A Amazônia Legal possui uma área total de 5,2 milhões de quilômetros quadrados, dos quais cerca de 1,8 milhão não possui informações cartográficas terrestres do relevo compatíveis com escalas maiores que 1:250.000. Essa área, denominada de “vazio cartográfico”, pode ser dividida em 1,5 milhão de quilômetros quadrados que correspondem à área de floresta e 300 mil à área de não-floresta.

A constante presença de grande quantidade de nuvens na região, a alta densidade da vegetação, as dificuldades logísticas e os perigos naturais da selva são os fatores responsáveis por tornar o mapeamento da Amazônia o maior desafio nacional para os profissionais da área.

Mesmo com o uso das mais diversas e modernas tecnologias dos sistemas sensores ópticos orbitais e aerotransportados, essa floresta, grandiosa em sua beleza e extensão, cria obstáculos quase que intransponíveis às atividades de cartografia e topografia.

Inserido nesse contexto, de vencer desafios e garantir informações terrestres necessárias à soberania nacional, encontra-se o Serviço Geográfico do Exército Brasileiro, executando o Subprojeto Cartografia Terrestre do Projeto Implantação do Sistema de Cartografia da Amazônia.

Tal projeto é o resultado de vários anos de articulação, do qual participam também o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), a Marinha, a Força Aérea Brasileira e o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), por meio de um Acordo de Cooperação Técnica assinado em 26 de fevereiro de 2008 e com vigência de cinco anos.

Foram estabelecidas as atividades con-juntas dos partícipes, na consecução do projeto denominado, cujos resultados es-perados são a geração de produtos cartográficos (planialtimétricos) e geoinformações com precisão compatível com as escalas de 1:50.000 e menores, a geração de cartas geológicas nas escalas 1:100.000 e 1:250.000 e a atualização da cartografia náutica na escala 1:100.000 das principais hidrovias da região amazônica.

O Projeto Cartografia da Amazônia é composto de três subprojetos: a Cartografia Terrestre, sob a responsabilidade da Diretoria de Serviço Geográfico (DSG) com apoio da Força Aérea Brasileira (FAB); a Cartografia Geológica, sob a responsabilidade do Serviço Geológico do Brasil; e a Cartografia Náutica, sob a responsabilidade da Diretoria de Hidrografia e Navegação da Marinha (DHN).

O projeto tem dimensão estratégica e sua realização permitirá o aprofundamento do conhecimento sobre a Amazônia Brasileira, bem como o suporte a projetos de infraestrutura a serem implantados na região. Além do desenvolvimento regional, o projeto prevê a geração de informações para monitoramento, segurança e defesa nacionais, com especial ênfase nas áreas de fronteira. Serão gerados também modelos numéricos de elevação e informações detalhadas sobre a estratificação vegetal, em abrangência ainda não realizada na Amazônia Brasileira, que projetará positivamente o Brasil quanto ao conhecimento daquela região.

A solução tecnológica para superar a dificuldade relacionada à constante presença de nuvens na Região Amazônica é o emprego de Radares de Abertura Sintética (SAR). As áreas de floresta serão imageadas com sistemas sensores SAR interferométricos (InSAR) nas bandas P e X, possibilitando, desta forma, o mapeamento planialtimétrico no nível do solo e da copa das árvores. O serviço de aerolevantamento InSAR está sendo realizado pela empresa Orbisat da Amazônia Indústria e Aerolevantamento. As áreas de não-floresta, que compreendem as áreas desmatadas, áreas de cultivo agrícola, áreas de pecuária, etc., localizadas onde avança o arco do desflorestamento, serão imageadas com o uso dos radares interferométricos, nas bandas L e X, das aeronaves R99-B do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam).

A quantidade de dados produzidos é imensa. Todas as unidades de discos rígidos provenientes dos dados do aerolevantamento são remetidas para o Centro de Imagens e Informações Geográficas do Exército (CIGEx), em Brasília, onde são processados para a geração das imagens e dados vetoriais, de acordo com a Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde).

Um requisito para o processamento é a implantação de refletores, denominados corners reflectors, que serão empregados na sinalização do aerolevantamento SAR. Tais refletores são implantados no campo e medidos por meio de GPS pelos militares da 4ª Divisão de Levantamento do Exército (4ª DL), sediada em Manaus. A seleção dos pontos de instalação tem uma metodologia que leva em conta a largura das faixas de voo, as precisões desejadas, o limite operacional da tripulação e da aeronave, a acessibilidade e o requisito de preservar o ambiente, sem cortar uma única árvore.

Apoio em campoApoio em campo

A região é totalmente inóspita e todos os deslocamentos de pessoal e o transporte de suprimentos, combustível, equipamentos e outros materiais são muito difíceis.

As equipes de campo são compostas por topógrafos e outros militares, gerenciadas por oficiais engenheiros cartógrafos. A preparação das equipes de campo envolve, além da capacitação técnica na área radar e posicionamento GPS, uma extensa programação de cursos e estágios para operação em condições tão extremas, como o conhecimento de noções básicas de sobrevivência na selva, primeiros socorros, resgate aquático, condução de embarcações, dentre outros. Esse pessoal é destacado em bases pré-estabelecidas nas cidades próximas às áreas de trabalho. A partir daí, pequenas equipes, geralmente com quatro homens, seguem para o meio da floresta por meio fluvial ou aéreo. Os deslocamentos até os locais, nos quais serão feitos os rastreios GPS e colocados os refletores, podem chegar a mais de mil quilômetros e levar vários dias de voadeira (lancha regional). Ressalta-se que são transportados também notebooks, geradores, aparelhos de comunicação, combustível, gêneros alimentícios, material para sobrevivência e resgate, além do equipamento individual e do armamento necessário, dadas as peculiaridades da região.

Essas equipes ficam acampadas na selva por uma semana, até que a aeronave realize o vôo radar previsto para aquela área, quando então podem retrair para a base ou prosseguir para outro ponto.

Juntamente com as equipes são mobilizadas viaturas leves, caminhão e caminhão tanque com combustível de aviação para a aeronave radar, bem como inúmeros outros equipamentos. Tudo isso é feito por balsas que, a 12 quilômetros por hora, levam dias para transportar o material até o destino.

Em face da obediência às legislações ambientais, é proibida a abertura de clareiras. Como há necessidade do uso de GPS de precisão e implantação dos refletores, que devem ser visualizados pelo radar, as equipes têm que procurar na selva locais que possibilitem o rastreio e a montagem dos corners reflectors. Desta forma, alguns pontos são feitos sobre pedras existentes nos leitos dos rios ou em cima de plataformas montadas na hora pelo pessoal.

Vale lembrar que o local de trabalho possui animais selvagens, diversas doenças tropicais, corredeiras e grande incidência de chuvas fortes.

Esse projeto é, sem dúvidas, um marco na história da cartografia nacional, não apenas pelos produtos cartográficos gerados e dificuldades na sua execução, mas principalmente por se tratar do mapeamento de uma região de extrema importância no contexto internacional e quase que desconhecida do ponto de vista cartográfico.

Gen Pedro Ronalt Vieira
Diretor do Serviço Geográfico

Maj Antonio Henrique Correia
Chefe da Seção Técnica da DSG

Cap Rogério Ricardo Silva
Chefe da Equipe de Levantamento da 4ª DL