Falta de legislação clara e incentivos do governo, mapeamentos sobrepostos e consequente desperdício de recursos, competição predatória entre empresas. Este são apenas alguns problemas enfrentados pelo mercado de geomática e soluções geoespaciais no Brasil.

Confira abaixo uma das questões “fundamentais e estruturantes” que vêm emperrando o pleno desenvolvimento do mercado e afetando uma comunidade formada por centenas de empresas, instituições públicas, universidades e milhares de profissionais que atuam direta ou indiretamente neste mercado.

Políticas públicas: fontes de recursos, coordenação e planejamento de longo prazo

O que esperar do Governo para o setor de Geomática? Muito. A lista é grande, mas foram selecionados três pontos essenciais e conectados. E a comunidade foi unânime em apontar como muito relevantes todos os três itens:

• Definir melhor os responsáveis pela padronização, coordenação, produção e distribuição de dados geoespaciais no país
• Planejar e executar um Plano de Mapeamento Básico e Sistemático do Brasil
• Garantir recursos para executar e manter atualizados os dados geoespaciais do país

Desafios da Geomática no Brasil-PolíticasConsiderando o nível federal, não existe, hoje, uma instituição que atue como integradora de esforços e coordenadora das políticas públicas do setor. A prioridade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sempre foi a estatística, a Diretoria do Serviço Geográficos do Exército (DSG) tem suas principais missões ligadas à defesa nacional, a Comissão Nacional de Cartografia (Concar) é um órgão que tem uma missão nobre, mas que na prática pouco tem feito para dinamizar o setor. A coordenação do Ministério de Planejamento e Gestão poderia ter um papel importante na integração dos esforços dos demais ministérios, bem como na tentativa de unir esforços.

Por outro lado, os avanços do IBGE, DSG, Concar e demais órgãos para implementação da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais (Inde) têm sido notáveis. O que falta realmente é a definição mais clara das funções dos atores. Sem esta definição, não se percebe um movimento claro de um projeto a longo prazo, que viabilize recursos permanentes para a execução e manutenção do mapeamento do país em escala adequada. O vazio cartográfico continua e a colcha de retalhos aumenta. Entra governo, sai governo, de direita, de esquerda, de centro, mas infelizmente o quadro não muda. Este é um assunto dos mais complexos e mais comentados em eventos, mas que há anos não evolui na velocidade que se espera. Um país que está crescendo, que quer ser de fato uma grande potência, tem que ser plenamente mapeado, para que sua infraestrutura seja projetada, executada e monitorada a partir de informações atualizadas, de fácil acesso e georreferenciadas. A principal pergunta, apesar de importante, não deveria ser “Quanto vai custar este mapeamento?” mas sim “Quanto custa ao Brasil não ter este mapeamento atualizado?”

Para Dênis de Moura Soares, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, uma forma de agilizar as questões relacionadas às Geotecnologias foi a criação do Fórum Intergovernamental de Gestores de Geoinformação (FIGG), que se constitui como uma instituição de composição mais flexível e menos limitada por questões formais, cujas decisões são formadas por consenso. “O FIGG representa, portanto, uma ponte entre as políticas públicas e a Concar, além de um mecanismo de interface com a sociedade, permitindo a inserção da geoinformação no processo de planejamento e de monitoramento de programas, projetos e políticas públicas”.

Por outro lado, Luiz Antonio Ugeda Sanches, Presidente do Instituto Geodireito, afirma que é urgente a necessidade de políticas públicas que levem em conta os avanços atuais. “As diferentes escalas de governança (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) começam a perceber a necessidade de usar as informações geoespaciais para melhor compreender fatos geográficos, com o objetivo de construir a espacialização da cidadania. Para tanto, é imperioso cumprir a Constituição Federal e criar uma política pública geográfica e cartográfica atualizada, de forma a conferir ferramentas jurídicas eficazes ao cumprimento desta missão”.

Além da definição mais clara de políticas públicas, a grande quantidade de impostos é uma preocupação recorrente dos empresários. Para Eduardo Oliveira, presidente da Santiago & Cintra, “um ponto importante que gostaria de chamar a atenção, refere-se à alta tributação imposta aos equipamentos de topografia e mapeamento. Há casos em que a totalidade de impostos chega a 60 ou 70% do valor importado”. E isto impacta vários setores da economia. “Trata-se de equipamentos utilizados nos mais variados segmentos, como georreferenciamento, mineração, cadastro, agricultura, meio ambiente, obras de infraestrutura, etc., ou seja, áreas fundamentais para o desenvolvimento do país”, argumenta.

Já Moema José de Carvalho Augusto, da Diretoria de Geociências do IBGE, os exemplos de outros países são fundamentais. “Na definição da Política Nacional de Informação Geoespacial é importante considerar as reflexões feitas por outras Infraestruturas de Dados Espaciais (IDE) na busca para aumentar o acesso físico a redes e serviços, e da ‘liberalização’ da informação do setor público, para facilitar a sua reutilização e criar mercado e indústria de informação competitivas, propiciar serviços mais eficientes e apoiar a participação pública”.

Assim como Eduardo Oliveira, o presidente da Associação Brasileira de Engenheiros Cartógrafos – Regional Paraná, Juan Carlos Gironda, também aponta para a falta de políticas claras. “Assim como as políticas públicas que são embrionárias, lentas e desligadas da realidade nacional em todas as áreas que envolvem Tecnologia, principalmente as que serviriam de sustentação para o desenvolvimento, não poderia ser diferente nas áreas de Cartografia, Mapeamento, Geoprocessamento e outras ferramentas da Geomática”. Juan Carlos comenta, ainda, sobre os resultados da enquete: “a pesquisa também revela a maturidade e consciência dos entrevistados que, ao apontar deficiências de padronização, planejamento e recursos, expressou quão precárias são as políticas públicas para o segmento”, conclui.

Da mesma forma, Rogério Rigato, Diretor de Desenvolvimento de Negócios da Sisgraph/Hexagon, concorda com a ordem de relevância do resultado da pesquisa. “Enquanto existem iniciativas em andamento para padronização e distribuição de dados geoespaciais no Brasil, como a Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais, a execução de mapeamentos é muito carente de recursos”. O problema, segundo ele, são os mapeamentos descoordenados. “É comum que governos municipais contratem aerolevantamentos com regularidade […]. Mas, em geral, os produtos obtidos para esse fim ainda são meros ‘desenhos’ CAD, sem a inteligência topológica típica de dados SIG, não aderentes às Normas Técnicas da Cartografia Nacional. Se essas iniciativas tivessem apoio do Governo Federal, o escopo do mapeamento poderia ser mais abrangente e o produto final poderia ser melhor aproveitado por todos”, complementa.

Para saber mais sobre este e conhecer os outros desafios da Geomática no Brasil, acesse a matéria de capa da revista MundoGEO 74 e veja abaixo um vídeo com a opinião de Emerson Granemann, Diretor da MundoGEO: