Mapeamento da pecuária e a pastagem no oeste do Estado de São Paulo

A relevância, influência e aplicação dos sensores remotos espaciais são muitas vezes percebidas de forma subjetiva por uma significativa parcela da população. Contudo, as geotecnologias assumem importância cada vez maior no contexto das relações econômicas, políticas e sociais e no conhecimento, apesar de sabermos das restrições tecnológicas atuais, que oportunamente serão superadas pela capacidade inovadora do homem.

Por várias décadas, o oeste do Estado de São Paulo foi uma região tradicional para a pecuária. No entanto, observamos acentuada mudança nesse cenário. Esta região foi foco do projeto de pesquisa Sustentabilidade e Recuperação de Pastagens: Aspectos Técnicos, Ambientais e Econômicos com Transferência de Tecnologia e Tomada de Decisão (Mapastore), aprovado no final de 2008 pela Embrapa Monitoramento por Satélite em edital competitivo do CNPq, que teve por objetivo mapear as pastagens, identificar seus níveis de degradação e levantar dados de campo relacionados à sua ecologia.

De forma a possibilitar a obtenção de informações que subsidiassem a elaboração de um diagnóstico da região, utilizamos como modelo as áreas de três microbacias – Córrego Frutal, Córrego Barra Grande, Córrego Nove de Abril – situadas na região rural do Município de Guararapes (SP). Foram obtidas informações de campo sobre os níveis de degradação e as condições das pastagens (cobertura vegetal, composição botânica, plantas invasoras) e do solo (compactação, riscos de erosão, atividade e diversidade de microrganismos).

Inicialmente, avaliamos as mudanças no uso e na cobertura do solo. Para tanto, foram utilizadas fotos aéreas do ano de 1972, imagens do satélite Spot 2 de 1990 e do satélite Alos de 2009. A partir da análise das imagens, foi possível traçar um padrão histórico da agropecuária local, configurada pelo cenário do mercado nacional e mundial e integrado às forças produtivas residentes.

Em 1972, as principais classes definidas foram: cafeicultura, canavicultura, heveicultura, mata (vegetação arbórea primária ou secundária), pastagem, silvicultura, solo exposto e uso misto, caracterizado por pequenas áreas de cultivo variado como pomares, hortas domésticas, plantação de tomate e outras pequenas áreas com outra cultura na época. Essas classes citadas ocupavam 97,3% dos 11 mil hectares das três microbacias. Observamos o predomínio da classe pastagens (77,2%), seguida pela classe mata (13,9%). Somente 0,4% da área analisada era ocupada com a cultura da cana-de-açúcar.

Uso e cobertura das terras nas sub-bacias Córrego Frutal, Córrego Barra Grande e Córrego Nove de Abril, na região rural do Município de Guararapes, no ano de 1972 (somente foram consideradas classes com representatividade superior a 0,4% da área analisada)

Dezoito anos depois, a área de pastagem ainda era predominante. Contudo, observamos redução de aproximadamente 20% em sua área de ocupação. Isso significa que 1,7 mil hectares estavam ocupados com outras classes em 1990, o que demonstra uma mudança acentuada na dinâmica da agropecuária regional, resultado da estratégia dos pecuaristas em relação às oportunidades e incertezas econômicas do mercado durante esse período, mesmo considerando-se a complexidade e diversidade do ambiente rural nacional. Se considerarmos a área de pastagem em 1972 e a área estimada em 2009, houve redução de aproximadamente 42%.

Uso e cobertura das terras nas sub-bacias da mesma área, no ano de 1990

É evidente a importância da cultura da cana-de-açúcar para o novo cenário de 1990. Em 1972, esta cultura era encontrada em apenas 39 hectares, ou seja, em menos de 0,5% da área estudada. Em 1990, 2,2 mil hectares eram ocupados com cana-de-açúcar. Culturas anteriormente tradicionais, como o café, cederam lugar ao plantio da cana-de-açúcar, e uma considerável área de pastagem foi utilizada para a sua expansão. Duas décadas depois, a área reservada para as pastagens perdeu mais 1,8 mil hectares. Paralelamente, observamos que a cana-de-açúcar cresceu somente 0,4 mil hectares, portanto não ocorreu transferência direta da pastagem para a cana-de-açúcar.

Uso e cobertura das terras nas sub-bacias da mesma área, no ano de 2009

Por vezes, áreas ocupadas com pastagem tornaram-se solo exposto ou foram tomadas por vegetação secundária. Embora ainda pouco significativa, verificamos a introdução do cultivo da seringueira (30,1 hectares), entretanto houve aumento de áreas destinadas a culturas anuais, como o milho (193,9 hectares), superando a silvicultura.

Do ponto de vista conservacionista, é interessante destacarmos que as áreas ocupadas com mata cresceram de 1,5 mil hectares em 1972 para 2,1 mil hectares em 2009. Embora deva ser analisado com cautela, este fato é importante, porque representa um indicativo de restauração ambiental no município, mesmo que em pequena escala. Nossos cálculos foram baseados na interpretação de fotografias aéreas ou imagens de satélite, seguindo protocolos estabelecidos na literatura científica, e foram realizadas visitas para correção de erros de interpretação. Entretanto, a relação entre a resposta espectral da vegetação e sua composição é complexa. Não podemos tecer afirmativas sobre a composição, destruição espacial dentro dos fragmentos e estrutura das espécies vegetais que se estabeleceram entre os anos de 1972 e 2009, e nem podemos afirmar, no momento, que esses fatos correspondam a um plano de restauração que obteve sucesso. O certo é que a adição de espécies arbóreas exóticas ou nativas contribuiu para reduzir a erosão do solo e para melhorar a fertilidade do solo.

O projeto Mapastore disponibilizou na internet um WebGIS com a dinâmica de uso das terras e aspectos do solo, como risco de erosão. Essas e outras informações sobre o projeto, como a metodologia empregada e publicações técnicas, podem ser acessadas no endereço: www.cnpm.embrapa.br/projetos/mapastore.

 

André Luiz dos Santos Furtado
Biólogo, Dr. Pesquisador da Embrapa Monitoramento por Satélite

 

 

 

Cristina Aparecida Gonçalves Rodrigues
Zootecnista, Dra. Pesquisadora da Embrapa Monitoramento por Satélite

 

 

 

Célia Regina Grego
Engenheira Agrônoma, Dra. Pesquisadora da Embrapa Monitoramento por Satélite