Novos rumos para o georreferenciamento de imóveis rurais no Brasil

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), juntamente com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), aprovaram recentemente documentos importantes que definirão os novos rumos do georreferenciamento de imóveis rurais no país. Dentre eles estão a Portaria Nº 486, a Instrução Normativa Nº 77 e a Norma de Execução Nº 107, construídos com o principal propósito de modernizar as ações de certificação de imóveis rurais, que serão processadas pelo Sistema de Gestão Fundiária (Sigef). Todos os normativos passarão a vigorar a partir do dia 23 de novembro deste ano. Até lá, o sistema estará disponível para ambientação com a nova sistemática de trabalho.

Portaria 486

Esta Portaria homologa os novos normativos para execução dos serviços de georreferenciamento de imóveis rurais, que foram reestruturados e divididos em:

• Norma técnica para Georreferenciamento de Imóveis Rurais 3ª Edição, que aborda os conceitos e princípios fundamentais para a realização
dos serviços;

• Manual Técnico de Limites e Confrontações, que define qual objeto deve ser medido e qual a forma de identificá-lo; e

• Manual Técnico de Posicionamento, que estabelece a forma de como medir o objeto e referenciar o levantamento ao Sistema Geodésico Brasileiro.
As alterações em relação à 2ª Edição da Norma foram realizadas com o propósito de tornar o processo mais célere, com menor custo, sem prejuízo da qualidade final do produto.

Não se exige mais a elaboração de um conjunto de documentos e peças técnicas, hoje apresentados para fins de certificação. O processo, totalmente eletrônico, passa a ser operado via Sigef. A partir de 23 de novembro o único documento a ser apresentado será uma planilha eletrônica no formato Open Document Sheet (ODS – documento de planilha aberto), segundo o padrão Open Document Format (ODF – formato de documento aberto). O uso da planilha ODS é homologado para o aplicativo Calc, contido no pacote LibreOffice, o que atende à política do Governo Federal de utilização de software livre e aos Padrões de Interoperabilidade do Governo Eletrônico (e-Ping). Este modelo diminuirá drasticamente o trabalho de preparação de peças técnicas, requerimentos e outros documentos apresentados hoje, tanto em meio analógico quanto digital.

Outro avanço importante está na definição do objeto a ser considerado para o georreferenciamento e a certificação, que agora passa a adotar o conceito de imóvel rural contido na Lei de Registros Públicos. Isso aproxima os procedimentos de certificação com o registro de imóveis. Com esta medida, o proprietário rural fica desobrigado a georreferenciar todas as suas matriculas, para o caso de matrículas vizinhas, permitindo a certificação de apenas uma, quando for de seu interesse.

Apesar de não exigir a apresentação de nenhuma peça técnica, estes normativos indicam a necessidade da guarda das informações que geraram a planilha e a consequente certificação, enfatizando a responsabilidade técnica da produção
dessas informações.

Norma de Execução 107

Esta importante Norma homologa o Manual para Gestão da Certificação de Imóveis Rurais, que estabelece os procedimentos a serem realizados pelo Incra para promover a gestão da certificação. Padroniza os critérios técnicos e os procedimentos administrativos, garantindo impessoalidade ao processo de Cerificação, uma vez que determina a unicidade das ações de todos os Comitês Regionais. Este manual está voltado exclusivamente para os servidores do Incra, que estarão envolvidos nas verificações dos requerimentos de análise de sobreposição, desmembramento, remembramento, retificação e cancelamento de parcelas certificadas. Deve-se salientar que todas as ações previstas no Manual serão operadas via Sigef e poderão ser acompanhadas, a qualquer momento, por qualquer cidadão, independentemente se é ou não parte
do processo.

O Incra, preocupado com a qualidade dos dados produzidos pelo processo de Certificação, determinou que fosse incluído neste manual um capítulo específico para sanções administrativas cabíveis nos casos comprovados de imperícia, negligência ou má fé nos serviços de georreferenciamento relativos à certificação e na abertura indevida de requerimentos. O objetivo dessas sanções não é penalizar os profissionais credenciados, mas sim coibir o mau uso das atribuições técnicas frente aos novos recursos disponíveis para a Certificação.

