dados alfanuméricos ou espaciais.

Para que problemas como esses, além de outros, sejam solucionados, é necessária a realização de uma informatização cadastral, realizada de maneira bem planejada, podendo-se notar que em diversos trabalhos cadastrais há utilização de sistemas de informação para entrada e saída de dados, para realização de cálculos, consultas, etc.. Esses sistemas deveriam ser elaborados com um projeto de modelagem conceitual de banco de dados, para assegurar ao sistema a possibilidade de alteração, considerando-se o dinamismo das cidades e a reutilização desses sistemas com maior facilidade em cadastros de municípios diferentes.

Sabe-se que, em um trabalho de cadastramento municipal, são comumente utilizados formulários ou Boletins de Cadastro Imobiliário (BCI), que são elaborados de modo a gerarem inconsistências quanto ao banco de dados e normalmente direcionam ao levantamento de informações redundantes, proporcionando mais chances de se cometer erros grosseiros e sistemáticos.

Os municípios sofrem com os prejuízos gerados por esse tipo de problema, que poderia ser reduzido ou totalmente evitado através da implantação de boletins adequados aos objetivos do CTMF, possibilitando assim a utilização correta dos atributos a serem observados e inseridos no sistema.

Na dissertação de mestrado “Modelagem Conceitual de Bancos de Dados Geográficos para Cadastro Técnico Multifinalitário em Municípios de Pequeno e Médio Porte” é apresentada uma proposta de alteração para corrigir e otimizar a forma de coleta de informações para o CTMF. O método busca a redução de custos operacionais e a eliminação de redundâncias e incompatibilidades com o banco de dados que irá gerenciar e organizar essas informações, a fim de sugerir modelos de boletins que sejam compatíveis tanto com o banco quanto ao sistema de inserção desses, preocupando-se principalmente com as informações necessárias aos municípios de pequeno e médio porte.

Esses equívocos acarretam no levantamento de informações redundantes, que encarecem a implantação do levantamento cadastral, podendo até inviabilizá-lo, como acontece quando há coleta de dados anteriormente levantados, produzindo inconsistências aos sistemas de banco de dados implantados.

A reutilização desses boletins por empresas, em diferentes prefeituras, proporciona a reprodução de dados que não serão necessariamente utilizados, tornando-se outro fator gerador de redundâncias.

No trabalho foram analisados e apresentados diversos modelos de BCI, nos quais todos mostram as mesmas falhas, destacando-se as principais como: “Localização do Imóvel”; “Informações sobre o Proprietário”; “Informações sobre o Terreno” e “Informações sobre o Logradouro”.

Em todas as situações analisadas, os BCIs continham todos esses campos citados, o que provoca a coleta dessas informações para cada imóvel ou unidade cadastral. É aí que se encontram os equívocos, já que dessa forma o levantamento dos dados se torna repetitivo e redundante, acarretando em sérias inconsistências nas consultas e atualizações do banco de dados.

Por exemplo, ao se levantar informações sobre a localização do imóvel, para cada um se estará coletando dados sobre seu endereço, ou seja, sobre seu logradouro, significando que para o imóvel vizinho, caso esse encontre-se na mesma seção de logradouro, as informações sobre essa seção serão levantadas novamente, e assim sucessivamente para todos os imóveis da rua, como pode ser ilustrado na figura 1.

Figura 1
Figura 1 – Parte de uma rua com seus respectivos imóveis

No caso da Rua A, todos os imóveis apresentados resultarão no preenchimento de seu BCI, onde constam informações como localização.

Um exemplo de equívoco cometido em uma situação como esta é o preenchimento diferente sobre informações da mesma rua, ocasionando inconsistências na consulta. Ou então, quando for feita a atualização de tal cadastro, deveria ser renovado diversas vezes o mesmo logradouro para cada imóvel, caso o nome do mesmo seja alterado, prescrevendo, além dos problemas citados, a necessidade de levantamento dos dados diversas vezes. Isso causa mais tempo para o levantamento, gerando aumento nos custos do cadastro.

Para o caso do proprietário, se por exemplo o “Sr. Fulano da Silva” possuir um imóvel na Rua A, outro na Rua B e outro na Rua C, ele será cadastrado três vezes, podendo ser cadastrado em um dos casos como “Sr. Fulano Silva” ou “Sr. Fullano da Silva”, dentre outros erros possíveis, além da inconveniência de se cadastrar um mesmo proprietário mais de uma vez.

Sobre as informações de terreno ou lote, essas também sofrem os mesmos problemas, já que se for considerado um edifício com cinco apartamentos, por exemplo, sendo um por andar, então todos terão as mesmas informações sobre o terreno onde estão localizados, pois o lote será o mesmo para todos (figura 2), gerando mais redundância e possíveis inconsistências.

