Vazio cartográfico do BrasilA mobilização “Vamos mapear o Brasil?” está realmente agitando a comunidade. Apesar das inúmeras divergências, o ponto em comum é que todos concordam que alguma coisa precisa ser feita.

Os mapas hoje são parte importante dos projetos de Tecnologia de Informação na gestão de grandes corporações públicas e privadas. Além disso, ferramentas como o Google Earth revolucionam a mente, tanto de crianças como de altos executivos.

O próprio conceito histórico do mapeamento sistemático vem sendo rediscutido dentro do IBGE, segundo relata o seu atual diretor de geociências, Luiz Paulo Fortes. Será que os usuários realmente precisam desses dados no formato que sonham muitos cartógrafos e empresários do setor?

Outro ponto são as responsabilidades. Deve-se apostar todas as fichas no governo federal, ou não seriam os Estados os verdadeiros responsáveis por dinamizar os investimentos no setor? Assim, restaria a uma entidade reguladora central somente a definição de conceitos de padronização e de infraestrutura de dados espaciais, como a Comissão Nacional de Cartografia (Concar) já vem fazendo.

Mal ou bem, os projetos estão saindo do papel. Segundo o general Pedro Ronald Vieira, recém empossado na Diretoria do Serviço Geográfico (DSG), existe em curso um grande projeto de mapeamento da Amazônia, envolvendo várias instituições que atuam na região. Os recursos são significativos e passam de 300 milhões de reais, a serem usados nos próximos seis anos.

Fruto do debate, começam a ser melhor divulgados vários projetos estaduais e regionais de mapeamento. A descentralização da cartografia, como diz o cartógrafo Nilson Ferreira, do Espírito Santo, é uma realidade e pode ser considerada um novo paradigma do setor. O que faz falta é não termos no Brasil um mecanismo para inventariar e divulgar essas ações de forma sistemática.

Existem ausências sentidas nessas discussões, como as universidades. Além da falta de iniciativa da maioria dos acadêmicos em manifestar suas opiniões, notamos uma quase inexistência de pesquisas aplicadas, que respondam a perguntas freqüentes dos usuários. Não existe melhor lugar para aparecerem propostas para testar novos processos de mapeamento, em pequenas e grandes escalas. Pelas facilidades de linhas de financiamento para pesquisa, comparações entre soluções de outros países poderiam queimar etapas no Brasil, no momento de propor uma solução que, invariavelmente, envolve milhões de reais, muitas vezes de dinheiro público.

A produção de pesquisas e projetos é inegavelmente grande nas universidades do Brasil. O que é questionável é o número reduzido de projetos que atendam melhor às necessidades atuais da sociedade.

Outra ausência sentida é da Sociedade Brasileira de Cartografia (SBC). Nos últimos anos, só ouvimos falar dela quando está próximo da realização do seu congresso ou da festa de entrega das famosas condecorações.

A SBC deveria, através da sua direção, atualizar-se tecnologicamente e gerencialmente, e reconstruir sua imagem para, depois, manifestar-se para a comunidade. Não é o bastante para uma sociedade científica, de grande tradição, virar uma mera organizadora de congressos para um grupo cada vez mais restrito de profissionais. Prova disso é o crescimento de outros eventos afins, como o de sensoriamento remoto promovido pelo Inpe e outros realizados pela UFPR, UFPE, Unesp, etc..

O ato de repensar a cartografia no Brasil deve seguir o mesmo caminho mundial. Os dados geográficos para aplicações, sejam elas convencionais, na internet ou móveis, devem atender não a cartógrafos, mas a seus usuários. Fica cada vez mais evidente e irreversível que, no processo de especificação, produção e representação cartográfica, existe espaço para agrimensores, cartógrafos, geógrafos e demais profissionais sérios que se especializaram no tema, e que os usuários das mais diversas formações é que vão dizer que tipo de mapa precisam, de forma compatível com a verba disponível.

Emerson Zanon Granemann
Engenheiro cartógrafo
Diretor e publisher da Editora MundoGEO
emerson@mundogeo.com