Instrução Normativa Nº 77

Esta instrução regulamenta os procedimentos de Certificação de imóveis rurais a que se refere o § 5º do art. 176 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015, de 1973):

“Nas hipóteses do § 3º, caberá ao Incra certificar que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e que o memorial atende às exigências técnicas, conforme ato normativo próprio.”

Já em seu segundo capítulo, aponta o Sigef como o sistema responsável pela efetivação dos requerimentos de certificação, desmembramento, parcelamento e remembramento de imóveis rurais: as operações cartoriais já previstas pela Lei de Registros Públicos.

Por dentro do Sigef

O Sigef é um sistema web desenvolvido para automatizar a certificação de imóveis rurais e dar suporte a outras atividades ligadas à destinação de terras públicas. Contempla a recepção, validação, organização, regularização e disponibilização das informações georreferenciadas de limites de imóveis rurais, públicos ou privados.

O Sigef abrange as seguintes funcionalidades:

• Recepção de dados georreferenciados, via
internet;

• Validação rápida, impessoal, automatizada e precisa, de acordo com a 3ª Edição da Norma Técnica de Georreferenciamento de Imóveis Rurais
e Manuais Técnicos;

• Certificação automática com geração online de documentos: planta e memorial descritivo;

• Atualização de informação de forma segura com o Registro de Imóveis;

• Realizar operações de desmembramento, remembramento, retificação e cancelamento de parcelas;

• Gerência eletrônica de processos relativos a parcelas: certificação, registro, desmembramento, remembramento, retificação, cancelamento;

• Pesquisa pública online para dados cadastrais rurais georreferenciados;

• Gestão de serviços de georreferenciamento realizados por órgão públicos.

Para a gestão de serviços de georreferenciamento, o Sigef possui as funcionalidades de cadastro de licitações, contratos, empresas contratadas, responsáveis técnicos e fiscais. O responsável técnico possui a funcionalidade de envios de planilhas referentes aos serviços contratados e o fiscal tem a funcionalidade de analisar os dados enviados, aprovando ou rejeitando as parcelas contidas nas planilhas.

O acesso é feito pelo endereço https://sigef.incra.gov.br e está disponível para todos os profissionais credenciados para requerer certificação de imóveis rurais.

Quanto aos procedimentos para Certificação, primeiro o profissional credenciado executa o georreferenciamento de acordo com a Norma Técnica para Georreferenciamento de Imóveis Rurais 3ª Edicão e seus Manuais Técnicos. Depois, formata os dados em planilha eletrônica segundo o Manual do Sigef e acessa o sistema com certificado digital padrão da Infraestrutura de Chaves Públicas (ICP-Brasil), definida pelo governo brasileiro. Então, informa a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) do serviço e envia os dados, os quais são validados em questão de segundos ou minutos, dependendo da quantidade de vértices.

Sigef

Caso não seja detectado erro, o profissional pode confirmar a solicitação de certificação, que é realizada instantaneamente. Neste momento já é possível obter os

 documentos planta e memorial descritivo, prontos para serem levados ao Cartório de Registro
de Imóveis.

De posse da certidão atualizada da matrícula contendo o memorial descritivo certificado, o profissional credenciado ou o oficial de registro efetua um requerimento

de registro, informando o número da matrícula e os dados dos proprietários. Finalizada a análise do requerimento, a parcela certificada passa a conter informações atualizadas em relação ao registro de imóveis.

Segurança e Estrutura do Sigef

Para profissionais credenciados e outros usuários que têm permissão para alteração de dados, o acesso ao Sigef é feito exclusivamente com certificado digital. O padrão de certificado segue as definições da ICP-Brasil, um recurso seguro de identificação, válido juridicamente. Já é utilizado por diversos órgãos e instituições no país, públicos e privados.

Em termos de infraestrutura de Tecnologia de Informação, o Sigef conta com dois ambientes distintos e independentes, cada um composto por quatro servidores: um de aplicação, um de tarefas e dois de banco de dados. O ambiente de homologação é utilizado para testes de novas funcionalidades e correções de eventuais falhas, antes de serem aplicadas no ambiente de produção, que hospeda o sistema disponível no endereço https://sigef.incra.gov.br, acessado por usuários com certificado digital e que guarda e atualiza os dados válidos.

