A padronização utilizada internacionalmente para equipamentos laser empregados em levantamentos terrestres e aéreos

Muitos dos equipamentos utilizados atualmente pela Topografia, Geodésia, Fotogrametria e Sensoriamento Remoto empregam a tecnologia laser. Porém, como estes são equipamentos provenientes de outros países, seguem normas e padrões de fabricação e utilização muitas vezes desconhecidas dos usuários nacionais.

Assim, o presente trabalho tem por objetivo apresentar a padronização utilizada internacionalmente na classificação de equipamentos laser empregados em levantamentos terrestres e aéreos, os riscos a que estão sujeitos aqueles que os operam e as conseqüentes precauções que devem ser tomadas para evitar a exposição à radiação emitida pelos mesmos.

A Radiação LASER

O princípio de funcionamento do LASER constitui a emissão estimulada de ondas eletromagnéticas na região do visível, do infravermelho e do ultravioleta.

Nos equipamentos laser destinados aos levantamentos terrestres e aéreos tal tecnologia é utilizada na determinação de distâncias (entre o dispositivo laser e um alvo) por meio de duas técnicas distintas (TOF – Time of Flight e Beam Modulation), dependendo do modo de operação do laser (pulsado ou contínuo).

As características que permitem avaliar a quais riscos ou perigos estão sujeitos todos aqueles que vierem a se expor à radiação laser são: comprimento de onda, potência, duração e taxa de repetição.

Outras características físicas do laser e igualmente importantes na avaliação dos riscos são o diâmetro do feixe e sua divergência.

Os Riscos da Radiação LASER

De acordo com o Laser Safety Program da Charles Sturt University (2001), o que distingue a radiação laser dos outros tipos conhecidos de radiação é a colimação do seu feixe. Um sistema biológico qualquer só sofrerá danos se for capaz de absorver tal radiação. A absorção ocorre ao nível atômico ou molecular e é o comprimento de onda do feixe irradiado que determina qual tecido o laser é capaz de danificar.

Na figura a seguir, a parte sombreada em amarelo ilustra o intervalo de comprimento de onda próprio da radiação laser, que vai de 180nm a 1mm, ou seja, do ultravioleta ao infravermelho distante.


Figura 1 – Intervalo do Espectro Eletromagnético onde o Laser atua
Fonte: Laser Institute of America, Laser Safety Information Bulletin, May 24, 2002

Dentre os sistemas biológicos passíveis de danos encontram-se os olhos e a pele humana. Pesquisas confirmam que os olhos são muito mais vulneráveis à radiação laser que a pele e o pior caso de exposição ocorre quando aqueles focalizam diretamente o feixe de radiação a uma certa distância, ou, quando o feixe focalizado é refletido por uma superfície espelhada.

Carroll (1978) afirma que em certas partes do corpo, tais como o globo ocular e os testículos, a conexão térmica com os tecidos circundantes é mínima e o fornecimento de sangue é inadequado para conduzir a energia desenvolvida pela exposição local ao laser. Quando estes órgãos estão expostos a tal tipo de radiação, podem produzir-se graves danos nos tecidos profundos dentro dos mesmos, pelo qual há um grave risco de que causem cegueira ou esterilidade.

A figura a seguir apresenta os principais efeitos adversos ocasionados pela radiação laser nos olhos e pele humanas em função do intervalo de comprimento de onda em que o laser atua.


Figura 2 – Efeitos Biológicos da Radiação Laser
Fonte: Adaptado de EPFL, GOEQ, Laser Hazards

Quanto à exposição dos olhos, os danos podem ocorrer em quatro situações distintas, dependendo do tipo de laser utilizado (comprimento de onda e potência) e do tempo de exposição. São elas:

1)Observação direta do feixe de radiação


2)Observação do feixe de radiação refletido por uma superfície plana espelhada


3)Observação do feixe de radiação refletido por uma superfície curva espelhada


4)Observação do feixe de radiação difuso refletido por uma superfície não espelhada

A maioria dos danos provocados pela radiação laser se deve ao aquecimento dos tecidos que a absorvem. Os laseres visíveis são particularmente perigosos, pois o olho humano focaliza o feixe na retina e esta pode sofrer queimaduras. A densidade de potência do ponto laser focalizado na retina é cerca de 100.000 vezes a densidade de potência incidente na córnea. Assim, embora seja relativamente seguro expor a pele a laseres visíveis de baixa potência é sempre perigoso observar o feixe diretamente. (ARP/NSA, 1999)

Além destes, um equipamento laser engloba riscos associados ao seu funcionamento, denominados colaterais ou secundários, que estão fora do escopo deste trabalho.

