O futuro do GIS Urbano
Sistemas de informação têm se tornado cada vez mais importantes para prefeituras e concessionárias. Mas o contexto de criação destes sistemas mudou bastante nos últimos anos.
A descentralização crescente da administração dos recursos públicos, que acontece desde a Constituição de 1.988, obrigou os governos municipais a assumir uma série de novas responsabilidades e atribuições. Este processo, bastante saudável, trouxe para mais perto do cidadão atividades que são melhor desempenhadas sob o controle da sociedade. Soma-se a isso a modernização das concessionárias de serviços públicos, como energia, saneamento e telecomunicações, em grande parte provocada pelo processo de privatização. Estes órgãos, que hoje são em parte públicos e em parte privados, constituem agentes de mudança no território municipal, especialmente nas áreas urbanas mais densas.
Devido à realidade tecnológica atual, tanto as prefeituras quanto as concessionárias estão redescobrindo o valor da informação correta, confiável, atualizada, disponível com agilidade, apresentada de forma conveniente, no momento da tomada de decisão. No caso das prefeituras e empresas que ainda não têm concorrentes, a informação representa uma ferramenta importante, que oferece recursos para a prestação de serviços de maior qualidade ao cidadão. No caso das empresas que já enfrentam a concorrência, ou que estão se preparando para enfrentá-la, esta mesma informação é uma importante fonte de vantagem competitiva no mercado.
Em ambos os casos, a existência e a disponibilidade de informação precisa, confiável e atual é um fator de aproximação entre o prestador do serviço e sua clientela, ou seja, a população como um todo. Além de atender melhor ao cidadão, prefeituras e concessionárias estão se conscientizando da necessidade de manter seus clientes informados sobre suas ações, até para que seja possível obter destes clientes uma avaliação positiva. Para isso, é necessário contar com recursos que facilitem o acesso do cidadão (com ou sem algum intermediário tecnológico) à informação disponível.
O aperfeiçoamento dos mecanismos de acesso à informação tem guiado boa parte dos investimentos em tecnologia em prefeituras e concessionárias. Em muitos estados, por exemplo, é possível obter a segunda via da conta de luz por telefone ou pela Internet. Algumas prefeituras já contam com recursos para permitir o acompanhamento do andamento de processos administrativos, enquanto várias outras estão montando centrais de atendimento informatizadas para eliminar filas e economizar o tempo do contribuinte.
A grande maioria das informações mantidas a respeito do ambiente urbano tem associada alguma forma de referência geográfica (como endereço, bairro, CEP, cruzamento). Assim, os GIS passam a cumprir o papel de ferramentas de integração de bases de dados. Desta maneira, tornam-se recursos tecnológicos que permitem organizar e acessar a informação com base em conceitos muito próximos da clientela principal dos sistemas de informação urbanos: a população em geral.
Dentro deste contexto, passa a ser imprescindível o georreferenciamento dos dados urbanos disponíveis em prefeituras e concessionárias. Boa parte destes órgãos está trabalhando intensivamente com esta perspectiva, investindo fortemente na consolidação de bancos de dados georreferenciados e na ligação de GIS com sistemas de informação existentes. Mas o contexto de criação desses bancos de dados georreferenciados tem mudado significativamente (embora existam forças de mercado que tentam sistematicamente reduzir o ritmo da mudança).
Até pouco tempo atrás, criar um banco de dados georreferenciado urbano significava executar um levantamento aerofotogramétrico em escala 1:8.000, restituir todos os objetos observáveis e gerar um conjunto de plantas em escala 1:2.000. Este processo, extremamente trabalhoso e muito caro, dificultou a entrada de muitas pequenas e médias prefeituras no universo das geotecnologias. Com o tempo, tem-se observado que o desenvolvimento de produtos cartográficos de alta precisão não é um pré-requisito indispensável para implantar um GIS urbano.
Atualmente, faz muito mais sentido construir uma base geográfica urbana simplificada, apoiada por imagens digitais de resolução suficientemente alta para a tarefa. Imagine-se que está disponível um conjunto de imagens, indispensáveis para as aplicações geográficas pretendidas. Uma desvantagem deste modelo é a grande quantidade de espaço em disco ocupada pelas imagens.
Ortofoto da cidade de Belo Horizonte em formato raster com objetos vetorizados
Porém, acontece que o barateamento e o aumento decapacidade observada nos microcomputadores atualmente tornou este problema praticamente irrelevante.
Um problema maior é, na verdade, inerente à escolha de software para suportar esta solução: nem todos os GIS disponíveis no mercado conseguem manipular com igual eficiência tanto as imagens quanto os vetores que formam a base geográfica.
Uma relação básica de objetos vetoriais que uma base geográfica urbana deve conter, para uso por prefeituras, está apresentada na tabela abaixo. Observe que os objetos listados estão sempre associados a uma importante aplicação (tributação, cadastro técnico, manutenção da infra-estrutura urbana). Estes objetos precisam ser complementados por elementos da paisagem urbana que estão fora do alcance dos sensores remotos, mas que são indispensáveis para promover a integração do GIS com outros sistemas de informação municipais. E também para facilitar o acesso dos cidadãos às informações geográficas disponíveis.
Nesta categoria estão incluídos, principalmente, objetos ligados ao endereçamento e objetos que promovem o georreferenciamento de sistemas convencionais. Também são indispensáveis objetos que representem divisões políticas e administrativas (limites municipais, administrações regionais, bairros), e objetos que permitam o georreferenciamento de dados sócio-econômicos, em especial os setores censitários definidos pelo IBGE. Além dos objetos listados na tabela, o modelo digital do terreno que é necessariamente construído para a produção de ortofotos digitais pode gerar, como subproduto, curvas de nível e pontos cotados.
A figura abaixo mostra o aspecto geral de uma base geográfica urbana criada com estes princípios. Observe que diversos objetos que não foram vetorizados inicialmente (postes, árvores e meio-fios) podem sê-lo em uma etapa posterior, já que são visíveis nas imagens. Também observe que a operação do GIS pode ser feita, na maior parte das vezes, sem a necessidade da imagem no fundo, o que melhora a velocidade das respostas.
Outros órgãos e empresas interessados nas mesmas informações urbanas podem usar as mesmas imagens, tornando possível o estabelecimento de esforços cooperativos de formação da base. Cada órgão ou empresa interessado seria responsável por vetorizar os elementos de seu interesse, sendo ainda viável a cooperação para a vetorização de camadas utilizadas em conjunto.
Em resumo, é necessário rever os processos de formação de bases geográficas urbanas. Existem alternativas tecnológicas muito interessantes tanto em termos de custos como em termos de benefícios, que podem ajudar a viabilizar a implantação de geotecnologias no município.
Em especial, todos os atuais e futuros interessados em GIS urbano aguardam ansiosamente a entrada em operação dos satélites de alta resolução, cujos produtos de baixo custo e qualidade suficiente para a grande maioria das aplicações modificarão completamente os paradigmas de trabalho na área. Inclusive com relação a hardware, software e capacitação de pessoal.
Clodoveu Davis é engenheiro civil, analista de sistemas, mestre em Ciência da Computação e Assessor de Desenvolvimento e Estudos da Prodabel – Empresa de Informática e Informação do Município de Belo Horizonte. email: cdavis@uol.com.br