Comunidade cartográfica discute o futuro do cadastro nos municípios brasileiros

Engenheiros, geógrafos, arquitetos, professores, alunos e pesquisadores estiveram em Florianópolis de 15 a 19 de outubro participando do 7º Congresso de Cadastro Técnico Multifinalitário e Gestão Territorial (COBRAC).

Simultaneamente, foram realizados o 5º Encontro para os Países do Mercosul e o 2º Encontro para os Países da América, que reuniram profissionais de vários países envolvidos com o Cadastro Técnico Multifinalitário (CTM).

Ficou evidente no congresso que os problemas dos países da América Latina são parecidos. Regularização fundiária, desatualização cartográfica e falta de padronização de dados geográficos não são “privilégios” dos brasileiros.


->Feira de produtos e serviços no COBRAC 2006

O principal problema no Brasil é que geralmente cada setor das prefeituras ou dos governos estaduais tem o seu próprio cadastro ou multicadastros que não se interligam. Isto se chama “geoprocessamento em ilhas”, e dificulta o acesso aos dados cartográficos.

Modernas tecnologias de mapeamento estão à disposição atualmente no Brasil, porém não há uma definição de conceitos, regras e padrões para que o cadastro seja feito com eficiência. Exemplos de outros países e experiências nacionais foram amplamente discutidos no COBRAC.

Experiências internacionais

Da Espanha veio o exemplo apresentado pelo Dr. Manuel Alcázar, da Universidade de Jain. Ele contou que com a implantação do cadastro espanhol os proprietários de imóveis passaram de “vítimas cadastrais” a agentes de cadastro, pois têm interesse que seus dados sejam inseridos corretamente na relação de imóveis da prefeitura.

Rui Julião, do Instituto Cadastral Português, declarou que “o cadastro não é uma obra concreta, não é uma ponte, e tem sempre um grande risco político envolvido”. O problema para os governantes é que o cadastro não aparece, mas vale a pena ser feito mesmo sendo arriscado e com alto custo. Segundo Julião, 60% do investimento volta em dois anos, e depois de cinco anos há lucro.

Na Alemanha, o cadastro está estabelecido há 200 anos e funciona perfeitamente. Segundo o Dr. Jurgën Philips, o CTM alemão é bastante simples, pois não é baseado em cobrança de impostos. As palavras mais recorrentes são precisão, confiabilidade e atualidade. A diferença é que no Brasil os cadastros são específicos (fiscal, ambiental, etc) e na Alemanha o objetivo único do cadastro é caracterizar o imóvel e registrá-lo.

Os exemplos apresentados pelas autoridades cartográficas européias indicaram um norte a ser seguido para que o Brasil e os demais países latino-americanos possam realizar o ordenamento territorial com maior eficácia.

Como implementar um cadastro?

A discussão central do encontro foi: como implementar um cadastro usando os novos métodos de mapeamento para registrar e medir imóveis? Houve um consenso de que o problema não é o método, mas sim a organização, e que não existe coisa pior do que começar um cadastro e não terminar.

Uma proposta apresentada no congresso foi a terceirização do serviço de mapeamento e cadastro para a iniciativa privada, através de licitações, sendo o governo responsável pela organização do trabalho e pela divulgação dos dados para a sociedade.

Outra solução viável pode ser a utilização de servidores de mapas. Na administração pública, alguns setores muitas vezes relutam em ceder os dados, mas com servidores eles podem ser acessados de um computador remoto.

Segundo Jürgen Philips, a lei 10.267 do INCRA foi um marco no cadastro rural brasileiro, pois nunca na história do Brasil o cadastro tinha sido obrigatório para o registro de imóveis. Assim como existe o INCRA, a existência de um Instituto Nacional de Planejamento Urbano seria vital para a gestão territorial dos municípios.

Planos diretores

Estatuto das cidades e plano diretor foram assuntos bastante discutidos no COBRAC. A qualidade dos planos aprovados em outubro deste ano é a principal preocupação do governo federal. Porém, quem verifica a qualidade dos planos diretores é o Ministério Público, que não tem uma posição única para todo o país.

Um integrante da Comissão Nacional de Cartografia (CONCAR), presente no evento, comentou que deve ser definida uma estrutura de dados nos planos diretores, para que todos sigam o mesmo padrão. Ele questionou que tipos de insumos foram utilizados, se foram evitados usos indevidos de tecnologias, etc. .

De acordo com Benny Scharsberg, representante do Ministério das Cidades, os municípios que elaboraram os planos diretores nos padrões corretos receberão mais repasses. Mesmo os que não entregaram também receberão recursos, porém em menor quantidade. Para ele, a imprensa tem “sanha punitiva”, condenando as cidades que não terminaram o plano, mas o ministério vai ajudar todos os municípios.

Resultados concretos

O resultado de toda a discussão feita em torno do CTM foi uma moção dirigida ao Ministério Público, feita pelos especialistas do congresso, para alertar sobre a importância da qualidade dos planos diretores dos municípios. Também foi sugerido um seminário mais geral, a ser realizado com a presença de técnicos, prefeituras e registradores.

Segundo os congressistas, o momento atual é importantíssimo na política de desenvolvimento urbano no Brasil. Os primeiros passos foram a Constituição de 1988 e o Estatuto das Cidades. A atual revisão da lei de parcelamento urbano, conhecida como “lei de responsabilidade territorial”, é o passo mais importante no conceito de gestão plena do território.

Sistema Nacional de Informações das Cidades

O principal programa de CTM em andamento no Brasil é o Sistema Nacional de Informações das Cidades (SNIC). No início de 2007, as prefeituras receberão do Ministério das Cidades um software, baseado no Terraview do INPE, que permitirá integrar o banco de dados sócio-econômicos dos municípios com imagens de satélites de alta resolução.

A intenção do Ministério das Cidades é que todos os municípios com mais de 20 mil habitantes, que por lei precisam fazer o Plano Diretor, usem o software do SNIC.

O sistema auxiliará na transparência da administração pública, pois qualquer cidadão com acesso à internet poderá consultar os mapas do município e verificar como está o andamento de obras públicas.

Para fazer com que o software seja usado em sua plenitude, o Ministério iniciará em janeiro um plano de capacitação para treinar dois técnicos de cada município. A idéia é que os técnicos orientem os demais servidores a utilizar o sistema.

Eduardo Freitas Oliveira
Engenheiro cartógrafo
editorial@mundogeo.com