Trabalho realizado por especialistas da Embrapa Gestão Territorial (SP) delineou as áreas do Cerrado que abrigam águas subterrâneas naturalmente mais sujeitas à contaminação por agentes químicos. O levantamento divide o bioma em quatro categorias de vulnerabilidade: alta, média, baixa e muito baixa.
Os lençóis freáticos mais vulneráveis foram localizados no sudeste, centro-oeste e centro-leste de Mato Grosso, oeste da Bahia, sudoeste de Goiás e norte de Mato Grosso do Sul, marcadas no mapa em cor escura.
“Lençóis de água mais próximos da superfície, em regiões de solo poroso e clima chuvoso, por exemplo, são naturalmente mais sujeitos a receber contaminantes em comparação a corpos d’água em grandes profundidades e em locais áridos”, exemplifica o engenheiro-agrônomo Rafael Mingoti, analista da Embrapa que participou do trabalho. Ele explica que a equipe levou em conta diversas variáveis como dados climáticos, perfis e tipos de solo, profundidade dos lençóis freáticos e balanço hídrico.
A segunda etapa do projeto vai aumentar o detalhamento dessas áreas, identificar atividades econômicas nelas presentes e avaliar possíveis riscos a que os corpos de água subterrâneos poderão estar expostos. Mingoti revela que o método para estimativa da espessura de perfil de solo é o mesmo utilizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para estimar a profundidade do lençol freático da floresta Amazônica, que se baseia em dados de relevo.
Metodologia inovadora
Uma importante inovação da pesquisa foi o aprimoramento da metodologia empregada, que permitiu a obtenção dos resultados sem a necessidade de análises em campo. O trabalho foi alimentado com bancos de dados e imagens de satélites analisados e processados por meio de métodos de determinação indireta e sistemas de informação geográfica (SIG).
Entre as vantagens dessa abordagem está a economia de recursos exigidos em levantamentos convencionais que envolvem: deslocamento de especialistas, coleta de amostras, análises laboratoriais, observações em campo e maior tempo empregado. “Esse método otimiza esforços e recursos, o que é especialmente importante em estudos de áreas enormes, como é o caso do bioma Cerrado”, afirma o pesquisador Cláudio Spadotto, gerente-geral da Embrapa Gestão Territorial e coordenador da pesquisa.
Chamada de escala exploratória, o grau de detalhamento dos resultados é menor que o comumente obtido em métodos convencionais, por abranger áreas maiores. No entanto, os cientistas frisam que os dados obtidos são confiáveis e servirão de base para indicar as áreas vulneráveis que serão alvo da fase de detalhamento da pesquisa. É na segunda etapa que os pesquisadores visitam as áreas prioritárias, coletando amostras de solo e água, fazendo análises laboratoriais e aumentando a precisão das informações.
Spadotto acredita que os resultados finais do estudo deverão subsidiar diferentes atividades ligadas a gestão territorial, planejamento agrário, práticas conservacionistas, políticas públicas ambientais e uso e ocupação do solo. “Após a fase de detalhamento, será possível embasar decisões para proteção dessas águas subterrâneas localizadas em áreas mais críticas. Assim, haverá embasamento científico para efetuar, por exemplo, restrição de determinadas atividades ou produtos químicos em localidades mais vulneráveis à contaminação”, prevê o especialista.
Governos e órgãos de licenciamento ambiental serão os principais usuários desses dados. De acordo com o pesquisador, o ordenamento de uso e ocupação do solo é fundamental para a proteção das águas subterrâneas e pode ser baseado na identificação de áreas mais vulneráveis à contaminação.
A equipe planeja ampliar esse levantamento para o restante do Brasil, contemplando os demais biomas. “Começamos pelo Cerrado por ser uma importante área para a atividade agrícola nacional. Agora pretendemos aplicar a mesma metodologia para todo o País”, anuncia Spadotto, ressaltando a importância dos reservatórios subterrâneos de água.
“As atividades humanas, especialmente quando desenvolvidas em áreas onde as águas subterrâneas estão em condições de maior vulnerabilidade à contaminação química e biológica, representam uma ameaça à qualidade e à potabilidade da água, podendo colocar em risco a conservação da biodiversidade, o equilíbrio dos ecossistemas e a saúde humana”, alerta.
Há pouco mais de um ano, a mesma equipe desenvolveu um software que avalia riscos de contaminação de corpos hídricos subterrâneos e superficiais por agrotóxicos. Chamado de ARAquá, o sistema é utilizado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama)
Fonte: Embrapa