Desde 16 de setembro de 1965 temos um Código Florestal (4.771 de 15/09/1965). Daquela época até os dias de hoje ele sofreu várias emendas, fruto dos ajustes necessários entre as políticas do governo, a sociedade e a comunidade dos ambientalistas. Ainda hoje, o Código é alvo de críticas, tanto por parte de proprietários que desconhecem os benefícios resultantes ou pelo fato que a propriedade de um imóvel não é mais absoluta como no passado.

No seu artigo primeiro, o Código Florestal estabelece que as florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral, e especialmente essa Lei, estabelecem.

Essa Lei é um passo no reconhecimento, pelo Estado Brasileiro, de que as florestas e demais formas de vegetação natural, assim como as outras formas de vida que nelas se abrigam, são recursos essenciais à sobrevivência das espécies, inclusive à humana, pois tudo é interligado nesta enorme nave que se desloca no espaço.

Nesse novo Código foram definidas as Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal. Conforme se lê dos trechos transcritos do parágrafo, se caracterizam por:

II – Área de Preservação Permanente: área protegida nos termos dos artigos 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;

III – Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.

Chama-se a atenção para o significado dessas áreas, visto seus objetivos e quão importantes são para todos, proprietários e não proprietários de imóveis, urbanos e rurais.

Mais adiante, no texto da lei, também se verifica sobre a Reserva Legal (RL):

Artigo 15, parágrafo 8o – A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas neste Código.

Dada a sua importância, a RL torna-se uma parcela com direitos diferenciados das demais porções do imóvel. Deve, portanto, ser especializada e averbada no título e assim tem sido feito. São áreas protegidas, precisam ser identificadas e localizadas eficientemente de forma remota. Assim, podem ser protegidas com uso de meios tecnológicos que dispensam a constante presença humana local. Por isso, a descrição tabular deve espelhar a realidade.

Da mesma forma se deveria proceder com a Área de Preservação Permanente (APP), que tem grande importância (veja definição). Entre outros objetivos ela protege os cursos d’água e ajuda na manutenção de sua vazão, por exemplo. Os corpos d’água sem a APP reduzem muito o seu volume.

Ao analisar as normas, as decisões e as próprias averbações de RL nas matrículas de imóveis podemos verificar que a especialização da RL é, de fato, a intenção de todos, mas em análise mais detalhada verifica-se que as descrições padecem do mesmo mal que acometiam as descrições perimétricas de imóveis, antes da instituição do georreferenciamento. Vejamos alguns exemplos:

RL 1 – Começa no ponto R2B, cravado em terras do proprietário, na confrontação com a fazenda Espigão; daí segue confrontando com o último, no azimute 302º 25’ 30” e distância de 1.453,56 metros até o marco R1D.

Como definir a posição do marco R2B, ao longo da divisa da fazenda Espigão? Sem bem definir a posição do marco inicial, na descrição por azimute e distância, há completo prejuízo na identificação da superfície preservada.

RL 2 – …; daí segue por esta confrontação no seguinte azimute e distância 11º 37’ 23” – 112,00 metros até o marco M-29, cravado a 50 metros de uma represa, daí segue por esta confrontação sempre a 50 metros de área de preservação até o marco M-30, também cravado a 50 de área de preservação.

Neste caso, como saber a forma da represa e verificar se a área é aquela averbada ao longo do tempo?

Estes dois pequenos exemplos, trechos baseados em descrições reais de duas diferentes matrículas, nos mostram a fragilidade na identificação dessas parcelas e como, sem a aplicação de conceitos mais apropriados, permanece comprometida a preservação desses bens, observada a escala de tempo que se deve conceber para esses casos, na medida em que deles dependem as futuras gerações.

Mesmo que sejam arquivadas as plantas, nelas podem constar somente tais informações, pois a descrição contida no memorial descritivo é o espelho desta.

Raciocinando segundo a necessidade da preservação e do uso sustentável dos recursos, da sobrevivência das espécies (Homo sapiens, inclusive), ante o espírito do Código Florestal e as necessidades que envolvem a preservação desses espaços, bem como as questões com que se deparam os produtores brasileiros, aos poucos compelidos pelo mercado internacional a se adequarem à legislação ambiental brasileira (ou mundial), seria mais sensato cuidar de sistematizar melhor a especialização dessas parcelas de RL e APP. Ambas, no aspecto da identificação, merecem procedimentos melhor normalizados e documentados, incluindo-se: o georreferenciamento apropriado; a descrição dos limites também por posição; e o controle de qualidade dessas informações por parte dos órgãos ambientais, para que os mesmos tenham menor custo e maior eficiência na fiscalização. ?

Régis Bueno
Régis Bueno é engenheiro agrimensor, doutor em engenharia pela
Escola Politécnica da USP (EPUSP) e diretor da Geovector Engenharia Geomática.
Atua na área de posicionamento por satélites e regularização fundiária desde 1989
regisbueno@uol.com.br