Duas décadas de desafios
Um estudo da IBM em 2012 estimou que 2,5 quintilhões de dados são publicados diariamente na web. São fotos, postagens, vídeos, coordenadas geográficas e muito mais, o que nos coloca à disposição um universo tão vasto que é chamado de “Big Data”. O termo se refere a dados não estruturados e manipuláveis por máquina, e representa uma tendência que incentiva a geração de novas ferramentas que possam gerar conhecimento a partir de tal ampla oferta de insumos.
Grande parte desta informação é de cunho espacial e nos desafia a continuar a evolução que vem afetando a comunidade desde a popularização dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG) na década de 1990. Dos cinco componentes clássicos dos SIGs: software, hardware, métodos, dados e pessoas, todos passaram por grandes transformações sob efeito de avanços tecnológicos, científicos e de políticas públicas. Isto implicou em um impacto no modelo das “ilhas” originais, nas quais técnicos altamente especializados criavam análises isoladas usando computadores especiais, software de custo extremamente elevado e dados escassos criados ainda com tecnologia analógica, para a época atual, de informação em tempo real, em dispositivos móveis e gerada de forma colaborativa e compartilhada.
Outras tendências foram também incorporadas: a necessidade do diálogo para a resolução de problemas de interoperabilidade resultou na criação do Open GIS Consortium ( OGC) e do Comitê Técnico para Informação Geoespacial da ISO – International Standards Association (ISO/TC 211), que irão completar 20 anos em 2014. Questões de incompatibilidade sintáticas, como formatos exclusivos, atualmente não são mais preponderantes, mas sim uma série de discussões afins, como formas de estabelecer a interoperabilidade semântica, isto é, explicitar o conhecimento utilizado na criação de uma base de dados e compartilhar este resultado com as demais comunidades. Um ambiente padronizado abriu caminho para a diversificação no mercado de software, dando ao usuário a opção de escolha entre uma grande quantidade de componentes proprietários e livres. Desta forma, foi facilitada a inovação, a ampliação da base de usuários e o desenvolvimento de aplicações criativas.
Os primeiros sistemas de mapeamento para internet datam de 1996. Desde então, a infraestrutura de comunicação vem sendo ampliada, multiplicando a capacidade de transmissão de dados. Adicionalmente, a onipresença de dispositivos GPS associados a computadores móveis gera uma infinidade de terminais interconectados. Conjuntamente com a maior participação dos usuários, é possível vislumbrar uma rede das pessoas como sensores, gerando informação no local onde ocorrem. Em situações de emergência, onde a velocidade de atualização é um parâmetro crítico, o mapeamento colaborativo já apresentou alguns resultados, mas em muitas outras situações é um potencial a ser ainda totalmente estudado.
De forma paralela, cresceu a demanda da sociedade por transparência, principalmente com relação a dados governamentais, e importantes iniciativas legais, como a Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE), a Lei de Acesso a Informação e a Infraestrutura de Dados Abertos, têm influenciado fortemente o modo de publicação destes dados, possibilitando a criação de aplicações mash-ups, cruzando fontes diversas e maximizando o potencial de uso.
Entre os próximos desdobramentos, é esperado que não apenas a Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais se consolide, mas IDEs locais, municipais, metropolitanas e estaduais se multipliquem, a exemplo das pioneiras que estão sendo estabelecidas. O dado compartilhado, ainda que de forma precária, por vezes carente de investimento em sua melhoria e atualização, acaba por despertar a demanda de uma atenção mais especial. Esta é uma forma de auxiliar nas questões que permanecem a resolver, como a falta de recursos para os essenciais dados de referência. Outros desafios emergem, como a documentação e avaliação da qualidade de dados, a resolução de conflitos semânticos e a exploração mais eficiente de novas interfaces para visualização e compreensão dos dados. Principalmesnte, há muito o que avançar na qualificação dos profissionais que permeiam todos estes processos, pois há necessidade de um perfil raro, que apresente entendimento tanto das peculiaridades do campo geoespacial como do estado da arte da tecnologia da informação e comunicação. A abundância de informações e o fim gradual das barreiras culturais, políticas e tecnológicas para seu compartilhamento só contribuem para que o conhecimento do espaço geográfico tenha um peso crescente nas atividades e interações da sociedade.
Professora de Banco de Dados Geográficos e SIG no Departamento da Geomática da UFPR. Engenheira Cartógrafa e doutora em Ciências Geodésicas pela UFPR, com mestrado em Gestão Ambiental pela Universidade de Nottingham, Reino Unido, e MBA em Gerenciamento de Projetos pela FGV. Coordenadora do nó da UFPR da rede ICA/OSGeo Labs. Coordenadora do Grupo de Trabalho de Normas e Padrões do Cinde/Concar
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