O controle necessário dos riscos à radiação laser varia com: a classificação atribuída ao laser (explicitada mais adiante); o ambiente onde o laser é utilizado; e as pessoas envolvidas na operação do laser ou que se encontram em sua vizinhança. (Columbia University, 1998)

É importante ressaltar que o usuário mais seguro é também o mais bem informado a respeito dos riscos e procedimentos de segurança envolvidos por este tipo de radiação.

Classificação dos Produtos LASER

Um padrão pode ser desenvolvido para uso ao nível mundial, regional (um continente ou parte dele) ou nacional (um único país). Os padrões internacionais têm um papel importante no comércio entre as nações e são a base de aceitação de um produto nos países que adotam padrões idênticos. Tais padrões não são leis ou regulamentações, apesar de poderem ser citados por elas tornando-se, assim, legalmente obrigatórios.

Os padrões internacionalmente empregados na classificação de produtos laser são:

Padrão Internacional IEC 60825-1

Trata basicamente da segurança dos produtos laser no que se refere aos danos causados aos olhos e à pele e contém, além da classificação dos equipamentos laser e dos requisitos para sua utilização, um guia do usuário.

Na Europa, o Comité Européen de Normalisation Electrotechnique (CENELEC) adota o padrão EN 60825-1:1994, que contém todo o IEC 60825-1:1993 com material regulatório complementar. Segundo o CENELEC, o padrão EN deve ser publicado e adotado por todos os países membros da União Européia.

O padrão IEC 60825-1 é também adotado, com algumas pequenas modificações, pela Austrália (AS/NZS 2211.1) e Japão (JIS 6082-1).

A tabela a seguir apresenta os riscos, os tipos de laseres e a potência máxima emitida relativamente a cada uma das classes que compõem o referido padrão.

Tabela 1 – Classificação no Padrão IEC 60825-1:1993

Uma nova edição deste padrão, publicada em 2001, apresenta diferenças na classificação em relação à edição anterior. Tal classificação é apresentada na tabela a seguir.

Tabela 2 – Classificação no Padrão IEC 60825-1:2001

Basicamente, a letra M das novas classes (1M e 2M) indica o uso de instrumentos óticos magnificadores e a letra R a redução de requisitos em relação à classe 3A original.

Padrões Americanos ANSI Z136.1 e CDRH 21 CFR

O padrão utilizado pelos Estados Unidos da América divide-se em: usuários (ANSI Z136.1 – desde 1986) e fabricantes (CDRH 21CFR – Ch. I Part 1040 Sec. 1040.10 e Sec. 1040.11 – desde 1976). Apesar de independentes, tais documentos apresentam esquemas de classificação similares ao do padrão IEC.

O desenvolvimento destes padrões teve início durante a década de sessenta, logo após a invenção do primeiro laser, e revisões sucessivas das documentações ocorreram no período entre 1973 e 1986, quando os mesmos alcançaram o estado em que se encontram atualmente.

Durante os últimos anos houveram várias iniciativas, por parte dos americanos, de harmonizar os padrões adotados nos EUA com o padrão internacional. A FDA/CDRH comprometeu-se em unificar seus padrões, num futuro próximo, com os estabelecidos recentemente pela IEC (60825-1:2001).

A tabela a seguir apresenta a classificação dos produtos laser segundo o CDRH. Nesta tabela, além dos riscos encontram-se os comprimentos de onda (?) e os tipos de laser relativos a cada classe.

Tabela 3 – Classificação no Padrão CDRH

É possível verificar, pelas tabelas acima, que além de uma diferença no número de classes os padrões apresentam escritas diferentes para o número e letra correspondente a cada classe. Além disso, a classe IIIa (CDRH) engloba apenas os laseres visíveis, enquanto a classe 3A (ANSI) engloba tanto laseres visíveis como invisíveis.

Padrão Adotado no Brasil

A ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, conta atualmente com quarenta e nove Comitês Brasileiros e dois Organismos de Normalização Setorial orientados para atender ao desenvolvimento da tecnologia e participar efetivamente na normalização internacional e regional.

