O multicaminhamento, ou seja, a multi reflexão dos sinais em uma ou mais superfícies antes de atingir a antena do receptor, é uma das fontes de erro que afetam a determinação de coordenadas no posicionamento por satélite, conforme pode ser visualizado na figura 1.

A ocorrência destes efeitos depende do local e das superfícies no entorno da antena, para que possa ser causada a reflexão. Estas superfícies podem ser chapas metálicas, espelhos d’água, veículos, entre outras fontes, e podem estar dispostas de forma horizontal, vertical ou inclinadas. Além disso, estas superfícies podem estar até mesmo um pouco distantes da estação.


-> Figura 1: reflexão de sinais

O multicaminhamento, em casos extremos, pode causar perda e travamento de sinal no receptor e a consequente perda de ciclo. Os efeitos provocam erros maiores nas observações de código do que nas de portadora e prejudicam proporcionalmente a combinação linear destes sinais. Conforme SEEBER (2003), o sinal recebido diretamente e o sinal refletido podem ser representados de forma simplificada pelas expressões:

Ad = Acosфd
Ar = aAcos(фd + ф)

Onde:

• Ad é a amplitude do sinal direto, em m
• Ar é a amplitude do sinal refletido, em m
• a é o fator de amortecimento (0 < a < 1)
0 quando sem reflexão
1 sinal refletido, forte como o direto
• фd fase do sinal direto e
• ф deslocamento de fase, do sinal refletido, em direto.

A sobreposição de ambos conduz à expressão:

AΣ = Ad + Ar = AcosΦd + aAcos(Φd + Φ) = βA cos(Φd + Θ)

Com Ad,max = A, e Ar,max = aA, resulta que a equação para o erro de multicaminhamento resultante (Θ) na fase da portadora observada será:

Θ = arctan (senΦ/a-1 + cosΦ)

A amplitude pode ser expressa por:

B = A (1 + a2 + 2a cosΦ)1/2

Pode-se verificar que para a = 1, caso mais desfavorável – quando o maior valor de Θ é 90º – o erro no sinal L1 (comprimento de onda de 0,1905m), atinge aproximadamente 0,05m. A propagação de h para as duas freqüências gera valores correspondentemente maiores ou menores. A propagação na altitude h (geométrica) pode chegar à casa de 0,15m.

Os efeitos são cíclicos e podem ser atenuados com um tempo de observação maior do que o período necessário para completar um ciclo (tipicamente entre 15 e 30 minutos). Contudo, a permanência em estação por intervalos de tempo desta duração não é viável para os métodos relativos rápidos: cinemático e semi cinemático, pois estes se baseiam na ocupação de um ponto por curto período de tempo, tipicamente menor que 5 minutos.

Estes efeitos são mais preocupantes nos casos em que se requer maior precisão relativa, em ambientes propícios ao multicaminhamento. Isto se pode dar, no dia a dia, tanto na cidade quanto no campo.

Este mesmo ambiente também influencia de outro modo a recepção do conjunto necessário de satélites, dificultando assim a obtenção de geometria adequada (Geometric Dilution of Precision – GDOP). Os sinais podem ser bloqueados, refletidos ou refratados pelos elementos da estrutura, , alterando o conjunto de satélites de forma diferente em cada ponto. Alguns dos aspectos que envolvem o fator DOP foram tratados no artigo da edição 15 da revista InfoGPS|GNSS.

A preocupação com o multicaminhamento deve ser maior ainda nas estações base, devido à propagação dos efeitos para a posição do receptor móvel. Maior cuidado ainda deve ser tomado se as bases estiverem em ambiente urbano.

As medidas para redução dos efeitos podem ser tomadas durante a definição da rede de pontos, dos receptores e programas de processamento e da calibração da estação:

• A primeira medida é considerar a escolha de pontos em locais mais adequados, uso de antenas providas com plano terra e “choke ring”, entre outras providências que podem minimizar os efeitos quando for conveniente sua aplicação;
• A segunda está no âmbito da escolha de equipamentos e programas que proporcionem técnicas de mitigação, que podem ser baseadas na polarização dos sinais e na diferença de tempo de propagação, pois o sinal refletido chega atrasado à antena em relação ao sinal direto e, por isso, pode ser discriminado;
• A terceira, com aplicação mais restrita, requer a calibração dos efeitos de multicaminhamento na estação, que deve ser realizada em várias etapas, detectando e avaliando seus efeitos cíclicos para proceder a calibração da estação em uma etapa seguinte.

A disponibilidade futura de mais sinais também trará benefícios na minimização dos efeitos de multi-caminho. Experimentos com a simulação de sinais L5, feitos por LAU e CROSS (2003), demonstram que os resultados provenientes do processamento com três freqüências e técnicas de detecção e rejeição de multicaminhamento poderão apresentar resultados 50% mais precisos do que os produzidos somente com sinal L1.

LANGLEY (1998), bem como SEEBER (2003), também discorrem rapidamente sobre potenciais efeitos da difração, fenômeno associado ao multicaminhamento dos sinais. O fenômeno da difração ocorre quando o sinal é obstruído, porém uma fração da frente de onda é recebida pelo receptor.

O primeiro autor reporta que os erros dependem da elevação do satélite e variam lentamente com a longa distância e com a elevação e tempo, não sendo cancelados necessariamente com repetição das sessões de observação. São introduzidos erros sistemáticos, da ordem de centímetros, na estimativa de todos os parâmetros, inclusive nas coordenadas. Relata ainda que estes efeitos foram observados em antenas instaladas em pilares.

Os sinais também podem sofrer interferências intra e extra banda, decorrente da técnica de espalhamento do espectro (spread spectrum) empregada para os códigos, que espalha o sinal em uma faixa de 2,046 MHz para o código C/A e 20,46 MHz para o código P.

Portanto, os sinais não são discretos e podem sofrer interferências de fontes externas nessas proximidades, mesmo que se empreguem técnicas para minimizar este efeito na recomposição do sinal. As interferências ocorrem preferencialmente na L2 e podem ser causadas por:

• Fontes transmissoras de VHF, UHF e de TV com grande potência e localizadas a distâncias de até 500 m;
• Transmissores direcionais “digipeater” de rádio amadores;
• Radares para controle de vôo a distâncias de até 20 km;
• Cabos de alta voltagem a uma distância de até 10 m; e
• Telefones celulares.

Outro fator que deve ser lembrado é a atenuação do sinal provocado por cobertura vegetal. As folhas de árvores causam bloqueio ou atenuação dos sinais, em especial quando se observa as portadoras, ocorrendo demasiadas perdas de ciclo.

Observe os potenciais riscos no entorno da antena do seu GPS e tenha melhores resultados no posicionamento por satélites.

Referências para consulta

LANGLEY, R. Propagation of the GPS signal. In: TEUNISSEN, P.; DE JONGE, P.; KLEUSBERG, A. (Ed.) GPS for Geodesy. 2 ed., Berlin-Heidelberg-New York, Springer-Verlag 1998, p. 111- 149
LAU L.; CROSS P. Impact of GPS modernization on precise carrier phase-based positioning in the presence of multipath. ION GPS 2003. Portland, Oregon Proceedings. Institute of Navigation. 2162-2172 p SEEBER, G. Satellite Geodesy: foundations, methods, and applications. New York, Walter de Gruyter, 2003.

Régis Bueno
Engenheiro agrimensor, Msc
Diretor da Geovector Engenharia Geomática
regisbueno@uol.com.br