Os especialistas e usuários com visão mais ampla terão nítida vantagem com relação aos produtores de mapas coloridos
Em nossa coluna na edição passada da "Infogeo", fizemos uma apresentação das diferentes tecnologias de Geoprocessamento disponíveis no mercado. Procuramos demonstrar que a escolha de uma solução GIS tornou-se mais complexa, por envolver a montagem de um sistema de informação e não apenas a seleção de um aplicativo para uso pessoal. Neste artigo, apresentamos uma visão adicional da questão, para apontar tendências de médio e longo prazo.
O que está acontecendo com a tecnologia de Geoprocessamento? Ao analisarmos a maioria dos lançamentos recentes, há uma nítida tendência na direção de soluções GIS corporativas. A idéia é utilizar a tecnologia de Geoprocessamento de forma integrada ao ambiente de informação já existente. O centro do sistema é um gerenciador de bancos de dados capaz de armazenar tanto os atributos quanto as geometrias dos dados espaciais, em conjunto com os cadastros já existentes. A partir deste suporte, os fabricantes oferecem interfaces de acesso e de comunicação com ambientes "desktop".
Antes que o leitor salte da cadeira e diga "é disto que eu preciso", é importante lembrarmos que as tecnologias de bancos de dados geográficos ainda estão longe de ser capazes de reproduzir, em escala corporativa, as ferramentas disponíveis na atual geração de ambientes "desktop". Para começar, as atuais soluções suportam apenas geometrias do tipo vetorial (pontos, linhas e polígonos), sem permitir o armazenamento de imagens e grades. Adicionalmente, as atuais implementações padecem de sérios problemas de ineficiência. Procedimentos que são extremamente rápidos quando realizados sobre estruturas de dados tradicionais, tornam-se ineficazes quando executados sobre tabelas de bancos de dados.
Deve-se ainda lembrar que as soluções corporativas exigem investimento significativo, não apenas na compra de hardware e software, mas principalmente no custo de treinamento, suporte e adaptação dos ambientes. Por enquanto, os casos de maior sucesso em soluções de GIS corporativo envolvem aplicações com grande necessidade de cadastro e poucas operações geométricas. Um exemplo são as aplicações de redes em concessionárias de energia, água e telefonia, quase sempre redutíveis a problema de consulta sobre bancos de dados tradicionais, com estruturas geométricas simples (arcos e nós).
Para a maioria das demais aplicações, será preciso perguntar: que uso faremos dos dados ? Que informação será produzida pelo GIS corporativo? A resposta pode parecer trivial, mas não é. Em artigos recentes na InfoGeo ("Além dos Mapas Coloridos", revista nº8, e "Mineração de Dados Espaciais", revista nº9), alertamos para este problema: a imensa maioria dos GIS possui mecanismos limitados de apresentação e exploração de dados. Será que a única coisa que queremos, após gastar um enorme esforço para construir uma base de dados municipal, é responder a perguntas simples como "mostre os lotes com IPTU acima de R$ 1.000,00 no bairro do Jardim Paulista"?
Nessa perspectiva, podemos apontar outra grande tendência, na área de Análise e Mineração de Dados Espaciais. Essas ferramentas buscam descobrir padrões de ocupação do espaço e relacionamentos causais entre as diferentes variáveis, com duas vertentes principais: Estatística Espacial e Geocomputação. No primeiro caso, buscamos produzir modelos matemáticos de distribuição e correlação, aos quais possamos associar propriedades como significância e incerteza. A Geocomputação utiliza técnicas como Redes Neurais, Autômatos Celulares e Busca Heurística para produzir resultados empíricos, mas cuja validade prática vem sendo crescentemente demonstrada.
Como mostramos em artigos anteriores, a Análise Espacial produz resultados muito superiores aos métodos tradicionais. Apesar disso, os fabricantes de GIS ainda estão reticentes em incorporar tais técnicas aos seus ambientes, talvez preocupados com o grau de sofisticação envolvido. Aqui vale a máxima de Einstein: "a teoria tem de ser tão simples quanto possível, mas nunca mais simplista que o necessário". Em outras palavras, é nossa convicção que os usuários, uma vez conscientes dos benefícios, irão fazer o esforço de aprendizado requerido. Isso irá favorecer aos fabricantes mais arrojados, e que incorporarem essas ferramentas de análise com maior ênfase.
Em resumo, à medida que avança a montagem de soluções corporativas de geoinformação, cresce a necessidade de técnicas de Análise Espacial, imprescindíveis para fazer bom uso desses grandes bancos de dados. Isso aponta para um cenário com grandes desafios e muita necessidade de atualização por todos nós. Ou seja, "se você pensa que sabe tudo de Geoprocessamento, pense de novo".
Um bom teste é analisar a figura 1, que apresenta uma visão das novas tecnologias de geoinformação. Quantas destas você conhece ou pelo menos tem idéia dos conceitos chave? Se a resposta for limitada, não se desespere ainda. Por enquanto, você está na companhia da maioria da comunidade. No entanto, daqui a alguns anos, os especialistas e usuários com visão mais ampla terão nítida vantagem com relação aos produtores de mapas coloridos.
Figura 1 – Tecnologias de Geoprocessamento
(adaptado de Marília Sá Carvalho, FIOCRUZ).
Os interessados em saber mais podem consultar as infopáginas do Centro de Geografia Computacional da Universidade de Leeds (www.ccg.leeds.ac.uk), do Centro de Ciência Social Habilitada Espacialmente, Universidade de Santa Barbara (www.ncgia.ucsb.edu/csiss), e o material disponível no site do INPE (www.dpi.inpe.br/geopro).
Gilberto Câmara
é coordenador de Pesquisa e Desenvolvimento em Geoprocessamento do INPE, sendo um dos responsáveis pelos sistemas SGI e SPRING (www.dpi.inpe.br/gilberto).