Por Viviane Prestes

Quando o país pede uma resposta

As catástrofes urbanas, causadas pelas chuvas, estão se tornando frequentes e mais desastrosas no Brasil. Porém, as Ciências da Terra têm mostrado que seus instrumentos são a peça chave para amenizar esses impactos

Os últimos cinco anos inauguraram uma era em que a força da natureza mostrou a que veio. Esse pode ser um momento decisivo para o homem pensar no que está fazendo com relação ao planeta e elaborar, cada vez mais rápido, soluções de prevenção e alerta contra desastres naturais.

Vemos que, de norte a sul do Brasil, as consequências do desequilíbrio no clima mundial aconteceram de forma arrasadora. Em menos de três anos já causaram prejuízos de bilhões de reais, impossíveis de serem calculados, pois quase todos os Estados do país sofreram alguma reação da força da natureza.

Um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Banco Mundial indica que, até o fim do século, a perda financeira causada pelos desastres naturais irá aumentar aproximadamente 185 bilhões de dólares por ano (Fonte: Planeta Água/Docol).

Casos de deslizamentos de terra na região serrana do Rio de Janeiro e do Paraná, enchentes em São Paulo, Santa Catarina, Espírito Santo e Minas Gerais foram os mais assustadores; talvez por mostrarem a ineficiência do país em responder de forma ágil nessas situações.

Atualmente se discute a implantação de um Sistema Nacional de Prevenção e Alerta. Segundo informações do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), esse programa – que terá como partes integrantes os Ministérios da Defesa, Justiça, Integração Nacional, Saúde e Casa Civil – pode ser finalizado para uso daqui a quatro anos. O objetivo do projeto é informar os dados mais comuns sobre desastres no Brasil, como deslizamentos de terra e inundações, e contará com um supercomputador, adquirido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Além disso, o ministro da Ciência e Tecnologia declarou, no programa de rádio “Bom Dia, Ministro”, que as cidades que puderem devem antecipar o mapeamento geológico das regiões e estruturar a defesa civil.

Porém, o Brasil já contava com um programa de alerta, lançado em 2008 pelo Inpe: o Sistema de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Sismaden), no qual uma base de dados geográficos auxilia na análise de risco de desastres naturais provocados por eventos meteorológicos e climáticos.

Uso de ferramentas SIG

Por outro lado, os eventos catastróficos que estão acontecendo no país têm mostrado como as ferramentas de Sistema de Informações Geográficas (SIG) podem achar um campo fértil para atuação, nas condições de recuperação de mapas, em decorrência dos desastres, e prevenção destes.

Um exemplo de sucesso na resposta a desastres naturais é o mapeamento colaborativo. Essa ação foi bastante trabalhada no Brasil, com a difusão do uso de mapas, que hoje se estende às várias áreas do conhecimento aplicado ao planejamento urbano.

Arlete Meneguette, engenheira cartógrafa e professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp) -juntamente com outros profissionais-, esteve em contato direto com os processos de mapeamento colaborativo na região serrana do Rio de Janeiro, em janeiro deste ano. Ela conta que a ação do grupo aconteceu sobretudo no município de Bom Jardim (que amargou um prejuízo de 75 milhões de reais, segundo a prefeitura), e que a ideia surgiu no Grupo de Discussões Mapping Brazil.

“Cada um dos membros ofereceu sua contribuição voluntária, na medida da sua disponibilidade. Mapeamos as feições a partir da interpretação visual da imagem de satélite, datada de maio de 2010 (anterior às chuvas). Júlio Monnerat, arquiteto e urbanista, e Cléverson Cândido da Roza, professor de informática, mapearam as rodovias estaduais. Eu mapeei o Rio Grande, as pontes e as construções. E Denis Tostes, consultor em agropecuária, colaborou no controle de qualidade das informações, por residir na área atingida”, explica Arlete. O trabalho foi feito através dos programas Google Maps, Google Earth e Google Map Maker. “O acesso às novas tecnologias de informação e comunicação mantém nossa equipe unida, apesar de geograficamente separada”, afirma Arlete.

O site O Eco, voltado a assuntos relacionados ao meio ambiente, também criou uma plataforma para que as pessoas enviassem relatos, fotos e vídeos ajudando no mapeamento dos impactos das chuvas no Brasil. “A ideia surgiu da aplicação do conceito de crowd sourcing que temos buscado usar em todos os nossos sites. Para nós isso é muito importante. Não apenas contar com a ajuda do público, mas também fornecer informação geolocalizada”, diz Gustavo Faleiros, editor-chefe do O Eco.

Um dos principais projetos de O Eco é o chamado Geonotícia, no qual são aplicadas ferramentas geoweb para a comunicação de temas ambientais: www.oeco.com.br

“O mapeamento colaborativo e cooperativo é mais uma maneira de representar o mundo real no ciberespaço. O ideal seria a implantação de uma política de mapeamento e atualização constante das áreas de risco, com um monitoramento contínuo pelo Poder Público, em parceria com a iniciativa privada e a sociedade civil organizada”, pondera Arlete Meneguette.

VANTs

Os Veículos Aéreos Não Tripulados (VANTs) já mostraram que podem ser uma ferramenta eficaz em várias situações de risco. O Instituto Militar de Engenharia (IME) usou um VANT nas ações de busca e mapeamento na ocasião dos deslizamentos de terra na região serrana do Rio.

Adriano Kancelkis, diretor da AGX Tecnologia, explica que uma das vantagens em se usar os VANTs em situações de desastres naturais é a rapidez de entrada em operação para a obtenção de dados aéreos. “Pois quanto mais rápidas e precisas forem as informações -captadas pelos veículos aéreos não tripulados- em tempo real, da região atingida, mais chances de se resgatar pessoas com vida”, complementa.

Segundo ele, ainda, a utilização dessa tecnologia vem aumentando gradativamente, pois existem hoje demandas específicas para este tipo de veículo, não apenas em desastres naturais. “Nossas forças de defesa -Exército, Marinha e Aeronáutica- têm desenvolvido seus projetos de VANTs. Isso demonstra o grande interesse e a grande demanda que existe hoje por este tipo de tecnologia”, diz o diretor.

Para ele, não há empecilhos para difundir o uso dos VANTs no Brasil, apesar do custo alto, do nível da equipe envolvida na fabricação do equipamento e do tempo de desenvolvimento. “Mas o Brasil ainda não investiu nem um décimo, se comparado a outros países como os EUA”, conclui Kancelkis. “O Pentágono investiu, entre 1991 e 1999, algo em torno de 3 bilhões de dólares em projetos de VANTs. Até o fim de 2010 estava previsto o investimento de 10 bilhões de dólares neste tipo de tecnologia, segundo o DoD UAV Roadmap-2002-2027”, afirma.

Mapeamento colaborativo, VANTs ou supercomputadores: independentemente da tecnologia, o importante é que o Poder Público e a sociedade tenham instrumentos para prever ou, ao menos, diminuir os efeitos de uma grande catástrofe natural. Os acontecimentos recentes já mostraram que o Brasil, definitivamente, não está a salvo dos efeitos da natureza.

Exemplo internacional

Nos desastres naturais ocorridos na Austrália, em 2008, foram registradas apenas duas mortes, graças ao sistema de alerta que avisa aos municípios sobre riscos de enchentes, com um dia de antecedência. O Programa Nacional de Mitigação de Desastres tem como medidas a construção de diques, barragens e bacias, elevação de casas, construção de prédios a prova de enchentes, canais de desvio e um sistema de alerta para a população (Fonte: Agência Fiocruz)