O colunista Marcelo Santos fala das vantagens previstas a partir da inserção do sinal L5 no sistema de posicionamento global

A Parte do processo de modernização do Sistema de Posicionamento Global envolve alteração na estrutura dos sinais transmitidos pelos satélites. Um novo sinal se tornará disponível à comunidade civil, aqui referido como L5, com freqüência igual a 1176,45 MHz. Ao mesmo tempo haverá uma alteração na modulação do sinal L2, que terá incluído o código C/A, a exemplo do que já acontece com o sinal L1. Dentro de alguns anos, os satélites a serem colocados em órbita já transmitirão os sinais nessa nova estrutura.

A Tabela abaixo resume as características dos sinais em termos de freqüência e comprimento de onda.

Vários são os motivos que levam a atualização do sinal L2, e o surgimento do novo sinal L5. Notadamente dois, relacionados à navegação: redundância de sinais visando aumento da disponibilidade e redução dos riscos de interferência, e correção dos efeitos da ionosfera. O fato do sinal L5 estar dentro da banda protegida de navegação torna-o mais atraente para correção do efeito da ionosfera do que o L2, a ser modulado pelo código C/A, por ser este último mais susceptível a interferências.

Para a comunidade de usuários ligados à Geodésia e topografia, que se valem de observações sobre a fase do próprio sinal, o terceiro sinal é interessante por outro motivo: a resolução da ambigüidade. A ambigüidade, para um satélite qualquer, corresponde ao número de ciclos inteiros, incógnito para o receptor, no início da sessão de observação. Por ser incógnito para o receptor, a ambigüidade deve ser calculada, ou resolvida, se for desejada precisão ao nível do centímetro, por exemplo, em aplicações diferenciais empregando a fase da portadora (RTK). A resolução da ambigüidade, nesses casos, é facilitada ao se combinar linearmente (isto é, somar ou subtrair) observações de fase em duas freqüências. Duas combinações, propostas no final dos anos 80, encontraram utilidade na resolução da ambigüidade, as chamadas combinações wide-lane e narrow-lane. As características dessas combinações podem ser vistas na Tabela. Pode-se verificar que a combinação wide-lane resulta em um novo sinal com comprimento de onda maior do que os sinais L1 e L2. Esta característica é muito importante: em geral, quanto maior o comprimento de onda, mais rápida a resolução da ambigüidade. A combinação narrow-lane participa de forma complementar no processo, cujo objetivo é, em geral, a resolução da ambiguidade portadora L1. Existe outro método de resolução da ambiguidade que utiliza um processo de busca para determinar, dentre uma família de combinações, qual delas oferece o melhor resultado segundo algum critério pré-estabelecido como, por exemplo, o critério dos mínimos quadrados.

Uma observação quanto a palavra lane, que significa "comprimento de onda". Sabendo-se disso, pode-se apreciar o significado dos adjetivos wide ("largo") e lane ("estreito"), significando o "alargamento" ou "estreitamento" do comprimento de onda, com respeito às portadoras L1 e L2, ao se formarem combinações wide-lane e narrow-lane, respectivamente.

O advento do terceiro sinal (L5), cuja freqüência é próxima a da freqüência dos sinais originais L1 e L2, permite que duas novas combinações surjam, conforme a Tabela: as combinações (L1-L5) e (L2-L5). Estas duas combinações possuem comprimento de onda maior do que aqueles dos sinais L1 e L2, sendo que a combinação (L2-L5) possui um comprimento de onda de 5,86 metros, 5 metros maior do que a combinação wide-lane! A resolução da ambigüidade se dá em forma seqüencial, isto é, resolve-se a ambigüidade das combinações com maior comprimento de onda, um por um, até a de algum dos três sinais primários (L1, L2 ou L5).

Simulações feitas indicam a possibilidade de resolução da ambigüidade após a coleta de uma pequena seqüência de observações (ou até mesmo em uma única), em distâncias curtas o bastante para que se possa ignorar o efeito oriundo da ionosfera. Além da ionosfera, existe um outro fator limitante nesta estratégia: o efeito provocado por multicaminhamento. Para bases longas, pouca vantagem advém da terceira freqüência.

Observações de pseudo-distância são bem-vindas, nessa estratégia de resolução da ambigüidade, ao se amalgamarem com as observações de fase da portadora, em um processo de amaciamento. Este processo de combinação entre código e fase, foi originalmente proposto por Hatch, nos primórdios da década de 80, motivo pelo qual é, às vezes, referido como filtro de Hatch.

É interessante também verificar que o mesmo autor, Ron Hatch, então cientista da Magnavox, já preconizava as vantagens que uma terceira freqüência traria, em uma época onde não se poderia imaginar a revolução que o GPS provocaria. E nem que algum dia um terceiro sinal se tornasse disponível.

As vantagens oriundas da futura nova estrutura dos sinais GPS são notáveis. Em levantamentos em bases curtas e em tempo-real, do tipo RTK, será possível uma imediata resolução da ambigüidade, com conseqüente precisão centimétrica, praticamente ao se ligar o receptor. Pode-se antever possível vantagem também na navegação aérea, na aproximação da aeronave: se existir um receptor de referência no aeroporto, a distância entre ele e a aeronave será pequena (base curta), e justo na hora certa. Também para navegação em geral, o acesso a um novo sinal, protegido, trará vantagens, pela correção do atraso provocado pela ionosfera, e redundância.

Marcelo Carvalho dos Santos
é Ph.D. em Geodésia e Engenharia Geomática pela Universidade de New Brunswick, Canadá, onde é professor adjunto e membro do Laboratório de Pesquisa Geodésica. E-mail: msantos@unb.ca