Atualizações em tempo real, mapas colaborativos e coordenadas de usuários cada vez mais presentes no geoprocessamento

Por Eduardo Freitas

No início de 2011, um desastre natural na região serrana do Rio de Janeiro expôs, de forma trágica, como estamos dependentes de mapas em situações de emergência. Com a popularização dos celulares, smartphones e tablets com GPS, a localização passou a ser mais uma “commodity”. No setor de Serviços Baseados em Localização (LBS), coordenadas de usuários geram uma enorme quantidade de dados, que precisa ser processada e virar informação.

Estariam os dados de campo invadindo o setor de GIS? A fronteira entre os dados de escritório e móveis está desaparecendo? As bases de dados e o trabalho diário vão tornar-se cada vez mais colaborativos?

Desde o terremoto no Haiti até as recentes tsunâmis no Japão, passando pelos tremores no Chile e deslizamentos de terra no Rio de Janeiro, o setor de geotecnologia passou a contar com um novo componente para o mapeamento de áreas atingidas por desastres naturais: a geocolaboração.

Em uma situação de emergência extrema, além de sobreviver ao caos, a primeira reação do ser humano é localizar-se. Afinal, há várias perguntas a serem respondidas: Para onde deve-se ir? Onde encontrar ajuda ou alimento? Como auxiliar outras pessoas?

Um vídeo sobre a criação do mapa colaborativo de Porto Príncipe, capital do Haiti, está disponível em http://bit.ly/k4Fscp

Nos locais onde o desastre acabou com a infraestrutura existente, mapas antigos não têm utilidade e servem apenas para comparação com o que havia e com o que restou. Nestes casos, é imprescindível poder contar com uma cartografia atualizada, de preferência feita em poucas horas. E é aí que entra o mapeamento colaborativo e as imagens de satélites em tempo “quase real”.

O terremoto no Haiti expôs de maneira dramática a falta de mapas de um país. Poucas horas após o evento, a população local e voluntários de todas as partes do mundo passaram a elaborar a cartografia dos locais atingidos, a partir de dados obtidos por navegadores GPS e imagens de satélites fornecidas por grandes operadoras. Esta geocolaboração foi possível através do OpenStreetMap, um projeto inspirado por sites como a Wikipedia que tem o ambicioso objetivo de criar um mapa livre e editável do mundo.


Crowdsourcing é um modelo de produção que utiliza a inteligência e os conhecimentos coletivos e voluntários, espalhados pela internet, para resolver problemas, criar conteúdo ou desenvolver
novas tecnologias

Além do OpenStreetMap, existem várias outras iniciativas de mapeamento colaborativo. A própria Esri lançou o ArcGIS Online (www.arcgis.com), site que conta com funcionalidades de geocolaboração. Recentemente, no Brasil, um grupo de voluntários ajudou a mapear a região atingida pelos deslizamentos de terra na região serrana do Rio, através do Google Map Maker. Ainda no Brasil, outro exemplo de projeto colaborativo é o TrackSource, no qual a comunidade gera mapas roteáveis para navegadores GPS.

Toda essa colaboração é turbinada pela computação em nuvem, que permite a vários usuários acessarem uma mesma base de dados e editarem um mapa em tempo real. Este tipo de tecnologia permite que qualquer equipamento, conectado à internet, vire uma estação de trabalho remota, na qual um usuário pode acessar mapas e imagens, analisar a situação ao seu redor e executar as devidas atualizações.

Outro fator que contribui com a popularização da geocolaboração é justamente o uso de celulares, smartphones e tablets com capacidades de localização e mapeamento. É possível, hoje, com um simples telefone, acessar a internet, buscar por um serviço de mapas online, fazer uma pesquisa e indicar se o resultado está correto ou não. Com isto, os usuários podem avaliar um mapa, em tempo real, fornecendo seu feedback e alterando o seu conteúdo. Em aplicações desse tipo, a própria comunidade gera, atualiza e avalia os dados gerados.

Neste ponto chegamos às redes sociais, nas quais o crowdsourcing é levado ao seu nível máximo, com milhões de pessoas gerando e compartilhando informações, reações e comentários sobre um mesmo assunto.

Seja em redes sociais baseadas no desktop (Facebook, por exemplo) ou em dispositivos móveis (Foursquare), os dados sobre localização estão presentes para qualificar ainda mais as informações dos usuários. São registros sobre posts, pontos de interesse, fotos, vídeos, eventos, viagens, empregos, estudos, check-ins, check-outs e uma infinidade de outras ações que podem ser “georreferenciadas”.

Tudo isso gera uma imensa quantidade de dados para os administradores das redes sociais e das empresas que coletam dados de seus funcionários. Cabe aos profissionais de mineração de dados a árdua tarefa de processar esta grande massa de conteúdo georreferenciado para, então, encontrar tendências e gerar informação realmente relevante.

Data mining (ou mineração de dados) é o processo de explorar grandes quantidades de dados à procura de padrões consistentes, como regras de associação ou sequências temporais, para detectar relacionamentos sistemáticos entre variáveis, encontrando assim novos subconjuntos de dados

Neste caso, a principal questão a resolver é: o que fazer com tanta quantidade de dados? Isto nos leva então ao geo data mining, que é o processo de encontrar tendências dentro de grandes quantidades de conteúdo, tendo como base a localização dos usuários e/ou dos conteúdos. É isto que grandes grupos, como Esri, Microsoft, Facebook e Google, fazem quando lançam suas soluções de geocolaboração, registrando os dados e as coordenadas gerados pelos usuários.

6 bilhões de sensores inteligentes

Em um artigo de 2006, bem antes do “boom” das redes sociais, o pesquisador da área de geotecnologia Mike Goodchild já comentava sobre um intenso movimento de geocolaboração que estava nascendo, chamado “citizens as sensors”. Segundo ele, os habitantes do planeta se converteriam em 6 bilhões de sensores móveis mapeando a Terra através de seu conhecimento, suas impressões e seus registros sobre locais.

Hoje, se levarmos em conta que um mesmo terráqueo pode levar consigo, em seu celular, um receptor GPS, uma máquina fotográfica, uma filmadora, um gravador de som, um editor de textos, uma calculadora, etc., este número pode aumentar ainda mais. Além disso, um carro tem o seu próprio chip de celular para rastreamento e seu próprio navegador, bem como um caminhão tem sua carga monitorada e assim por diante. Ou seja: já deve haver, hoje, muito mais do que 10 bilhões de sensores sobre a Terra, que podem trabalhar tanto para o mapeamento do planeta como para a geração de dados baseados em localização, fornecendo informações preciosas sobre comportamento, tendências de consumo, entre outros “tesouros” do marketing e da administração.

Definitivamente, os dados dos usuários invadiram o setor de geo, mas a análise geográfica também invadiu o dia a dia das pessoas. É a integração das tecnologias para o bem de todos, gerando novas possibilidades e oportunidades de negócios.