e-Turismo e e-Cultura: viagens físicas e espirituais
As possibilidades de acesso à cultura e ao turismo através da da internet
Quando estive participando do congresso ICIS 04 (International Conference on Information Systems) em Washington D.C, realizado em dezembro passado, tive a oportunidade de entrar em contato com um grupo interessado em e-Turismo (turismo eletrônico), ou seja, interessado em todas as oportunidades de complementar o turismo real (visitando o lugar) com informações através da Internet.
O que assisti sobre o assunto na Conferência foi o workshop "e-Culture, U-Tourism and Virtual Heritage" (www.cis.gsu.edu/~emonod/washington), organizado pelo o interessantíssimo professor francês Emmanuel Monod. Este encontro discutiu, além de turismo, as possibilidades culturais na grande rede. Principalmente as oportunidades abertas pela futura disponibilização dos acervos dos grandes museus na Internet. Eu tentei achar alguns museus brasileiros. Comecei pelo Ministério da Cultura. A página inicial é bem mais ligada a parte burocrática das atividades do ministério do que a cultura em si mesma. Mas, lá encontrei o link para o IPHAN (www.iphan.gov.br) que me levou a uma lista de museus brasileiros (www.iphan.gov.br/pagpatr/links.htm#link13). Na lista os três primeiros endereços que tentei acessar levaram a páginas não encontradas (Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte de São Paulo – MASP, Museu de Arte da Pampulha). Entretanto, depois tive sucesso com outros como o Museu do Índio e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
A e-Cultura está ligada diretamente ao e-Turismo já que você pode ‘viajar’ e visitar o museu sem ter fisicamente ido ao local.
Também ligado à organização do workshop está o consórcio para o turismo aberto, o Open Tourism Consortium (www.opentourism.org). O consórcio tem como objetivo principal participar no desenvolvimento de padrões de ferramentas de software que dêem suporte ao turismo. Eu achei especialmente interessante o escopo que menciona a fase antes da viagem, momento em que se faz a pesquisa, sonha com os lugares, planeja e deseja. Depois vem a fase da viagem em si, em que se está lá, vendo e apreciando as diferentes culturas e lugares. Finalmente chega-se a fase depois da viagem, em que se vê as fotos, conta-se os casos, passa-se os vídeos em seções intermináveis para os amigos.
Tudo isso me lembra um caso interessante que eu denomino de turismo ao contrário: a viagem da saudade, a vontade de viajar não para um lugar novo e sim para sua casa, o lugar antigo, onde já se conhece tudo.
Nos anos 80, um amigo meu viajou para a Europa para tentar a vida. A vida de um imigrante, principalmente um ilegal e sem preparação profissional, pode ser bem difícil. Então no meio de uma de suas crises de imigrante ilegal, ele criou esta máxima: "se você acorda já pensando na pátria é sinal que uma crise está chegando e talvez seja a hora de ir embora de volta pra casa". É também dele a frase: "ontem estava tão perto, hoje está tão longe" manifestando seu espanto com a rapidez com que as pessoas se movimentam neste mundo globalizado. Sua vida de imigrante na Europa não era fácil, situação que aumentava ainda mais suas chances de acordar "pensando na pátria". Entre as coisas extravagantes que ele tinha de fazer para sobreviver incluíam entrar andando de costas em parques e museus que cobravam ingresso. Desta maneira os porteiros eram enganados pensando que ele estava saindo e não entrando no museu. Que tipo de turismo seria este eu não sei. Outras atividades menos turísticas que ele uma técnica de colocar uma tortinha inteira de uma vez na boca. Voltando ao assunto de cultura, ele também ficava em pleno inverno com a cabeça fora da janela com seu radinho de pilha tentando pegar melhor as ondas curtas das rádios brasileiras transmitindo os jogos de futebol nos domingos a tarde. Mas, isto foi nos anos 80. Hoje com o e-Turismo e a e-Cultura as coisas são diferentes.
Na minha última coluna falei um pouco sobre a fase anterior a viagem. Como é possível conhecer um pouco do lugar e ver um pouco do que te espera. Usando a Internet pude ter noção de como era o lugar para onde eu iria. Pude ler o depoimento de pessoas que já tinham estado lá. Fiz reservas de táxi e me informei sobre horários de trens. Hoje, vou falar do meu ponto de vista sobre a e-Cultura: Não só a e-Cultura dos museus e galerias, mas também da e-Cultura popular. E esta sim podemos dizer que já está amplamente disponível na Internet.
"Vendo a obra ‘O Ovo -Urutu’, da artista plástica Tarsila do Amaral, no e-museu, a vontade que se tem é de ir correndo ao MAM do Rio ver ao vivo o quadro"
Podemos então começar com o rádio. Eu sempre tive uma relação ‘geográfica’ com o rádio. Estando em Belo Horizonte sempre gostei de ouvir rádios do Rio de Janeiro. Gostava de pensar como eram as vidas das pessoas em uma outra cidade e fazia esta conexão através do rádio. Agora, estando distante do Brasil, faço a conexão ao contrário. Ouço as rádios do Brasil através da Internet e me lembro da minha própria vida no passado. E tem, é claro, o futebol no domingo. O sinal que não estou sozinho é que freqüentemente as conexões nos domingo são difíceis. Todo mundo quer ouvir seu time na Internet. Uma novidade por aqui é um pequeno transmissor de FM (digite fm transmitter no Google e veja os resultados). Você pode conectá-lo ao computador e ouvir as rádios brasileiras no seu radinho de pilha.
Os jornais também estão amplamente disponíveis na Internet. Pode-se ler as notícias compiladas por serviços como o do IG (www.ultimosegundo.ig.com.br) ou do Yahoo (http://br.news.yahoo.com). Eu particularmente prefiro ler direto no O Globo (www.oglobo.globo.com), na Folha (www.folha.uol.com.br) para noticias do Brasil em geral ou O Tempo (www.otempo.com.br) para as noticias de Belo Horizonte.
O ponto alto da e-Cultura popular brasileira para mim são as novelas. O portal da Globo Media Center (www.gmc.globo.com) está muito bom. Com uma boa conexão você agora pode assistir as novelas e shows da Globo na Internet. Pode ver a Maria do Carmo procurando por Lindalva ou então a maravilhosa Nina (Alinne Moraes) beijando o português na novela das seis.
E não é só isto. Também pode-se encontrar na Internet receitas da cozinha brasileira. Desde pão de queijo até moqueca capixaba. Mais uma vez voltando ao assunto inicial da coluna, a e-Cultura. Experimente a pergunta ‘museu site:br’ no Google. Ela retorna 623.000 resultados encabeçados pela pagina do Museu de Arte Moderna do Estado do Rio de Janeiro (www.mamrio.com.br). Para quem acha que Urutu é um veículo militar de uma olhada na página do MAM do Rio ou na página de Tarsila do Amaral (www.tarsiladoamaral.com.br) para ver a pintura "O Ovo – Urutu".
Vendo as pinturas de Tarsila a impressão que me vem é a mesma que tenho sobre livros eletrônicos. Eles não substituem os livros de papel. São mais um incentivo para que se vá a obra original. Vendo Urutu de Tarsila no e-museu a vontade que se tem é de ir correndo ao MAM do Rio ver ao vivo o quadro.
Frederico Fonseca
Doutor em Ciência da Informação Espacial pela Universidade do MaineProfessor na Escola da Ciência da Informação e Tecnologia da Penn State University nos Estados Unidos.
fredfonseca@ist.psu.edu