Sensores Hiperespectrais a bordo do SIVAM
Ao entrar em operação absoluta a partir do segundo semestre de 2004, os sensores do SIVAM poderão gerar tipos de imagem de sensoriamento remoto ainda raras no Brasil, entre as quais IMAGENS HIPERESPECTRAIS.
O Sistema de Vigilância da Amazônia (SIVAM) compreende quatro aeronaves, a bordo das quais foram instalados sensores destinados ao monitoramento de recursos naturais. Desse montante, três aeronaves EMBRAER 145/R99-B foram equipadas com um sistema de Radar de Abertura Sintética (SAR), um sistema de varredura multiespectral (sensor MSS) e um sistema sensor operando nas regiões do visível e do infravermelho termal (sensor OIS).
O sensor SAR opera na banda espectral L (1,28 Ghz – 23,43 cm), com mulitpolarimetria (transmite e recebe radiação eletromagnética na polarização vertical e/ou horizontal – HH, VV, HV, VH) e na banda X (9,3Ghz – 3,22 cm), com uma única polarização, horizontal (HH). A resolução espacial (tamanho dos pixels que compõem a imagem) pode variar de 3 a 18 metros e a largura da faixa imageada de 10 a 120 quilômetros.
O sensor OIS é uma câmera de vídeo de alta definição que opera com sensibilidade no visível (imagens diurnas) e infravermelho (imagens noturnas).
O sensor MSS trabalha com duas possibilidades de campos de visada instantânea (IFOV) – 1,25 ou 2,50 graus. O tamanho do pixel das imagens MSS é função da altura do vôo e do IFOV utilizado. Esse sensor é flexível também quanto à resolução espectral, com modos que podem abranger 11 ou 31 bandas simultâneas, entre a faixa do visível e do infravermelho termal (0,42 a 10,50 microns ou 420 a 10500 nanômetros) (Tabela 1).
Das 33 bandas contidas em seu modo espectral expandido, o MSS possui 28 canais contíguos entre a faixa do azul visível até o infravermelho próximo (420-1050nm). Embora não contenha mais de uma centena de canais, o que é típico para um sistema hiperespectral (Figura 1), o sensor MSS pode ser entendido como um sistema do tipo hiperespectral, por possuir várias bandas que cobrem faixas do espectro de forma contínua, o que é condição necessária e suficiente para que um sensor seja definido como desta categoria.
O MSS é claramente um sensor voltado ao sensoriamento remoto da vegetação em geral, visto que inclui conjuntos de bandas capazes de detectar variações sutis na pigmentação (clorofila) das plantas nas regiões do visível azul, verde e vermelho; efeitos na borda vermelha devido a mudanças na cor e estrutura da planta; e variações no conteúdo de água e na estrutura celular interna das folhas (Figura 2).
Uma quarta aeronave, a R98, é equipada com um sistema de varredura HIPERESPECTRAL (sensor HSS). O sensor HSS opera com 50 canais, os quais cobrem as faixas do visível(VIS :12 canais; 430-790nm), infravermelho próximo (NIR : 8 canais; 820-1030 nm), infravermelho de ondas curtas (SWIR : 17 canais; 1550-2390 nm), infravermelho médio (7 canais; 3000-5400) e infravermelho termal (TIR :13 canais; 8200-12.700 nm) (Tabela 2, Figura 3). Embora também não contenha mais de uma centena de canais, o HSS ainda assim é classificado, pelos próprios fabricantes do sistema, como sendo um sensor genuinamente hiperespectral.
O HSS tem uma cobertura espectral diferenciada e é muito similar, nesse sentido, a sensores aeroportados modernos de sensoriamento remoto hiperespectral, atualmente em operação no mercado (confira última coluna SensoR). Entre as características que o destacam, são elencadas: (i) a cobertura espectral de alta resolução espectral das faixas do visível e do infravermelho próximo, com resolução espectral ligeiramente inferior ao do sensor MSS no modo de 33 canais (20 bandas no HSS, contra 28 no MSS); (ii) a altíssima resolução espectral na faixa do infra-vermelho de ontas curtas; (iii) os canais do infra-vermelho médio e termal, somente disponíveis em poucos sistemas dessa categoria.
A Figura 4 apresenta uma composição colorida elaborada com três imagens do sensor HSS, sendo uma referente à região espectral do vermelho (recebeu o filtro azul), outra do infravermelho próximo (recebeu o filtro vermelho), e outra imagem da região do infravermelho médio (recebeu o filtro verde).