Mesmo com tantos Comitês e Organismos, até a presente data, as duas únicas normas relacionadas à tecnologia laser e constantes do acervo da ABNT são: 1) NBR 14588 de 09/2000, que prescreve a determinação do raio de encurvamento em fibras óticas pelos métodos por vista lateral e por reflexão de feixe laser; e 2) NBR IEC 60601-2-22 de 10/1997, norma internacional adotada no Brasil e que prescreve os requisitos particulares para a segurança de equipamentos laser utilizados em diagnósticos e terapias.

Nenhuma das normas citadas, portanto, prescreve a utilização segura de equipamentos laser em quaisquer outras atividades senão na medicina.

Por outro lado, a legislação ordinária sobre a proteção dos trabalhadores diante dos riscos no trabalho faz parte da legislação trabalhista e está contida na CLT, estabelecida pela Lei No 6514 de 22/12/1977. O detalhamento e a aplicação desta lei estão contidos em vinte e oito Normas Regulamentadoras (NRs) estabelecidas por portarias do Ministério do Trabalho. Dentre estas normas encontra-se a NR-15, regulamentadora das Atividades e Operações Insalubres, com quatorze anexos. Dentre os anexos, o de número sete é relativo às Radiações Não Ionizantes. Tal anexo, composto por apenas três parágrafos, estabelece que:

? São radiações não ionizantes as microondas, as ultravioletas e o laser.
? As operações ou atividades que exponham os trabalhadores às radiações não ionizantes, sem a proteção adequada, serão consideradas insalubres, em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho.
? As atividades ou operações que exponham os trabalhadores às radiações da luz ultravioleta na faixa entre 320 a 400 nanômetros não serão consideradas insalubres.

A legislação trabalhista, portanto, regulamenta como atividade insalubre a operação de equipamentos laser e, no entanto, não estabelece critérios que permitam identificar quais condições contribuem para a insalubridade da operação nem qual seria o tipo de proteção adequada aos que operam ou se expõem à radiação provocada por tais equipamentos.

Assim, é extremamente importante que seja do conhecimento de todos os envolvidos com a operação de equipamentos laser no Brasil, as classes às quais pertencem tais equipamentos e, uma vez que existem diversos padrões, o padrão ao qual as referidas classes correspondem. Só assim é possível determinar a quais riscos os operadores destes equipamentos estão sujeitos e estabelecer critérios que permitam reduzí-los ao máximo.

O quadro a seguir foi construído com a finalidade de facilitar o reconhecimento das classes e padrões ao qual pertencem.

Quadro 1 – Padrões e Respectivas Classes

Uma vez que classes idênticas, de padrões distintos, possuem diferentes definições dos riscos a ela associados, recomenda-se, após a identificação da classe de um equipamento e seu respectivo padrão, consultar a relação de riscos e medidas de segurança para a sua utilização nas publicações oficiais.

Considerações Finais

Os equipamentos laser utilizados em levantamentos terrestres e aéreos classificados pelo padrão IEC80625-1:1993 ou pelo padrão FDA 21 CFR:1996, normalmente estão compreendidos entre as classes 1 e 3A. Se o equipamento laser em uso não possuir etiqueta ou rótulo com informações sobre a classe e riscos que apresenta, recomenda-se consultar o manual ou o representante/fabricante do mesmo a fim de obtê-las.

Caso tal equipamento seja utilizado como material didático no aprendizado de certas disciplinas, recomenda-se alertar os alunos quanto aos riscos a que estão sujeitos e também quanto aos procedimentos de segurança requeridos para sua operação.

Referências Bibliográficas

Carroll,J.M.: Fundamentos y Aplicaciones del Laser. Barcelona, Marcombo Boixareu Editores, 1978.
Hecht,J.: The Laser Guidebook. Singapore, McGraw-Hill Editions, 1986.
Tarasov,L.: Laser Physics and Applications. English Translation, MIR Publishers, 1986.

Maria Cecília Bonato Brandalize é Engenheira Cartógrafa (UFPR), Mestre em Educação (PUCPR) e Doutoranda do Curso de Pós-Graduação em Engenharia Civil – Cadastro Técnico Multifinalitário e Gestão Territorial (UFSC). mcbonato@rla01.pucpr.br

Jürgen W. Philips é Engenheiro Geodesista (Universidade de Bonn – Alemanha), Doutor em Geodésia e Fotogrametria (Universidade Técnica de Aachen – Alemanha), Professor Orientador do Curso de Pós- Graduação Em Engenharia Civil – Cadastro Técnico Multifinalitário e Gestão Territorial (UFSC). philips@ecv.ufsc.br