Figura 2
Figura 2 – Edifício com diversos apartamentos, todos no mesmo lote

O mesmo pode acontecer para o caso das informações sobre logradouro, já que nos BCI não constam informações separadas para cada seção de logradouro, podendo essas diferenciarem-se umas das outras.

O problema faz com que o tempo gasto pelos agentes cadastradores seja maior, o número de informações repetidas cresça, podendo ter o preenchimento diferente para evidenciar a mesma informação, resultando em mais falhas.

Além de todas essas informações contidas nos boletins, normalmente existentes e utilizados, deve-se pensar também na falta de informações sobre dados referentes às demais finalidades de um CTMF, como por exemplo a educação básica, a saúde e a segurança pública, dentre muitos outros que fazem parte do sistema urbano de qualquer município.

A proposta é que seja feito um redirecionamento para a utilização dos boletins cadastrais, como sua divisão e especialização em novos modelos, buscando evitar a ocorrência dessa coleta de informações desnecessárias e repetidas, para que não aconteçam falhas de inconsistência no banco de dados a ser implantado.

Essas novas sugestões para os boletins significam uma tentativa de aperfeiçoar o processo de coleta de dados no CTMF, buscando-se facilitar o emprego de uma nova logística para a execução de levantamento e coleta de dados em campo.

A especialização pode acontecer de diversas maneiras. Porém, para que os problemas acima detectados sejam melhor solucionados, é necessário que exista um boletim especializado para cada uma das grandes finalidades do CTMF, como os logradouros, proprietários, terrenos e unidades cadastrais, além de uma possível ligação desses com as demais finalidades do cadastro, como a educação, saúde e segurança.

A figura 3 apresenta uma organização da proposta de como devem ser especializados e divididos os novos boletins de levantamento de dados cadastrais, a fim de evitar essas falhas comuns.

Figura 3
Figura 3 – Proposta de especialização dos boletins para coleta de dados cadastrais

Para evitar certos transtornos que são comumente encontrados quando o analista de sistemas ou o programador enfrentam ao se deparar com os BCIs, que trazem inúmeras informações prejudiciais ao bom funcionamento do trabalho, é que se preza o acompanhamento da produção desses boletins, juntamente com a modelagem conceitual do banco de dados.

Essa fase é extremamente importante, pois é nela que será garantida a consistência do sistema, evitando-se assim os erros que de praxe costumam inutilizar grande parcela dos sistemas cadastrais. Na dissertação foi modelado conceitualmente um banco de dados geográficos, onde é apresentada toda a fase de modelagem, podendo também ser observadas as sugestões para os novos boletins, assim como a interface do sistema responsável pela entrada desses dados cadastrais, além do processo de logística para execução do levantamento de campo.

No trabalho, buscou-se apresentar as falhas mais comumente cometidas e assim reformular o modo com que são adquiridas, a fim de aperfeiçoar a coleta dos dados referentes ao CTMF, tentando minimizar a distância existente entre o setor de informática, referente às análises de sistemas gerados para armazenar e organizar os dados; e o setor de engenharia, referente ao cadastro técnico como instrumento de promoção do processo de tomada de decisões da administração pública.

Acredita-se que, a partir dos resultados obtidos com o trabalho e apresentados em maiores detalhes na dissertação, torna-se mais viável a possibilidade de atualizações constantes dos dados cadastrais, já que a eliminação na duplicidade de informações facilita essa tarefa e torna o banco de dados mais consistente, o que possibilita um desenvolvimento mais acelerado ao município.

Rômulo Parma Gonçalves
Engenheiro agrimensor
M.Sc. em informações espaciais
Professor do departamento de engenharia civil
Universidade Federal de Viçosa
goncalvesrp@ufv.br

Referência Principal

Gonçalves, R. P. Modelagem Conceitual de Bancos de Dados Geográficos para Cadastro Técnico Multifinalitário em Municípios de Pequeno e Médio Porte. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (Área de concentração: Informações Espaciais), Universidade Federal de Viçosa, Viçosa – MG. 2008.

Artigos Relacionados

Gonçalves, R. P. et al. Proposta para coleta eficiente de dados para o Cadastro Técnico Multifinalitário. II SIMGEO (II Simpósio Brasileiro de Ciências Geodésicas e Tecnologias da Geoinformação), Recife – PE. 2008.

Gonçalves, R. P. et al. Coleta eficiente de informações para o Cadastro Técnico Multifinalitário. COBRAC (Congresso Brasileiro de Cadastro Técnico Multifinalitário e Gestão Territorial), Florianópolis – SC. 2008.