Cassio Taniguchi

O prefeito reeleito de Curitiba, Cassio Taniguchi, conta como têm sido as experiências com Geotecnologias na cidade – considerada um dos maiores centros de Geoprocessamento do país. Nesta entrevista exclusiva à InfoGEO, em seu gabinete, o prefeito, que participa do planejamento urbano da cidade desde 1972, fala das dificuldades enfrentadas, as soluções encontradas, e dos projetos para o mandato que está iniciando.

infoGEO – Curitiba é uma cidade com tradição em Geoprocessamento. Como o uso desta tecnologia no município tem se aperfeiçoado no decorrer dos anos?

Taniguchi – Não começamos pelo caminho mais acertado, num primeiro momento fizemos escolhas de tecnologias não muito adequadas. Mas podemos dizer que depois de algumas tentativas mal sucedidas, chegamos a uma modelagem que é a mais moderna, a mais adequada – neste momento, é claro, pois a gente sabe que esta é uma área que evolui com muita rapidez.

infoGEO – Qual sistema é utilizado atualmente?

Taniguchi – Atualmente estamos utilizando o Arcinfo, mas já com uma disseminação em rede. Hoje nós temos todas as secretarias que precisam ter acesso a dados georeferenciados, já com seus próprios terminais. As secretarias de Urbanismo, do Meio Ambiente, de Obras, de Saúde (agora com o cartão saúde), o Ippuc, e todos os órgãos que eventualmente tenham necessidade de ter acesso a este banco de dados, poderão disponibilizar do sistema, que tem uma arquitetura aberta. Este fator nos dá uma condição excepcional de atualização permanente, o que é fundamental, pois nunca se pode ter dados desatualizados. Desta forma, cada uma das unidades atualiza seus dados, mantendo o cadastro permanentemente vivo, up to date.
O que nós queremos é que esta tecnologia seja disponibilizada de um maneira dinâmica. Esta tendência de todas as cidades que possuem ou têm condição de ter , hoje é aquela que melhor consegue gerenciar o processo de crescimento e o aparecimento de favelas, que são as preocupações maiores.

infoGEO – Curitiba tem utilizado largamente o Geoprocessamento, desde a sua implantação nas áreas de planejamento urbano, de transporte, de cadastro – acredito que o cadastro de Curitiba esteja bem atualizado…

Taniguchi – Não muito. Este é um aspecto que a gente vem brigando há muito tempo, pelo menos uns quinze anos, insistindo que era necessário fazer um novo levantamento aerofotogramétrico. Esta necessidade ficou comprovada, quando finalmente fizemos um novo levantamento, no ano passado, e pudemos ver em Curitiba, 125.000 imóveis que sofreram alteração ou de uso ou de área .

infoGEO – Que fatores fizeram com que o cadastro de Curitiba permanecesse desatualizado durante tanto tempo?

Taniguchi – Isso se deve a uma cultura de que "o Geoprocessamento e o cadastro de Curitiba vão muito bem, que não é preciso fazer coisa alguma", pela própria tradição da cidade nesta área. Mas veja o crescimento de novos bairros, como o Bairro Novo, que tem apenas oito anos de existência e 60.000 pessoas morando, o Tatuquara que tem seguramente 20.000 habitantes que não constavam no cadastro prova o quanto o cadastro até então vigente, com fotografias de 1991, estava desatualizado.

infoGEO – Que providências a prefeitura tomou para atualizar seu cadastro técnico?

Taniguchi – O sistema está sendo atualizado através do PMAT, financiamento do BNDES. Já atualizamos toda a parte de aerofotogrametria e trabalho de campo, e foi exatamente neste processo que foram detectados os 125.000 imóveis desatualizados – num universo de 400.000, uma parcela significativa dos imóveis do município.
Com essa desatualização também fica evidente que está havendo uma evasão enorme de receita. Por isso, estamos tentando introduzir um novo conceito, com uma discussão mais ampla de reforma tributária. Estamos revendo várias taxas, até porque existem muitas variáveis condicionantes do governo federal. Por exemplo, antigamente se podia cobrar taxa de iluminação pública, hoje até a taxa de coleta de lixo é questionada, por questão de variação de volume. Ou seja, tudo aquilo que era taxa, e que não pode mais ser caracterizada como tal, foi incorporado ao imposto. São aspectos que precisamos urgentemente rever e, apoiados no Geoprocessamento e no cadastro técnico, fazer uma administração mais justa, mais equânime, que se faz possível principalmente à disponibilidade de dados.

Com isso o objetivo não é apenas arrecadar mais; é arrecadar porque a Lei de Responsabilidade fiscal exige isso. Mas se mais gente pagar, pagar efetivamente o que é devido, nós podemos até reduzir, criando uma justiça fiscal, ou seja, quem pode mais, paga mais.

infoGEO – Curitiba, que já foi capital ecológica, depois modelo de urbanismo, agora está mudando sua imagem para capital social. O que o Projeto Decidindo Curitiba e o Geoprocessamento tem a ver com esta nova imagem?

Taniguchi – Tem tudo a ver, as áreas alvo do Decidindo Curitiba são áreas de extrema pobreza, originadas de ocupações. Por isso mesmo, são áreas extremamente complicadas onde não se tem um tecido urbano bem definido, é caótico, aleatório. Então vai ser preciso abrir novas vias, áreas de acesso para caminhões de lixo, ambulância e bombeiro, apoiados no cadastro e em dados georeferenciados. Feitas as alterações, o desenho da região vai mudar, e o cadastro também vai mudar. Para urbanizar as áreas de ocupação irregular, eu tenho visto o pessoal da equipe técnica esquecer um pouco daqueles princípios de urbanismo de ruas de 10 metros, para se ajustar nas possibilidades da região, só depois estas áreas serão definitivamente mapeadas. Além do mais serão necessárias ainda relocações de habitações inadequadas, como as que estão em fundos de vale, para outras localidades. A execução destas alterações vai exigir a atualização imediata, on line, do cadastro. Para isso precisamos adotar medidas de atualização permanente. Talvez até novos vôos de algumas faixas, para só então se ter o cadastro definitivo.

infoGEO – O programa Decidindo Curitiba será um dos principais focos de investimentos nos próximos quatro anos. Quanto a prefeitura pretende investir?

Taniguchi – Ainda não temos uma estimativa, acredito que até o final de março teremos uma idéia muito clara de valores. Mas já temos os números dos projetos piloto nestas áreas de Bolsões de Miséria, como o bairro do Xapinhal, que já recebeu mais de 7,5 milhões de reais em investimentos em relocações, infra-estrutura básica e iluminação pública.

infoGEO – A prefeitura está usando alguma linha de financiamento do BNDES, como o PMAT?

Taniguchi – Nós recebemos do BNDES, através do PMAT, um empréstimo de 11 milhões de reais para melhorar não só o gerenciamento, mas também a arrecadação.

infoGEO – No seu ponto de vista de administrador e técnico, que tipo de retorno os investimentos em Geoprocessamento e Tecnologias da Informação trazem para uma prefeitura?

Taniguchi – O retorno no ponto de vista de gestão é que, com todo o sistema, é possível prestar a informação direto ao usuário via internet. Por exemplo, para se obter uma licença, um alvará, o usuário entra no site de urbanismo, e tem acesso a todas as informações do seu lote; na segurança pública, também as unidades têm acesso ao mapa instantaneamente, o que é fundamental para monitorar toda a cidade, observar os pontos críticos e direcionar o policiamento.

Em termos de retorno em receita, existe um retorno financeiro sem dúvidas, principalmente através da arrecadação decorrente do cadastro atualizado.

Mas o principal benefício continua sendo facilitar a vida do cidadão, que pode ter acesso à informação sem se deslocar, enfrentar filas, burocracia, espera. Além disso, a transparência das informações acaba evitando a corrupção – de criar dificuldades para vender facilidades, e isso também é favorável para a imagem de uma administração pública. O fácil acesso à informação é indispensável. Por exemplo, o uso do solo está dentro do computador, não se faz necessário o cidadão consultar um especialista para ver se uma determinada atividade pode ser realizada em determinada via, ele tem acesso direto, gratuitamente no computador, depois só vai pagar a taxa respectiva para obter o alvará. Vale a pena porque o custo/benefício de um investimento deste nos dá margem não só para aprimorar o planejamento da cidade como também de dar uma resposta à população.

Quando começamos a implantar o Geoprocessamento em Curitiba ninguém acreditava muito, nós também começamos por caminhos difíceis. Hoje este já é um instrumento super aceito pelas administrações públicas e cada vez mais estão surgindo novas aplicações, que tendem a crescer cada vez mais, só dependendo da criatividade de cada administração.  

Entrevista por: Aline Assumpção