A estrutura foi dimensionada para comportar o modelo de dados que contempla a relação entre vértices, limites e parcelas. A partir do momento da certificação, todos esses dados são gravados no banco de dados do SIGEF e passam a ser considerados como critério para análise de sobreposição.

Transparência

O Sigef disponibiliza um conjunto de consultas importantes por meio de sua página pública, acessível por qualquer cidadão. Uma delas é a consulta de parcelas, por meio da qual é possível acessar detalhes de cada parcela certificada pelo sistema: dados de vértices, limites, polígono em mapa interativo, datas, situação registral, além de acesso à planta e ao memorial descritivo. Também é possível exportar os dados em formatos shapefile e kml de vértices, limites e parcela.

Na página pública também é possível obter informações online sobre requerimentos, acompanhar sua situação e interagir com os Comitês de Certificação. Além disso, disponibiliza dados de profissionais credenciados por município, com nome e contato. Os dados cadastrais são atualizados pelos
próprios credenciados.

O Sigef é operado por diferentes atores, que têm acesso a funcionalidades bem definidas:

• Profissionais credenciados – podem abrir requerimentos de certificação, registro, desmembramento, remembramento, retificação, cancelamento e sobreposição;

• Comitês de Certificação do Incra – analisam os requerimentos de registro, desmembramento, remembramento, retificação, cancelamento e sobreposição;

• Oficiais de Registro de Imóveis – podem efetuar requerimentos de registro, retificação e cancelamento;

• Órgãos Públicos – atuam na gestão de serviços de georreferenciamento;

• Público em geral – pode consultar informações sobre requerimentos, parcelas e profissionais credenciados.

Desenvolvimento

O Sigef foi desenvolvido com apoio do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRS Xingu), instituído em 2010 pelo Decreto nº 7.340 da Presidência da República e composto por órgãos governamentais representações da sociedade civil organizada. O projeto de desenvolvimento do Sigef foi apresentado pela Câmara Técnica de Ordenamento Territorial, Regularização Fundiária e
Gestão Ambiental.

A especificação, monitoramento e fiscalização do serviço de desenvolvimento foram realizados por profissionais do Incra e MDA – Analistas em Reforma e Desenvolvimento Agrário. O desenvolvimento foi realizado pela empresa ZNC Sistemas, com pessoal especializado e com experiência no tratamento de dados geoespaciais.

Utiliza 100% tecnologia livre, segundo as recomendações da política de software livre do Governo Federal. Atende os padrões do e-Ping, o que possibilita a interoperabilidade com outros sistemas, conforme também estabelece a Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde). Dessa forma, procurou-se garantir que outros entes envolvidos, como órgãos públicos de diferentes esferas e outros sistemas, tenham acesso aos dados e possam integrá-los para atender às suas necessidades específicas.

Expectativas

Sabemos que este é apenas um primeiro passo de muitos ainda necessários, mas acreditamos ter encontrado o caminho. Contamos com a fundamental contribuição de todos os profissionais envolvidos para trilhá-lo. Sem isso nada novo
será construído.

Por fim, esperamos que o trabalho desenvolvido atenda à sociedade brasileira de forma mais eficiente, impessoal, transparente e justa, como o Serviço Público deve ser. Dessa forma, contribuiremos de fato para o desenvolvimento econômico e a consolidação da democracia no campo.

• Fábio Pagliosa Ulkowski, Engenheiro Cartógrafo – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Incra/PR

• Heliomar Vasconcelos, Engenheiro Agrimensor – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Incra/TO

• Kilder José Barbosa, Engenheiro Agrimensor – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Incra/MG

• Miguel Pedro da Silva Neto, Engenheiro Cartógrafo – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Incra/BA

• Oscar Oséias Oliveira, Engenheiro Agrimensor – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Incra/ES

• Thiago Marra, Geógrafo – Analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário – Terra Legal/BSB