Essas imagens utilizadas na elaboração da Figura 4 foram geradas durante uma missão experimental sobre a cidade de Anápolis, GO. Nessa composição colorida, é possível observar um estádio de futebol e um grande ginásio de esportes que aparece no canto inferior esquerdo da cena. A resolução espacial média dessas imagens é de 5 m. Pela opção dos filtros nas respectivas bandas espectrais, a cobertura vegetal assumiu a cor vermelha, enquanto que as áreas ocupadas por concreto assumiram a cor esverdeada e o solo exposto assumiu uma tonalidade azulada.
Os sensores do SIVAM têm a função de dar suporte às missões de vigilância do Comando da Aeronáutica. Entretanto, os mesmos também podem ser utilizados, a princípio, em missões de mapeamento. Isso muito interessa à comunidade usuária de dados remotamente coletados e ao segmento de Geotecnologias do país, que ainda tem pouco acesso a algumas tecnologias de fronteira, parte das quais agora disponíveis com o advento dos sensores do SIVAM.
A aplicação dos dados disponibilizados a partir da concretização de missões de coleta de dados realizadas pelo programa SIVAM poderá atender à diferentes necessidades da comunidade de usuários, transcendendo o caráter meramente aplicativo (monitoramento), senão abrangendo aspectos acadêmicos. Muitos destes últimos vêm sendo realizados mediante missões de coleta de dados hiperespectrais aerotransportados, as quais têm contado com a participação de sistemas sensores (p.ex.: AVIRIS, HYMAP) e de profissionais (p. ex: NASA) baseados exclusivamente no exterior. Entre essas missões destacam-se aquelas realizadas no âmbito do projeto LBA (Grande Experimento da Biosfera e Atmosfera da Amazônia), além de outras iniciativas pontuais de universidades em conjunto com instituições de pesquisa internacionais. Vale salientar que o processo de negociação da entrada de missões envolvendo aeronaves, sensores e pesquisadores estrangeiros nem sempre é um procedimento rápido e corriqueiro. Assim, a disponibilidade dos sensores descritos no âmbito de uma iniciativa nacional como o programa SIVAM, permitirá uma maior agilidade e controle na aquisição e no processamento dos dados coletados.
Dessa forma, com base nas suas características, os sensores HSS e MSS
poderão proporcionar à comunidade avanços em várias áreas de aplicação, algumas das quais sintetizadas na Tabela 3.
A partir das possibilidades sucintas apresentadas na Tabela 3, muitas outras aplicações, de maior detalhe, podem ser raciocinadas. Por exemplo: no estudo da vegetação, a disponibilidade de dados hiperespectrais aerotransportados, como os do programa SIVAM, permitirá a avaliação de deficiências nutricionais, a avaliação das conseqüências de estresses ocasionados por poluentes em dosséis de culturas agrícolas ou de formações florestais protegidas por legislação, o inventário multi-estágio de áreas reflorestadas, a estimativa de parâmetros biofísicos de culturas agrícolas
que em última análise serviriam para a estimativa de suas produtividades, etc.
Atualmente, os sensores do programa SIVAM estão sendo preparados para serem efetivamente disponibilizados à comunidade nacional. Essa fase de preparação inclui avaliações sobre seus funcionamentos e sobre a qualidade dosados que estão sendo gerados. Nesse último aspecto, estão as etapas de completa compreensão daquilo que é efetivamente registrado por esses sensores no que se refere principalmente aos aspectos geométricos e radiométricos das imagens geradas.
Acredita-se que ainda no segundo semestre de 2004 alguns desses sensores poderão ser disponibilizados à comunidade de usuários, mesmo que para a finalização de mais alguns ajustes e testes. Portanto, os leitores da coluna SensoR devem ficar atentos às futuras novidades sobre o programa SIVAM, que certamente serão aqui documentadas. Obs: Partes desse texto foram baseadas nos seguintes documentos: (i) "Produtos Disponibilizados a partir dos Sensores das Aeronaves R99-B (SAR, MSS e OIS) e R98 (HSS)", Maj-Av. Nilo Sergio de Oliveira Andrade (Comando da Aeronáutica – COMGAR); (ii) "O Sistema de Proteção da Amazônia", Edgar Fagundes (Diretor Executivo do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia -CENSIPAM). Esse artigo foi preparado em parceria com e Flavio Jorge Ponzoni (DSR-INPE)
Carlos Roberto de Souza Filho
Chefe do Departamento de Geologia e Recursos Naturais (DGRN)
Coordenador do Laboratório de Processamento de Informações Georreferenciadas (LAPIG) do Instituto de Geociências da UNICAMP
beto@ige.unicamp.br