Durante o final do mês de setembro e início de outubro, eventos de intenso transporte de poeira ocorreram em cidades do interior de São Paulo. Os casos foram observados entre os dias 26 e 27/09 e nos dias 01, 03 e 04/10, atingindo cidades como Araçatuba, Barretos, Catanduva, Presidente Prudente e Ribeirão Preto. Cidades vizinhas ao estado de São Paulo, localizadas em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul, também foram atingidas.

Tempestades de poeira ou areia são comuns em regiões áridas e semi-áridas, como por exemplo aqueles eventos comumente observados no deserto do Saara. Eles afetam a radiação solar nas regiões atingidas de forma direta, reduzindo a quantidade de energia que chega à superfície devido à reflexão e absorção da luz solar.

Indiretamente, as partículas de poeira ou areia reduzem o potencial de formação de nuvens devido à estabilização da atmosfera e também agindo como núcleos de condensação. Devido a estes efeitos, observa-se resfriamento da atmosfera e a redução das temperaturas próximo à superfície. Como prejuízo à sociedade, pode-se citar a piora da qualidade do ar e consequente impacto na saúde.

A redução do potencial regador em áreas providas de empreendimentos que exploram a energia solar é um exemplo de impacto econômico. Porém, os efeitos vão além, e especificamente no período considerado, observaram-se perdas de vidas humanas e danos a imóveis.

Previsões meteorológicas produzidas por diversos centros de meteorologia no Brasil e no mundo, em geral, representam apenas variações climatológicas de poeira na atmosfera e não são capazes de prever fenômenos específicos como os ocorridos em São Paulo.

Em geral, há grandes limitações na representação numérica e consequente previsão de tempestades de poeira e seus efeitos sobre a América do Sul, especialmente os ocorridos no interior de São Paulo.

Modelagem e monitoramento

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), unidade do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), lidera um projeto para o desenvolvimento de um Modelo Comunitário Unificado do Sistema Terrestre.

Neste contexto, há grande potencial de o INPE/MCTI, em conjunto com diversos parceiros, elevar a capacidade brasileira em modelagem numérica do Sistema Terrestre, que atenda todas as escalas espaciais e temporais para previsão de eventos extremos como o ocorrido no interior paulista.

Levando em consideração as projeções de mudanças climáticas para o clima regional brasileiro e também o desmatamento da Amazônia, a frequência de ocorrências de tempestades de poeira pode aumentar em um futuro próximo.

Tempestades de poeira no Brasil estão geralmente associados à ocorrência de sistemas convectivos de mesoescala que se formam especialmente durante os períodos de primavera, quando a atmosfera passa a ficar mais instável. A ocorrência de tempestades devido à formação destes sistemas provoca a ocorrência de chuvas intensas que geram fortes correntes descentes de ar que se propagam na dianteira do sistema convectivo e são denominadas frentes de rajada.

Por outro lado, algumas características do período seco ainda predominam durante a primavera, como por exemplo a baixa umidade presente nos solos, altas temperaturas e baixa umidade do ar. As frentes de rajada, ao atingirem e se deslocarem por áreas onde o solo se encontra muito seco e especialmente em áreas agrícolas onde não há cobertura vegetal, provocam a suspensão ou ressuspensão de grande quantidade de poeira, ocasionando as densas nuvens de partículas que foram observadas nos últimos dias.

A situação de seca predominante sobre a Região Sudeste do Brasil vem contribuindo para a redução da umidade disponível nos solos. Nas últimas semanas do mês de setembro foram observadas temperaturas elevadas, inclusive com recordes em diversas localidades do centro do país.

Mudanças nos padrões atmosféricos

Foi identificado uma onda de calor que persistiu entre os dias 19 a 21 de setembro na região que abrange as cidades atingidas pelas tempestades de poeira, reforçando a condição seca e quente tipicamente observada durante a estação seca do Brasil central.

Entretanto, na última semana de setembro observou-se uma mudança nos padrões atmosféricos entre o Centro-Oeste, o Sudeste e o Sul do Brasil com a ocorrência de tempestades localizadas.

Na imagem a seguir é mostrada a situação ocorrida na região de Presidente Prudente – SP no dia 01/10/2021. É possível observar uma linha de instabilidade entre o extremo norte do Paraná e o oeste do estado de São Paulo, caracterizada pela organização em linha de um conjunto de tempestades. Na dianteira da linha de instabilidade, verifica-se a frente de rajada que levantara as partículas do solo e formaram a intensa nuvem de poeira na região. É importante salientar que além da nuvem de poeira, a frente de rajada provocou ventos intensos. Rajadas de até 107 km/h foram registradas no aeroporto de Presidente Prudente às 12h local.

Imagem do Satélite GOES 16 no canal visível, às 14:50 UTC

Fonte: Inpe