Qual será o futuro do GPS

Qual será o futuro do GPS? Esse foi o tema de um desafiante debate de que participei no evento expoGEO Brasil’99 realizado recentemente em Curitiba. Apesar de difícil de responder, a pergunta é pertinente e instigante. Obviamente não se pode prever nada com clareza, mas algumas tendências da tecnologia e de suas aplicações certamente podem ser vislumbradas. Perceber esses pontos e tentar prever qual seu impacto na realidade brasileira foi possivelmente o ponto alto do debate.

Mas, quais são essas tendências? Antes de mais nada, pode-se afirmar sem medo de errar que o emprego de técnicas espaciais para navegação e posicionamento se consolidou e está cada vez mais presente em nossas vidas. Isso é bastante claro não apenas pelo emprego crescente do GPS como também pelo surgimento dos novos sistemas similares, como o russo GLONASS, que atualmente está em fase de implantação (tema da coluna em infoGEO nº2).

Há ainda outros sistemas em fase de projeto, incluindo aí possíveis sistemas comerciais privados. Na Europa, discute-se há algum tempo sobre um sistema global de navegação por satélite (conhecido pela sigla GNSS), que incorporaria o GPS, o GLONASS e satélites geo-estacionários.

Duas alterações no sistema GPS foram prometidas pela vice-presidência dos Estados Unidos. São elas a extinção da Disponibilidade Seletiva e a liberação da freqüência L2, que aconteceria em conjunto com a criação de uma nova freqüência para uso civil. Estas duas modificações, aliadas ao avanço da eletrônica, deixariam mais perto da realidade o sonho do usuário de ter em mãos um receptor de tamanho reduzido, barato, que consuma pouca bateria e que seja capaz de fornecer posição com precisão milimétrica.

Debate sobre GPS no expo GEO Brasil 99

Estas alterações acarretarão grande impacto nas diversas aplicações já existentes do GPS e abrirão novas perspectivas de aplicação. Aos usos já tradicionais (navegação, geodésia, mapeamento), vêm se juntando o controle de frotas, a coleta de dados para Sistemas de Informações Geográficas, a agricultura de precisão, o uso do GPS como sensor atmosférico na meteorologia, (para a estimação do vapor d’água, por exemplo) e em investigações da alta atmosfera, para a determinação do conteúdo total de elétrons ionizados e na transmissão de energia elétrica (tema da coluna em infoGEO nº7).

Existe ainda uma invasão do GPS em novos mercados. A construção civil e a mineração são dois bons exemplos. Várias antenas GPS, colocadas em posições diametrais de veículos, tratores ou maquinários em geral, definiriam não apenas a posição, mas também o movimento deles.

Pode-se imaginar, por exemplo, que a quantidade de minério escavado seja calculada em tempo-real. Ou que o movimento de veículos remotos seja controlado a distância. Pode-se prever também, a concretização da navegação e localização automática de veículos, que promete revolucionar o setor de transportes.

Vamos agora passar o olhar para os possíveis impactos que estes avanços trarão para os usuários no Brasil. Inicialmente, qualquer alteração no sistema GPS, como por exemplo a introdução de novos sinais, traz a necessidade de aquisição de novos receptores.

Logo, os usuários no Brasil podem começar a se preparar para novos investimentos, caso queiram se manter em dia com o desenvolvimento da tecnologia.

Outra situação de grande impacto para o uso do GPS no Brasil é a proliferação de estações e redes de referência, que oferecem dados GPS de forma gratuita ou não. Pode-se mencionar, como exemplo, os dois serviços comerciais de DGPS atualmente ofertados no país (Racal e Omnistar), algumas estações que oferecem ou não dados GPS gratuitamente via internet (como a da Santiago & Cintra e a da Sight GPS, por exemplo), a rede de rádio-faróis da Marinha, e, finalmente, a Rede Brasileira de Monitoramento Contínuo (RBMC) do IBGE. Em breve estará funcionando a rede do INCRA, em fase de implantação. Ela visa atender primeiramente aos propósitos do INCRA, mas possivelmente terá seus dados disponíveis para a coletividade mais tarde.

O potencial do Sistema de Posicionamento Global (GPS) vai muito além do uso militar, para o qual foi originalmente criado

De todas, a mais importante é a RBMC. A rede do IBGE define uma estrutura básica, a nível nacional, compatível com o sistema de coordenadas usado pelo GPS. Todos os levantamentos feitos nesse mesmo sistema serão compatíveis entre si. A idéia básica é que uma estação de referência que tiver suas coordenadas ligadas à RBMC determinará sempre coordenadas também compatíveis com esse sistema. A diferença entre elas será resultado do método de posicionamento utilizado (tema da coluna em Infogeo nº6).

O uso de estações e redes de referência permite que usuários com um único receptor possam levar a cabo suas atividades.

Isto é, as coordenadas determinadas pelo usuário serão relativas à estação de referência e estarão ligadas ao sistema de coordenadas do IBGE. Isto é positivo tanto do ponto de vista econômico (redução de custos por se usar um único receptor) quanto do ponto de vista da compatibilidade do levantamento em relação a outros.

Logo, a preocupação pela proliferação de redes e estações de referência é de que elas possam não estar ligadas à RBMC, tornando suas coordenadas incompatíveis entre si.

Marcelo Carvalho dos Santos é Ph.D. em Geodésia e Engenharia Geomática pela Universidade de New Brunswick, Canadá, professor adjunto do Departamento de Geomática e pesquisador associado do Laboratório de Geodésia Espacial, da UFPR. E-mail: mcsantos@geoc.ufpr.br