Continuo neste artigo a conversa que tivemos anteriormente sobre o uso de geotecnologias para apoiar estratégias de combate às fraudes no setor elétrico.

Desta vez, apresento a contribuição que a geoestatística trouxe para as análises aplicadas na área de concessão da AES Eletropaulo (municípios da Grande São Paulo)

Compreender a distribuição espacial de dados oriundos de fenômenos ocorridos no espaço constitui hoje um grande desafio para a elucidação de questões centrais em diversas áreas da administração pública e de empresas, como saúde, dinâmica urbana, meio-ambiente, marketing e gestão de ativos.

Tais estudos vêm se tornando cada vez mais comuns, devido à disponibilidade de Sistemas de Informação Geográfica (GIS), e também à necessidade de explicação da distribuição espacial de problemas e variáveis de interação socioeconômica que modelos tradicionais e clássicos geralmente não endereçam.

A geoestatística é um campo da ciência que aborda o tema da dependência e da heterogeneidade espacial, aspectos críticos em qualquer estudo de economia regional. Essas características podem invalidar o uso de técnicas econométricas convencionais.

Os métodos quantitativos espaciais são um caso especial do enfoque estatístico geral e, portanto, necessitam de um conjunto de métodos e técnicas diferentes daqueles utilizados na estatística convencional. Empresas que possuem na geografia informação essencial para sua gestão se beneficiam tremendamente do uso dessas técnicas.

Para mensurar o quanto a geografia contribui para o entendimento do fenômeno de manifestação da perda (fraudes e ligações clandestinas, basicamente), realizamos regressões multivariadas para explicar a perda total, utilizando as outras variáveis que compõem o indicador de propensão à perda (ver InfoGEO 45) como base: renda domiciliar média (consumo médio residencial de energia elétrica), percentual da área ocupado por favelas e percentual de clientes cortados.

As regressões realizadas que utilizaram o componente espacial (ou, em linguagem mais formal, o termo espacial auto-regressivo) aumentaram em 190% o poder de compreensão do fenômeno (os coeficientes de explicação foram de 11%, da regressão simples, para 32%).

Mais ainda, cerca de 43% da perda estão correlacionados com a perda das áreas vizinhas (segundo o índice I de auto-correlação espacial de Moran, uma medida de dependência espacial). A figura apresenta um mapa de associação espacial local da perda. As regiões azuis (situadas principalmente no centro) representam áreas com baixa perda de energia e com áreas vizinhas igualmente com pouca perda, o contrário das regiões vermelhas (alta perda e alta perda na vizinhança). Outros padrões (alto-baixo e baixo-alto) praticamente inexistem. Já as regiões brancas representam mudanças de regime de transição.

Indicador de auto-correlação espacial local da perda de energia
-> Indicador de auto-correlação espacial local da perda de energia

Como as áreas analisadas são relativamente pequenas (com no máximo 1 quilômetro quadrado), é razoável supormos que o aspecto cultural ajuda a explicar essa relação. Além da questão ligada à capacidade de pagamento, os clientes podem passar a praticar a fraude por perceberem a prática em seus vizinhos.

Por isso, é fundamental a ação da distribuidora de energia na coibição de ações dessa natureza, combatendo os fraudadores e também promovendo inclusão social e geração de renda em áreas que apresentem essas características.

Eduardo de Rezende Francisco
Mestre e doutorando em administração de empresas pela FGV-EAESP
Bacharel em ciência da computação pelo IME-USP
Atua em GIS, Business Intelligence, pesquisas de mercado e estratégias de marketing na AES Eletropaulo
Consultor em integração Geomarketing & Data Mining
Presidente da GITA Brasil (www.gita.org.br)
eduardo.francisco@aes.com